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CRIANÇAS RICAS, POBRES E FILTROS

– Por que nos últimos anos tem surgido tantas doenças esquisitas entre crianças, especialmente nas ricas, coisa que era raro há 50 ou 60 anos? É diabetes, câncer, obesidade, pressão alta, problemas no coração, sem falar em outras enfermidades, exóticas e crônicas! Comentou o amigo Alberto dia desses num papo meio macabro.

– É compadre, deve ser a industrialização desses alimentos enlatados e com embalagens de visual atraente, cheios de substâncias químicas conservantes, comidas de papel daqueles filmes norte-americanos, só porcaria. Antigamente não havia muito disso. A maior parte dos produtos era comprado nas feiras da agricultura familiar.

– Outra coisa é que criança rica, criada pelas babás, nascida em berço de ouro, vive como se fosse numa bolha, não pode pisar os pés no chão, e os pais, na corrida do ouro, pouco dão atenção. As mães só pensam no trabalho e nem amamentam suas crias. Criança rica hoje tem até depressão, estrese e problemas psiquiátricos. Coisa de doido!

– É, deve ser isso mesmo – concordou o amigo. Agora, veja bem a diferença das ricas em relação às crianças pobres, principalmente as sertanejas nordestinas do agreste brasileiro, lá dos cafundós onde o judas bateu as botas!  Quando nascem, com poucos dias, os pais dão logo é caldo de mocotó, de feijão, buchada, pirão de rabada e bode, coisa com sustança!

– Esqueceu de falar compadre que esses meninos e meninas, com um ano de idade, já estão por aí nos terreiros e nos matos, de pés descalços, na poeira, na lama e tomando chuva na cara. São criados com anticorpos e dificilmente pegam uma gripe.

– Lembro que fui um desses na roça. Com quatro e cinco anos já estava trabalhando. Tive sarampo, catapora, papeira, tosse braba e logo ficava bom com banho de ervas e chás de plantas medicinais. Se ficava doente, triste melancólico e banzo, chamavam uma rezadeira e tirava o mal olhado. “Este menino está de mal olhado comadre”!

– Naqueles lugarejos e povoados nem existiam postos de saúde. A gente crescia sem vacina, sem nunca ver um médico e era nascido de parteira. Os tempos hoje mudaram, compadre Alberto. Qualquer coisa é receita ali, receita acolá e nada de remédio natural, só drogas!

– A maior doença hoje da criança pobre (sempre existiu), seja da zona urbana e rural, é a desnutrição, a danada da fome. Essa é terrível e nunca vai deixar de existir nesse Brasil de políticos safados. As cestas básicas do Bolsa Família enchem o bucho é com feijão com arroz e um pedaço de carne quando acha. Dificilmente comem industrializados. Nada de iogurte, presunto e outros conservantes. É raro um Danoninho e tem que ser dividido por três ou quatro!

– No campo entra o cuscuz, o aipim, o beiju, milho cozido, assado, fubá e a velha buchada com mocotó. Quando bate a seca, aí o bicho pega. Mesmo assim são mais fortes e resistentes do que esses moleques da cidade, que até matam a fome com droga e cola de sapateiro. Os pais são mais violentos e se enterram na cachaça para curar as mágoas.

– Como um assunto puxo outro e estamos falando de doenças, viu como se faz tanta publicidade de protetor solar? A mídia mais parece garota propaganda das fábricas de cosméticos, entrevistando dermatologistas que até ganham com isso. Tem filtro que custa até mais de 100 reais – disse o amigo Alberto.

– Oh, compadre, não estamos numa suíça baiana? Podiam até propor uma lei na Câmara de Vereadores para mudar o nome de Vitória da Conquista para Suíça Baiana, ficaria chique. Pelo menos carimbava de vez o ridículo! Mas, isso é outro assunto, meu camarada!

– O pobre que ganha um salário mínimo pode comprar isso? Claro que não! A linguagem deles (médicos e mídia) é para classe média, de média a alta. Não se pode tomar um sol que aí já vem o câncer de pele. Isso é terrorismo! Cadê a vitamina B ou C que os raios solares emitem? É muita frescuragem. Que se danem os dermatologistas!

