ENERGIAS POSITIVAS E OS BORDÕES
Existem entrevistas na mídia sobre determinados assuntos onde os personagens sempre soltam aqueles bordões que já se transformaram em marca registrada, inclusive por parte do entrevistador que, muitas vezes, faz aquela pergunta imbecil de deixar qualquer um de queixo caído.
Muitas falas saem da boca de turistas endinheirados que estão passeando numa boa, sem tantas preocupações como a maioria do trabalhador brasileiro que recebe um salário mínimo e faz milagres para atravessar o mês, com uma feira regrada e ainda pagar as contas. Trata-se de uma dura realidade da nossa profunda desigualdade social.
– Aqui é uma maravilha de beleza. Essa gente é acolhedora e hospitaleira. Sinto fortes energias positivas nesse lugar – diz o turista ou a turista para o repórter. É claro que tudo é muito bonito porque a pessoa já chega com um pacote ou uma lista na mão para visitar os centros históricos e os lugares mais aprazíveis da natureza.
Turista não pega ônibus lotado, trânsito engarrafado no horário do rush e nem chega perto das periferias para ver barracos pendurados nos morros, ruas sujas de lixo e esburacadas. Em Salvador, por exemplo, com tantas festanças e exotismos, o visitante de fora fica deslumbrado e tome “energia positiva”.
É claro que o vendedor ambulante, o guia e até o morador têm que ser receptivos porque estão de olho na grana do gringo ou do visitante de outro estado, daí essa coisa de energia positiva, sem falar que o turista está ali curtindo o seu luxo.
De pau para cassete, quando a questão é violência brutal, bárbara e fútil com mortes, seja do lado militar ou civil, o que mais se ouve dos membros familiares mais próximos da vítima, com olhos lacrimejantes de tanto chorar, são as frases “que a justiça seja feita” ou “queremos justiça”, que nunca chega ou tarda a chegar a passos de cágado.
Por sua vez, as autoridades soltam aqueles bordões de que tudo será apurado e investigado o mais rápido possível, doa a quem doer. Isso acontece muito quando um policial comete um desatino, um desvio de conduta e abuso de autoridade. Muitas vezes incriminam um inocente para ficarem livre do caso.
– Uma delícia de sabor, um manjar dos deuses. Esses termos com gestos nos olhos e nos lábios de saboridade e deleite são de repórteres quando provam uma receita alimentar feita por um chefe de cozinha. Já ouviu alguém dizer que o bolo, o pudim ou um prato qualquer estão sem sal, gosto diferente e o tempero está forte? O paladar sempre está na ponta da língua.
E entrevista com jogador de futebol? Ele sempre passa o dedo no rosto, a mão no pescoço ou na cabeça e fala um monte de besteiras repetitivas desconexas. Quando ganha o jogo ou faz o gol, foi Deus quem fez ou foi a mão de Deus. Só falta dizer que foi o pé Dele. Até parece que Deus é torcedor do tipo “folha seca” que está sempre mudando de lado.
Por falar em futebol, também existem aquelas perguntas idiotas por parte de “profissionais” da mídia esportiva. Certa vez um coleguinha perguntou para o técnico como ele está vendo o jogo. Como estava perdendo e irritado, de pronto o cara respondeu: Estou vendo daqui do outro lado das quatro linhas. “E aí Baiaco, sem você, como o Bahia vai ficar? Comigo ou sem migo, meu time vai ganhar.
Existem outros bordões que não falham nunca em reportagens que mostram a natureza do lugar, tais como: É uma paisagem deslumbrante, de tirar o fôlego. Têm ainda aquelas entrevistas onde o repórter diz tudo que o entrevistado ia falar. Não faz uma pergunta.
São tantos outros bordões que as pessoas falam maquinalmente, inclusive nas festas de final de ano, que não vou ficar aqui enchendo o saco de vocês, sem falar em perguntas cretinas, como indagar para um presidiário lascado numa cadeia suja fedorenta se ele vai bem. “Como está, tudo bem? Dá vontade de mandar para aquele lugar que ninguém que ir.











