“ANDANÇAS” TAMBÉM É MÚSICA
Não são só causos, contos e histórias, numa mistura de ficção com realidade, o novo livro “Andanças”, do jornalista e escritor Jeremias Macário, também tem poemas, muitos dos quais começam a ser musicados por artistas locais e de outras paragens do Brasil, como de Fortaleza, no Ceará.
Do título “Na Espera da Graça”, que fala do homem nordestino que sempre vive a esperar por tempos melhores, o cantor, músico e compositor Walter Lajes extraiu de sua viola uma bela canção, numa parceria que fez com o autor, com apresentação em vários festivais.
O músico e compositor Papalo Monteiro se interessou por “Nas Ciladas da Lua Cheia”, uma letra forte que descreve os políticos na figura de bichos que, de quatro em quatro anos, aproveitam as eleições com promessas vãs para se elegerem.
Tem “O Balanço do Mar”, um xote que lembra passagens de nossas vidas, e “Lágrimas de Mariana”, um belo poema triste sobre a tragédia do rompimento da barragem da Samarco, lá em Mariana (MG), musicados e cantados pelo amigo parceiro Dorinho Chaves.
Lá de Fortaleza, Ceará, os companheiros Edilson Barros e Heriberto Silva realizaram uma parceria musical aproveitando a letra “A DOR DA FINITUDE”, que versa sobre um tema que pouca gente gosta de abordar, que é a morte, e filosofa que tudo passa, tudo muda e tudo se transforma. Outros poemas estão sendo trabalhados para entrarem no rol das letras musicadas, inclusive do novo livro “ANDANÇAS”.
Essa é uma parceria com o amigo poeta e músico, baiano de Alagoinhas, Antônio Dean, que há muitos anos reside em Campina Grande da Paraíba com sua família, fazendo sucessos e cantando com sua profunda voz, a cultura nordestina para todo o Brasil.
Conheça o Espaço Cultural “A Estrada”
Com 3.483 itens entre livros (1.099), vinis nacionais e internacionais (481), CDs (284), filmes em DVDs (209), peças artesanais (188) e 106 quadros fotográficos, dentre outros objetos, o “Espaço Cultural a Estrada” que está inserido no blog do mesmo nome tem história e um longo caminho que praticamente começou na década de 1970 quando iniciava minha carreira jornalística como repórter em Salvador.
Nos últimos anos o Espaço Cultural vem reunindo amigos artistas e outras personalidades do universo cultural de Vitória da Conquista em encontros colaborativos de saraus de cantorias, recitais poéticos e debates em diversas áreas do conhecimento. Nasceu eclético por iniciativa de um pequeno grupo que resolveu homenagear o vinil e saborear o vinho. Assim pintou o primeiro encontro do “Vinho Vinil” com o cantor e compositor Mano di Sousa, os fotógrafos José Carlos D`Almeida e José Silva entre outros convidados.
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FATOS CURIOSOS DO NORDESTE
CANGA E CANGAÇO
Existem muitas controvérsias em relação às origens do termo cangaço (cangalha). Para alguns estudiosos do assunto, sua origem vem de “canga” e surgiu no século XIV. Arrumação de madeira sobre telhados de palha, peça para prender junta de bois a carro ou arado. Pode ser instrumento de suplício chinês, ganga, domínio, opressão. A origem poder ser ainda quicongo kanga de nhanga. Outros falam da origem tupi acanga. Há quem diga que o termo cangaço é de origem africana.
GATO
Quando já era membro do bando de Lampião, certa feita o cangaceiro Gato pediu permissão ao chefe para irt visitar seus parentes. Aproveitou a ocasião para massacrar toda família. Como não tinha mais pais vivos, matou a avó, duas tias, quatro irmãs e dois primos. Adolfo Meia-Noite, de Afogados do Ingazeira, Pernambuco, foi espancado pelo tio para não cortejar sua filha. O cangaceiro se vingou e assassinou o agressor.
CIVILIZAÇÃO DO COURO
Para o pesquisador João Capistrano de Abreu, ao falar sobre a civilização do couro, dizia que essa pele era muito usado nas portas das cabanas, no rude leito aplicado ao chão duro, e mais tarde serviu de cama para partos; de couro todas as cordas, a borracha para carregar água, o mocó ou alforge de levar comida, a maca para guardar roupa, a mochila para milhar cavalo, a peia para prendê-lo em viagem, ou para apurar sal; as broacas e surrões, a roupa de entrar no mato; os banguês para curtume.
A CAATINGA E SUAS DIVISÕES
A caatinga é o bioma predominantemente nordestino único no mundo, mas tem suas subdivisões. Dentro dela temos o Sertão (sete milhões de hectares), o Seridó, com 3,5 milhões, o Agreste (seis milhões de hectares, o Brejo e a Mata. Na caatinga, os solos podem ser rasos, de origem arqueana, como em Pernambuco. O Agreste do Piauí é todo em formação sedimentar, a topografia é bem plana e o solo carece de corretivo. Entre a Mata, parte chuvosa e a Caatinga interior, está o Agreste.
A ESTRADA DE FERRO
De acordo com o pesquisador Robert Levine, a estrada de ferro não só possibilitou novas ligações com a costa, como implementou mudanças no modo de vida do sertanejo. Numa região onde os únicos eram padres missionários, chegavam agora imigrantes para trabalhar como engenheiros das ferrovias. Mil trabalhadores vieram da Sardenha e da Itália, sendo a maioria de Turim, isto na segunda metade do século XIX. Os missionários evangélicos não eram bem vistos pelos católicos. Conta que o escocês David Law foi expulso de fábricas de Recife por distribuir e divulgar livros religiosos para os operários.
