UM AMBIENTE DE CULTURA E TERAPIA
Ir ao Museu de Kard é como tomar um banho de cultura, conhecimento e saber, além de uma terapia espiritual que lhe faz deixar todos problemas lá fora. Aqueles das correrias diárias. Quando você entra naquele portal e bate o olho na pirâmide, imediatamente vem à cabeça as pirâmides do Egito, a Quepes, Quéfren e a Miquerinos. Em seu entorno, as esculturas nos transportam para uma viagem ao imaginário. Cada um faz sua interpretação porque a arte em si e o artista têm esse poder mágico de provocar, de levar a pessoa à reflexão.
Pelo caminho do xadrez nordestino, do tribunal, do fantástico labirinto, no bule, na sala antiga da televisão, o prédio da exposição das artes plásticas dos expoentes Romeu Ferreira, Valéria Vidigal, Emanuel Kardec, dentre outras obras, o visitante vai sentindo o vento tocar suave em sua alma e criando uma interação entre a arte e a natureza, com as flores (São João), a quaresmeira e as árvores típicas do nosso sertão, no sapé da Serra do Periperi.
O museu, o maior a céu aberto do Norte e Nordeste já conhecido em toda Bahia e no Brasil, é só poesia de forte inspiração, não somente para os poetas. Ah, e passa também aquele ambiente de meditação para o além, não importando qual seja sua religião. Aliás, nem é preciso ter religião. Não importa sua crença ou até mesmo se é ateu. Ali você se encontra com um ser superior. Ainda existem locais reservados para um bom bate-papo relaxante familiar e entre amigos. Cada um expressa sua visão sobre o que viu.
Todas as vezes que vou ao espaço idealizado e criado pelo artista visionário Alan Kardc, me sinto assim, mais humano e relaxante. Dá vontade de morar ali por toda eternidade, ou por toda vida, como queira. Não importa qual seja sua filosofia. Não posso deixar de acrescentar que o museu só cresce.
Agora mesmo, seu criador está construindo o Tambor onde vai abrigar diversas linguagens artísticas e já sugeri para ele que não deixe de incluir a nossa literatura nesse ambiente cultural. Ali também pode servir como espaço para leitura, estudos e pesquisas. Outra ideia, em minhas conversas que já tive com o amigo Alan, é que dentro do museu se construa um museu da imprensa, uma forma grandiosa de resgate da história dos jornais impressos, com destaque para o primeiro “A Conquista”, em 11 de maio de 1910.
Quando vou ao Museu de Kard sempre levo minha máquina fotográfica para flagrar com suas lentes as belezas artísticas e naturais. Até parece que ela também gosta do local porque capricha nas imagens e capta a luz em tempo certo, num ambiente de cultura, paz e terapia.
O METAL VIL MOVE MONTANHAS
– Os idealistas e filósofos costumam dizer que a palavra move ou remove montanhas. Este milenar pensar, além de ser metafórico e figurativo, é abstrato, relativo e subjetivo. O que move montanhas neste mundo capitalista é o dinheiro, meu caro amigo. Quando brindamos, pedimos saúde, pensando no vil metal.
– Pelo visto, você hoje está amargo, aperreado e revoltado com a vida, mas as palavras têm forças de realizar sonhos e fazer mudanças, inclusive nas cabeças das pessoas. Grandes líderes da humanidade fizeram revoluções e movimentos bons e ruins através das palavras.
Essa dialética, ou embate entre o material e o espiritual, existe desde a origem do homem sapiens quando começou a se organizar, saindo da caça, da pesca e da colheita para a agricultura e a propriedade privada. A partir daí tudo passou a girar em torno do dinheiro. O ser humano começou, então, a conhecer a infelicidade.
– A palavra pode até ter o poder de convencimento e concretizar sonhos, mas depende do dinheiro – retrucou o amigo, afirmando que quando a pessoa se vê sem dinheiro, ela entra em desespero e depressão; fica irritado com tudo; não consegue raciocinar direito; e até adoece física e mentalmente. Palavra pode até mover montanhas, mas o dinheiro está em tudo – desabafou.
– Em parte, meu camarada, você tem razão e até compreendo a sua situação e sua agonia, mas seu estado de espírito está mais para confundir. Com este sentimento atrasado, as coisas só tendem a piorar. É quando o urubu debaixo caga no de cima.
– Que nada, vamos ser realistas! Observe uma pessoa endividada e sem dinheiro que olha para todos os lados e não enxerga uma saída. Ela fica macambúzia, banza e mal-humorada, tornando-se até estúpida e bruta. Imagine um pai de família com três ou quatro filhos chorando num canto com fome e ele não tem uma grana no bolso, nem para comprar um pão?
