:: out/2024
USO CONDENÁVEL DAS EMENDAS
Carlos González – jornalista
Tenho plena certeza, amigo e colega Jeremias Macário, que a ferida causada pela punhalada nas costas que você recebeu no domingo (6) não iniciou ainda o processo de cicatrização, porque não existe um medicamento para a cura de uma traição. Você carregará essa cicatriz, infelizmente, para o resto da vida, mesmo que vá residir, como pretende, no meio do mato, trocando a companhia dos “civilizados” pelos bichos.
Sem recursos, mas com um discurso objetivo, mostrando o porquê de querer ampliar sua ajuda ao município, você colocou os pés nas ruas sem calçamento da periferia, a cata dos votos de uma parcela da população esquecida pelo poder público de Vitória da Conquista. Você recebeu tapas nas costas, junto com promessas e pedidos de ajuda, mas também foi alvo da revolta dos menos favorecidos contra a classe política.
Você partiu para essa luta desigual, consciente de que ia enfrentar uma corja que briga sujo, usando o dinheiro como arma. Foi sua estreia e, ao mesmo tempo, sua despedida da política. Na verdade, a convite da sociedade civil conquistense você já deveria estar ocupando uma cadeira na Câmara de Vereadores, ou numa outra casa parlamentar de maior projeção, logo após se aposentar.
Sem um mandato, salvo a indicação do jornal “A Tarde”, Jeremias dedicou mais de 30 anos de vida a serviço de Conquista, sem obedecer a horário. Na condição de chefe de uma sucursal de um grande periódico, o jornalista é um plantonista 24 horas. Líder de um poder virtual, – a Imprensa -, na época, o quarto da República, Jeremias fez mais por este município do que muitos prefeitos e vereadores.
Há 50 anos, quando “A Tarde” deixou a Praça Castro Alves, no Centro de Salvador, mudando-se para a Avenida Tancredo Neves, seu único vizinho era, na margem esquerda, a sede e a pista de corridas do Jóquei Clube. Hoje, a avenida, com seus prédios, restaurantes, bancos e escritórios luxuosos, e o maior shopping da Capital, é considerada como o centro financeiro da cidade.
A Sucursal de “A Tarde” foi um polo de desenvolvimento, não só de Conquista, como de todo o Sudoeste. Exerceu aqui a mesma função que a sede do jornal empreendeu nas regiões do Iguatemi, Caminho das Árvores e Pituba. Pessoas e instituições procuravam o jornalista quando precisavam da divulgação de um evento, de uma ajuda ou de uma denúncia contra o poder público. Hoje, Jeré, essa gente nem lhe cumprimenta com um “bom dia”.
Assistimos a uma das mais vergonhosas eleições neste país, onde o dinheiro correu solto, sem o menor rubor no rosto dos políticos, que usaram as emendas parlamentares – cerca de 70 bi este ano -, para eleger ou reeleger seus afilhados. Veículos carregados com maços de notas de 50 e 100 reais foram apreendidos pela Polícia Federal (PF) em estradas carroçáveis, para serem usadas na compra de votos nas periferias das cidades, onde a fome é um dos maiores flagelos.
Essas emendas, objeto da pressão do Congresso sobre o presidente Lula, distorcem a disputa eleitoral. Um exemplo é Campo Formoso (71 mil habitantes), no norte da Bahia, governado por Elmo Nascimento (União), irmão do deputado federal e presidente do União Brasil, Elmar Nascimento.
Campo Formoso recebeu este ano 53 mi “derramados” pelo filho dileto, que usou de sua influência política na estatal Codevasf para presentear seu mano com máquinas, tratores e caixas-d’água. Conquista, com quase 400 mil habitantes, obteve 23 mi em emendas. E o Elmo, que aqui teve 7.189 votos nas eleições de 2022, com o apoio declarado da prefeita Sheila Lemos (União), não nos reservou nem uma caixa–d’água.