– Novamente entra nesse caso o sertanejo nordestino que toma um sol de rachar o cano, de mais de quarenta graus e quase não se vê câncer de pele nesses cabras da peste. Têm casco de jacaré e tartaruga. Leva pedra, pau, toma porrada no lombo e pega no pesado do dia a dia. Por acaso, esse pessoal tem grana para comprar esses protetores caros?  Afirmou o compadre Alberto.

– Eu mesmo, meu amigo, já tomei muito sol quando menino na roça. Não uso esses tais de protetores. Me dão nojo e alergia. Sou bruto mesmo, tipo casca grossa! A pele fica toda melada! Nem esse tal de repelente! Tô fora dessa! Minha pele é a prova de mosquito e muriçoca. O couro é duro e tenho o corpo fechado pelo meu pai de santo. Podem me esculhambar e até me chamar de ignorante. Nem tô aí, compadre Alberto, para esse lero-lero!

 

 

 

 

OS BEBÊS REBORN E AS LOUCURAS

A impressão que temos é que deu a louca no ser humano, mas calma que essa loucura de transtorno mental e desequilíbrio não atinge a todos. Nas redes sociais e na mídia em geral estamos lendo, ouvindo e assistindo casos que mais parecem causos, estórias surreais e fake news, mas são verdadeiros. Por mais que se procure uma explicação, fica difícil assimilar determinadas atitudes.

Estou falando dos tais bebês “reborn”, que na tradução significa renascido, renascimento, feitos de forma artesanal nos anos 90 e agora industrializados com formatos semelhantes de uma criança. É renascimento, ou obscurantismo? É idade moderna, ou das trevas?

Dizem na psiquiatria que esses bebês servem como tratamento terapêutico, talvez para mulheres que, por motivos biológicos, não puderam alcançar a maternidade e vivem em depressão. Se vivo fosse, meu pai diria, em seu linguajar bíblico, que isto é sinal do fim do mundo, ou seja, estamos no juízo final.

Acontece que o remédio provocou efeitos colaterais nas criaturas, ao ponto de cometerem os absurdos dos absurdos. Não sou especialista no assunto, mas fatos que li e ouvi esta semana sobre esses tais bebês reborn me deixaram chocados, bem mais grave do que tratarem os cachorrinhos como se fossem seus filhos legítimos.

Nesta semana acompanhei o noticiário de uma mulher em Guanambi, aqui em nossa região, que chamou um carro de aplicativo com um desses bebês no colo dizendo que tocasse rápido para a UPA porque seu neném estava sentindo muitas dores. Na unidade de saúde descobriram que se tratava de um “reborn”. A situação chegou ao extremo que um deputado da Assembleia Estadual entrou com uma lei proibindo que os postos de saúde, que já são precários e faltam médicos, não atendam esses bebês reborn, ou artificiais.

“Existe mais mistério entre o céu e a terra do que sua vã filosofia”. Se a criação era para ser terapêutico, virou caso de loucura, de internamento. Em Salvador, se não me engano, uma mulher foi a uma Igreja Católica e pediu que o padre rezasse uma missa para seu boneco ou boneca. O sacerdote, é claro, respondeu que ela procurasse um psiquiatra.

Li em algum lugar que a indústrias desses bebês em São Paulo está bombando e ganhando milhões com a grande demanda. A depender da perfeição e do material usado, um chega a custar entre mil a dois mil e quinhentos reais, o que nos leva a concluir que não está ao alcance dos pobres porque já têm uma penca de filhos e a maior preocupação da família é como alimentá-los. Predomina a fome.

São fatos que demonstram em que nível a humanidade chegou, que se apega a um a boneca como se fosse um bebê de verdade. Entendo que o mundo tecnológico tem muita parcela desse desequilíbrio mental onde o espiritual foi posto de lado.

Quando pensamos que já vimos todos os absurdos, aí aparecem outros, e as coisas anormais vão se tornando normais e comuns, tanto que a maioria das pessoas nãos fica chocada. Junte a tudo isso a violência, a corrupção, os desvios de conduta, o individualismo, a necessidade premente de se aparecer nas redes e teremos como pano de fundo a degradação humana.

NA ESTRADA DA MUDANÇA

Todo mundo é praticamente unânime em dizer que fazer mudança é uma coisa horrível, cansativa e que causa inúmeros transtornos. Também concordo, e olha que em minha vida já fiz inúmeras, de perder a conta, pegando estrada de uma cidade para outra ou de casa em casa. Mesmo assim, nunca fiquei especialista nesse troço, sempre requer muito esforço e coragem.

