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LIVROS, ÁRVORES E SOMBRAS

Dizem que para você ser realizado na vida tem que ter um filho, plantar uma árvore e escrever um livro. Não é propriamente uma máxima e nem é só isso que devemos fazer nessa curta travessia da ponte para o outro lado, mas vale pela força das palavras que nos deixam mais fortes para as lutas diárias. Lembrei desse pensamento ao flagrar com minhas lentes a exposição de vários livros debaixo de uma árvore no Centro de Cultura Camilo de Jesus Lima durante a I Fliconquista – Feira Literária de Vitória da Conquista. É como se fosse uma prosa debaixo de uma sombra. Não deixa de ser poético e significativo. Os dois representam a vida. Livro e árvore são fontes de alimento para o espírito e, infelizmente, são tão maltratados e vilipendiados nos tempos modernos e desumanos onde se idolatra o capital, ao invés de se valorizar e cuidar bem do meio ambiente e do livro. Lemos pouco para expandir nossos conhecimentos e saber, e derrubamos e incendiamos nossas árvores que nos dão oxigênio para respirarmos. No campo (não se faz muito isso nas cidades) como é bom prosear debaixo de uma árvore frondosa numa sombra fresca em sol escaldante. O livro também é uma sombra fresca onde você bate um bom papo com o autor e viaja dentro da sua imaginação, seja qual for o gênero. Livro e árvore são símbolos da vida que devem ser preservados e admirados com todo carinho e zelo. Ambos são puras poesias e brotam flores perfumadas e dão frutos existenciais. São eternos e imortais. Eles merecem louvor porque emitem amor e paz quando estamos triste, deprimidos, desanimados, sem fé e esperança diante de tantas intempéries do mundo atual.

AURORAS DO MENINO POSSÍVEL

Depois da ponte, a fazenda Natal;

A casa azul, adiante, no caminho.

Na Avenida Baér, os carroceiros

Acomodam arreios e alimárias.

De calças curtas ou calção de banho,

Ia com o primo manco de menino,

Sempre de tarde, quando o sol morria,

Tomar banho no Poço do Curtume.

Moço cordato e companheiro que era,

Ensinou-me a nadar no calmo rio.

Comecei pelo nado-cachorrinho;

Logo braçadas e depois mergulhos,

Só voltando de lá no lusco-fusco,

Quando o sino dobrava Ave-Marias.

Poema do meu digníssimo professor na Faculdade de Jornalismo da UFBA e colega de redação do jornal “A Tarde”, Florisvaldo Mattos, o Flori, para os mais íntimos, nasceu em Uruçuca-Bahia, poeta, jornalista, exerceu cargos em vários jornais, como editor-chefe do Diário de Notícias e no A Tarde. Foi chefe da Sucursal na Bahia do Jornal do Brasil, editor do Caderno Cultural do A Tarde, premiado em 1995 pela Associação Paulista de Críticos de Arte como melhor do Brasil no quesito de Divulgação Cultural. É membro da Academia de Letras da Bahia. Dentre outras obras poemas publicou Reverdor (1965), Fábula Civil (1975), Mares Anoitecidos (2000), Galope Amarelo e Outros Poemas (2001), Poesia Reunida e Inéditos (2011) e participou de antologias poéticas nacionais e internacionais.

 

“ESCÂNDALO”, BRADAM OS ARGENTINOS

Carlos González – jornalista

“Escândalo” foi o termo mais usado pela imprensa argentina para qualificar as agressões sofridas por torcedores do país vizinho nas arquibancadas do Maracanã. Claro, a Polícia Militar do Rio de Janeiro executou as ações violentas, mas quem foi o responsável por não separar as torcidas, como é normal em jogos onde a rivalidade tem a maior relevância. Há casos de partidas com torcida única, como os Ba-Vi em Salvador.