DE BELÉM PARA O NORDESTE
Quando o imperador D. Pedro II visitou lugares sagrados no território da Palestina, em 1887, conversou com autoridades locais que conseguiram recursos na França e enviaram grupos de Belém para o Nordeste. Essas pessoas, em sua maioria, foram morar no Ceará e no Piauí, mas não suportaram as duras condições climáticas e nem se adaptaram à cultura local. No entanto, em 1930, os árabes, sobretudo de origem palestina, controlavam o comércio atacadista de Recife.
ESTRANGEIRAS
As empresas estrangeiras, especialmente as ferroviárias, não eram bem vistas pelos cangaceiros porque serviam para transportar as forças volantes e transmitir informações. Lampião chegou a capturar representantes de vendas da Standart Oil e da Souza Cruz no sertão. Servidores que atuavam em empresas nacionais e estrangeiras levavam muitas notícias para aquelas áreas. Em Mossoró, no Rio Grande do Norte, entre 1872 e 1874, pelo menos dezoito firmas estrangeiras se registraram na cidade.
MINORIA DE ESCRAVOS
Na segunda metade do século XIX, os escravos existentes no sertão nordestino eram minoria e de interesse econômico menor do que os trabalhadores livres. No casso específico do cangaceiro romântico Jesuíno Brilhante, podia-se dizer que ele não fazia parte dos mais pobres. Era originário de uma família de posses.
RASO DA CATARINA
Os historiadores, de uma forma em geral, descrevem o Raso da Catarina (seis mil quilômetros quadrados), entre Paulo Afonso Glória) e Jeremoabo, na Bahia, como uma região inóspita e muito seca, de difícil acesso. Lampião e vários grupos de cangaceiros sempre utilizaram esse deserto dentro da caatinga como esconderijo, pois as volantes evitavam entrar ali, temerosas de enfrentarem as agressividades e a inclemência do clima.
SUBORNO DE POLICIAIS
Desde o início do cangaço, na segunda metade do século XIX, a maioria dos policiais era subornada pelos cangaceiros que requisitava dinheiro dos vilarejos para pagar os chamados “macacos”. Uma pequena parte dos roubos era distribuída entre os pobres, como fazia Antônio Silvino. Foi assim que ele chegou a conseguir apoio popular. As extorsões não tinham como principal objetivo redistribuir renda, mas assegurar quantias necessárias para si e para seus homens. Uma pequena porção do coletado era para os pobres.
GUERRA DO PARAGUAI
O historiador Ulysses Lins de Albuquerque narra que o “coronel” Tomás de Aquino Cavalcante, em 1866, como diretor dos índios carnijós, convocou todos eles para uma reunião em frente da Cadeia Pública de Águas Belas. Mandou a rapaziada entrar no salão e então anunciou que o pessoal teria que ir lutar na Guerra do Paraguai. Os indígenas foram algemados e enviados para Recife e, em seguida, para o combate.
UM BRASIL FALSIFICADO
Como se diz no jargão jornalístico, vou pegar aqui um “gancho”, ou no popular mesmo, uma “ponga” do meu colega Chico Ribeiro Neto, com suas exímias crônicas, com quem tive o privilégio de trabalhar na redação do jornal A Tarde, lá em Salvador, por muitos anos, para falar um pouco desse nosso Brasil falsificado e misturado.
Para começar, a gente costumava tomar umas pingas nuns botecos cavernosos depois das matérias, mesmo sabendo que se tratava de cachaça “batizada”. Muita doideira depois de um dia de estresse correndo atrás do fato! No outro dia era aquela ressaca danada e batia aquela enxaqueca.
– Fala sério, meu caro e cara, dá para confiar nos produtos brasileiros, no que você come e bebe, principalmente nos dias quadrilheiros de hoje? Poderia fazer aqui uma lista de itens falsificados que atravessaria o Oceano Atlântico até a Europa, inclusive remédios. Nem vamos falar da gasolina!
Quando se adquire um objeto imprestável que dura poucos dias, sempre quem leva a fama é o nosso país vizinho, aqui bem do nosso lado. “Isso aqui é paraguaio, meu irmão”! Quem mistura e falsifica mais? Pode dar empate – respondeu de lá, o meu camarada.
Quando era repórter da Editoria de Economia, lá pelos anos 70 e 80, uma vez dei um “furo” de reportagem sobre exportadores baianos de sisal que colocavam bagaços e até pedras nos fardos para pesar mais. Isso causou um escândalo no exterior e muitos países deixaram de importar o nosso sisal. O mesmo se fazia com o algodão.
Essa coisa de falsificação e misturada vem desde 1500 quando Cabral aqui chegou e trouxe de Portugal presentes falsificados, de quinta categoria, para conquistar a curiosidade e a “confiança” dos índios. Com a chegada da Família Real, em 1808, a coisa piorou mais ainda.
Com a abertura dos portos para os ingleses, boa parte das compras era feita em ouro que foi logo se desvalorizando. Depois veio a prata que também sofreu uma queda drástica. Partiram, então, para as moedas de cobre. Com elas surgiu a macuta ou xenxém, que era o cobre falsificado.
Quando esse metal começou a faltar, aí entrou uma enxurrada de cobre falso no mercado interno. Em 1832, mais de 40% das moedas em circulação no país eram falsas. Até os governos pagavam os salários dos seus empregados com dinheiro falsificado e a coisa rolava de mão em mão.
Nos dias atuais estamos acompanhando aí os estragos do metanol nos destilados, com várias mortes e sequelas graves de cegueira. Nem o “santo” está querendo mais aquela “pinguinha” que o bêbado joga ao lado do balcão antes de dar aquela golada do copo.
Dizem por aí a fora que até o “suicida” está hoje desconfiado do veneno para se matar. Pode ser uma substância qualquer sem o efeito desejado. Por um lado, isso é até bom porque o indivíduo pode ter a chance de repensar sobre o lado prazeroso de se viver, mesmo diante de tantas falsificações e golpes.
