:: 13/fev/2025 . 23:03
A MELANCIA DO CONDOMÍNIO
(Chico Ribeiro Neto)
A empregada me deu a notícia: estava nascendo um pé de melancia no canteiro do prédio que dá para o “hall”. Foi ela quem – num instante de saudade do interior – plantou num dia em que estava a chupar uma talhada e, displicentemente, jogou uns caroços ali. Pois não é que a planta vingou?!
Comecei a matutar de quem seria essa melancia brotada na chamada área de uso comum. Achei bom iniciar as consultas – talvez até propor uma assembleia geral do condomínio – enquanto ela está pequenininha. Seria cortada em 50 talhadas, proporcionais aos apartamentos do condomínio? Quem jogou as sementes tem direito a uma talhada maior? Quem molhou todo dia também não deve receber mais?
Procurei o Regimento Interno. Tal disposição não figura em nenhuma de suas cláusulas. Pensei, então, em incluir um artigo mais ou menos assim:
Artigo 248 – As frutas ou quaisquer hortigranjeiros plantados em áreas comuns do prédio serão de propriedade do condomínio, a quem compete decidir pelo destino final dos produtos: se serão vendidos ou consumidos pelos próprios condôminos.
Sendo melancia, a segunda hipótese é melhor. Nada como um pedaço de melancia gelada contra uma ressaca domingo de noite. Pelo que sei, o pessoal do prédio ia fazer fila para receber seu quinhão comedidamente repartido pelo síndico.
Outra decisão a ser tomada também em assembleia: iria se limitar as áreas de plantio? Iria se determinar os tipos de hortigranjeiros que poderiam ser plantados? Já pensou se alguém resolver plantar milho, como está se fazendo agora no Terminal da França, graças à leseira total que se abateu sobe a Prefeitura de Salvador? Ou plantar cana, mamão, abacate ou jaca?
Um vizinho levantou outro problema: depois da reforma agrária e da nova Constituição, era preciso se ficar muito atento com relação à posse e uso da terra. A empregada que lançou os caroços da melancia poderia, com o tempo, ficar com direito a uma parte do canteiro, principalmente depois que o usucapião urbano ficou definido a partir de cinco anos.
Para resolver isso, o lançamento das sementes, também conhecido como plantio, somente poderia ser feito por empregado do condomínio ou alguém expressamente autorizado pelo Conselho de Administração para esse fim. Senão, ia se correr o risco de ter que enfrentar uma manifestação, na porta do prédio e com a televisão filmando, com o pessoal gritando palavras de ordem: “Já cheguei/ E não vou/ A melancia é/ De quem plantou”.
Outro assunto a ser discutido é a despesa com adubos e herbicidas, sem contar o salário do agrônomo. Primeiro, ia se verificar se haveria algum agrônomo no prédio pra assumir a assistência técnica dos hortifrúti, ficando dispensado do pagamento do condomínio.
Mais um tributo seria acrescido aos já pagos pelo Condomínio: O Imposto Territorial Rural (ITR), cobrado pelo Incra, que não sei mais se ainda existe, mas, se acabou, já criaram outro órgão para a coisa que esse governo gosta mais de fazer: cobrar.
Faço votos de que, enquanto dure essa discussão, o vigia lance mão de uma amolada faca, numa dessas noites de lua em que o verde da melancia chega a brilhar, e passe no canteiro rapidamente, sorvendo-a em rápidas talhadas, contando com a preciosa ajuda do porteiro, por sinal o autor da ideia de jogar as cascas na lixeira do prédio vizinho.
(Crônica publicada no jornal “A Tarde” em 12/7/1989)
(Veja crônicas anteriores em leiamaisba.com.br)
VEM AÍ O NOSSO REGISTRO
Flagrante do nosso último sarau, realizado no dia 08/02/2025, onde as portas estão abertas a qualquer interessado. Fotos de D´Almeida
Estamos quase chegando lá. Vem aí o registro oficial do nosso Sarau A Estrada, justamente nos seus 15 anos de existência a serem comemorados agora em julho quando, em 2010, um grupo de amigos (Jeremias Macário, Mano Di Souza e José Carlos d´Almeida) decidiu criar o “Vinho Vinil” que logo depois transformou-se no formato de sarau. A comissão organizadora, formada por Cleo Flor, Dal Farias, Alex Baducha e Eduardo Morais está cuidando do processo. Segundo informações de Morais, mais de 90% do projeto já está concluído. A partir dessa etapa, teremos diretoria e conselho fiscal, além de um regimento interno que irá conduzir melhor nossos trabalhos culturais. O registro está sendo viabilizado graças à colaboração voluntária mensal dos participantes do sarau através da criação de um fundo financeiro. É bom deixar claro que a contribuição não é obrigatória e qualquer interessado pode participar dos nossos eventos bimensais, sem nenhum impedimento. Com o registro, o Sarau A Estrada passará a ser uma entidade cultural de utilidade pública sem fins lucrativos, com seu corpo de associados. Essa formalização poderá ser concedida em ato de lei pela Câmara de Vereadores, o que possibilitará o Sarau celebrar parcerias com outros órgãos e empresas na arrecadação de recursos visando a realização de atividades artísticas em Vitória da Conquista. A comissão também está idealizando os meios necessários para uma comemoração dos seus 15 anos. Outra ideia é realizar um documentário sobre a história do sarau mais longevo de Conquista.
MENINO MOLEQUE
Autoria do jornalista e escritor Jeremias Macário
Quando menino traquino,
Franzino nordestino,
De pai roceiro e carpinteiro,
Cresci na labuta da mandioca,
Que da terra saia
Como se fosse minhoca.
Depois fui para cidade pequena,
Da minha querida Piritiba,
Enfrentar outra cena:
Como menino moleque,
Paquerei uma morena,
Onde fiz o primário,
E de lá fui para o seminário,
Para ser padre vigário.
Estudei o latim e o grego,
Até o português e o francês;
Larguei a batina,
Porque não era minha sina,
E rumei pra capital,
Só com meu embornal.
Ainda aprendiz,
A rua era o meu lar,
Passei no vestibular
Para o curso de jornalismo,
Onde aprendi tanto ismo;
Duelei com a sorte
Como sertanejo forte;
Inventei ser escritor
Menino moleque,
Que nunca sonhou ser doutor,
Apenas um respeitado senhor,
Lá do interior.
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