O que mais causou indignação dos argentinos foi observar nitidamente pela televisão que os policiais brandiam os enormes cassetetes contra uma minoria, quando os incidentes entre as duas torcidas, com ampla vantagem numérica de brasileiros, era generalizada. Alguns argentinos tiraram as camisas para não serem identificados, enquanto outros sangravam no rosto e na cabeça.

“Isso sempre acontece no Brasil”, exclamou Lionel Messi ao observar as cenas de selvageria. Liderando seus companheiros de seleção partiu em direção às arquibancadas, numa tentativa de ajudar seus compatriotas. O goleiro Martinez chegou a arrancar o cassetete das mãos de um policial.

A atitude de Messi, que chegou a colocar em dúvida a realização da partida, surpreendeu a todos, porque o melhor jogador do mundo, eleito pela FIFA, revelou em toda sua carreira um comportamento passivo, nunca se envolvendo em confusões dentro do campo. Em sua última apresentação em solo brasileiro Messi admitiu que não jogou bem, “porque estava mais preocupado com a segurança dos “hinchas” nas arquibancadas”.

Rodrigo Paiva, eterno assessor de imprensa da CBF, questionado sobre a ausência de divisão de torcida, explicou que o “o mando de campo é nosso, mas a organização do jogo é de responsabilidade do Consórcio Maracanã”. Acrescentou que “a CBF não é polícia para definir a estrutura de isolamento”.

Vamos acabar com essa falácia de apontar argentinos e uruguaios como catimbeiros e violentos. No jogo de ontem, o Brasil cometeu 26 faltas, muitas violentas (o uso do cotovelo no rosto do adversário virou uma prática comum entre nossos jogadores); a Argentina, 16. Os brasileiros receberam dois cartões amarelos e um vermelho (jornalistas patriotas não viram o tapa desferido pelo desconhecido Joelinton no rosto de De Paul).

Recentemente, Argentina e Uruguai (a rivalidade entre os dois países é muito grande) se enfrentaram pelas Eliminatórias no “alçapão” da Bombonera, em Buenos Aires. Assistida por mais de 70 mil torcedores, a partida terminou em paz, com vitória da seleção visitante.

Três derrotas consecutivas e o primeiro revés em eliminatórias no Maracanã. É preciso reconhecer que já não temos o melhor futebol do mundo; caímos ao nível de colombianos e equatorianos; praticamos um futebol cheio de faltas e atitudes antiesportivas, como a irritante “cera”; nossa seleção tem 90% de “estrangeiros”, desconhecidos para o torcedor; a Europa está mil anos-luz na nossa frente.

Durante os 25 minutos que a seleção da Argentina permaneceu no vestiário do Maracanã, determinada a não jogar, o dirigente que mais se movimentou no estádio, com o objetivo de reverter aquela situação, foi Claudio Tapia, presidente da AFA (Associação de Futebol da Argentina). A presença do presidente da CBF, Ednaldo Rodrigues não foi notada.

Segundo os críticos de Ednaldo na imprensa do Rio e de São Paulo, que o discriminam por ser nordestino, o ex-jogador da várzea de Vitória da Conquista estaria evitando “bater de frente” com os dois metros do seu colega argentino. “Uma vergonha! Ednaldo se acha o rei do futebol. Deveria deixar o cargo…”, bradou Galvão Bueno.

Para outros, Ednaldo ainda estaria em Salvador festejando o título do seu time, o Vitória, campeão da série B de 2023. Coincidência ou não, durante os 16 anos como presidente da FBF (Federação Baiana de Futebol), o dirigente avalizou 12 dos 29 títulos de campeão baiano conquistados pelo clube rubro-negro em 124 anos de existência.

 

 

UM VENDEDOR DE POESIAS

Uma alimenta o corpo e a outra a alma, o espírito. Estou falando das feiras de produtos agrícolas, de cereais, carnes, frutas, mantimentos em geral, bugigangas e tantos outras coisas nas pequenas e grandes cidades, com seus cheiros, sabores e cores, onde acontecem os encontros e encantos através das amizades do bom bate-papo, e das literárias com suas ideias, pensamentos, conhecimentos, saberes e livros de autores de diversificados gêneros. Ambas são culturais, uma mais popular, mas ricas.