AS FORMIGUINHAS E A LAGARTA
O mundo animal tem suas especificidades e cada um age à sua maneira na luta pela sobrevivência, como o homem que o chamam de racional. Este mata por matar e não para se alimentar do outro. As hienas, os lobos e raposas, por exemplo, atacam os animais mais fortes, como a onça e o leão, em bandos e têm suas próprias estratégias e técnicas para dominá-los e saciar sua fome.
Neste final de semana estava em meu quintal e observei por horas o ataque das formiguinhas chatas miúdas, que surgiram das mínimas frestas e gretas, contra uma lagarta daquela grande de coqueiro. Notei que ela estava parada e enfraquecida no chão porque cortei o coqueiro de tanto elas terem roído as palhas. Foi a única saída para eliminar a praga diante do desperdício de colocar veneno. Essas formiguinhas têm um faro inacreditável.
De repente apareceu um batalhão delas e foram para cima da lagarta. Ela se estrebuchava, se virava, se enrolava em forma de caracol e se arrastava lentamente, mas as formigas não desistiam das picadas, não davam trégua. Dei uma de cientista biólogo e fiquei acompanhando aquele embate infernal.
De certo ponto fui até masoquista, pois poderia muito bem ter separado a lagarta das formigas e lá estaria eu como salvador herói e benfeitor, mas resolvi ver até onde ia a resistência do bicho. Na tentativa de desvencilhar das miudinhas, ela se arrastou por um metro toda ferida das picadas, mas nada de falecer.
Caramba, pensei comigo, ela tem sete vidas dos gatos e é mais dura na queda do que as baratas que resistem até a bomba nuclear! Imaginei um bando de formigas ou abelhas de ferrão me atacando. Ficaria desesperado de tanta dor e poderia parar no hospital.
Tão miúdas contra uma gigante! No entanto, o que estava contando ali era a união de dezenas delas e a persistência para conseguirem seu objetivo final. Já era final de tarde esfriando e as formiguinhas sumiram. Avaliei que elas detestam a frieza da noite.
Depois dessa luta, lá ficou a lagarta inerte, mas ainda com um resto de vida, como um ser em estado terminal. Deixei em seu mesmo lugar. No outro dia, já no ambiente mais quente, apareceram as mesmas formiguinhas e aí foram só fazer a refeição.
Existe aquele ditado na política, no setor empresarial e na vida social de “trabalho de formiguinhas” quando a situação ou o quadro está difícil de se reverter, como o avanço da extrema direita no Brasil. A esquerda, por exemplo, esqueceu desse trabalho das “formiguinhas” para manter e ampliar seu espaço de conscientização política do povo.
Contra um monstro dragão, um só não tem condições de combater, mas um conjunto unido e determinado pode fazer a diferença e a tarefa de eliminá-lo. O mal é que nos tempos atuais, principalmente, a humanidade se tornou mais ainda individualista e egoísta, do cada um que se vire e o resto que se dane.
Por onde andam as manifestações e as mobilizações populares para reverter essa decadência e comodismo? A banda está tocando desafinada, meu amigo! Uma formiguinha só jamais iria paralisar a lagarta, mas o bando, sim, cada uma fazendo a sua parte. Isso poderia ser uma fábula e dela tirarmos as lições, no bom sentido.
A CULTURA VAI BEM, AQUELE ABRAÇO!
Diante do cenário de calmaria que observamos, a sensação que temos é que a cultura de Vitória da Conquista vai muito bem, aquele abraço! É um céu de brigadeiro, ou um mar de almirante! Como diz o professor Dirley Bonfim, é tudo melancólico e triste de se ver.
Alguma reaçãozinha ali e outra acolá, e o resto é cada um por si, tocando num barzinho de final de semana para ganhar uma merreca de gorjeta, fazendo um teatrinho, lançando um livrinho, uma exposiçãozinha e declamando sua poesia com palavrório de intelectual e “doutor” do universo literário.
Outros se contentam com os editais das leis Paulo Gustavo e Aldir Blanc, para pegar uma graninha do audiovisual e alguns projetos noutras linguagens artísticas, de olho nas cotas das políticas públicas. Se temos editais, para que reclamar mais!