Realmente é um papo complicado e até arrasta energias negativas. Como diz o poeta cancioneiro Raul Seixas, “o ponto de vista é o ponto da questão”. Às vezes julgamos determinadas atitudes de pessoas do nosso convívio de amizades sem procurar saber o que elas estão passando. Muitas vezes, o errado para um, pode ser o certo para o outro.
A velha experiência nos ensina que nem sempre devemos falar tudo o que pensamos, como essa coisa de que só o dinheiro move literalmente montanhas. Do outro lado, existem profissões onde o indivíduo só ganha dinheiro com palavras e muita “lábia”.
A grande maioria não concorda com isso e ainda lhe condena. As naturezas humanas são diferentes. Tem gente que vive alegre e sorrindo, mesmo sem dinheiro. Outros ficam acabrunhados.
Quando um empresário tem recursos, por exemplo, ele derruba uma montanha de minérios e ainda faz um estrago no meio ambiente, vencendo mil palavras contrárias.
Se não me engano, o poeta Fernando Pessoa disparou que a morte é uma confusão. Eu, particularmente, colocaria também a vida nesse rol. Para se nascer é aquela confusão, principalmente para quem não tem dinheiro. A mesma coisa acontece quando se morre.
Trocamos ideias sobre este assunto tão complexo, sem um convencer o outro, mas, num certo momento, achamos por bem falarmos de futebol e amenidades porque religião e política são outros entreveros controversos que, às vezes, terminam em inimizades.
Quando alguém lamenta a falta de dinheiro, o outro do lado rebate prontamente que é o problema de todo mundo, talvez até seja uma indireta com receio de que o queixoso possa se atrever a lhe pedir um empréstimo.
Sabe do caso do moço que foi pedir uma grana ao “amigo” e este contou tanta miséria e desgraça em sua vida que o primeiro chorou e ainda lhe deu o pouco que restava? Ficou sem nada.
Aliás, para o banqueiro, só o dinheiro move montanhas. Para um monge ou um religioso de um convento, são as palavras que movem e removem montanhas através da fé e da esperança. Fé é mistério e dinheiro é como ciência exata.
“FOI O XAMPU, BEM”!
( Chico Ribeiro Neto)
O cara viajou. Disse à mulher que ia voltar quinta-feira, mas chegou quarta à noite.
Estava sem chave. Morava num conjunto habitacional en Salvador, com paredes de cobogós. Resolveu escalar os cobogós até o segundo andar e fazer uma surpresa à mulher. Surpreso ficou ele ao ver o Ricardão ao lado da mulher, de cueca cheia de girassóis. O Ricardão se picou em desabalada correria enquanto ele exigia explicações da mulher.
O caso se espalhou pelo bairro todo e o cara teve que se mudar, pois não aguentava mais ouvir a rua toda gritar seu novo apelido: “Corno Aranha!”
Vamos a outro caso onde quem viajou foi a mulher. Aconteceu num município baiano onde morava “Maciste”, apelido dado porque ele era magro de fazer dó, parecia um palito. O que tinha de baixinho e magrelo sobrava em ousadia. Era só dona Lindaura viajar e “Maciste”, já da Rodoviária, se mandava pra “zona”, onde amanhecia
Ele tinha uma.lanchonete embaixo da casa onde morava, onde se chegava através de uma escada apertadinha.
“Maciste” nunca pensou em levar mulher pra dentro de casa – “tá maluco?” – mas acabou que vai uma cervejinha, vem outra já tava beijando a moça na praça, pra todo mundo ver.
“Faz assim: eu vou na frente, fico na lanchonete distraindo a moça do caixa e você sobe com uma encomenda na mão, qualquer embrulho serve, e logo depois eu subo também”.
O coração de “Maciste” batia como nunca. A cerveja deu pra criar aquela coragem toda, até para abrir a geladeira, cortar rapidinho um tira-gosto de queijo, guardar o porta-retrato dos meninos no guarda-roupa e esconder ligeirinho o chambrão estampado de dona Lindaura.
“Não se preocupe, ela só vai chegar amanhã” – dizia “Maciste”, já de cueca na sala e sem camisa, aparecendo aquela ossada toda, dava pra contar as costelas.
Ele tava animado como nunca, ensaiou uns passos de dança leu poesia de Castro Alves pra ela e chegou até a pensar em fugir pra Salvador um dia desse, agarrado com ela num ônibus-leito que saía meia-noite.
Amaram-se às três da tarde, e “Maciste”, com aquela coragem do mundo todo que a cerveja continuava a dar, foi tomar banho junto com a namorada.
Estava tudo um paraíso se dona Lindaura, que estava pra chegar de viagem na quinta, não chegasse na quarta. “Maciste” ouviu a porta bater e logo depois a voz de dona Lindaura na sala:
“Benhê, você tá aí? Já cheguei”.