Tanto numa como na outra existem aqueles bons vendedores propagandistas e comunicativos que, num bom argumento, sabem atrair o cliente para negociar o “seu peixe”, seja numa barraca, num cantinho qualquer, no chão, na mão ou num estande. Não importa se o local é confortável ou estratégico. O que mais conta como arma principal é a palavra, esta que vem do alto e sai da mente com aquela força que arrebenta corações.

Na I Fliconquista – Feira Literária de Vitória da Conquista. que foi encerrada neste domingo (19/11/23), tive o grande prazer de conhecer esse bom vendedor, mas de ideias e poesias, de conversa agradável e cativante,  que segue como um peregrino ou mochileiro de longas caminhadas e histórias para contar. Onde chega ele vai logo pedindo passagem com seu axé.

Trata-se do nosso poeta José da Boa Morte que veio lá da capital, numa distância de pouco mais de 500 quilômetros num ônibus tipo comercial, mais conhecido como “pinga-pinga” que para em todos lugares. Com sua mochila de imaginações e sonhos, não teme a hora desde que cheguei em seu destino das letras. É isso ai, seu Zé da travessia.

Com seu jeito simples e matreiro, atento a tudo que ocorre em seu redor, ele pode ser chamado de o rei das feiras literárias porque está sempre presente nelas. Na Bahia ou em outros estados, lá está o José cortando estradas, encurtando distâncias entre as veredas e comendo poeiras.

Olho no olho, falante e contador de causos, usa até seus repentes para vender suas poesias, como Amor e Risos (Sem  Fronteiras), livretos “ArtPoesia”, da poetisa goiana Cora Coralina (134 anos), Maria Firmina dos Reis, uma negra que canta a liberdade (Poesia, Prosa e Amor) e tantos outros escritores e poetas de renome. Em sua sacola, o perfume das flores.

Tive o privilégio de ficar ao seu lado num estante da Fliconquista e aprendi muitas coisas, como abordar o leitor e ser um bom vendedor de ideias. Fizemos uma parceria onde um vendia a obra do outro quando precisávamos dar uma saidinha e até participar de algumas atividades que rolavam na feira.

“Daqui do telão, ouvi sua palestra sobre Cenas de Resistências na História de Conquista e adorei, uma potência de informações” – disse-me o Zé. Não sou muito de ligar para elogios, mas quando é sincero, sinto que a missão foi cumprida e o recado foi dado. O fundamental é a mensagem que fica, mesmo que seja uma só pessoa.

Sempre se diz que o escritor, como o artista de outra linguagem qualquer sabe fazer sua arte, mas se enrola e tropeça quando parte para comercializar seu trabalho ou entrar nesses editais burocráticos, mas José aprendeu a se virar na hora de conquistar um novo leitor. Se o sistema é assim, quem está na chuva é para se molhar. Ele vai com ânimo e não desiste, mesmo quando recebe um não.

José da Boa Morte, em homenagem à Irmandade da Boa Morte, de Cachoeira – Bahia, contou que no seu primeiro dia da feira em Conquista, na quinta-feira (dia 16/11) não vendeu nada e quase retornava, mas repensou e enfrentou com coragem os outros dias. “Não posso ser vencido logo no primeiro dia”. “E agora José”? Tem uma pedra no caminho, mas é só retirá-la. Se perdeu a chave, existe outra forma de entrar.

Não se abateu e se deu bem. Ele me fez lembrar do bom barraqueiro das feiras livres que, com sua voz firme na garganta e simpatia, chama o cliente para si mostrando a qualidade do seu produto. Vai chegando meu povo que aqui tem coisa boa – grita o bom feirante! Nessa hora, não adianta ficar pensando em crises. Na literatura, acontece o mesmo.