Muitos aproveitam para embromar com algum projetinho de qualidade duvidosa e usam a grana em benefício próprio. A fiscalização faz de conta que fiscaliza a “prestação de contas” e o selecionado faz sua bajulação.
Temos até baluartes e papas da cultura, sem contar os gênios Elomar Figueira e Glauber Rocha, nossas referências do passado. Para que, então, queimar os neurônios, protestar e se preocupar com o presente e o futuro? Para que reformar e abrir os equipamentos culturais? Sem essa de Plano Municipal de Cultura, coisa burocrática de leis que vai estabelecer orçamento.
Deixa isso para os estressados que não sabem viver e ficam enchendo o saco da Secretaria de Cultura, Turismo, Esportes e Lazer – Sectel! Êita nome bonito e pomposo danado! Nada de aporrinhar e atanazar o poder executivo com esse negócio de cultura, mesmo porque o povão está se lixando!
Parodiando Zeca Pagodinho, deixa o tempo nos levar, leva eu, e vamos tomar umas boas num barzinho da vida, exibindo nossos dotes de conhecimento e sabedoria sobre história, filosofia, política, artes plásticas, pensamentos de escritores, vida de pintores, economia e até de psicologia. Afinal de contas, sabemos de tudo, somos os sabichões neosocráticos e platonistas.
O resto são tapinhas nas costas, falsos elogios, exibicionismo barato, vaidades e criticar os defeitos e as fraquezas dos outros. Quem fica por aí martelando que a nossa cultura está abandonada e foi esquecida é velho ranzinza reclamão que não está contente com a vida.
Conselho Municipal de Cultura é só para enfeite simbólico do prefeito ou da prefeita. É assim mesmo que a banda toca. Os documentos, projetos, manifestos e ofícios com indicações, sugestões e propostas são sempre engavetados. Vida que segue, meu amigo!
Ora, todos os anos temos São João com Amado Batista, sertanejos, pagodeiros e arrocheiros. No Natal é só iluminar a Praça Tancredo Neves com milhões de pisca-piscas com túneis bonitos para as famílias tirarem fotos e selfies para postagens em seus status e redes sociais. Algumas bandinhas ganham uns trocados e todo mundo fica feliz da vida.
Sem essa de fazer manifestações em porta de prefeitura ou nas ruas para reclamar da cultura. Aliás, isso há muito tempo não faz mais parte da nossa cultura, coisa arcaica, atrasada e ultrapassada, meu camarada! Melhor tocar seu burro na estrada e uma viola na praça, de preferência com um chapéu para colher algumas moedas.
Sem demais ironias, o que falta mesmo é coesão dos grupos, entidades (Casa da Cultura) e academias de letras da cidade que ainda fazem cultura entre si de forma fechada, sem distinção ideológica, seja de esquerda ou de direita. Por que todos não se unem em torno de um objetivo coletivo e comum? Movimentos isolados terminam perdendo a credibilidade e chegam até a ser chamados por gente da Secretaria de Cultura, Turismo, Esportes e Lazer como coisa de comunistas de esquerda. Aquele abraço!
ÚLTIMA CHAMADA
(Chico Ribeiro Neto)
Os japoneses costumam colocar no túmulo dos parentes ou amigos um pouco do doce ou comida que a pessoa falecida mais gostava, seguindo uma tradição. Uma vez um paulista perguntou ao japonês: “A que horas seu defunto vem comer a comida?” “Na mesma hora em que o seu vem cheirar as flores”, rebateu o japa.
Fui ao sepultamento de um amigo no Campo Santo e resolvi comprar uma coroa de flores. Escolhida a coroa, o funcionário da floricultura me entregou um caderno, já bem amarelado, com centenas de sugestões de frases para escrever no cartão, que começavam por “saudades eternas”.
Também no Campo Santo, enquanto esperava a hora de um sepultamento, convidei um amigo para tomar um cafezinho na cantina do cemitério. Ele me acompanhou, mas não quis o café. “Não tem problema, pode tomar”, disse eu. E ele reagiu preocupado: “Mas, e esse pozinho que vem de lá?”, e apontou para as sepulturas.