Da roça para Piritiba, de lá para Mundo Novo, para Rui Barbosa, Itaberaba, Amargosa e Salvador, lá ia eu com minha mala de couro com os “panos da bunda”, como se diz no popular. A mais longa foi de Salvador para Vitória da Conquista, em 1991, e aí já tinha muito mais do que simples “panos de bunda”. A bagagem era bem maior e robusta.

Morei 23 anos em Salvador e cerca de 20 como inquilino. Todos os anos fazia uma mudança arrastão porque era expulso pelos moradores do prédio ou do condomínio por fazer muito barulho nos finais de semana com farras e som alto. Pagava um preço caro, mas merecia purgar pelos meus pecados.

Existem outros tipos de mudança, da física corporal à espiritual, e todas elas significam desafios, que podem ou não dar certo, mas, para saber disso, a pessoa tem que encarar e vivenciar. Desconfio que tenho um sangue cigano ou é um carma que me persegue. Em todas elas foi como se o tempo parasse e começasse outro novo.

Agora mesmo estamos, eu e minha esposa, fazendo uma nova mudança, do Bairro Felícia, na zona sul, para o Sobradinho, na zona oeste, e com muito mais bagagem. Em cada mudança, as coisas, os utensílios e bens vão aumentando, inclusive a idade que já está avançada.

Só em Conquista, esta é a sexta que eu faço e agora com um acervo cultural pesado de mais de seis mil itens entre livros, artesanatos, chapéus, aparelhos de som, DVDs, CDs, vinis, televisão, sofás, ferramentas, facas, mesas, recortes de jornais, revistas e outros materiais.

Talvez esta seja a mais marcante porque nestes quinze anos que se passaram aqui nesta casa realizamos o nosso Sarau A Estrada que se notabilizou nas noites fraternais de troca de conhecimento e saber através das cantorias, dos debates, das declamações de poesias, das contações de causos, do papo agradável e dos comes e bebes.

Formamos um grupo sólido e aqui fizemos história, cuja narrativa deve permanecer na outra casa. A mudança é como uma passagem de uma estação para outra e assim seguimos nossa jornada, construindo memórias. É um novo tempo, um novo ambiente, mas os propósitos são os mesmos. Vamos deixar de saudosismo! “Alegria, Alegria”, como na canção de Caetano Veloso.

Bem, já que estamos falando de mudanças e elas caminham por várias vertentes, confesso que, como toda gente, adoro viajar, mas detesto arrumar e desarrumar uma mala. Quando estou só, a mala ou a mochila vira uma bagunça só.

O que mais me incomoda numa viagem é carregar e descarregar, por isso é que costumo levar pouca coisa, principalmente quando se trata de um itinerante internacional. Ninguém gosta de descer num aeroporto e ficar esperando sua mudança aparecer numa esteira rolante. O pior é quando ela se perde e vai para outro destino.  Oxalá que esta nova mudança não tome outro destino.

CONCLAVE, “CONCHAVOS” E O CONGRESSO

IMAGINE OS BRASILEIROS FECHAREM TODAS AS PORTAS DO CONGRESSO NACIONAL, DAS ASSEMBLEIAS ESTADUAIS E DAS CÂMARAS DE VEREADORES E DEIXAREM ESSES POLÍTICOS LÁ DENTRO TRANCADOS ATÉ QUE DECIDAM LEGISLAR EM BENEFÍCIO DO NOSSO POVO, SEM CORRUPÇÃO E MALFEITOS! SERIA UMA ESPÉCIE DE CONCLAVE POLÍTICO – SUGERIU UM AMIGO.

Essa ideia veio à tona enquanto conversava com um camarada amigo sobre a história do primeiro conclave papal (em latim, cum clavis, literalmente, com chaves), na cidade de Viterbo, na Itália, isto há mais de 700 anos, que levou 1006 dias (dois anos e nove meses) para eleger o Papa Gregório X, quando a população da cidade se irritou com a demora e resolveu trancar os cardeais para agilizar a decisão da escolha do pontificado.