Pingavam do corpo de “Maciste” água e suor, numa tremedeira só. Não tinha nada a fazer a não ser sair correndo, já que descer pelo ralo era impossível. E foi isso que “Maciste” fez. Antes de chegar no banheiro, que estava com a porta escancarada, dona Lindaura foi surpreendida com a passagem de “Maciste”, a mais de 100 por hora, molhado e nu, a cabeça branca de xampu.
“Tô cego, tô cego, meu Deus do céu, tô cego, não vejo nada” – berrava “Maciste”, já ganhando a escada e a rua. Dona Lindaura desceu a toda, corria, gritava e chorava.
Quase um quarteirão depois – quando a namorada já ganhara o mundo – conseguiram segurar “Maciste” e enrolá-lo numa toalha, enquanto dona Lindaura chegava esbaforida: “O que foi, meu amor, o que foi que aconteceu com você?”
“Não sei, acho que foi o xampu. Comecei a lavar a cabeça, escorreu pros olhos, parecia que tinha brasa viva nos meus olhos e fiquei sem ver nada, justo na hora que você chegou.
Dona Lindaura mandou trazer uma bacia d’água ligeiro e depois conseguiu um carro pra levar “Maciste” na melhor clínica da cidade. Duas horas depois, depois de muita lavagem nos olhos com soro fisiológico e farta aplicação de colírios especiais, “Maciste” voltava a enxergar lentamente e dona Lindaura perguntava:
“Tá me vendo, bem, tá bem vendo?”
“Tô vendo tudo nublado mas tá melhorando, acho que vou voltar a enxergar”.
“Aquele xampu nunca mais entra lá em casa. Vamos mandar carta pros jornais, vou levar o vidro pra televisão, isso é um crime se vender um xampu desses.
E depois daquele dia o xampu “Havaí del Sol” nunca mais entrou na casa de “Maciste”.
(Crônica publicada no jornal A Tarde em 5/7/1989)
(Veja crônicas anteriores em leiamaisba.com.br)
ADAGAS AFIADAS
De autoria do jornalista e escritor Jeremias Macário
Oh, deuses gregos-romanos!
Cada um com sua saga ancestral,
Seu feroz instinto animal:
Alianças e tramas atadas,
Com suas adagas afiadas,
Montaram cruel assassinato,
Num trágico secreto ato.
Da Gália Italiana,
Gauleses da terra parisiana
Com seu exército treinado,
Homens bravos mercenários,
Júlio César contrariou o Senado,
Cruzou o Rio Rubicão,
Como um deus furacão,
Em Roma imperial,
Foi louvado e amado
Em sua carruagem triunfal.
Uma guerra civil romana,
Em quarenta e nove
Antes da era cristã,
Fez-se uma carnificina humana,
Brandiram as espadas tiranas,
Nas batalhas sanguinárias,
Que se tornaram lendárias.
No Egito como um tufão
Encurralou o general Catão
Que preferiu se sacrificar,
Ao invés de se entregar;
Renegou a clemência,
Para não ser um prisioneiro
Do seu senhor no cativeiro.
Com suas legiões seguiu avante,
Pois na frente tinha mais gente;
Negociou com a rainha Cleópatra,
Dela fez sua amante,
E do seu ovário
Gerou o bastardo Cesário.
Em Alexandria,
Admirou todo seu esplendor;
Rendeu vênias ao seu criador:
Alexandre, o Grande,
Vindo do rei Filipe da Macedônia,
Que o mundo desbravou,
Como maior conquistador.
Nas Colinas da Anatólia
Praticou sua oratória:
Vim, Vi e Venci,
No aqui e no agora,
Pontuou sua hora,
Consagrou mais uma vitória,
Como guerreiro da história.
Depois de tanto inverno infernal,
Num inferno sem igual,
Destronou o vingador Pompeu,
Que já era pelo povo odiado,
Depois fugiu e foi assassinado,
Para não mais voltar ao reinado.
Em Roma assentou os colonos,
O plebeu apoiou seus comandos;
Deu terras aos seus veteranos;
Ajustou o planeta em seu astral;
Reformulou o calendário anual;
Recebeu mil honrarias:
De rei, deus imperador
Coroado até como ditador;
Expandiu todo vasto império
Do Oriente ao Ocidente.
Ciúmes, invejas e ódio,
Intrigas ambiciosas palacianas,
Brutus virou conspirador,
Com Cassius e Decimus,
A conspiração se espalhou;
Transformaram tudo em terror,
Nas noites cálidas romanas.
Com suas adagas afiadas,
Escondidas em suas togas,
Como feras em manadas,
A César apunhalaram,
Em nome das ideias republicanas,
Senadores enganaram,
Com suas ganâncias espartanas.