Quase todo cemitério tem o cara que adora discursar em enterro, mesmo que não conheça o falecido. Numa cidade do interior baiano, havia o Seu Zezinho, que não perdia um. Mas nesse sepultamento ele se deu mal. Com o surrado paletó marrom, chegou ao cemitério, procurou algum montinho ou lápide pra subir, já que era baixinho, e disparou: “Aqui vai mais um amigo, honesto e trabalhador. Será o destino de todos nós. Hoje é ele. E amanhã quem será?” “Seu Zezinho”, gritou um gaiato. “É a puta que lhe pariu”, reagiu Zezinho furioso, já pulando no chão e dobrando as mangas pra brigar.
O artista plástico Ângelo Roberto gostava de beber à noite no bar do Cemitério Jardim da Saudade, em Salvador. Dizia que o bar não fechava, era seguro e tinha uma vizinhança muito tranquila. Parece que o bar fechou.
Ninguém sabe o que dizer ao viúvo ou viúva. Tenho um amigo que, na total falta do que dizer, acabou dando “Parabéns” à viúva. E esse não passou pelo bar do Jardim da Saudade.
Um velho jornalista baiano estava num velório no Jardim da Saudade quando um funcionário lhe ofereceu o Livro de Presença para assinar. Ele se recusou e o funcionário perguntou “por que o senhor não assina?” O conhecido repórter policial apontou para o céu e disse: “Ele faz a chamada é por aí”.
(Veja crônicas anteriores em leiamaisba.com.br).
NOSSA SAÚDE É UM BARRACO
A própria imagem já diz tudo como anda nossa saúde em Vitória da Conquista. Um morador de rua armou um barraco de lona bem em frente do Hospital de Base, ou Hospital Regional, e tascou o nome “UPA 24 horas”. Não deixa de ser uma forma de protesto para dizer que a nossa saúde é um barraco, simbolizando a precariedade em que vive este setor no Brasil, na Bahia e, particularmente, em Conquista. Nunca precisei de recorrer à unidade para um atendimento médico, mas ouço muitos relatos de pacientes que, em outras palavras, constataram que o local é um verdadeiro barraco no sentido da deficiência e até mesmo nas discussões entre os pobres usuários e funcionários. No entanto, não é somente a UPA de Conquista, mantida pelo governo do estado, que é precária e alvo de críticas. Os postos de saúde do município, seja na zona rural ou urbana, também são verdadeiros barracos, mas a atual prefeita mente quando disse em plena campanha que tudo é uma maravilha. Ao posto de saúde do meu bairro já fui e sou testemunha do sofrimento que é marcar um exame, muitos dos quais ficam na fila de espera por mais de um ano, ou até dois, como foi o caso de uma consulta para um otorrino. Para realizar algumas seções de fisioterapia, a atendente me falou que teria que aguardar por seis meses. A nossa saúde é, ou não é um barraco? O eleitor que votou pela permanência da prefeita não adianta chorar quando se sentir abandonado. Tem mais é que arcar com as consequências.
EM GRATIDÃO
Do livro “Suspiros Poéticos – a beleza da lira cor, da poetisa Regina Chaves dos Santos
{…}, sinta: deixe a brisa tocar o teu rosto, ventilar o teu coração, embrulhar os teus pensamentos, atravessar as tuas canções, – te contagiar
E depois, sorria despretensiosamente – veja, como a vida é maravilhosa!
{…}, permita espiar o manto das estrelas na madrugada, a brisa leve, e o coaxar,- dos sapos na lagoa.
Por um sorriso de menina, deixe-me, contagiar da alegria dos transeuntes… em gratidão à vida, sejamos, – amantes dos olhos da imaginação!!!
Em gratidão à vida, – sejamos sempre entusiastas do amor!
COMO ACREDITAR NAS PESSOAS?
A humanidade não é mais aquela de antigamente que era sincera e acreditava na ética, na honestidade, na honradez e valorizava o conhecimento, a cultura e o saber. O errado, o anormal, o ilícito e até o crime tomaram o lugar do certo, do normal, do lícito legal, da moral e do respeito às leis. Quase ninguém se presta mais a refletir e a pensar no seu eu, no que é e no que se tornou.