Por falar em metanol, muita gente se esqueceu e também a própria mídia, com relação às mortes ocorridas em Iguaí, ou Ibicuí, aqui na Bahia, se não me engano, no final dos anos 90 e início de 2000. Ainda atuava na Sucursal do A Tarde, em Vitória da Conquista.
No início era um mistério, mas depois se descobriu que muita gente estava tomando cachaça misturada com metanol vindo de tambores que foram utilizados no transporte do líquido perigoso. Ninguém se atentou para este caso de repercussão nacional.
A humanidade se deteriorou ao ponto, em termos de maldade, tudo com a intenção de se obter lucros ilícitos, que não dá mais para se confiar em ninguém. Qualquer “bobeira” e você leva aquele tombo! Eu mesmo fui vítima de um recentemente.
Você não sabe ao certo hoje se o amigo ao seu lado numa mesa de bar é verdadeiro ou falsificado. Tem aquele olhar, aquele aperto de mão e aquele abraço falso com aparência de ser leal. Imagina político em época de eleições!
A pessoa hoje tem que treinar e aprender a dormir com um olho fechado e o outro aberto, e não pode piscar. Alguém por aí pode até achar isso um exagero, mas não é, meu amigo, confie desconfiando. “É, mas temos que confiar nas pessoas” – diz o positivista.
QUE FIM LEVARAM NOSSOS SONHOS?
Poema de autoria do jornalista e escritor Jeremias Macário
Que fim levaram nossos sonhos,
Se perderam nas longas marchas,
Das avenidas e praças,
Dos cartazes nas mãos,
Nas letras das eternas canções,
Que ficaram em nossos corações?
Que fim levaram nossos sonhos,
Nascidos das revoluções?
Arrancaram as flores do nosso jardim,
Nele plantaram corrupções,
Na base do meio justifica o fim.
Que fim levaram nossos sonhos,
De igualdades humanas sociais,
Justiças para nossas oprimidas gentes?
Estão nos cofres dos capitais,
Mas ainda vivem em nossas mentes,
Nessa sociedade de canibais.
Que fim levaram nossos sonhos,
De resgatar nossa jovem geração;
Acabar de vez com a fome,
Amparar as desgarradas multidões,
Nas lutas armadas ou pela razão?
ROÍA BROCHA, CHUMBREGÂNCIAS, CONXAMBRANÇAS E A CAPADURA
COISAS DO NOSSO NORDESTE DO SÉCULO XIX, EXTRAÍDAS DO LIVRO “OS CANGACEIROS”, De Luiz Bernardo Pericás.
Um “cabra” tarado praticou atos libidinosos e foi levado a julgamento. O pronunciamento do promotor e a pena do juiz foram lastreadas com base nos Mandamentos do Antigo Testamento da Igreja Católica (Moisés) e até no Alcorão (Maomé) mulçumano. Imaginou essa prática nos tempos atuais? Com certeza, muita gente iria concordar nos tempos atuais.
Uma Sentença judicial do juiz municipal suplente em exercício, Manuel Fernandes dos Santos, para o juiz de Direito da Comarca de Porto da Folha (Sergipe), datada de 15 de outubro de 1833, é bastante curiosa pelos termos condenatórios a um indivíduo que praticou estupro contra uma mulher grávida.
Naqueles tempos, as palavras estupro e relações sexuais não eram usadas e tinham interpretações diferentes. Para os conceitos da época, o ato nem era caracterizado como estupro. O “meliante” não podia ver uma vizinha do outro lado que rufiava e pulava a cerca como touro bravo para cruzar na tora.
Na súmula, diz o juiz que comete pecado mortal o indivíduo que confessa em público suas patifarias e seus deboches e faz coças de suas vítimas desejando a mulher do próximo para com ela fazer suas chumbregâncias. Sua condenação final foi a de mandar CAPAR o “cabra”, capadura feita a MACETE. Nos dias de hoje pelo Código Civil, ou Penal, o ato é julgado como estupro, mesmo que não consumada a penetração carnal.
A representação do promotor foi contra o “cabra” Manuel Duda porque no dia 11 do mês de Nossa Senhora Sant´Ana, quando a mulher do Xico Bento ia para a fonte e o suspeito que estava perto de tocaia em uma moita de mato, saiu de supetão e fez a proposta à senhora por quem “roía brocha”, para coisa que não se pode fazer a lume. O “cabra” estava mesmo era doidão e ia esperar pelo escuro!
Como ela se recusou, o dito “cabra”, com ella, deitou-a no chão, deixando as encomendas della de fora e ao Deus dará e não conseguiu matrimônio porque ella gritou e veio em assucre della Nocreto Correia e Clemente Barbosa, que prenderam o sujeito em flagrante, na hora, naquele estado durão.
Pediu-se a condenação delle como incurso nas penas de tentativas de matrimônio proibido. Afirmou o promotor que a dita mulher estava peijada e, com o sucedido, deu à luz um menino macho que nasceu morto. Só no susto, matou o bebê no ventre da mulher.
As testemunhas bisparam a perversidade do “cabra”. Em suas considerações, o juiz descreveu que o “cabra” deitou a paciente no chão e quando ia começar suas conxambrancas, viu todas as encomendas della, que só o marido tinha o direito de ver, e mais ninguém. A paciente estava peijada e, em consequência do sucedido perdeu o filho. A morte do menino trouxe prejuízo na herança que poderia ter quando o pai delle ou a mãe falecesse. E pobre nordestino naqueles tempos tinha alguma herança? Só dívida com o “coronel”.
