O METAL VIL MOVE MONTANHAS
– Os idealistas e filósofos costumam dizer que a palavra move ou remove montanhas. Este milenar pensar, além de ser metafórico e figurativo, é abstrato, relativo e subjetivo. O que move montanhas neste mundo capitalista é o dinheiro, meu caro amigo. Quando brindamos, pedimos saúde, pensando no vil metal.
– Pelo visto, você hoje está amargo, aperreado e revoltado com a vida, mas as palavras têm forças de realizar sonhos e fazer mudanças, inclusive nas cabeças das pessoas. Grandes líderes da humanidade fizeram revoluções e movimentos bons e ruins através das palavras.
Essa dialética, ou embate entre o material e o espiritual, existe desde a origem do homem sapiens quando começou a se organizar, saindo da caça, da pesca e da colheita para a agricultura e a propriedade privada. A partir daí tudo passou a girar em torno do dinheiro. O ser humano começou, então, a conhecer a infelicidade.
– A palavra pode até ter o poder de convencimento e concretizar sonhos, mas depende do dinheiro – retrucou o amigo, afirmando que quando a pessoa se vê sem dinheiro, ela entra em desespero e depressão; fica irritado com tudo; não consegue raciocinar direito; e até adoece física e mentalmente. Palavra pode até mover montanhas, mas o dinheiro está em tudo – desabafou.
– Em parte, meu camarada, você tem razão e até compreendo a sua situação e sua agonia, mas seu estado de espírito está mais para confundir. Com este sentimento atrasado, as coisas só tendem a piorar. É quando o urubu debaixo caga no de cima.
– Que nada, vamos ser realistas! Observe uma pessoa endividada e sem dinheiro que olha para todos os lados e não enxerga uma saída. Ela fica macambúzia, banza e mal-humorada, tornando-se até estúpida e bruta. Imagine um pai de família com três ou quatro filhos chorando num canto com fome e ele não tem uma grana no bolso, nem para comprar um pão?
Realmente é um papo complicado e até arrasta energias negativas. Como diz o poeta cancioneiro Raul Seixas, “o ponto de vista é o ponto da questão”. Às vezes julgamos determinadas atitudes de pessoas do nosso convívio de amizades sem procurar saber o que elas estão passando. Muitas vezes, o errado para um, pode ser o certo para o outro.
A velha experiência nos ensina que nem sempre devemos falar tudo o que pensamos, como essa coisa de que só o dinheiro move literalmente montanhas. Do outro lado, existem profissões onde o indivíduo só ganha dinheiro com palavras e muita “lábia”.
A grande maioria não concorda com isso e ainda lhe condena. As naturezas humanas são diferentes. Tem gente que vive alegre e sorrindo, mesmo sem dinheiro. Outros ficam acabrunhados.
Quando um empresário tem recursos, por exemplo, ele derruba uma montanha de minérios e ainda faz um estrago no meio ambiente, vencendo mil palavras contrárias.
Se não me engano, o poeta Fernando Pessoa disparou que a morte é uma confusão. Eu, particularmente, colocaria também a vida nesse rol. Para se nascer é aquela confusão, principalmente para quem não tem dinheiro. A mesma coisa acontece quando se morre.
Trocamos ideias sobre este assunto tão complexo, sem um convencer o outro, mas, num certo momento, achamos por bem falarmos de futebol e amenidades porque religião e política são outros entreveros controversos que, às vezes, terminam em inimizades.
Quando alguém lamenta a falta de dinheiro, o outro do lado rebate prontamente que é o problema de todo mundo, talvez até seja uma indireta com receio de que o queixoso possa se atrever a lhe pedir um empréstimo.
Sabe do caso do moço que foi pedir uma grana ao “amigo” e este contou tanta miséria e desgraça em sua vida que o primeiro chorou e ainda lhe deu o pouco que restava? Ficou sem nada.
Aliás, para o banqueiro, só o dinheiro move montanhas. Para um monge ou um religioso de um convento, são as palavras que movem e removem montanhas através da fé e da esperança. Fé é mistério e dinheiro é como ciência exata.