O ser humano, com raras exceções, está deteriorado, podre, corrupto e se aliou à sagacidade dos inescrupulosos que só pensam em se dar bem e levar vantagem em tudo, não importando que para isso tenha que aniquilar o outro, no último caso até com a morte, se for preciso. Quando alguém te chama amigo-irmão, desconfie.
Não acredite tanto nas pessoas que lhe encontra nas ruas, apertam sua mão, dão tapinhas em suas costas e fazem rasgos de elogios por ser digno e andar de cabeça erguida por nada dever e não ter cometido ilegalidades. Em sua vista, você é tudo de bom e digno, mas pelas costas lhe estraçalha e lhe faz de picadinho. Quer mesmo é comer o seu fígado na brasa.
São quase todas falsas, meu amigo, se é que ainda existe isso. O melhor que se tem a fazer é se recolher e se resguardar em seu silêncio, que ainda é o seu mais bem precioso em que se pode confiar. Os bons serviços prestados são rapidamente esquecidos e seus defeitos são julgados pelos invejosos que fazem questão de lhe anular.
A sociedade é a pior inquisidora, mais terrível que nos tempos da inquisição católica e, lentamente, lhe leva à coivara da fogueira para ser queimado, impiedosamente. Quando você está num cargo de destaque, todos lhe bajulam, lhe chamam até para aniversário de boneca e cachorro e estão sempre frequentando a sua casa com seus risos falsos.
Basta perder tudo e cair numa situação difícil (não importam os motivos), você passa a ser visto como um cão pulguento de rua. Esse comportamento desumano não exclui os mais religiosos que vão às missas ou aos cultos evangélicos todos os dias. Talvez esses sejam os mais cruéis que falam em Deus e fazem suas oferendas ao diabo.
Infelizmente, os bens materiais e o ter, em quase sua totalidade, para esta humanidade atual individualista e egoísta, estão acima dos espirituais. Para esta gente, só restaram as palavras mentirosos como armas de destruição do ser. Na verdade, os pecados capitais, descritos pela Bíblia, são os mais idolatrados. Valem mais os bezerros de ouro.
O mundo competitivo capitalista selvagem a qualquer custo, sem olhar o outro lado colaborativo e solidário, nos levou a este abismo humanitário da tecnologia destruidora onde o dinheiro e o poder de sedução se tornaram deuses da salvação. O inferno está na terra. Só não enxerga isso quem não quer, ou é cego da mente.
Todos condenam as fake news dos boatos e das difamações, mas as mentiras que estão camufladas nas propagandas, nas promessas não cumpridas, nos discursos retóricos, nas mutretas escondidas, nos decretos e projetos de bilhões assinados pelos governantes, nas tramoias feitas entre quatro paredes, nas alianças escusas, são aceitas como verdades.
No faz de conta, as pessoas se escondem atrás das câmaras como bonzinhos e mocinhos do bem para seguir a linha do politicamente correto do não ao racismo, à homofobia, à desigualdade social, à injustiça, à xenofobia, à imoralidade, mas no íntimo são tudo isso que não presta. Vivemos no mundo do fingimento, no armário dos preconceitos.
Quem é contra à preservação do meio ambiente? Acredito que todos são a favor, mas na prática agem de modo diferente quando têm o consumismo supérfluo como seu deus predileto. A prova de toda essa falsidade está no aquecimento global com suas catástrofes e tragédias.
O choro e o ranger de dentes só aparecem quando você e seus familiares são atingidos em cheio. O planeta está pegando fogo literalmente e nas guerras genocidas, mas o que impera é a passividade. Enquanto a desgraça é com os outros, seus sentimentos e compaixão pouco afloram. É como se diz no popular: Vida que segue, ou “vou levando a vida como ela é”.
Portanto, não dá mais para acreditar no que falam essas pessoas interesseiras. Suas bocas nojentas fedem, suas narinas farejam carniça e suas línguas são malditas como lâminas cortantes. Amaldiçoados sejam os falsos que em sua frente lhe tratam como admiradores da sua conduta.