Considero o “Cabra” que é um suplicante debochado que nunca soube respeitar as famílias de seus vizinhos, tanto que quis também fazer conxambranças com a Quitéria e a Clarinha, que são moças donzelas e não conseguiu porque ellas repugnaram e deram aviso à polícia. O cara já havia cometido outros delitos de estuprador em outros lugares. Tinha uma extensa ficha corrida, do Ceará à Bahia.
O Manuel é um elemento perigoso e se não tiver uma causa que atalhe a perigança dele, amanhã está metendo medo até nos homens por via de suas patifarias que eram grandes por demais. Considero que o “cabra” está em pecado mortal porque nos Mandamentos da Igreja é proibido desejar a mulher do próximo. O bicho queria até homem.
Considero que sua majestade imperial e mundo inteiro precisam ficar livres do “cabra” Manuel Duda, para secula, seculorum amem, por causa de seus deboches e servengonhesas. Elle é um sujeito sem vergonha que não nega suas conxambranças e ainda fez isnoga das encomendas de suas vítimas.
No final, o juiz condena o Duda pelo malefício que fez à mulher de Xico Bento a ser CAPADO, capadura que deverá ser feita a MACETE. A execução da pena deverá ser feita na cadeia desta villa. Nomeio o carrasco e carcereiro. Feita a capação depois de 30 dias, o mesmo carcereiro solte o cujo “cabra” para que se vá em paz, claro, sem seus tentáculos exagerados.
“O nosso pior aconselha – Homini debochado deboxatus mulheroru, inovacabus est sententias quibus capare est mace macetorium carrascus sinefacto notre negare pete. Apelo ex-ofício desta sentença para o Dr, Juiz de Direito desta Comarca”.
A PROFESSORA NINA QUE EU TIVE
A PROFESSORA NINA QUE EU TIVE
(EM HOMENAGEM A TODOS PROFESSORES)
Este texto foi publicado no livro “Andanças”, de autoria do jornalista, escritor e poeta Jeremias Macário. A obra pode ser encontrada na Banca Central, ou diretamente através do autor pelo e-mail macariojeremias@yahoo.com.br e pelo tel 77 98818-2902.
O homem sem instrução é um homem iludido. Em minha vida nunca imaginei que uma profissão tão linda e nobre fosse se transformar em medo, angústia e pesadelo. O orvalho da manhã está cada vez mais escasso, e a relva e a grama da minha casa estão secas. O prazer de ensinar e levar conhecimento aos rebentos virou uma obrigação. Sem o riso de antes, muitos estão partindo para outras atividades enfadonhas e chatas, seguindo a lei da sobrevivência a qualquer custo.
Aprendi as primeiras letras e a entoar a tabuada para fazer umas continhas de somar, diminuir e multiplicar com a real professora leiga dona Nina, não aquela personagem título de livros, de peças teatrais, crônicas e contos como símbolo da nossa imaginação para identificar a profissão. Como tudo que acontece pela primeira vez na vida, nunca me esqueci daquela frágil, terna e carente mulher. Mas, o que mais me marcou foi a sua extrema pobreza e como arranjava forças para ensinar.
Era meado dos anos 50 do século passado quando tive minha primeira professora Nina. A infância na roça da fazenda Queimadinha, isolada de tudo, não me dava nenhuma noção do porquê tinha que caminhar com minha irmã dois, três quilômetros dentro de um matagal todos os dias para encontrar com a professora, para ler soletrados os textos de uns livros e ouvir o clamor, choros e brigas de uma família de mais de dez pessoas por causa de um prato de comida nas horas do almoço.
A professora Nina morava como agregada de um vasto latifundiário que mais lembrava os condes e duques franceses da pré-revolução. A fazenda de quilômetros e mais quilômetros de capim e gado se situava num território pertencente ao município de Mundo-Novo e depois Piritiba e Tapiramutá. Como meeira, ela dividia com o patrão usurário e opressor os poucos pés de cafés que tinha no quintal da velha casa. O quadro não mudou. O capitalismo se alimenta de carne humana.
Todos definhavam de fome. Um rapaz anêmico vivia chorando pelos cantos da casa e o velho pai era um alcóolatra à beira da morte que pegava vísceras de bois em matadouros da vizinhança para cozinhá-las numa aguada panela de feijão. Meu pai, também pobre, pagava seus préstimos de professora com um pouco de dinheiro e farinha da terra donde colhia a mandioca do roçado. Eram tempos de muita dureza e o homem trabalhava como escravo, sem direitos a nada. Não mudou muito. A fome batia quase todos os dias na nossa porta e nos olhava com aquela careta de monstro.
O velho e o rapaz morreram e, como já viviam na miséria, nem foram notados. Eram lixos deteriorados ocupando o espaço. Como observou Shakespeare, “Quando morre um mendigo nenhum cometa é visto, mas os céus cospem fogo quando morre um príncipe”.
A professora Nina e o restante dos seus filhos pegaram um pau-de-arara e tomaram o rumo de São Paulo. Meu pai vendeu a terrinha e fomos para outro local onde pelo menos tinha um tanque d´água. Passei anos longe das minhas primeiras letras e só depois fiz, com muito sacrifício, o primário em Piritiba. Mais algum tempo parado e somente em 1962 ingressei no Seminário Nossa Senhora do Bom Conselho, em Amargosa. Bons tempos de estudos e aprendizagem, com professores de qualidade. Ensino puxado!
Passaram-se quase 65 anos e a educação teve suas reviravoltas de altas e baixas, mais que baixas, para cair numa vala lamentável de decadência e menosprezo, numa cruzada de greves, paralizações, ocupações, protestos, desespero, revolta, lamentos e violência nas salas de aulas onde existem mais discórdias que harmonias.
Até o final dos anos 70 e início dos 80, a educação pública era uma referência de qualidade e conteúdo. O professor era o verdadeiro mestre respeitado na sala e os alunos o reverenciavam como um pai, somente abaixo do Eterno. De lá pra cá foi entrando em degradação de promiscuidade total, diferente da missão primordial de transmitir sabedoria e conhecimento.