O livro, a abóbora, a melancia, o pepino ou uma verdura têm suas peculiaridades e gostos diferentes, mas são iguais na mão de um bom vendedor. José escolheu o mais difícil e vai rompendo trilhas, conhecendo gente nesse mundão e acreditando em sua arte de escrever e vender.

É o José das ideias e das poesias. “Quem sabe faz a hora, não espera acontecer” – já dizia o cancioneiro Geraldo Vandré, o Boby Dilan do sertão nordestino. “Para não dizer que não falei das flores”. Lá vamos nós cruzando a ponte e pedindo passagem nas travessias.

 

TREZE ANOS DE HISTÓRIA QUE COMEÇOU COMO “VINHO VINIL”

São treze anos de história cultural que nasceu do encontro entre os amigos Jeremias Macário, Mannu Di Souza e José Carlos D´Almeida que tiveram a ideia de criar o grupo “Vinho Vinil”. Isto ocorreu em 2010 num bate-papo descontraído entre uns comes e bebes festivo. Para comemorar esses treze anos, decidimos realizar um documentário como forma de registrar sua história.

Como a própria denominação já diz, o objetivo era unir as duas coisas, mas com o propósito principal de valorizar o velho vinil. A ordem era não se ouvir músicas de outras mídias, tocar viola e nem tomar outra bebida que não fosse o vinho.

Não demorou muito e outras pessoas foram se juntando ao grupo. Em pouco tempo, o “Vinho Vinil” se transformou num sarau, com cantorias variadas, declamação de poemas, contação de causos e a liberação de se tomar outras bebidas, mas o vinho permaneceu como carro-chefe.

O “Vinho Vinil” tomou outras proporções e formatos se tornando “Sarau a Estrada”, realizado no Espaço Cultural que leva o mesmo nome, sempre com um tema central na abertura. Durante sua existência, os participantes acreditam que seja o sarau mais longevo em Vitória da Conquista.

Mesmo no período da pandemia da Covid-19 (2020/22), quando as pessoas foram obrigadas a se isolar para não serem contaminadas, o Sarau A Estrada continuou a funcionar de forma virtual através de lives e produzindo vídeos de textos poéticos autorais, nas pessoas de Jeremias Macário, Vandilza Gonçalves e D´Almeida.

Como resultado, foram gravados dois curtas-metragens (“Coronavid” e “Brasil, Nunca Mais”) de mais de 20 minutos cada, sendo que um deles foi contemplado num edital da Prefeitura Municipal de Conquista. Esses vídeos foram distribuídos em redes socais e entre o grupo do sarau.

Durante esses anos, além do lançamento de um CD com músicas e poemas autorais, bem como uma apresentação no Teatro Carlos Jheovah, debatemos questões culturais, políticas e sociais abordando diversos temas, como educação, carnaval, cultura conquistense, os movimentos políticos de 1968, folclore nordestino, literatura, escritores do Nordeste, história da música popular brasileira, escravidão, o povo cigano, Gregório de Mattos, Castro Alves, cordel, cinema, Glauber Rocha, dentre tantos outros. Como o sarau é eminentemente cultural, evitamos colocar em discussão política partidária.

Com a participação de estudantes, jovens, artistas em geral, intelectuais, professores e demais interessados, o Sarau A Estrada tem hoje sua própria história e identidade, sob o comando de uma comissão organizadora.

Nesses treze anos de fundação ocorreram muitos fatos interessantes e curiosos, como lançamento de um filme e livros, os quais merecem uma crônica ou um artigo literário. Muitos, inclusive, já sugeriram o seu tombamento municipal por se tratar de um evento de utilidade pública.

Nas lentes das máquinas fotográficas e dos celulares, nos debates de diversos temas, no bate-papo fraternal e acalorado, nas contações de causos, nos casos de pessoas que aqui pernoitaram, nas pessoas que já partiram para o outro lado, nas declamações de poemas, nas cantorias dos violeiros, nos amores encantados e nas trocas de ideias, o “Sarau A Estrada” é conhecimento, saber e aprendizagem. Como já foi dito, o evento é realizado no Espaço Cultural A Estrada de dois em dois meses de forma colaborativa e democrática.

