:: ‘Na Rota da Poesia’
SEUS CABELOS
Mais um verso da lavra de Jeremias Macário
De seus cabelos,
Cor da graúna,
Finos fios,
Tecem nessa teia,
Enredos e segredos.
Seus cabelos ternura,
De pura seda,
Deusa grega,
Tão meiga,
Do cisne Zeus,
Ou cigana alegria,
De alma indiana,
A irradiar energia.
O poeta navegante,
Das espumas flutuantes,
Encantado se enamorou,
Com aquela sereia,
Serena a flutuar,
No mar das águas nua,
Prateada da lua,
E de seus cabelos,
Dela fez musa amor,
Com seu poema eternizante.
Seus cabelos,
Na rede balança,
No vaivém da trança,
Flor da poesia,
De sorriso menina,
Que me ilumina.
O SERTÃO VAI VIRAR DESERTO
Mais um poeminha de autoria do jornalista Jeremias Macário
Do alto tem um vigia,
Que nos espia.
Vagueiam o mistério e a magia,
No meu sertão catingueiro,
Onde a lua prateia nosso terreiro.
Poetas, profetas e cancioneiros!
Entre amores e dores,
Os ventos rasgam os montes;
A seca devora açudes e fontes,
E o nordestino temente penitente,
Em seu oratório,
Sem mais adjutório,
Implora a Nossa Senhora.
O sal engole a terra,
Não mais há mata naquela serra;
Lá se foram os bravos e os fortes;
Nos engaços rondam as mortes,
Nesse tempo tão incerto,
O sertão vai virar deserto.
Não quero ser coveiro,
Meu amigo Conselheiro!
O sertão já foi mar,
E nunca mais será.
Agora o certo:
É o sertão virar deserto.
Não adianta ser esperto,
Criar barragens e canais,
A natureza dá seus sinais,
Que o sertão vai virar deserto.
PARADO NA ESQUINA
Mais uma produção poética social do jornalista Jeremias Macário
Ei, seu cabra suspeito!
O que está a pensar,
Aqui parado,
Neste poste da esquina,
Com esse jeito,
De quem vai roubar?
Seu polícia,
Meu nome é fome,
Que não me deixa raciocinar.
Só estou assuntando,
Essa sociedade assassina,
Metida a grãnfina,
Que concentra toda riqueza,
Pra gerar nossa pobreza.
É, seu preto meliante!
Com esta cara de traficante,
Se vire pra uma revista,
E “tege” preso,
Vagabundo subversivo,
Que nem deve estar vivo.
Seu soldado,
Só estou aqui parado,
Neste poste da esquina,
Esperando o carro do osso,
Pra pegar umas pelancas,
Fazer um angu,
Pra Zefa de Manu,
E minha criança menina.
Não passo de um cidadão,
Sem no bolso um tostão,
E o senhor, um cativo
Do capital patrão.
Está algemado e detido
Por desacato à autoridade,
Sem essa de liberdade,
Seu bandido atrevido.
Por ter reagido,
Jogaram o moço na viatura,
Nem passaram na delegacia,
Muita porrada e tortura,
Deram cabo do coitado,
Com tiros na travessia.
A CONTA NÃO BATE
Mais uma produção do jornalista Jeremias Macário sobre a destruição do meio ambiente
Da ficção nasce o real,
Em cenas chocantes,
De gemidos lamuriantes:
Labaredas lambem a terra,
Da serra derrete o gelo,
Pelo calor infernal,
Que vai esquentar o mar.
É o dragão soltando fogo,
O beija-flor pingando água,
E a campanha entra no jogo,
Pra ver quem consome mais,
Na disputa dos canais.
Quando se planta uma árvore,
Milhões são derrubadas,
Gases tóxicos vão ao ar,
O sal come o chão,
E só se vê destruição.
A conta nunca bate,
Nem existe empate,
Nesse diário planetário.
Em noites de orgias,
De caras taras de famas,
A fome revira o bagaço,
O bilionário caga no espaço,
E a floresta se arde em chamas.
A mente cria outro invento,
Para a indústria lucrar;
Lá fora sopra um vento,
Como alma penada a vagar.