Aquela imagem da professora Nina e sua família continua viva em mim através de cenas reportadas nos dias atuais de professores comendo bolachas num reservado escondido de uma sala para matar a fome e outros vendendo seus livros de literatura nas ruas para sobreviver, sem contar as agressões sofridas no exercício de suas atividades.
Uma professora chora quando lembra que um dia um aluno colocou um revólver em sua cabeça e lhe intimou que desse uma nota máxima em sua prova para passar de ano. Perdeu, professora! Para não morrer, teve de ceder, mas, traumatizada, nunca mais retornou à sala de aula. Para sobreviver foi ser doceira. Igual a ela, tantos outros se afastaram do ministério de ensinar. De amigo e conselheiro, o professor é visto hoje pelos seus estudantes como um inimigo que merece ser castigado porque escolheu ensinar e formar crianças e adolescentes rebeldes de um lar, cujos pais se ausentaram de suas obrigações, valorizando mais o capital que o humano.
Pelo nível a que chegamos, de baixos índices de aproveitamento escolar que envergonham a nação, com imagem tão negativa lá fora, a pátria como mãe biológica ou adotiva, carece parar com todas suas obras, pontes, estradas, viadutos e projetos de portos e aeroportos, para só cuidar da educação. Esta filha desamparada de mãe desnaturada caiu em desgraça na prostituição das ruas e das drogas.
A figura de um professor qualificado e motivado é o fator mais importante para o sucesso do aluno na escola e na vida, conforme estudos realizados em vários países. No Brasil, quem tira maiores notas nas escolas prefere fazer outros cursos universitários ao invés de pedagogia, isto porque a profissão oferece pouca atratividade, devido à baixa remuneração e más condições de trabalho. O próprio Ministério da Educação constatou que o curso de pedagogia tem sido o destino dos alunos com as piores notas nos exames do ensino médio.
Chegamos ao ponto crucial de que a educação não é mais apenas uma questão de prioridade, mas de salvação de vidas. Milhões são vitimados antes do tempo no Brasil por falta de educação. A professora Nina foi a primeira a me dar régua e compasso para escrever este texto. Outros mestres vieram depois fazendo o demorado processo de lapidação
AS FORÇAS ALINHADAS À UNIÃO DEVEM SUPERAR AS BARREIRAS
Peço licença aos companheiros e companheiras estradeiros para dar a minha modesta opinião a respeito da atual situação da cultura em Vitória da Conquista, que deveria estar à altura do porte da terceira maior cidade da Bahia, e que, historicamente, já viveu sua efervescência nesse quesito com grandes nomes até de projeção internacional.
Não vou aqui fazer arrodeios, arroubos e nem citações filosóficas, sociológicas ou de outro cunho ideológico socialista marxista. Parto do meu tema de que as forças alinhadas da união superam as barreiras do descaso.
Longe de mim ser “advogado” dessa administração que sepultou nossa cultura, mas poderia aqui também abrir uma crítica sobre a atuação do nosso Ministério da Cultura. Não vou entrar nessa polêmica. Vamos voltar o nosso olhar para nossa aldeia de terra arrasada onde vivemos.
MOBILIZAÇÃO PÚBLICA
Sinto que está existindo determinados ruídos de “vozes isoladas” sob o ponto de vista dos movimentos e coletivos que, ao invés de se unir num todo, não importando a coloração ideológica, estão partindo para a divisão de intrigas entre si e até com um certo tom de agressividade e ofensas. Sempre defendi que a saída é a mobilização pública nas ruas para mostrar nossa cara, porque os documentos são sempre engavetados.
Tenho ouvido comentários de que tal coletivo é um “balaio”, uma “panela”, tal grupo é de propriedade privada, de que existe censura, sem deixar de considerar pichações negativas que só fazem dividir e criar animosidade entre nós mesmos. Em meu entender, a radicalização com outra radicalização é como a soma de zero mais zero. Não adianta rompantes viscerais.
Certas atitudes são tudo o que o outro lado do poder quer para massacrar ainda mais a nossa cultura. Sobre esta questão, escutei muitas vozes dentro da própria Secretaria de Cultura de que tal movimento partia apenas de um punhado de gente isolada radical “sem importância”, que não representaria o todo.
Que a nossa cultura vai de mal a pior, isto é indiscutível, e agora colocaram um presidente do Conselho que é anticultura. Este quadro já vem se perdurando há pelo menos dez anos, e os nossos métodos usados para mudar este cenário não têm dado resultados satisfatórios e revitalizado a nossa cultura como desejamos.
No meu raciocínio lógico, alguma coisa tem que ser mudada para alcançarmos a mudança que queremos. Diante do exposto, a minha proposta, e não é de hoje, é que todos nós sentemos numa mesa, não importando as ideologias, se de direita ou de esquerda, sem as “fogueiras das vaidades”, para falarmos uma única linguagem de que a arte interessa a todos e que a divisão de ideias só nos separa e fortalece esse poder de destruição da nossa cultura. Alguns podem até rebater que isso é impossível, mas não é.
A linguagem da qual me refiro é de políticas culturais, mas, sinceramente, vejo gente jogando esta causa tão nobre para o viés político partidário, numa nação tão polarizada que só rende ódio e intolerância. Será que constrói ou desconstrói? Vamos ser progressistas no bom sentido para conservar nossas tradições.
Temos um nível intelectual bem mais alto que eles e não estamos aproveitando esta força que é a união de todos num objetivo comum, sem essa de “donos da cultura”. Temos aqui deputados estaduais e outros nomes de expressões que podem se juntar à nossa mesa para fazer ecoar as nossas vozes e estremecer aquelas paredes do atraso.
