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:: 2/maio/2024 . 23:46

O GALO CANTOU ERRADO

O feirante-tropeiro saia da sua roça todas as madrugadas de sexta para sábado em seus jumentos para vender sua farinha, mantimentos (feijão e milho) e beijus na feira da cidade. Tinha que chegar cedo para pegar os primeiros fregueses e não perder para seus concorrentes.

Como não tinha relógio e rádio em seu rancho, sempre se guiava pelo canto do velho galo para percorrer uma distância de cerca de 20 a 25 quilômetros e chegar no horário. Sempre dava certo no apressar dos passos e chegava à cidade ao clarear do dia, na barra dos primeiros raios solares.

Era um bravo trabalhador, de sol a sol, de chuva a chuva que ficou calejado com a seca e com a fome, mas era um zangão que não tolerava pilherias com sua pessoa e logo partia para uma briga.  Tipo do sujeito cismado. Era parecido com seu Lunga casca grossa, mas, no fundo, tinha um bom coração e ajudava muita gente necessitada.

Sempre confiou no despertar do galo da sua mulher, mas teve um dia em que o danado cantou errado. Foi sua sentença de morte. Deve ter tido algum pesadelo ou alguma raposa se aproximou do galinheiro. Quem sabe uma galinha não tenha lhe acordado com algum desejo.

Nessa noite de total breu, sem o luar, o guerreiro acordou apressado com o primeiro canto do galo e, todo avexado, mandou seu menino moleque pegar os animais no pasto. O tempo urge!  Não queria perder suas vendas e deixar de fazer uma boa feira.

Estava mesmo apressado e não parava de reclamar da vida dura que levava, como todo sertanejo nordestino, para ganhar o sustento da casa. A mulher com seu temperamento calmo e paciente, resmungou lá de dentro: “Êta homem doido! Esse galo cantou errado”!  Havia algo esquisito mesmo porque não se ouviu nenhum galo cantar naquelas bandas!

Colocou os arreios nos jumentos e as cargas de farinha, um saco em cada lado da cangalha, cada um pesando cerca de 50 quilos. Era uma viagem cansativa de uma estrada esburacada, com pedregulhos e ladeiras. Todo cuidado era pouco nas subidas e descidas. Quando chovia, às vezes tinha jegue que atolava nas poças de águas. Não é nada fácil a vida de um roceiro para manter sua sobrevivência.

Era um sofrimento e, por isso, tinha que sair cedo, mas nesse dia o galo cantou errado. O trabalhador rural percebeu isso logo que passou na porta do vizinho e ainda estava dormindo. Estranhou porque ele tinha relógio e também saia na hora certa.

– Esse miserável do galo cantou errado – desconfiou o roceiro que começou a cafangar e a xingar o dono do terreiro que lhe orientava em suas jornadas para a feira. Não parava de esbravejar e ameaçar que na volta ia botar aquele galo na panela para ele nunca mais cantar errado.

Ele e seu menino, o tropeiro mirim obediente ao pai e sempre calado para não levar uns tabefes, entraram na cidade ainda no escuro da noite, sem nenhum sinal do amanhecer do dia. Todo mundo ainda dormia em suas casas, nem um latido de cachorro.

Aquilo lhe deixou mais irado ainda e continuava a jogar praga no galo que cantou errado. Fomos os primeiros a entrar na feira. Arriamos as cargas nos couros e o velho sentou nos sacos com uma raiva danada.

Como sempre levávamos uma esteira e outros apetrechos na tropa, o menino aproveitou para tirar um cochilo. Demorou para o alvorecer do dia e aparecer os primeiros fregueses da sua farinha, de qualidade que era de primeira e tinha um diferencial da dos outros feirantes.

Era um produto feito no capricho, com aquele esmero, sequinho e com aquela tapioca por dentro. O comprador passava os dois dedos, como de costume, e saia aquele pó branco. Era a melhor farinha das redondezas.

Tudo foi vendido nas primeiras horas, mas o feirante ranzinza não esquecia do galo e disse que ia jogá-lo na panela quando voltasse para casa. Não tinha perdão.

O galo percebeu do sucedido e a dona lhe avisou que o patrão ia lhe tirar o couro. Todo cabreiro, o galo sabendo que poderia ir para a panela por ter cantado errado se meteu dentro do mato. Foi uma fuga estratégia e só retornou dois dias depois.

Quando o homem chegou soltando fogo perlas ventas, o galo, para não cair na faca, já tinha pulado fora e se picado para outros cantos. Se meteu nas capoeiras. Deixou a poeira passar e foi chegando de mansinho quando o seu senhor já estava mais calmo e esqueceu do ocorrido.

É aquela história: A pessoa pode fazer cem por cento certo, mas se errar no um por cento, ou até chegar aos noventa e nove vírgula nove por cento, não presta e é condenado. A vida no seu tempo real é sempre assim. O pobre do galo que o diga, pois por pouco não caiu na panela porque somente numa madrugada cantou errado.

 

 

 

“ENTENDEU”?

Continuo a insistir que os maiores focos dos mosquitos da dengue, em Vitória da Conquista, a cidade com maior índice da doença na Bahia, estão nas ruas de chão, nos esgotos a céu aberto, nos terrenos “abandonados” cheios de lixo e matagal, nas oficinas abandonadas que se transformaram em sucatas e outros pontos das periferias que ficam alagados quando chove. Parem de colocar a culpa somente nos moradores. Mande, senhora prefeita, fiscalizar e punir, conforme determina a lei, os donos de terrenos que não cercam e nem limpam suas propriedades; intime a Embasa a consertar e desentupir os esgotos; e os donos de oficinas a limpar suas áreas. Entendeu, senhora prefeita? A situação é grave com muita gente doente e hospitalizada, sem contar as mortes. Existe um motivo maior para Conquista ter esse alto índice epidêmico de dengue. Entendo que o poder executivo é o maior culpado. Entendeu, senhora prefeita? Fora do centro, é difícil não encontrar uma rua ou avenida que não tenha um matagal que serve de lixeira de sacos plásticos, garrafas, pneus e outros objetos que acumulam água e servem de criadouros das larvas dos mosquitos. Entendeu?

MOMENTOS

Autoria do jornalista e escritor Jeremias Macário

Às vezes, tem momentos,

Que fico no meu eu solitário,

No voo do triste pensar,

Como canário preso numa gaiola,

Rochedo nesse escuro mar,

Como canção sem viola.

 

São momentos

de mistura,

Entre banzo e feliz,

Passageiro de fim de estrada,

Nessa cilada,

Do tudo que já fiz,

De bom e ruim,

Na vida que é assim:

Da lei feita pros fortes,

Para os fracos, garrotes,

Com início, meio e fim.

 

Às vezes, tem momentos,

Do refletir,

Dos amigos que se foram,

E eu ainda aqui,

Em meu espaço,

Sem régua e compasso,

Nesse labirinto de canais.

Onde essa selvagem caravana,

Não me empolga mais.

 

Tem momentos,

Que nem quero mais ficar,

Para respirar,

Esse poluído ar.

 

Momentos são momentos,

Que não ligo mais pro tempo,

Nem a força do vento;

Sou amor e dor,

Nessa sociedade falsidade,

Que ainda discute

Os tons da cor.





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