Conspiradores traidores,
Nas armações planejadas,
Mais de vinte adagas afiadas,
De mortais ciladas,
Dilaceram suas carnes,
Até costelas quebraram,
E o sangue jorrou no plenário,
Num um aterrorizante cenário,
Na Casa de Pompeu do Senado
Seu maior inimigo,
Onde imaginava ser seu abrigo:
Tudo estava pelos adivinhos previsto,
Em quarenta e quatro antes de Cristo.
Depois os assassinos se refugiaram,
No forte da Colina Capitolina,
Com seus seguranças gladiadores,
E toda Roma chorou suas dores,
Até a sua deusa protetora divina.
No funeral de quatro dias,
Os céus se abriram,
Caíram tempestades e ventanias,
Que lhe fizeram imortal,
Como filho de Vênus e Júpiter,
Na Roma de Rômulo ancestral.
Sua pessoa foi deificada;
Deu nome a outros imperadores,
Que em Roma dinastia reinou,
Depois das adagas afiadas,
Que deixaram mentes revoltadas.
O tribuno Cícero das catilinárias,
Bradou com suas catilinárias,
Marco Antônio hábil negociou,
Um armistício de trégua,
Mas a vingança não tardou.
Outra guerra civil começou,
Da Gália Otávio César Augusto,
Que de Júlio herdeiro se tornou,
Um criou julho e o outro agosto,
O moço ergueu sua espada,
Carregando também sua adaga,
Formou até um triunvirato,
Todos caíram em seu prato,
Não sobrou um conspirador,
Teve até oficial desleal,
Que só queria fazer bacanal,
Que de tanto medo se suicidou.
Por quarenta e um anos,
Augusto César governou,
Jesus ainda era um adolescente,
Com sua filosofia envolvente,
Encantava toda mente,
Pregando paz e amor,
Quando o sucessor Tiberius
A Judéia massacrou
Pilatos lavou suas mãos,
Os sacerdotes insanos,
O filho Deus na cruz crucificou.
UMA LUZ NO FIM DO TÚNEL
Depois de quarenta e seis anos, finalmente nasce uma luz no fim do túnel no sentido de ser revista a anistia geral e irrestrita de 1979, do general Geisel, concedida aos presos políticos que lutaram bravamente contra a ditadura civil-militar de 1964, a qual também beneficiou os torturadores que mataram e desapareceram com os corpos dos resistentes, inclusive do ex-deputado Rubens Paiva.
Li em vários livros a respeito do tema ditadura e sobre movimentos históricos da humanidade, como do combate com sangue contra a escravidão. Nos depoimentos de psiquiatras, filósofos e historiadores, eles são enfáticos quando dizem que não constitui crime lutar e até matar, se for o caso, em nome da liberdade de expressão.
Para ficar mais claro, pela liberdade você tem o direito sagrado de ser um infrator das leis da sociedade e ser absolvido. Até um preso de um penitenciária tem o “direito” de lutar pela sua fuga, se bem que ele tem sua pena acrescida.
A questão da liberdade é comparável ao crime de legítima defesa quando uma pessoa indefesa tenta matar o outro. Liberdade é também vida. Foi o que ocorreu com aqueles que foram para linha de frente contra o regime ditatorial e, em momentos difíceis, cometeram crimes, inclusive de assassinato.
Acabei de ler um pronunciamento, encaminhado pelo meu amigo Dal Farias, da futura presidente do Supremo Tribunal Militar, Maria Elizabeth Rocha onde ela, em entrevista à jornalista Miriam Leitão, diz que Alexandre de Moraes, do STF, é o juiz natural para julgar a organização criminosa golpista de Bolsonaro, e defende o fim da Anistia de 1979.
Segundo ela, esta anistia deveria ser revogada por ser inconstitucional. Ao ser indagada sobre os 23 militares denunciados pela Procuradoria Geral da União pela tentativa de golpe, afirmou que não há crime militar que poderia ser usado como álibi para um julgamento no STM. Defendeu que Moraes deve seguir em frente e que ele é o juiz natural da causa.
Destacou ainda a futura ministra que a denúncia oferecida pela PGR (Procuradoria Geral da República) tem começo, meio e fim e que os indícios são fortes. De acordo com ela, a peça processual está bem fundamentada. Declarou de forma enfática que houve sim uma tentativa de golpe em oito de janeiro de 2023.
Ela vai de encontro ao novo presidente da Câmara Hugo Motta que disse que não houve tentativa. “Quando ele se pronunciou nesse sentido não tinha conhecimento nem noção dos fatos que foram expostos na denúncia”.
