Entre os séculos XV ao XIX, os grandes caçadores de livros antigos e raros, a partir da Bíblia de Gutenberg, por volta de 1456, se concentraram entre os livreiros, leiloeiros e afortunados da Grã-Bretanha.

Somente no início do século XX, no pós I Grande Guerra, esse quadro mudou, e os norte-americanos assumiram essa posição de colecionadores, inclusive trazendo livros da Inglaterra, ao ponto do governo inglês impor restrições para que essas obras não saíssem do país, sob o argumento de que essas relíquias já eram do pertencimento do Estado.

Um dos primeiros a investir nesse ramo foi o casal Edward Doheny e a senhora Estelle, mais por iniciativa dela quando o marido, dono de empresas petrolíferas, já se encontrava em decadência e passado por momentos difíceis de idade e suspeito de subornos e corrupções, além de ter perdido seu único filho que foi assassinado.

No livro “Em Busca da Bíblia Perdida de Gutenberg”, da escritora Margaret Leslie Davis, ela descreve que “rastrear o paradeiro das Bíblias ao longo do tempo produz o mapa de valor de influencias em transformação, na medida em que os livros se movem dos confins da Igreja Católica para as bibliotecas dos aristocratas da Europa continental e, em seguida, fluem para os construtores do império da Grã-Bretanha, embelezando a reputação de cada um dos sucessivos proprietários”.

Com Dyson, criador do molho inglês e das ilustradas porcelanas, a classe mercantil mostrou sua ascensão, e agora o centro do poder passa para os Estados Unidos, onde magnatas-colecionadores, como J.P. Morgan e Henry Huntington, começaram a atuar no Novo Mundo, proporcionando um mercado pronto para as bibliotecas que são vendidas para financiar fugas e a recuperação das agruras da guerra.

Os novos reis querem as Bíblias de Gutenberg. Eles obtêm por força de suas personalidades e de seus fundos. Os preços disparam, bem como a comissão paga pelo livro, agora alardeado pelos megafones norte-americanos. O colecionador Lessing J. Rosenwald anuncia que planeja comprar 84 títulos do catálogo do poderoso Dyson e indicou a Bíblia de Gutenberg entre eles.

Nesse esquema também entra a senhora Estelle Doheny, a herdeira, empresária e colecionadora da elite norte-americana que, na hora do leilão, estará no meio de uma caçada, cuja única conclusão possível será a posse do livro.

“Seu desejo por uma Bíblia de Gutenberg, com a busca de décadas que isso lhe custaria, surgiu, pela primeira vez, em 1911, logo após o surto de compras de livros antigos de Dyson, talvez sem saber ter atingido o alvo”. Na verdade, ela só veio a obter a Bíblia de Gutenberg, Número 45, em 1950, após a II Guerra Mundial. De origem católica, seu marido era um imigrante irlandês.

Doheny passou anos como garimpeiro, viajando com mochila e uma mula antes de encontrar o petróleo. Ela era uma telefonista com pouca educação e se tornou numa poderoso caçadora de livros, dentro de uma comunidade que aceita suas contribuições, como a Igreja Católica.