:: 19/out/2024 . 0:18
OS LIVROS COMO ARTES DE VELOR
A invenção da impressão pelo alemão de Mainz, Johannes Gutenberg, em meados do século XV, com a publicação da Bíblia por volta de 1456, foi o prenuncio da evolução científica e da Revolução Industrial no final do século XVIII.
A partir daquele período vieram outras gráficas e um boom de publicações de raros manuscritos e obras valiosas, como dos mais notáveis filósofos gregos (Sócrates, Aristóteles e Platão), além de ícones da intelectualidade da Igreja Católica, com destaques para São Jerônimo e São Tomás de Aquino. Eram os chamados livros incunábulos, ou seja, aqueles editados até antes de 1501.
Atrás dessas raridades houve uma corrida dos afortunados ingleses que dominaram esse mercado de arte entre os séculos XVIII e XIX. Os petroleiros norte-americanos entraram com toda força no século XX até por volta de 1985/87 quando os asiáticos (japoneses) roubaram a cena através dos famosos leilões ocorridos em Nova Iorque, Los Angeles e Londres.
Nessa época, o livro mais famoso leiloado foi a Bíblia de Número 45 de Gutenberg, o mais procurado, que alcançou um valor superior a US$5 milhões, considerado o mais caro do mundo. Até outubro de 1987 essa obra pertencia ao Seminário São João, localizado ao Sul da Califórnia, a qual foi doada 25 anos atrás pela ricaça do petróleo Estelle Doheny junto com sua coleção de raridades.
A venda desse acervo precioso, de cerca de 30 milhões de dólares pela Igreja Católica, provocou uma onda de protestos e denúncias por parte da mídia dos Estados Unidos e de personalidades de intelectuais da sociedade, mas venceu o pensamento retrógrado do arcebispado da Califórnia. Esses livros de valores incalculáveis saíram das mãos dos norte-americanos para os asiáticos.
Além da Bíblia 45, outros itens impressionantes foram leiloados, como um largo fólio que pertenceu ao Papa Alexandre VI, no século XV, uma impressão única da Bula de Demarcação, que separou as terras do Novo Mundo entre Espanha e Portugal, A Queda dos Príncipes, de Giovanni Boccacio, de 1494 e uma cópia de obras de Aristóteles em grego, impressa por Aldus Manutius, A Rationale Divinorum Officiorum, de Guillaume Durand, de 1459, a Epistolare, de São Jerônimo, de 1470 e um exemplar do mesmo ano da Summa Theológica, de São Tomás de Aquino, bem como outras bíblias raras.
Entre a Bíblia de Estelle, a de Número 45, constava do leilão um ensaio manuscrito de Mark Twain sobre Gutenberg, escrito em 1900, para comemorar a inauguração do Museu do inventor da impressão, em Mainz.
Em uma parte do texto ele dizia que a conquista de Gutenberg criou uma terra nova e maravilhosa, mas, ao mesmo tempo, também um novo inferno. Durante os últimos 500 anos, a invenção de Gutenberg forneceu à terra e ao inferno novas ocorrências, novas maravilhas e novas fases – assinalou.
Segundo Mark, a invenção criou verdade livre e deu-lhe asas, mas a inverdade também se espalhou, e a ela foi fornecido um duplo par de asas. O que o mundo é hoje, bom e mau, ele deve a Gutenberg. Destacou que o mal que sua colossal invenção trouxe é mil vezes ofuscado pelo bem que a humanidade recebeu.
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