 

MUITAS ATIVIDADES NA FLICONQUISTA E UM ESVAZIAMENTO NAS PALESTRAS

PRODUTOS ORGÂNICOS E ARTESANATO TAMBÉM SÃO CULTURA NA FLICONQUISTA NAS FOTOS DE BASTIDORES DE  JOSÉ CARLOS D´ALMEIDA E JEREMIAS MACÁRIO

É muito agradável entrar numa feira literária e passear entre os mais variados livros de autores com os títulos os mais chamativos possíveis contemplando gêneros desde o romance, contos, ensaios, biografias, poesias, histórias, entre outros, além dos infantis que deixam a criançada curiosa e ávida pela leitura.

Como jornalista e escritor, confesso que tudo isso me deixa mais esperançoso e fortalecido, como está sendo agora com a I Feira Literária de Vitória da Conquista- A Fliconquista que está sendo realizada no Centro de Cultura Camilo de Jesus Lima e se encerra neste domingo dia 19/11. Sem dúvida foi o acontecimento cultural mais marcante do ano, esperado há muito tempo pelos escritores das letras conquistenses.

É bom encontrar com os amigos artistas e bater aquele papo cultural sobre novas obras e sentir de perto o cheiro do papel saído das editoras e gráficas repleto de ideias. Não deixa de ser uma viagem que eleva nossos espíritos. Queremos ouvir de perto as vozes que ecoam neste Sertão da Ressaca, como foi a coletânea organizada por Chirles Oliveira e Ybeane Moreira que abriu as portas para outros lançamentos.

Observei nessa primeira Feira Literária a junção de muitas atividades nas rodas de conversas em torno do Centro de Cultura nos estandes e tendas e isto é saudável e salutar. Do outro lado, no entanto, houve um esvaziamento nas palestras (bate-papo) no auditório porque as pessoas não conseguiram acompanhar tudo ao mesmo tempo.

Sobre este assunto, conversando com um amigo, ele me respondeu que é nestas ocasiões onde o muito se torna menos. Falava que a organização poderia ter dado mais atenção para os temas escolhidos, de modo a valorizar o palestrante que muitas vezes chega lá e não tem quase ninguém na plateia porque existem outras atividades ocorrendo no mesmo horário.

Uma das saídas seria encontrar uma forma de divisão do trabalho de maneira que as palestras não fiquem ofuscadas e terminem sendo apenas um ponto decorativo da festa. Outra alternativa seria reduzir as palestras, encaixando-as em horários compatíveis, para que não ocorra conflitos com as outras ações da feira. As reuniões, os encontros, lançamentos de obras e as oficinas são importantes e necessários, contanto que não anulem as palestras.

Entendo que possa haver uma conciliação entre os horários e se abra um espaço de prioridade para os chamados bate-papos no auditório principal, para que o palestrante não seja diminuído em sua fala, especialmente quando não se trata de uma celebridade nacional, muitas vezes da mídia, da política e das artes. Quando é um personagem famoso como palestrante, acontece o contrário: São as outras atividades que ficam prejudicadas.

“Cenas de Resistência na História de Vitória da Conquista” foi um tema bem sacado pela curadoria, que deveria ter sido preservado e mais divulgado para atrair mais gente, justamente porque a feira está se realizando na própria cidade. Trata-se da história de um povo que precisa ser contada e escutada por todos nós.

 

 

HISTÓRIAS DA BAHIA GUARDADAS NO MOCÓ (2)

(Algumas notas de Hildegardes Vianna no final do livro “A Bahia já foi assim”)

(Chico Ribeiro Neto)

Publico hoje a segunda parte da crônica sobre o livro “A Bahia já foi assim” (Editora Itapuã, 1973), da folclorista Hildegardes Vianna.