Qualquer um tem o direito democrático de discordar da minha proposição e até achar que esteja sendo ingênuo. Só peço, porém, que as manifestações não sejam de agressões e ofensas como já vi sair da boca de alguns. Se for nesta toada, prefiro me recolher à minha modesta insignificância.
O SARAU NAS RUAS E O GRUPO
Gostaria aqui de aproveitar o ensejo para falar um pouco sobre o nosso Sarau a Estrada que levantou a ideia de partir para a estrada, literalmente, ou seja, ir para as ruas e dar o seu recado de que precisamos colocar a cultura em seu lugar merecido, desde que os discursos sejam alinhados e unificados.
O que não aceitamos são os deboches “stradêros” de quem quer que seja. Acolhemos todos aqui com muito carinho, desejando sempre boas vindas, com abraços e amizades. Precisamos sim, de colaboração e críticas construtivas, não de indiretas a um sarau que foi construído com muitas lutas e dedicação. Rogo mais respeito, pelo menos aos antigos frequentares que ajudaram a erguer este evento.
Ouvi críticas, que, ao me ver, considero injustas, de que o Sarau A Estrada nos seus quinze anos de vida só é para reunir festeiros, fazer cantorias e declamar poemas. Quem viveu isso aqui durante este período sabe que não é verdade este anunciado.
Aqui introduzimos debates de grande importância para o conhecimento e o saber intelectual, inclusive sobre a cultura em Conquista. As nossas portas sempre estiveram abertas e para entrar nunca indagamos qual sua linha ideológica. Ai, sim, seria censura.
Por outro lado, minha gente, um sarau, como o próprio nome já diz, é um sarau desde suas origens históricas, e não um movimento político partidário, não é um partido político, uma associação de classe, um sindicato ou um grupo popular revolucionário. Claro que a política faz parte desse processo, mas não é necessário polarizar ou destilar xingamentos. O que menos precisamos agora é de teorias.
Mesmo assim, sempre tenho dito em público para todos estradeiros, que o sarau, pelas proporções em que tomou e pelo seu tempo de resistência, deve sim tomar posições políticas no âmbito cultural. O Sarau A Estrada é nosso e ninguém tem o direito de tascar com verborreias depreciativas.
É um ponto de encontro cultural que nunca recebeu nenhum apoio do poder público. Que me perdoem os contrários, mas esta é a minha leitura e é nela que lastreio meus argumentos. É a nossa obrigação sairmos em defesa da cultura, mas sem a mistura partidária, respeitando as diversidades ideológicas em que nele habitam desde a sua fundação.
Por fim, queria também expressar aqui a minha posição, que pode não ser unânime, sobre o grupo “Estradeiros da Cultura”. Desde sua criação, temos como princípio básico não discutirmos política partidária, repito, por causa da convivência com as diversidades ideológicas, e só isto já foi uma grande conquista.
Alguém disse que se trata de um grupo privado. Ora, todo grupo é privado e tem suas normas, como, por exemplo, a dos partidos políticos, seja de direita ou de esquerda. Quem destoa é advertido e até eliminado. Pode até haver divergências e correntes, mas os objetivos são comuns.
Por sua vez, sabendo desse princípio, a pessoa é totalmente livre para participar, ou não. Portanto, quem desrespeita este fundamento básico, sem falar de não ofender e agredir o outro, não pode alegar que esteja havendo censura, nem mordaça e nem atentado contra a liberdade de expressão. Sua liberdade termina quando você invade a do outro ou a dos outros.
PROJETOS NA PAUTA DA CÂMARA
Nesta quarta-feira (dia 15/10), a partir das nove horas, mais uma sessão da Câmara Municipal de Vereadores de Vitória da Conquista vai debater diversos projetos de interesse da comunidade, como a instituição da Semana Municipal do Aleitamento Humano, dentre muitos outros.
Da parte do parlamentar Miguel Cortês, será instituído o dia cinco de outubro como o Dia Municipal do Rock, celebrado anualmente nesta data. Deverá também ser instituída a Política Municipal de Atenção Integral à Saúde da Mulher com Endometriose.
Ainda nas discussões serão analisadas propostas, como o Programa Vozes da Terceira Idade, que prevê rodas de memória em escolas públicas com a participação de idosos da comunidade, bem como a Semana de Combate à Exposição Indevida, Adultização, Exploração Sexual e Outros Crimes contra Crianças e Adolescentes na Internet, nas instituições públicas e privadas do município.
Além disso, a pauta da sessão inclui projetos de concessão de títulos e de denominação de ruas, que sejam de pessoas que prestaram serviços relevantes à cidade e ao município. Temos as falas dos vereadores que farão suas devidas considerações.
SE LAMPIÃO FOSSE PRESIDENTE DA REPÚBLICA
Certa vez o “rei do cangaço” e “governador do Sertão”, como muitos o denominavam, disse que deixaria de ser cangaceiro se fosse para ser presidente da República. Aliás, o primeiro a ser chamado “governador do Sertão” foi Antônio Silvino, isto até 1914 quando ferido se rendeu. Ele apelidava Lampião de “meu príncipe”.
Não se sabe ao certo se foi boato, lenda, ou não, mas deve ter sido quando foi convidado a ir a Juazeiro do Norte para combater a Coluna Prestes, por volta dos anos 30. Confundiram o juízo dele que já estava torrado de tanto sol e espinhos.
Pensando bem, já tivemos vários tipos de presidente, até um descendente de cigano, generais da ditadura, uns bons e outros não, uns exóticos e estrambólicos malucos, sem citar nomes. É bom não queimar e poupar os neurônios.
Então, vamos aqui viajar em nosso imaginário do realismo fantástico no caso de Lampião ter sido presidente da República, naquela época, entre o “arcaico” e o moderno.