Maria Elizabeth ressaltou que viu a tentativa de golpe como qualquer brasileiro que aprecia a democracia, com dor, com sofrimento e com esperanças de que a Constituição prevaleça sempre.
O mais importante em sua entrevista foi quando sinalizou que na presidência do STM vai seguir o entendimento do ministro Flávio Dino visando revogar definitivamente a Anistia de 1979. Seguindo a Constituição, declarou que crimes de tortura não são suscetíveis de anistia.
Como está escrito na bandeira mineira dos inconfidentes, liberdade, ainda que tardia. A Anistia de 1979 foi empurrada goela abaixo dos brasileiros, imposta pelos generais de que era assim ou não haveria abrandamento do regime. É como se diz no popular: É pegar ou largar. Esta anistia, da maneira como foi assinada, é mais uma das tantas vergonhas do Brasil.
UMA QUARTA-FEIRA DE RESSACA E CINZAS PARA OS POBRES ENDIVIDADOS
Se festas e carnavais de muitos dias de farras fossem fatores de aumento de índice de desenvolvimento humano, Salvador, por exemplo, teria um patamar de qualidade de vida comparável aos países nórdicos da Noruega, Suécia e Dinamarca. No entanto, servem para deixar o pobre mais pobre e endividado numa quarta-feira de cinzas de uma ressaca de lascar, inclusive das farras misturadas com drogas.
Em termos de circo, Salvador supera os povos antigos romanos, os maias, os celtas, os sumérios e outras civilizações que passavam dias glorificando seus deuses em homenagens pelas bonanças de uma estação para outra, ou até mesmo para aplacar suas iras. Muitos desses festejos haviam até sacrifícios humanos.
Não literalmente nos altares das oferendas, aqui também no Brasil centenas e milhares de humanos são também sacrificados pela violência nessas épocas do ano, sem contar que aqui os chefes poderosos dominadores do poder nem dão o pão, como ocorria na Roma para iludir os plebeus. Eram os meios de evitar as revoltas.
Dias antes do começo das fuzarcas eles aparecem na mídia dizendo que estão oferecendo milhares de empregos temporários, só que torram milhões de reais tirados do próprio povo, que fica com as migalhas. Nos camarotes e nos trios, os ricos milionários, enquanto no asfalto, os arrastas chinelos.
O que os já empobrecidos ganham, mal dá para pagar suas dívidas, dormindo nos barracos das ruas como escravos dos patrões agenciadores de viagens, hoteleiros e turistas endinheirados. Os pipoqueiros caem nas folias mostrando suas caras de um país desigual, sem educação e saúde. A maioria dorme com suas mentes e barrigas vazias.
A mídia atual entra nesse arrastão burguês capitalista dizendo de alto e bom som nos meios eletrônicos de que tudo é de graça lá embaixo, como se o dinheiro público fosse privado. Na Roma antiga, nos reinados da França, da Inglaterra, da Espanha, de Portugal, entre imperadores e sultões árabes, o discurso era e ainda é o mesmo para seus súditos. Nesse aspecto, não evoluímos em nada, muito pelo contrário. Pioramos em humanização.
Eles mentem descaradamente, e a imprensa se encarrega de fazer a cobertura das mentiras porque ela também faz parte do banquete e leva uma boa fatia do bolo, ou uma “bolada”. Além do mais, temos uma festa anticultura nas músicas e em suas letras vagabundas que merecem ser jogadas na lixeira.
Em se tratando do carnaval de Salvador, por exemplo, esses meios de comunicação alardeiam que é o maior do mundo, como se isso fosse uma glorificação, justamente numa capital com um dos maiores índices de desigualdade e pobreza do Brasil. O carnaval de hoje invade a quarta-feira de cinzas (antigamente ia até meia noite de terça-feira), dia sagrado para os católicos, o que é um desrespeito e intolerância religiosa, quando os promotores da festa pregam o contrário. Não deixa de ser uma cínica contradição.
Não se é contra à diversão do ser humano, mesmo porque faz parte das nossas vidas festejar, curtir momentos felizes, comemorar passagens e datas, mas não nesse estilo exagerado e exploratório onde as festas e os carnavais representam mais concentração de renda nas mãos dos mesmos.
É uma quarta-feira de juntar as cinzas para os pobres trabalhadores e de muita bonança e cofres cheios para os ricos, bem como para os políticos que, infelizmente, devido à grande ignorância popular, ganham mais pontos eleitorais. É o circo sem pão, sem saúde nos hospitais e sem mais ensino nas escolas.
“AINDA ESTOU AQUI” COM AS FERIDAS ABERTAS DA DITADURA CIVIL-MILITAR
Muitas vibrações pelo Brasil a fora em plena festa carnavalesca misturada com cerveja e álcool pelo óscar ao filme brasileiro “Ainda Estou Aqui”, do brasileiro Walter Salles com seu elenco principal Fernanda Torres, sua mãe e Selton Mello, mas as feridas da ditadura continuam abertas.