ÔXENTE, DIA DO NORDESTINO!
– Olha, eu sou nordestino com muito orgulho, lá do sertão catingueiro onde a nambu e a juriti piam no final da tarde, o vaqueiro rasga os engaços e bagaços para pegar a novilha desgarrada e levar o gado para o curral. Sou nordestino das veredas e encruzilhadas, de Antônio Conselheiro, dos penitentes, rezadeiras, benzedores, do cangaço de Lampião, da Coluna Prestes e do Padim Cícero.
– Eu sou nordestino aperreado lá do Maranhão do São Luis, capital dos azulejos portugueses, do maracatu, do bumba meu boi, dos escritores Josué Montello, que publicou “Cais da Sagração”, Gonçalves Dias, Arthur Azevedo, Graça Aranha e do reggae jamaicano, de praias paradisíacas e de seus lençóis de lagoas azuis.
– Sou nordestino da alpercata de couro, retirante da seca e da fome no pau-de-arara, comendo poeira nas estradas rumo a São Paulo em busca de sobrevivência, esperando as chuvas baterem no chão rachado para retornar ao torrão natal.
– Neste Dia do Nordestino arretado, sou o “Luar do Sertão”, de Catulo Cearense, que não é cearense, mas prateia meu terreiro do adjutório com minha gente na batida do feijão. Sou nordestino do mutirão e do aboio do cantador.
– Ôxente, sou o nordestino avexado lá de Natal do Rio Grande do Norte, de Câmara Cascudo, que escreveu e nos ensinou sobre todos os folclores da região, ricos em seus hábitos e únicos no Brasil. Sou das dunas das areias brancas beijando as ondas do mar.
– Sou nordestino arrochado de Zé Ramalho, Elba, Amelinha, José Lins do Rego, Patativa do Assaré e Geraldo Vandré contestador da ditadura, lá da Paraíba de João Pessoa e Campina Grande do forrobodó autêntico arrasta-pé, que sempre fizeram uma arenga com seus poemas, cantorias e romances.
– Sou Nordestino receoso e cismado de Exú, de Luiz Gonzaga, o rei do baião, que fez a Asa Branca cantar para o mundo com sua sanfona de doze baixos. Sou forrozeiro Zé Dantas e Humberto Teixeira que nos encantaram com seus versos sobre a vida e os costumes nordestinos.
– Sou o nordestino de Teresina, lá do Piauí, de São Raimundo Nonato, das terras das pinturas rupestres onde viveram nossos ancestrais vindos do outro lado do mar em jangadas ou sobre os gelos do Alasca.
– Sou o nordestino do Ceará – Fortaleza, de Iracema dos olhos da graúna e dos lábios de mel, de José de Alencar, que nos prendeu com suas belas histórias dos nativos da terra. Sou da terra dos humoristas de cabeça chata.
– Sou nordestino do tô na bruxa pernambucano do Recife, de Mocambos, da Casa Grande e Senzala, de Gilberto Freyre, que nos conta em detalhes a saga dos negros escravizados nos canaviais da cana-de-açúcar.
– Sou nordestino afeiçoado das Alagoas do Maceió, de Vidas Secas, São Bernardo e Memórias do Cárcere, de Graciliano Ramos, que fala do homem do Nordeste de alma agreste, explorado pelo coronel tirano e impiedoso.
– Sou nordestino do raio sergipano, lá do Aracaju, terra de Tobias Barreto, do marechal que proclamou a República e destronou o imperador.
-Sou o nordestino baiano, lá de São Salvador, a primeira capital do Brasil, a mais negra africana, que gosta de sombra e água fresca e não é agoniado; adora um bom papo, de um bom samba no pé e de uma lavagem no Senhor do Bonfim, ouvindo a musicalidade e a poesia de Gilberto Gil, Caetano e tantos outros compositores. Sou da terra de Ruy Barbosa, o Águia de Haia, o jurista dos juristas que nos deu régua e compasso.