Seu primeiro ato seria mandar surrar as mulheres de cabelos curtos e com saias um pouco acima do joelho, até correr o sangue em suas carnes. Só Maria Bonita ousou colocar esses trajes para se proteger dos garranchos da caatinga, do agreste e do sertão.
Ah, Maria Bonita seria ministra das Mulheres, com a incumbência de acabar com o cativeiro delas nas famílias. Seria Bom. Dadá poderia até ser ministra da Cultura, para incentivar as artes moralistas escolhidas por ela.
Lampião gostava de ouvir boas músicas em seus esconderijos e dançar o xaxado com seu bando. Adorava uma sanfona. Apreciava também que os fotógrafos tirassem fotos suas para exibir sua força e provocar os governantes. Era dado às artes. No entanto, talvez extinguisse o Ministério da Educação.
O padre Cícero Romão Batista, o seu idolatrado “Padim Ciço” seria nomeado ministro da Justiça, da Moral e dos Bons Costumes. Mandaria degolar Carlos Prestes e seus oficiais, os satanases comunistas vindos lá da União Soviética. Iria sobrar também para os ex-presidentes Artur Bernardes e Getúlio Vargas, com final trágico. A imprensa seria censurada e só pulicaria o que fosse do seu agrado.
Lampião decretaria a religião católica como a oficial do país, como fez o imperador Constantino na Roma do império em decadência. Todas regalias para os padres sacerdotes que deveriam ser venerados pelos fiéis como santos intocáveis, com bons salários.
O misticismo religioso, as superstições, os mandingueiros “fecha corpo” com suas rezas dos santos arcanjos Gabriel e São Jorge seriam preservados e seus praticantes ganhariam um bom dinheiro. Trataria os negros com desprezo, como raça inferior.
Para as outras religiões, ele mandaria queimar todos seus membros nas coivaras nordestinas, ou ordenaria suas tropas fuzilar todos nos paredões. Acabaria com os direitos humanos e nada de liberdade de expressão.
“Zé Baiano”, o grande agiota e ferrador de mulheres, seria indicado como ministro da Fazenda. Ia ter muita grana nos cofres públicos para dividir boa parte entre eles.
Seus “cabras” da peste, como Volta Seca, Gato, que matou toda família, Sabino, Turco Cândido, Xico Pereira, Paizinho Baio, o “Lampião do Agreste”, Jurema, Jararaca, Tenente, Fiapo, Andorinha, Nevoeiro, Gavião, Trovão, Mormaço, Cocada, Pontaria, Cobra Verde, Vereda e tantos outros seriam chefes de polícia ou teriam algum lugar nas pastas dos ministérios.
Corrisco, que chegou a servir o exército, seria comandante-chefe das Forças Armadas, com toda autonomia para praticar suas atrocidades contra qualquer opositor ao seu regime tirânico.
Os “coronéis de patentes”, nem todos, só seus aliados, seriam proclamados governadores das províncias ou dos estados. Para os outros adversários, autorizaria serem eliminados na base do punhal, do rifle e do fuzil.
Não vamos só imaginar coisas ruins e macabras. Como ele violentou muita gente, roubou até dos pobres dando a eles as migalhas das moedas, poderia se redimir de seus pecados hediondos e mandar distribuir muito dinheiro e alimentos para os miseráveis do nosso Sertão Agreste Nordestino. Seria o primeiro presidente a instituir o Bolsa Família.
Para os sulistas, só castigo de carregar pedras para erguer as construções, na condição de escravos. Ninguém mais iria esculhambar e debochar dos nordestinos. Seria um bom patrão para pagar bem os seus asseclas e abraçaria a todos com amizade, com viés marxista, embora de forma inconsciente.
Ordenaria importar perfumes franceses e máquinas modernas do exterior, principalmente as de costurar e bordar. Seu ministro nesta área poderia ser até o Antônio Silvino, desempregado e regenerado, depois de passar mais de 20 anos de cadeia na Casa de Detenção do Recife, ao lado do comunista Gregório Bezerra.
A segurança seria altamente reforçada com pena sumária de morte para os bandidos quadrilheiros. Bandoleiro só admitiria ele como presidente da República. Não que isso aí seria bom e politicamente correto. Mas, esse termo nem existia naquela época.
Acho que está bom, sem mais delongas. Como neste país é tudo falso como uma nota de três e misturado como os destilados, o resto é só vocês colocarem a imaginação para funcionar, se Lampião fosse presidente da República.
O FIM DO CANGAÇO E SEUS MOTIVOS
Desde Jesuíno Brilhante, passando por Antônio Silvino a Lampião e Corisco, entre o final do século XIX até as quatro primeiras décadas do século XX, o cangaço durou mais de 50 anos e viveu seu auge a partir dos anos 1920. Alguns historiadores e pesquisadores falam do “arcaico” ao moderno e outros que houve o pré-cangaço e o cangaço, que vigorou até 1940.
Para entender melhor os motivos que levaram ao fim do cangaço no Nordeste temos que recuar um pouco no tempo quando nas primeiras décadas as forças volantes eram deficientes, despreparadas, mais violentas com a população, corruptas e os chamados “macacos” não podiam atravessar as fronteiras de outro estado em perseguição aos bandoleiros.
Até por volta de 1930, os vínculos dos cangaceiros com os coronéis, donos de engenhos, fazendeiros e os próprios políticos eram mais fortes e muitos contavam com os serviços deles para resolver encrencas com seus adversários. Isto tudo começou a ser desmantelado no Governo de Getúlio Vargas, com o fim dos “coronéis de patentes” que representavam a Guarda Nacional criada a partir de 1831.
