:: 17/fev/2025 . 23:14
DO ANALÓGICO AO VIRTUAL
Ninguém quer mais saber da época do pilão de café ou fazer uma omelete num prato batendo os ovos com uma colher até ficar no ponto. Era gostoso e dava satisfação. Vivíamos no tempo do analógico onde o telefone fixo e aquela velha televisão de duas cores preto e branco eram nossas maiores invenções, sem contar o antigo rádio a pilha que levavam pancadas quando davam interferências e ruídos. Às vezes, voltavam ao normal.
Como diz um dos ditados mais populares: Éramos felizes e não sabíamos, como nas brincadeiras de criança. Pouco se falava de angústias existenciais, estresses, sintomas de pânicos, traumas diversos e outros problemas psicológicos.
Depressão tinha o nome de fossa e nem se ouvia falar em psicanálise. A sabedoria estava nos mais velhos. Eles hoje nem são mais consultados. Um conselho ao pé do ouvido nos tirava das enrascadas. Atualmente respondemos que se conselho fosse bom, não se dava, se vendia.
Hoje tudo é elétrico e tecnológico, da cozinha ao quarto de dormir e somos vigiados dia e noite pelas câmaras. Vivemos em plena era virtual onde as pessoas passam a maior parte de suas vidas agarrados num celular que lhe enche de informações, umas corretas e milhares de falsas, sem falar que este aparelho conseguiu colocar os bandidos dentro da sua casa para lhe infernizar com seus ardilosos golpes.
É claro que existem as vantagens e as facilidades, principalmente quando se trata de ganhar mais dinheiro, mas reclamamos da correria e de que o tempo passa bem mais rápido, o que é uma tremenda ilusão. O tempo é o mesmo, nós é que não somos mais os mesmos.
Aliás, por mais que sejam os problemas e os aperreios, sempre temos na ponta da língua palavras e expressões de otimismo, de que a vida é bela e que tudo vai melhorar, em nome de Deus. Para as doenças físicas, da alma ou do espírito, como queiram, nos apegamos a todo tipo de autossugestões, seitas e religiões.
Os vídeos virtuais nos mostram que dançar nos acalma, alivia nossas tensões e nos dá paz espiritual. Ter bons sentimentos serve até de remédio no tratamento do câncer. Os programas de televisão estão sempre ditando normas de como devemos agir diante das adversidades e querem nos ensinar como devemos fazer as coisas certas, como se existisse um padrão que valesse para todos, quando, na verdade, cada caso é um caso.
Mesmo com todas essas dicas e antídotos contra o baixo astral e as contrariedades, não podemos esquecer que depois de uma dança relaxante, de uma festa de porre com os amigos, de passar horas ouvindo boas músicas ou cuidando de nossas plantas e hortas, a realidade volta a ser o nosso carrasco, embora sejam meios de revigoramento das forças.
Sem ser saudosista, e sendo, na era analógica éramos mais humanos e solidários uns com os outros. Confiámos bem mais nas pessoas e as amizades eram mais sinceras e calorosas. O virtual já diz tudo. Ah, meu amigo, não seja tão duro assim com a vida – estará a esta altura alguém me dando essa repreensão e até me esconjurando. Vai de retro satanás! Será que deve ser a idade?
Hoje somos mais fake news e nem percebemos, ou simulamos que fazer belas e líricas poesias de amor é mais politicamente correto do que falar, por exemplo, do sofrimento, da exploração dos poderosos, da exclusão, da miséria e das desigualdades sociais. Temos mais medos e evitamos discutir ou expor nossas entranhas por receio de sermos excluídos das rodas de bate-papos.
- 1