Como eram os habitantes que pagavam (nós também custeamos os poderes) as despesas com alimentos e outros itens, as lideranças fecharam a porta principal do recinto e ficaram com as chaves. Passaram, então, de forma torturante, somente fornecer pão e vinho visando apressar a eleição que parecia não terminar por causa dos conchavos entre eles para indicar um nome.

Estava eu a contar essa passagem histórica quando o amigo espirituoso veio lá com sua ideia estapafúrdia e utópica de se fazer o mesmo com o Congresso Nacional até que os parlamentares tomassem vergonha na cara; reduzissem o número de seus membros; cortassem seus salários, mordomias e verbas de indenização pela metade; eliminassem as emendas; votassem somente projetos de interesse da população; acabassem com os conchavos do “toma lá, dá cá”; e elaborassem uma reforma eleitoral séria e limpa.

Ele sugeriu que os brasileiros, que também sustentam os políticos, fechassem as portas do Congresso, de suas assembleias estaduais e de suas câmaras de vereadores e só fornecessem pão e água (nada de vinho) até que eles atendessem as aspirações do povo. Depois do que aconteceu em Viterbo, o Gregório X aprendeu a lição e estabeleceu regras para o conclave no Concílio de Lyon, em 1274, e outros sucessores introduziram novas regras.

– Cara, em se tratando do Brasil, com um dos Congressos (513 deputados e 81 senadores) mais caros do mundo, onde um parlamentar recebe cerca de três milhões de reais por ano do nosso orçamento, esses cabras não largariam o osso. Eles iam preferir morrer tísicos de fome. A ganância deles não tem tamanho e não medem as consequências – respondi, depois de refletir um pouco sobre a questão.

Um outro sujeito ao lado da mesa do bar que acabara de ouvir o papo “maluco beleza” concordou e ainda acrescentou que eles arranjariam um jeitinho de fugir ou subornar brasileiros traidores para tirarem cópias das chaves e soltar a cambada toda. Pior é a vingança que viria depois – completou.

Raciocinei melhor e retruquei que nessa terra tupiniquim do Pau Brasil ou da Vera Cruz, de 525 anos invadida pelos portugueses degredados e malfeitores, essa proposta do amigo revolucionário não iria para frente e seria até ridículo.

– Ora, por que não, se deu resultado com os cardeais lá na cidade de Viterbo há mais de 700 anos? Acostumados com a fartura de mesas recheadas de produtos caros importados, eles não aguentariam passar fome com pão e água.

– Quando você tirou da sua cabeça essa sugestão esquisita de bêbado, não se tocou que a maioria desses parlamentares não frequenta as sessões. As votações agora são virtuais, lá de suas confortáveis mansões. Além do mais, outros nem vão lá, passam o tempo gazeteando e viajando, com atestados fajutos e comprados -argumentei.

– Outra coisa que você não parou para pensar é que os adeptos das bancadas ruralistas, evangélicas, da bala e até traficantes da pesada iriam para as portas desses legislativos com cartazes pedir o fim do conclave, ou com chaves. Essa coisa ia virar um fuzuê danado, sem falar na polícia que iria baixar a porrada. Enquanto isso, lá dentro era ladrão roubando ladrão, tramando seus conchavos.

– Bem, foi apenas uma ideia que passou pela minha cabeça como forma de acabar com essa ladroeira desse poder legislativo brasileiro que atravanca o desenvolvimento do Brasil, mas aqui a sociedade é toda dividida e uns passam o tempo odiando os outros, ao invés de se unirem.

– Esquece o que falei e vamos tomar nossas geladas, sem traumas, sem conclave, de portas abertas mesmo – finalizou o amigo, meio que sem graça.  Você que veio com esse tal de conclave de cardeais que elegeu um leão XIV.

 

 

 

AS ANTIGAS IMPRESSORAS E UM MUSEU

Aos 14 anos de idade, seu Mário Macedo Soares já era um gráfico em Vitória da Conquista, isso nos anos 70, e até hoje ainda trabalha com algumas impressoras antigas, em contraste com os tempos atuais da evolução tecnológica onde tudo é produzido através de modernos equipamentos, mais ágeis e automatizados. No entanto, a eficiência das gráficas antigas é reconhecida até hoje. Ao longo dos anos, como acontece com o nosso patrimônio histórico arquitetônico, essas preciosas peças, muitas italianas, inglesas e alemãs, flagradas pelas lentes digitais, foram sendo vendidas como sucatas e depois derretidas como ferro velho para siderúrgicas. É como o desmatamento das nossas florestas. Uma pena que pouca coisa foi conservada e hoje é raro encontrar, por exemplo, uma máquina linotipo, que me faz lembrar dos anos 70 quando ingressei na profissão jornalística, primeiro como revisor e depois como repórter e editor. Com a evolução tecnológica, passamos da impressão chamada a quente (linotipos à base do chumbo) para técnica a frio.