O dia vai ficar escuro,
Em ruínas de monturo,
Sem mais fonte cristalina,
Só escorre esgoto de latrina;
Nem o vermelho pôr-do-sol,
Pra acender nosso farol.
PESCADOR DE PENSAMENTOS
Mais um poeminha da minha lavra, Jeremias Macário, que em breve fará parte de uma obra intitulada “NA ESPERA DA GRAÇA”, só de textos poéticos. Aguardem!
Não sou de peixe pescar,
Nem em rio, nem em mar;
Sou mais da mata do orixá.
Curto minha cigana cabana,
Como recluso solitário,
Fugitivo dessa bruta sociedade,
Para ser pescador de pensamentos,
Sobre o sentido da liberdade.
Lá fora, o frio cortante,
No açoite dos ventos,
O coiote uiva no monte,
E a lareira aquece,
Minha prece,
Trazendo pensamentos,
Misturo Freud, Engls e Marx,
Na porta bate o Prudhon,
Também os antigos gregos,
Nietzsche, Tolstói e Sartre,
Existencialismos e ismos,
De Kafka, o niilismo,
De Shakespeare, o dom,
Na arte de viver sem apegos,
No dito pelo não dito,
Penso em Cristo,
No satanás maldito,
Que dizem ser mito.
A noite está se esvaindo,
A lua quase caiando;
Imagino não existir fronteira,
Como na origem dos tempos,
Quando amei aquela feiticeira,
Ladra do meu sonho,
Onde tudo lá deixei,
Para me tornar frei,
Pescador de pensamentos.
Nesse gelado inverno,
Escuto Círculo de Fogo,
Penso no céu e no inferno,
Nas palavras como jogo,
No fulk de Boby Dilan,
Milton, Raul e o pop Gil,
O bolero de Ravel,
Morricone e Joan Baez,
No som do piano de Elton John,
Que brotam de uma só vez,
Viçosos rebentos,
De pescador de pensamentos.
O sono no labirinto tombou,
Levando meus sentimentos,
De espírito cheio de dor,
Levanto com pensamentos,
De simples pescador.
A VELHICE
Verso de autoria do jornalista Jeremias Macário
Da velhice fazem piadas,
Que dói aqui, dói acolá,
Esquece que seu dia vai chegar,
Para seu ciclo fechar.
Falam que a velhice,
Volta a ser criança,
Que ela é o renascer,
Com a face da sabedoria,
A firme crendice,
Que não existe,
Uma única filosofia.
Velhice não é o fim,
É só um idoso jardim,
Colha dele sua flor,
Da senhora ou senhor.
Ela está no rio,
Que se encontra com o mar;
É terra em seu cio,
Semente que vai renovar,
O amanhecer do amanhã,
Fumaça do grande chamã,
O sol, montanha e o ar.
Meu camarada,
Você não sabe distinguir,
Entre o tudo e o nada;
Use sua cuca inteligente,
Para ser mais engraçado,
Que a velhice de repente,
Vai estar bem ao seu lado.
NA CONTRAMÃO
Do livro Pofesto – Ação Direta, de Danilo Jamal
Na contramão a arte,
Que tenta fugir dessa estrutura de tanta
Amargura.
Quem for artista que se cuide!
Repressão retada, truta!
Se vacilar eles vão querer de dar um pega
E não uma trufa.
Sempre eles, os donos da verdade
Absoluta.
Do outro lado, nós na luta,
Ferozes na labuta,
Por não aceitarmos esses filhos da puta,
Cheios de falhas na conduta,
Que não respeitam artistas de rua,
Que suam, todos os dias, para sobreviver,
Vencer e entender…
Por que nos prender?
Ah, tá! Eles pensam em deixar as ruas
Limpas, mas, pra quê?
Tem lógica esse pensamento?
Realmente, sinceramente…
O que falar dessas vendas nos olhos?
Incentivo só para os playboys nos postos.
Acidentes, sociedade no puro ódio,
Tempos retrógrados…
Quem é artista que fique ligado,
Negócio vai ficar pegado,
Alívio mesmo, só quando for carburar
Distante dos folgados.