Por outro lado, os estados nordestinos, em sua maioria, fizeram um pacto ou acordo de ajuntamento das forças para combater o cangaço, abolindo a proibição de uma força de uma província entrar na outra para lutar contra o banditismo. Esta medida contribuiu em muito para enfraquecer o movimento.
O autor da obra “Os Cangaceiros”, Luiz Bernardo Pericás, destaca que a quantidade de foras da lei no Sertão e Agreste nordestinos no final do século XIX e nas quatro primeiras décadas do século XX causou grande impacto econômico e cultural na região.
O pesquisador cita que teriam lutado, somente ao lado de Lampião, durante os anos em que esteve em atividade, mais de quinhentos bandoleiros. Há estimativas que tenha havido mais de mil baixas de ambos os lados, ou seja, polícia e criminosos. Optato Gueiros chega a afirmar que só em Pernambuco, onde o cangaço foi mais atuante, foram presos ou assassinados mais de mil cangaceiros.
Pericás aponta que os aspectos tecnológicos, logísticos, humanos e políticos tiveram grande contribuição para pôr fim ao cangaço. Após o assassinato de Lampião, o único “grande “ cangaceiro que restou foi Corisco, que não tinha as mesmas habilidades e qualidades do companheiro. Como a maioria se rendeu, o número de asseclas que poderia seguí-lo se reduziu em muito.
“Uma atuação maior da polícia, ofertas e garantias de vida para os que se entregassem, aperto ao cerco contra os bandidos, utilização de armas pesadas e modernas por parte das tropas, aumento de verbas federais para o combate aos quadrilheiros, a vontade política de Vargas para acabar com o banditismo que manchava a imagem do Brasil lá fora, a perda da força dos “coronéis”, a perseguição aos coiteiros, a presença da União nos assuntos do Sertão, foram alguns dos motivos para o término do cangaceirismo”.
A filmagem de Virgulino por Benjamim Abrahão Botto, mostrando ao mundo a existência de uma país supostamente “arcaico” e atrasado, fora da lei, que afrontava e desrespeitava a ordem jurídica vigente no novo regime, foi a gota d´água para eliminar os cangaceiros.
Luiz Pericás assinala ainda ser importante lembrar que muitos “coronéis” perderam seu prestígio e deixaram de apoiar os bandos. Muitos oficiais da polícia corruptos, que forneciam armas para os grupos, resolveram parar de negociar e seguir as ordens das autoridades estaduais.
A quantidade maior de soldados, todos dispostos e bem armados, dificultou a ação dos bandoleiros e fez com que muitos abandonassem o crime. Nos tempos passados, os “macacos” e sertanejos contratados para o combate recebiam pequenos soldos atrasados e, às vezes, até com dinheiro falso dos próprios governantes. Não existiam motivações por parte das volantes que eram mais violentas com o povo do que os próprios cangaceiros.
CONVÉM NÃO MISTURAR
(Chico Ribeiro Neto)
Há alguns anos me contaram: “Tem lugar na Bahia em que entra um caminhão de cachaça e saem dois”.
O Brasil já registrou duas mortes pelo consumo de bebidas com metanol, além de 181 notificações, das quais 14 casos confirmados em laboratórios. Cachaça contaminada por metanol deixou 37 mortos na Bahia em 1999.
Adulterar, “batizar”, misturar, isso é coisa que, infelizmente, acontece em todo lugar do Brasil.
Quem nunca achou um caroço de milho ou uma pedrinha no feijão ou no arroz?
Conheço uma baiana de acarajé que deixou de comprar o saco de camarão seco com 10 quilos. “Vinha de tudo misturado. Pequenos búzios, sirizinhos e pedrinhas. Isso tudo junto dava quase meio quilo ou mais”.
Conheço um dono de padaria que uma vez comprou 10 latas de manteiga, cada uma com 10 quilos, por 300 reais. O vendedor trouxe uma lata aberta, de onde retirou manteiga de verdade, e o dono provou. O preço estava ótimo (na época, o quilo de manteiga custava 6 reais e para ele ia sair por 3) e ele deu logo o cheque.
No fim da tarde, abriu a primeira lata e tomou um susto: era batata batida. Abriu as outras 9 latas e só tinha “purê”. Tentou sustar o cheque, mas já tinham descontado. Na época, os malandros aplicaram o golpe em vários estabelecimentos comerciais da Vasco da Gama e do Nordeste de Amaralina.
No interior da Bahia era frequente se colocar água na cachaça vendida em barris, aquela pinga sem marca e que era chamada de “lava jega”. O que nunca me fez mal foi a cachaça com jiló da Barraca de Seu Izidro, em Salvador.
A tramóia parece que é mundial. Um grupo de pescadores nos Estados Unidos todo ano ganhava um torneio de pesca, até que um ano descobriram o golpe: eles enfiavam bolinhas de chumbo goela abaixo dos peixes para pesarem mais.
De volta ao Brasil, muitos postos de combustível vendem gasolina com um percentual de etanol acima do permitido. Aí o carro começa a falhar, surgem vários problemas no motor.
Confesso que eu também já misturei. Quando tinha uns 10 anos, eu e meu irmão Cleomar, então com 12 anos, colocamos uma rolimã no meio de um pacotão de jornais velhos e o vendemos para um açougueiro (a carne era embrulhada em jornal) na feira do Largo 2 de Julho. Ele pesou, pagou e a gente se picou.
Nem toda mistura é ruim. O molho da baiana melhorou o prato do Tio Sam. Tem coisa melhor do que misturar feijão com arroz e farinha?
Uma vez, o cronista Carlinhos Oliveira, do Jornal do Brasil, e Tom Jobim saíam de um bar às 5 da manhã, no Rio, e Carlinhos perguntou a Tom:
“Vamos tomar um táxi?”
“Convém não misturar”, respondeu o compositor.
(Veja crônicas anteriores em leiamaisba.com.br)