Na crônica “O quarto dos santos” ela comenta: “Quarto de santo é atualmente expressão dúbia. Pode significar casa de orixá de candomblé para a maioria dos leitores. Lugar de oração para uns poucos. Afinal, hoje não há cômodos suficientes nas residências, começando a rarear os devotos empenhados em reunir várias imagens em seus nichos particulares”.

Depois de ressaltar que “imagem nunca se compra, troca-se”, Hildegardes explica: “Há uma superstição que não permite que alguém diga que comprou uma imagem ou um santo. Consideram apenas como uma troca por dinheiro, porque só Judas vendeu um Santo”.

Na crônica “Todo mundo gosta de abará” ela lembra do “abará que já vinha com a pimenta temperando a massa, que se desmanchava na boca como pão-de-ló” e lamenta que é “bem diferente do abará que se modificou pela exigência do consumidor e não somente por culpa das vendedeiras. Abará que nem sempre traz camarão na massa, recheado como um sanduíche qualquer, com molhos de vários aspectos e procedências, entupido com o vatapá, que nem sempre é vatapá, será que ainda é abará?”. Lembro que este livro é de 1973.

Para ela, “era fácil identificar uma lavadeira. A visão de uma mulher descalça, com uma trouxa de roupa à cabeça, nos dias de segunda-feira, era trivial.”. Hildegardes escreve na crônica “As lavadeiras faziam assim”: “As lavadeiras podem ser classificadas de várias formas: as que lavavam na casa da patroa e as que lavavam na fonte; as que lavavam por peça e as que lavavam por mês; as que apenas lavavam e as que lavavam e passavam, além das que lavavam e engomavam”.

Em “As mãos das baianas” diz Hildegardes: “Enquanto não aparece um poeta, deixem que eu fale das mãos das baianas que vestem suas roupas repolhudas nos dias de festa”, e poetiza: “Reparem nas suas mãos que, agitando um galhinho de mangericão ou coisa que valha à guisa de abanador, vão e vêm sobre o tabuleiro lentamente, num ritmo certo. São mãos nodosas, de unhas incertas. Estragadas, mas limpas. Contrastam com os braços sedosos e roliços de suas donas. Mãos de quem trabalha não são atraentes nem desejáveis, mas são mãos encantadas. Mãos de fada”.

Antigamente, o xaréu era um peixe farto em Salvador. Dizem que o xaréu sumiu ou ficou raro nas nossas praias porque ele é um peixe que não gosta de zoada e o barulho dos carros na orla o afastou. A crônica “No tempo do xaréu” diz assim: “Xaréu era o peixe mais popular, mais barato, mais gostoso, mais consumido nesta nossa cidade. Xaréu fresquinho, pegado em Amaralina, comprado inteiro por preço mais irrisório que o de uma única posta de outro pescado. (As ovas, vendidas separadamente, constituem iguarias preciosas quando devidamente fritas)”.

Antigamente, no estádio da Fonte Nova, quando faltavam 10 ou 15 minutos para o final do jogo, os portões eram abertos para a entrada do “xaréu”, o pessoal que não podia pagar o ingresso.

O jornalista José de Jesus Barreto conta que teve uma vez em que o “xaréu” assistiu todo o segundo tempo. Foi no jogo Bahia x Santa Cruz, pela Taça de Prata, antigo nome dado ao campeonato brasileiro. O Bahia havia tomado 4 x 0 no primeiro jogo e precisava fazer 5 x 0 para se classificar às oitavas de final. Foi na noite de 5 de abril de 1981. Acabou o primeiro tempo com 3 x 0 para o Bahia e aí o presidente do tricolor, Paulo Maracajá, no intervalo do jogo mandou abrir os portões para entrar o “xaréu”, uma multidão que lotou a Fonte Nova, aumentou a pressão da torcida e o Bahia deu os 5 x 0 que precisava, auxiliado pelo árbitro Carlos Rosa Martins, que deixou de marcar “um impedimento escandaloso” no último gol do Bahia, aos 43 minutos do segundo tempo, lembra Barreto. A Fonte Nova explodiu de alegria e o “xaréu” teve um peso importante.