Temos que comemorar pela primeira vitória de uma estatueta na categoria cinematográfica, mas precisamos também refletir sobre tudo que o país atravessou com o regime militar durante mais de 20 anos, sem contar as mortes de presos políticos, as torturas e os desaparecimento de corpos, cujos atores das arbitrariedades (muitos já morreram), ficaram impunes com a anistia mambembe de 1979.
Não estou aqui para colocar água no chope dessa grande façanha no campo cultural. O reconhecimento é merecido. No entanto, o filme deixou um vazio quando não mostrou cenas de torturas que Rubens Paiva sofreu antes da sua morte e nem contou como seu corpo foi desaparecido. Além do mais, o filme mostra Fernanda Torres, na representação de Eunice Paiva, festejando um atestado de obtido mentiroso dado pelos generais da época.
Outra coisa que me deixa triste – e aí é onde falo das feridas abertas – é que essa história é praticamente desconhecida e esquecida pelas novas gerações onde milhares nem acreditam que a ditadura existiu. Nesse rol de pensamento, também incluo os extremistas da direita que abrem a boca para dizer que ela é uma falácia da esquerda.
Essa história foi tão apagada do conhecimento popular que muita gente que assistiu ao filme sai dos cinemas achando que o enredo se trata de um romance entre uma família que foi perseguida pela polícia, e não consegue compreender o seu contexto. Além do mais, esse episódio, infelizmente, foi banido do ensino escolar e poucas pessoas têm o cuidado de ler sobre o que de fato ocorreu. Precisamos conhecer, por exemplo, sobre a Guerrilha do Araguaia.
Quando falo de “Ainda Estou Aqui” com as feridas abertas da ditadura, seria melhor ainda que os brasileiros não apenas comemorassem esse primeiro óscar, mas que refletissem sobriamente sobre tudo que passou, sobretudo a respeito dos anos de chumbo, de 1969 a 1974, no governo do general Médici. É momento de valorizarmos mais ainda a liberdade e a democracia e não atentar contra elas.
Não restam dúvidas que foi uma grande premiação, mas seria mais intensa e gloriosa se os torturadores tivessem sido punidos, como aconteceu nos nossos países vizinhos do Uruguai, da Argentina e do Chile onde os regimes foram ainda mais cruéis.
Passaram-se os governos de esquerda, do Lula e de Dilma e, praticamente, nada foi feito em termos de reparação, a não ser indenizações aos que foram perseguidos e torturados barbaramente nos porões da ditadura. Esse tipo de reparação monetária, por incrível que nos pareça, beneficiou também torturadores.
A Comissão da Verdade apurou e recomendou levar os torturadores aos tribunais, mas os governantes acharam que era revanchismo e preferiram engavetar os escritos. Ainda hoje, centenas de famílias derramam suas lágrimas porque não tiveram o direito de sepultar seus entes queridos e fazer seus rituais fúnebres como manda nossos hábitos culturais.
Portanto, glória para a estatueta do óscar que abre portas para o nosso cinema, fortalece a nossa arte e o Brasil passa a ter mais visibilidade no exterior. Ganhou como melhor filme internacional e isso é muito importante e nos orgulha.
É claro que é razão para se comemorar, mas as feridas da ditadura continuam tão abertas que ainda tem multidões que vão às ruas e praças defender intervenção militar e tentar um golpe de Estado. Oxalá esse filme nos sirva de lição para que ditadura nunca mais no Brasil.
O FUTEBOL DE ONTEM NÃO É O DE HOJE
Carlos Gonzalez – jornalista
Vamos tentar analisar e comparar o futebol jogado na Europa Ocidental com o do Brasil: imaginemos que você tomou um gole de “Estrella Galicia” (cerveja fabricada na cidade espanhola de La Coruña), e, em seguida, prove uma das nossas “louras”. Seu paladar não vai se iludir. É indiscutível a melhor qualidade do produto importado. Assim é o nosso futebol, desde 1982, quando a seleção verde-amarela deixou os gringos de boca aberta nos gramados espanhóis.
A partir daí, “cartolas” europeus, árabes e japoneses usaram suas valiosas moedas para levar nossos craques, deixando aqui um produto de segunda qualidade para consumo interno. Adolescentes bons de bola passaram a ser observados pelos “espiões” dos grandes clubes do Velho Mundo. A Copinha, disputada nos meses de janeiro, em São Paulo, por centenas de jovens, menores de 18 anos, é uma das vitrinas do futebol nacional.