MUSEU DA IMPRENSA

Várias vezes comentei com amigos companheiros de profissão e interessados no assunto de preservação da nossa memória, sobre a ideia de fundarmos aqui em Conquista um museu da imprensa, como forma de resgatarmos a história do jornal impresso. Lamentável que essa iniciativa não foi para frente e terminou ficando no imaginário, muito por conta da falta de recursos para adquirir esses maquinários e jornais impressos, bem como de um local adequado para instalação desse museu. Quanto mais o tempo passa, mais fica difícil concretizar esse projeto que, com certeza, seria de grande valia para a cidade, para toda região sudoeste e para a classe jornalística. Cada um de nós tem suas atividades, suas individualidades, seus interesses próprios e um projeto desse porte, que seria um legado para a posteridade, vai ficando de lado, como se não tivesse nenhuma importância. Nem o poder público se mostra interessado em apoiar a criação desse museu.

 

ELA NUNCA TE ESQUECE

Autoria do jornalista e escritor Jeremias Macário

Quando você nasce,

Ela se torna tua companheira,

Você pode até esquecer dela,

Mas ela nunca te esquece,

É tirana traiçoeira,

Te pega até no parto,

Ou num fulminante infarto.

 

Ao levantar, não esquece,

Faz tua prece,

Chama pelo teu guia,

No alvorecer da manhã,

Mantenha tua mente sã,

Antes de seguir tua via,

Não procure desvendar

O sentido da vida,

Porque ela é um mistério,

Como tumba de cemitério,

Uns com curta caminhada,

Outros com longa jornada.

 

Quando ela bater em tua porta,

Abra só a fresta da janela,

E convença ela,

Que pela frente,

Ainda existe mais cancela.

 

Lembra que ela nunca te esquece.

É dona do tempo e do vento,

Conhece teu pensamento,

É como senhora agreste,

Com seus nervos de aço,

Sempre com a mesma veste,

Impiedosa, como o carrasco.

OS TRÊS MAIORES LÍDERES MUNDIAIS

Nem é preciso descrever aqui suas trajetórias de vidas porque eles já são conhecidos da grande maioria populacional, desde o mais analfabeto ao intelectual. Seus exemplos já se eternizaram e ficarão para a posteridade. Se cada um seguir um terço do que eles disseram e fizeram, o mundo será bem melhor e mais humano.

Papa Francisco, Pepe Mojica e Divaldo Franco, dois religiosos e um grande político nos “deixaram” neste mês de maio, vindos do século XX e que tiveram a felicidade de entrar no portal do século XXI, na era da revolução tecnológica, com as mentes abertas e tão evoluídos no saber e no conhecimento, apesar de suas idades avançadas entre os finais dos 80 e dos 90.

Se formos avaliar e refletir, vamos concluir que estas três figuras tiveram a simplicidade, a humildade, a generosidade, a prática do bem-estar social aos outros e a capacidade de perdoar como pontos comuns, não importando a religiosidade. Suas filosofias de vida uniram os três numa única religião.

Seria até enfadonho falar aqui sobre estas três personalidades impares que nos deixaram como legado lições de paz, de tolerância, de respeito às diferenças ideológicas e não alimentar o ódio. Eles não deixaram apenas palavras, mas ações de lideranças que os políticos e governantes deveriam seguir.

O Papa Francisco tudo fez para abrir as portas da Igreja Católica para os desfavorecidos, os excluídos e, em seu pontificado, procurou renovar a instituição, apesar das reações dos conservadores. Ele tornou a Igreja menos arcaica, lutou pela paz, condenou o consumismo voraz, o capitalismo selvagem e denunciou as agressões contra o meio ambiente.