Segundo José de Jesus Barrreto, outro fator que certamente ajudou o Bahia foi o que um radialista (o repórter de pista) perguntou ao juiz, quando este retornou do intervalo e se espantou diante da Fonte Nova lotada para o segundo tempo: “O senhor vai ter coragem de anular um gol ou de marcar um pênalti contra esse time?”

Na crônica “Palavras más” Hildegardes escreve: “As horas eram boas e más. A pior de todas, a do meio-dia, quando o diabo saía do inferno para a sua ronda diária”. Mais adiante, observa: “O que eram palavras ruins? Coitado era uma. Não se lamentava alguém, impunemente, exclamando: Coitado! “Coitado do diabo que perdeu a graça de Deus, não eu que sou criatura de Deus, Padre todo poderoso. Coitado, por que?”

Hildegardes assinala: “Espreguiçar-se com o gemido “Ai-Ai” sem acrescentar “meu Deus” era caso para reprimenda. “Ai-Ai” era o diabo mais velho do inferno”. Ela ainda observa: “Quem tinha coragem de viver repetindo o nome de miséria, de desgraça, apenas para descarregar o seu gênio?”

(Veja crônicas anteriores em leiamaisba.com.br)

 

 

 

POESIA E FELICIDADE

Autoria do jornalista e escritor Jeremias Macário

O poeta canta a felicidade,

Manda valorizar cada dia,

O existir do viver,

Debulhar do alto o sinal,

Mas como alcançar essa felicidade,

Num Brasil tão desigual?

 

Felicidade! Felicidade!

Perdão meu poeta/poesia,

Numa festa tudo é alegria,

Utopia e distopia:

Não dá para rimar,

Amor com sofrer e dor,

Nesse turbilhão de maldade.

 

Felicidade! Felicidade!

Não consigo captar sua poesia,

Sua mensagem nessa viagem,

Se minha alma está em agonia,

De ver tanta gente encarcerada,

Meu povo andar como manada,

Nesse capital do gastar consumir,

Onde o pobre nem mais rir,

Passando fome pelos cantos,

Que mal dorme e come

Nos afogados da periferia.

 

Felicidade! Felicidade!

Liberdade! Igualdade!

Cadê minha soberania?

Finjo estar encantado,

No acalanto da sua poesia.

COMEÇOU A I FEIRA LITERÁRIA DE CONQUISTA EM HOMENAGEM A JESUS LIMA

Esperada por muitos anos pelos escritores, intelectuais, estudantes e artistas em geral, começou ontem (dia15/11) e vai até domingo 19/11, a 1ª Feira Literária de Vitória da Conquista – A Fliconquista numa homenagem ao poeta e escritor Camilo de Jesus Lima, tendo como tema a liberdade no ano do bicentenário da Independência da Bahia no Brasil.

Foi uma abertura memorável em grande estilo, com o primeiro lançamento de livros através da coletânea “Vozes que Ecoam na Joia do Sertão Baiano”, uma coletânea de 21 poetas e escritores, organizada por Chlirles Oliveira e Ybeane Moreira. A obra foi publicada pela editora “Versejar”, de São Paulo.

Ainda na parte da manhã e da tarde foram realizadas oficinas literárias, clubes de leitura, mostra de trabalhos artísticos das escolas, expografias temáticas de Madalena Santos (um quintal de telas) e tapeçarias para o mundo de Victória Vieira.

A sessão oficial de abertura se deu com a Camarata Neojibá, conferência sobre ideais da liberdade da Bahia na obra de Camilo de Jesus Lima, conferida pelo advogado, historiador e escritor Ruy Medeiros. Logo após aconteceu o espetáculo do artista musical “Gutemba” que cantou diversos poemas do homenageado da festa.