Felizmente, essa “fuga” não chegou ao patamar do que ocorre com as nações africanas. Na França, por exemplo, não só o futebol, mas outros esportes, formaram suas equipes nacionais naturalizando jovens do continente negro. Marcos Senna, Jorginho, Pepe, Tiago Alcântara e Diego Costa integram uma pequena lista de brasileiros que vestiram as camisas de seleções de nações europeias.
Um dos pioneiros desse êxodo de brasileiros para a Europa foi Evaristo de Macedo (atuou de 1957 a 1962 pelo Barcelona e de 1962 a1965 pelo Real Madrid). Técnico campeão brasileiro pelo Bahia em 1988, seu nome batiza o centro de treinamento do Tricolor em Dias d’Ávila. Ídolo onde passou como profissional, Evaristo rompeu uma espécie de norma na época: primeiro atleta a vestir as camisas dos dois maiores rivais do futebol da Espanha.
Quem viveu e frequentou os estádios – raramente uma competição esportiva era transmitida pela televisão, que dava seus primeiros passos – pode afirmar hoje que 60, 70 e 80 foram os “Anos Dourados” do futebol brasileiro. Maracanã e Morumbi recebiam nos domingos mais de 100 mil espectadores. Até mesmo na saudosa Fonte Nova, 110 mil pagantes assistiram Bahia 2 x Fluminense 1, em 12 de fevereiro de 1989, pelo Campeonato Brasileiro. Tempos que não voltam mais porque os estádios “encolheram”.
Santos, Real Madrid, Benfica e Milan eram os clubes mais lisonjeados do mundo; Botafogo x Santos era o maior clássico do futebol brasileiro – assisti a um deles no Rio, ao lado de mais de 100 mil torcedores. Imaginem, de um lado, pelo time paulista, Pelé, Zito, Coutinho, Mengálvio, Gilmar e Pepe; pelos cariocas, Garrincha, Nílton Santos, Amarildo, Didi e Zagallo. Os dois clubes, no final da década e 50 e começo de 60 formavam a base da Seleção Brasileira, campeã mundial em 58 e 62.
Quero dizer que o torcedor não sentia empolgação apenas com os shows montados por santistas e alvinegros. Recordo dos espetáculos encenados pela Academia do Palmeiras, de Ademir da Guia; pelo Cruzeiro, de Tostão e Dirceu Lopes; pelo Expresso da Vitória, do Vasco da Gama; pelo Bahia heptacampeão baiano (142 vitórias, 75 empates e 11 derrotas), de Douglas, Fito e Baiaco; a Máquina Tricolor do Fluminense, de Rivelino; o Rolo Compressor, do Internacional; e o Flamengo, de Zico e Júnior.
Vivíamos uma fase em que praticamente duas competições eram disputadas: os campeonatos Brasileiro e os estaduais. Os atletas tinham tempo para treinar, ter outra profissão e estudar. Atualmente, passam muitas horas nos aeroportos e a bordo de aviões, por causa dos torneios organizados pela Conmebol, CBF e federações estaduais. Atração o ano inteiro, os regionais duram somente três meses. Os jogadores dos clubes de divisões inferiores – a maioria – passam nove meses desempregados, viajam de ônibus, seus dirigentes reclamam da falta de ajuda do poder público municipal e do empresariado.
Temos um exemplo aqui na nossa casa. O Conquista está há cinco anos fora da Primeira Divisão do futebol do estado. As últimas gestões municipais têm ignorado o que o esporte pode representar para sua cidade, haja vista que uma secretaria tem que cuidar da cultura, do lazer, do turismo e do esporte. Mesmo que o titular do cargo tenha boa vontade para trabalhar, ele não irá se transformar num super-homem.
O empresariado justifica a recusa em colaborar sob o argumento de que, se o time fica muito tempo sem atuar. a marca do seu negócio não é vista pelo público, como não é mostrada pela televisão. Beneficiada com isenção fiscal concedida pelo município, uma grande loja instalada no comércio conquistense poderia aplicar em publicidade parte dos seus lucros, inserindo sua marca no uniforme do Conquista, como vem fazendo em clubes do interior do país, como o vôlei feminino de Brusque, em Santa Catarina.
Um dos maiores “adversários” do futebol brasileiro, responsável pelo decréscimo técnico das nossas equipes, sem distinção, é o chamado “time das despesas”. O boletim financeiro do jogo Jequié x Jacuipense, pela última rodada da fase de classificação do Campeonato Baiano, emitido pela FBF, mostra que 2.208 pessoas foram ao Estádio Waldomiro Borges, deixando nas bilheterias R$ 12.340. O visitante voltou à sua cidade de mãos vazias e o mandante, depois de somadas as despesas, teve um prejuízo de R$ 12.340.