Em toda história minha vida, Pepe Mojica, presidente do Uruguai, com seu fusquinha, como se fosse um funcionário público comum, sem mordomias e com sua honestidade, foi o líder mundial que mais me marcou. Ele se reconheceu um exótico porque nenhum mandatário político agiu como deveria ser. Foi torturado pela ditadura do seu país, mas não guardou rancor. No lugar do ódio, praticou o bem.

Outro que durante sua longa jornada se dedicou a melhorar o ser humano foi Divaldo Franco com suas obras psicografadas (mais de 200) e acolheu crianças e jovens em situação de vulnerabilidade através do Caminho da Mansão num bairro pobre de Salvador.

Os três formaram uma só trindade humana, unidos por uma filosofia humanística, tão carente no mundo de hoje de tantas adversidades, guerras e conflitos. Tiveram a coragem de ser diferentes e mostrar que nem tudo está perdido. Foram as três maiores perdas que tivemos neste século XXI.

SE ENTRAR, NÃO COMA

Quem aqui já entrou num restaurante e pediu para visitar a cozinha antes de fazer sua refeição? É bom lembrar que o cliente, como consumidor, tem esse direito, mas ninguém exerce essa prerrogativa

– Aquele patrão da peste só faz nos explorar como escravo. Trabalho dez horas por dia numa cozinha apertada e suja, num calor horrível de pingar o suor. Faltam panelas, frigideiras e o fogão é acanhado e velho. Só tenho folga para almoçar.

O desabafo é da cozinheira Luzia com sua amiga Maria das Dores numa fila de ponto de ônibus que passou superlotado e nem parou. Elas moram no mesmo bairro, numa periferia e tem muitas coisas em comum, como trabalhar duro para criar os filhos que seus maridos são imprestáveis.

– Sei como é amiga, fui babá de um menino “capeta”, cheio dos gostos de uns grã-finos e comi o pão que o diabo amassou nas mãos deles. Agora estou sendo cuidadora de um idoso que sofre numa cadeira de rodas. Os filhos são ingratos e nem ligam para ele – disse “Das Dores”.

– Olha o nosso “buzú”, depois de uma hora de espera e lotado. Vamos penduradas nesse mesmo, no esfrega-esfrega dos tarados fazendo “terra” em nosso corpo, com caras de insolentes – falou Luzia para sua amiga.

Um ônibus que carrega gente é um laboratório de queixas e de pessoas esquisitas, uns até alegres e falantes que levam a vida numa boa, outros calados, roendo seus sofrimentos e mágoas. Os jovens modernos de hoje fingem que dormem e não dão mais assentos para os mais idosos.

É isso aí, mas nosso assunto mesmo é sobre as cozinhas de restaurantes e hotéis populares a médios, se bem que os mais sofisticados apresentam os mesmos problemas. Só têm fachadas de limpos. As cozinhas de hotéis ainda são piores e o trabalho é estafante.

A maioria deles é aquela sujeira e os cozinheiros (ras), lavadores de pratos (os plongeurs em francês), garçons e os que exercem outras funções auxiliares trabalham diariamente sobre pressão e vivem estressados para ganhar um salário mínimo ou pouco mais que isso, muitos até sem carteira assinada.

– Minha amiga, aquilo ali é um inferno e acontecem coisas horríveis, especialmente em termos de higiene. A geladeira é uma velha enferrujada, a fiação elétrica é solta e antiga, usam até alimentos enlatados vencidos.  Na parte de verduras, o dono, um careca gordo, pega os legumes numa xepa de feira livre – ia conversando Luzia com sua amiga de lutas para passar o tempo.

– O lavador de pratos é um bruto cavalo que xinga o dia todo e briga com todo mundo. Só sabe reclamar da vida. Às vezes chega bêbado e entorna o caldo. Fala palavrões e um dia até me chamou de gorda vagabunda.

Certa vez enxaguou o pano de prato numa sopa, para se vingar do patrão. Tem vez que deixa as louças gordurentas para lavar no outro dia. A gente convive com ratos e baratas. Ele consegue roubar comida dentro das calças e assim passa na revista.

“Das Dores” ia ouvindo tudo entre uma “arrumação de freio” e outra do motorista, também esgotado de tanto trabalhar e ouvir desaforos de passageiros, sem contar os assaltos sofridos com armas em sua cabeça.