Com as presenças de artistas e escritores, como Zezé Mota, do jornalista premiado e ex-deputado federal, Jean Wyllys, Daniel Munduruku, ganhador do prêmio Jabuti e Paulo César Araújo, biógrafo do cantor Roberto Carlos, uma vasta programação de lançamentos e bate-papos está marcada para até o próximo domingo, com encontros literários, shows musicais e visitações guaidas.

Durante a Fliconquista, que conta com patrocínio do Governo do Estado da Bahia, recursos de emendas parlamentares  de iniciativa do deputado federal Waldenor Pereira, produção do Coletivo Barravento, curadoria de Ester Figieiredo, curadoria adjunta de Elton Becker e diversas parcerias, inclusive da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (Uesb), estarão expostas obras de escritores locais e de outros estados, sem contar a participação de bibliotecas comunitárias, como a Donaraça, de Juliana e Josué Brito, dentre outras, além da tenda do Sarau Multiverso, de Renas, abrangendo diversas linguagens do mundo cultural conquistense e de fora.

A 1ª Fliconquista é um acontecimento cultural que, sem dúvida, vai ficar marcado na história de Conquista. A expectativa dos participantes é que no próximo ano essa mesma festa seja repetida, com maior força e representação. A feira é um instrumento de incentivo de novos talentos voltados para a arte de escrever e também visa estimular a leitura, principalmente nos mais jovens.

 

O CINISMO DA PREVENÇÃO DA SAÚDE

Nos últimos tempos, a nossa mídia abriu mão de questionar os fatos e apenas faz aquela mesmice do factual na base do concordar com informações que, na verdade, não condizem com a realidade.

Em minha modesta análise, ela entra na onda por acomodação (não proposital e intencional) e termina desinformando a opinião pública, quando deveria ser o contrário. Isso é pecar por omissão, o que é tão maléfico como mentir.

Uma dessas coisas que sempre acompanho são matérias na área da saúde, especialmente em campanhas dos meses rosas, azuis e outras cores correspondentes ao tratamento de determinadas doenças, como do coração, do diabetes, da próstata e agora do câncer da mama.

Os repórteres se colocam, muitas vezes, no lugar dos médicos-cientistas (arrogância) e aconselham que a prevenção do tratamento é a melhor saída. Não é que esta recomendação não seja verdadeira, mas esquecem de explorar o outro lado do Brasil desigual onde a maioria dos brasileiros, dependentes do SUS, não tem acesso fácil aos exames mais importantes e caros.

É o que chamo de cinismo da prevenção da saúde onde a ordem geral é que todos procurem o seu médico e façam suas consultas regulamente, inclusive dos exames solicitados pelo profissional. Até parece que neste país a saúde é de alto nível e qualidade. É só marcar o exame e no outro dia a pessoa já é atendida.

Tenho exemplos, aqui mesmo em Vitória da Conquista, de mulheres que pediram uma mamografia no posto de saúde e estão na espera da fila há quase um ano. Eu mesmo marquei um otorrino e tem mais de um ano sem me chamar. Nem preciso mais. Imagina se fosse uma coisa grave, como um câncer! Teria virado uma metátese e morrido. Basta ser um procedimento de média a alta complexidade para tudo ficar emperrado!

Por que a mídia não mostra a outra face da moeda penosa do pobre que depende do SUS? A mesma coisa é quando se diz para não se comprar remédio na farmácia sem receita médica. Para complementar, acrescenta-se que procure seu médico. Isso é uma tremenda piada, para não dizer utopia. O que vemos muito são reportagens enganosas no estilo propagandista dos políticos governantes.

Será que os jornalistas acham que o povo é tão burro assim ao ponto de não perceber e ficar revoltado? Aprendemos a subestimar a inteligência dos outros. Vamos ser mais criteriosos, éticos e responsáveis com a verdade. Condena-se tanto as fake news e termina-se divulgando elas de outra forma, porque não existem mais editores, redatores e chefes de reportagem como antigamente.





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