– Sou nordestino barril, das gírias, poeta, cordelista, repentista, trovador, como o Cuíca de Santo Amaro, mas não um bajulador. Sou a pátria das artes, da imaginação, da criatividade e que aprendeu a se virar diante das adversidades e intempéries. Me batizei no Rio São Francisco, ou Opará, rio-mar, para os nossos índios.
UMA TREMENDA DECEPÇÃO
Confesso que me sinto desolado, triste, derrotado, frustrado e decepcionado com o resultado pessoal depois de uma campanha limpa, diferenciada, de luta, ética e seriedade, percorrendo bairros e ruas desta cidade. Neste momento que escrevo este texto, as únicas palavras que tenho para reproduzir é que a política não é mais para os bem-intencionados porque a esquerda perdeu suas origens e abandonou suas bases.
O pior de tudo é que essa própria esquerda, principalmente o PT, resiste em não fazer uma autocrítica, e os enrustidos fanáticos permanecem em seguir um caminho ultrapassado e não aceitam enxergar o espaço que a direita e a extrema avançaram. Essa própria direita aprendeu com a esquerda e aperfeiçoou seus métodos de políticas públicas sociais.
Não mais conta esse assistencialismo das cestas básicas e do Bolsa Família. O Lula de hoje não é mais o mesmo dos tempos passados que corria trechos do nosso Brasil, especialmente no Nordeste, carregado pelas multidões e tinha a “vara de condão” para mudar e reverter qualquer campanha correligionária que estivesse em baixa.
Com uma aprovação em baixa pela polarização ideológica, ele passou o tempo todo fazendo política externa e nem foi a São Paulo na reta final apoiar pessoalmente o Guilherme Boulos, do PSOL, que aqui em Vitória da Conquista praticamente deixou de existir. O mais desolador é que depois de uma eleição dessa, cada um toma seu rumo, e o partido simplesmente desaparece na fumaça.
O meu desabafo é de profunda tristeza, primeiro diante do trabalho que fizemos com garra e tivemos uma derrota acachapante. Da minha parte, não consigo entender o que deu errado se lutei bravamente e apresentei minhas propostas de trabalho na área cultural, sem contar a intensificação nas redes sociais. Sai dessa campanha igual burro estropiado, como se diz no popular, e recebi intenções de votos que foram falsas. Eu que percorri bairros e ruas, senti na pele a grande rejeição.
Por outro lado, além da esquerda ter se perdido no caminho, o nosso sistema eleitoral é cruel, desigual e desleal, feito pelo Congresso Nacional, para beneficiar eles mesmo e com brechas para serem burladas. Os malfeitores se aproveitam desse sistema para fazer suas trapaças e falcatruas políticas, enganando o povo que passa mais quatro anos na pobreza e na miséria, sem saúde e educação.
Ninguém lá de cima, como sempre tenho comentado, quer fazer uma reforma eleitoral profunda que elimine o uso da safadeza do dinheiro e da máquina de quem já está no poder. Aqui mesmo, em Conquista, todos candidatos à reeleição usaram da estrutura dos seus gabinetes.
A Justiça Eleitoral faz de conta que fiscaliza, que está de olho nas irregularidades. Com esse esquema que está aí, hoje vale a pena cometer ilícitos porque é só pagar uma multa pequena e recorrer das ações de irregularidades até o Supremo Tribunal Federal, sabendo que leva tempo para ser julgado, sem contar as imparcialidades dos juízes que até vendem sentenças. Mentir virou a melhor arma para se eleger.
Nesse processo todo arcaico e que só presta às elites burguesas e aos endinheirados que compram votos, como nos tempos dos coronéis, nossa democracia é mambembe e tupiniquim. É uma democracia que nos deixa envergonhados e bota fora os bons, os honestos e os que desejam melhorias para o povo.
Para ser realista, o nosso povo já se acostumou com uma educação, uma saúde e uma segurança precárias. Na zona urbana, ele só quer é asfalto nas ruas e no campo estradas pavimentadas. Para essa gente inculta, já é normal escolas caindo aos pedaços sem professores e postos de saúde sem equipamentos e médicos. De tanto apanhar, a nossa população já se acostumou a sofrer. Virou uma rotina. Cultura é palavrão.