Observem o que o cabresto faz?
Nos tira todas as possibilidades reais.
O FRIO ME CONSOME
Poema inédito de autoria de Jeremias Macário
O frio me consome,
Nessa solidão que lambe,
O meu verbo poemar,
Entre ondas geladas do mar,
Com a neve a engolir o ar.
O tempo parece não se mover,
Sem nunca esquecer de você.
Imagino o colorido da cigana,
Da dança religiosa-profana,
De temperatura-tortura,
Sem vontade de levantar,
Nem da vida o lidar.
Vejo até leão na savana,
Do outro lado de lá.
Rodando minha cabana.
Tomo uma taça de vinho,
Sinto o cheiro do cio,
Com as ideias no ninho.
Não consigo respirar;
Entender a alma latina,
De tanta gente com fome,
Do poder da mão assassina,
Nesse frio que me consome.
Da boca sai a fumaça,
Desse frio carrasco,
Que meu neurônio se assa,
Preso num frasco.
No alerta do radar
Vem o desejo de amar.
Estou condenado,
A ficar aqui isolado,
Sem saber se sou homem,
Lobo ou lobisomem.
Foi-se o mentiroso sol;
Minha mente escrava cativa,
Liga em Assaré Patativa,
Do agreste nordestino,
Nuvem Orixá, ente divino.
Esse frio me consome;
Preciso me aquecer;
Rogo voltar pra mim,
Com seu cheiro de alecrim.
Esse frio me consome,
Às vezes troco seu nome,
Mas grudou o amor que ardia,
Naquele verão do lindo dia,
Que me ensinou a te amar,
Em qualquer lugar.
Como vira-lata enlatado,
Aqui todo enrolado,
Como pacote fechado,
Sem forças para respirar
Nesse louco frio,
Que me rouba o brio,
Pensando pegar a pista,
Da minha querida Conquista,
Pra Juazeiro, Piauí ou Ceará
Natal ou até o Pará.
Seu moço,
Esse frio me consome,
Me impede de circular,
Mas sempre vou te amar.
O corpo arqueado doído
Fica ainda mais dolorido,
E o espírito pede passagem,
Para outra viagem,
No calor do meu amor.
O frio me consome,
Solitário de mim,
Em meus diários,
De segredos sagrados,
Como relicários.
Minha alma banha em lágrimas,
Nessa garoa fria e calma;
E só o amor me guia,
Nessa acelerada via,
Errante, pensante, delirante,
Nesse frio que me consome.
QUEM É ESSE ENCANTADO?
Quem é esse encantado,
De alma menino,
Que tanto nos fascina,
Como mito divino,
Que encurta caminhos,
De origem asiática ou latina,
Que escreveu em sua lápide:
Por aqui passei, sempre amei,
E tudo deixei.
Quem é esse encantado,
Sem mitra e estola,
Que da vida fez escola?
É índio guerreiro?
General das guerras vencedor?
Escravo liberto do seu senhor?
Sábio viajante do tempo?
Ou espírito amante cantante?
Quem decifra seu encanto,
De encantado profundo,
Religioso e profano,
Que sabe rir e sofrer,
Sem ser pecador e santo,
Que só o canto da viola,
Desencanta seu mundo?
Quem é esse encantado,
De tanto mistério na terra,
Que sabe subir e descer a serra,
E conhece os enigmas do ar e do mar?
Quem é esse encantado,
Que tanto encanta o humano,
Pescador de poesia,
Resistente como planta
Do nosso sertão nordestino,
Que rege seu próprio destino,
E vive da sua filosofia?
ESCRAVIZADOS
De Danilo Jamal, em POFESTO – Ação Direta, Editora EDU O.
Pela frente ou por trás,
Nenhum deles sabe o que faz.
Nos tiram o direito,
Alegando que é em nome da paz.
Nos jogam em qualquer lugar
Feito animais,
Mancham nossa história
E esquecem nossos ancestrais.
Nos colocam em vitrines,
Para ver quem paga mais.
São essas as grandes
Injustiças sociais.