Diante desse cenário, qualquer tipo de espetáculo para o público, seja teatro, música ou futebol, a tendência é deixar o palco. Há necessidade de se buscar novas fontes de renda, como vender suas revelações antes do término do contrato, aceitar propostas, até desvantajosas, de bilionários europeus e xeques árabes, submetendo-se ao capitalismo internacional selvagem, transformar-se em sociedade anônima com direito somente a 10% das ações; receber e agradecer o dinheiro dos sócios, dos patrocinadores, das casas de apostas e de sites de encontros amorosos, e o pago pelas TVS a título de direito de imagem.
No Brasil, o torcedor padrão é o que recebe um salário mínimo, – o “0 geraldino” -, aquele que está deixando de ir aos estádios – um público de 40 mil pessoas é manchete dos jornais – , porque não tem recursos para adquirir um ingresso, cujo preço está fora do seu orçamento. O show não conta mais com bons artistas. Termina presenciando agressões, sob a complacência dos árbitros, e, nas arquibancadas e imediações dos estádios, batalhas, até com uso de armas de fogo, de torcidas organizadas.
TEMOS MEDO DE MUDANÇAS
Elas nos assustam e nos deixam temerosos. Nos fazem suar frio, como se fosse duelo de vida e morte. Umas são desastrosas e outras vitoriosas, mas só os que enfrentam os desafios conseguem se amadurecer e seguir em frente. Dizem que pé que não anda não dá topada. Você é daqueles que prefere não andar para não sentir a dor, ou que se arrisca, mesmo sabendo que pode tropeçar?
Estou falando de mudanças na vida, seja ela no sentido material ou espiritual. Por ser inquieto e agitado, minha vida sempre foi pautada em mudanças e desafios, desde quando ainda era jovem e adolescente. Sai da roça e fui fazer o primário em Piritiba. Depois resolvi ser seminarista em Amargosa, num mundo que não era o meu. Digo sempre que sou um desgarrado da família.
De Amargosa parti para Salvador onde deixei a batina e fiz vestibular para jornalismo. Foram anos muito difíceis de sofrimento porque não estava preparado para aquela outra cena tão diferente e cruel daquela em que vivia. As mudanças não foram apenas de ordem física. Deixei de ser um religioso.
Outro grande desafio foi quando larguei tudo na capital e vim trabalhar em Vitória da Conquista para outra aprendizagem. Foram novas lições de sucessos e derrotas, mas me fizeram crescer. Parece até que as mudanças me atraem e vou entrando nelas de cabeça. Confesso que levei muitas topadas, mas não desisto, sou teimoso. Será um carma?
Não quero, no entanto, ficar aqui falando das minhas mudanças mesmo porque muitas delas não serão compreendidas e vão chamá-las de insensatas e loucas. Quando se faz uma mudança, cada pessoa aparece com seu ponto de vista, umas de apoio e outras de condenação.
Dizem os filósofos que tudo muda para ficar no mesmo lugar, mas não é bem assim. Cada mudança tem seu efeito e quem a faz tem suas razões, só que é julgado, muitas vezes até por quem se diz ser seu amigo. Alguma coisa me ensinou que é melhor você fazer sua mudança calado, na surdina, no silêncio, para que dê certo.
No mundo das mudanças, existe muita gente que prefere ficar acomodado em seu lugar, em sua zona de conforto. Em minha opinião, esse tipo de pessoa passa na vida sem viver. É como se fosse um morto vivo porque tem medo de espinhos e passa o tempo admirando as rosas até elas murcharem.
– Bem que eu falei: Foi sair do seu lugar e quebrou a cara. Essa é a fala que se ouve daquele que não tem a coragem de enfrentar uma mudança e ainda parte para as críticas injuriosas. Quando se alcança o sucesso, lá vem a inveja. São pessoas que devem ser excluídas do cardápio da vida.
A QUARESMEIRA E O ARCO-ÍRIS
Tarde de sereno e uma réstia de luz do sol beija a quaresmeira formando o poético arco-íris da natureza em plena cidade que começa a finalizar seus trabalhos em mais o corre-corre de um dia agitado. Cada um ainda tenta resolver seus últimos problemas, tudo pela sobrevivência. As lentes da minha máquina conseguem flagrar esse momento mágico e minha alma se eleva nesse cósmico misterioso como fino grão de areia que vaga à procura do sentido da vida. Depois retorno aos meus pensamentos, sem saber o que me aguarda no futuro próximo. O reflexo do arco-íris na quaresmeira é beleza que encanta e nos faz refletir sobre o que somos nesse universo e me convida a fazer o verso do silêncio. O tempo passa e lá se foi o arco-íris, sem dar um adeus, e não se sabe quando virá outro onde o sol penetra no sereno solene da tarde.