Os debates feitos nas televisões com aquele blábláblá todo só servem para aumentar a audiência das emissoras. Não passam de um circo para divertir os telespectadores e não mudam voto de ninguém, mesmo que o candidato seja o mais fraco e minta o tempo todo. Aliás, quem mente mais, sai melhor. O resto é conversa mole de cientista político e pesquisador.
Quanto ao resto, me sinto desiludido e desesperançoso com esse panorama político de uma democracia capenga, a não ser que a esquerda se uma em peso para voltar às suas origens de porta de fábrica e conversa franca com as bases.
Ela está inerte, apática e acomodada mandando seus recados teóricos lá do alto e apreciando a direita e a extrema avançarem. Quem começou essa divisão do “nós contra eles” deve agora fazer sua mea culpa e começar a juntar os cacos enquanto é tempo. As eleições municipais servem de parâmetro para as próximas, para corrigir os erros.
QUE NEGÓCIO É ESSE DE DIZER QUE O SÃO FRANCISCO TEM 523 ANOS?
Quando Américo Vespúcio e seus viajantes, um deles André Gonçalves, chegaram à foz do rio Opará, que significa rio-mar pelos índios, em 4 de outubro de 1501, esse rio já existia há milênios e foi denominado pelos desbravadores de São Francisco, hoje popularmente de “Velho Chico”, em homenagem ao santo do dia.
Ora, não consigo entender como os historiadores e a própria mídia afirmam que o Rio São Francisco está completando 523 anos! Até parece que quando eles chegaram em sua foz ele teria nascido naquele ano! Pelo menos não poderia dizer que ele foi descoberto pelos invasores em 1501? É um tanto hilário, para não falar irônico e contraditório esse negócio de aniversário de 523 anos.
Alguém pode até retrucar que é uma data simbólica, mas vamos ser mais coerentes para que as nossas crianças e jovens não confundam uma coisa com a outra, como aprenderam na escola que o Brasil foi descoberto em 1500. O mesmo fazem com a Baía de Todos os Santos, a Baía Guanabara, do Camamu, rios, montanhas e outros pontos do nosso Brasil que já existiam há milhares e milhões de anos.
No entanto, pegando aí o gancho do “aniversário” do nosso gigante São Francisco, das enigmáticas carrancas, podemos confirmar que foi a partir dali, em 1501, que o nosso “Velho Chico” começou a ser explorado pelos novos habitantes intrusos de forma desordenada, ao ponto de estar hoje degradado com suas margens devastadas, sobretudo devido a ação destruidora do ser humano.
Foi durante, por exemplo, os anos de 2011 a 2017 que a nascente do São Francisco, na Serra da Canastra, em Minas Gerais, chegou a secar. Suas águas baixaram tanto ao ponto do rio se tornar inavegável em quase todo seu leito. Muitas ilhas se tornaram bancos de areia e houve uma mortandade de peixes, sem contar as perdas de lavouras por falta de irrigação. Os ribeirinhos foram os que mais sofreram e passaram fome. O prenúncio era que o rio ia desaparecer.
Ao invés da revitalização, em decorrência do assoreamento em suas margens, o governo federal inventou de fazer a transposição de suas águas para outros estados nordestinos, que até hoje só beneficiou os mais ricos, ou seja, os empresários do agronegócio.
Depois da grande seca que deixou praticamente as barragens, como a de Sobradinho, sem vazão, São Pedro mandou chuva e ninguém mais falou em revitalização do “Velho Chico” com o plantio de árvores em suas margens. Continuam retirando água de maneira descontrolada para a irrigação de frutas para exportação.
Naquela época, entre 2011 a 2017, o mar adentrou boa parte do São Francisco em sua foz, entre Sergipe e Alagoas, e suas águas ficaram salobras. Pela sua história e importância, o São Francisco pode ser considerado o Nilo do Nordeste, mas, devido as agressões humanas, ele pode deixar de existir, ou se tornar temporário, ao invés de perene, basta sofrer outra grande seca.