Ela também contava suas lamentações e até se compadecia do sofrimento do velho, esquecido pelos filhos que só pensam em ganhar dinheiro, na ganância do ter e nem pensam na velhice do amanhã.

– Alguns aparecem lá no final de semana, mas demoram pouco tempo. O mundo hoje está virado, minha amiga! Antes os filhos zelavam de seus pais até o final da vida. Atualmente tratam como molambos. Coisa é quando têm bens para herdar, aí as brigas viram cenários de inferno e ocorre até mortes.

A grande maioria desses restaurantes da capital e cidades médias a grandes, como Vitória da Conquista, apresentam as mesmas cenas de horror, e a coisa engrossa em épocas de temporadas turísticas e festas de carnaval, caso de Salvador. O trabalhador (ora) é explorado, com jornadas estressantes e desumanas. Os clientes comem gato por lebre.

– Estou nessa amiga há mais de um ano porque não tem outro jeito. Sinto dores pelo corpo todo, falta de ar e pulmão poluído. Muitas vezes nem tenho vontade de comer quando vejo aquele piso nojento cheio de restos de alimentos – se queixava Luzia, enquanto chegava em casa morta de cansada e ainda com um monte de coisas para arrumar.

Alguém deve estar indagando sobre a fiscalização sanitária e trabalhista. Esquece isso no Brasil porque tudo não passa de um arremedo, do faz de conta que o sistema funciona. São poucos os fiscais e ainda existem muitos que aceitam aquele suborno e fazem vistas grossas.

Que se lasquem o trabalhador e o consumidor! Fim de papo, meu amigo e amiga. O restante da conversa é só você fazer suas deduções e tirar suas conclusões. O sistema é bruto e cruel. Quase ninguém se importa mesmo. Ninguém se interessa em ver como funciona uma cozinha. O negócio é comer e tomar umas, comemorar! O resto é papo furado.

 

ASSISTENCIALISMO “ENXUGA GELO”

Dia desse ouvi a entrevista de uma mulher rebatendo a crítica de que o assistencialismo praticado no Brasil através das doações de cestas básicas, bolsas famílias e outros programas semelhantes, não é uma ação de “enxuga gelo”, como muitos têm avaliado. Em sua concepção, dignifica e muda o ser humano.

Que me perdoem aqueles que concordam com a senhora, mas esse tipo de “caridade”, que já é secular no Brasil, sem priorizar acima de tudo a educação, só alimenta o comodismo, a alienação e não faz a pessoa mudar de nível econômico e social. Não basta somente matar a fome e encher a barriga se o beneficiário permanece na mesma pobreza e não progride.

De um modo geral, os cidadãos que dependem da ajuda assistencialista dos governantes não são incentivados e estimulados a saírem daquela dependência, e essa política eleitoreira não oferece outros meios para a família viver por sua própria conta, o que seria sim, dar dignidade humana.

Por outro lado, a grande maioria, por ignorância e falta de educação, termina se anulando e acha que sua vida não tem mais perspectiva de crescimento. Outros se servem das doações como se fossem drogas por saberem que sempre terão suas dosagens certas, resolvendo viver assim.

Esses programas sociais do governo, inclusive de cotas, sempre foram vistos como de linha progressista de esquerda, e quem não concorda com isso, é duramente criticado como direitista. O maior paradoxo nisso tudo é que políticos de direita também passaram a adotar esse esquema em seus governos e, nem por isso, são considerados como esquerdistas.

Vou apenas citar um exemplo que ocorre em Vitória da Conquista onde a prefeita Sheila Lemos, filiada a um partido de direita, o União Brasil, tem o assistencialismo como uma de suas prioridades de governo, seguindo o caminho da sua mãe quando foi vereadora e vice-prefeita.

Existe em Conquista um abrigo com capacidade para 30 pessoas entre mulheres e homens, que acolhe moradores de rua e andarilhos de passagem pela cidade. Além da dormida, oferece café da manhã, jantar e lanche à noite. Existe uma regra onde a pessoa pode utilizar o local por 30 dias e mais outro período igual após 30 dias fora.

Uma boa parte desses abrigados recebe o dinheiro do Bolsa Família do governo federal e gasta todo em bebidas, jogos e até em festas. Tem gente (não são todos) que pega até empréstimo consignado para esses gastos, inclusive para comprar drogas.

Pelo acolhimento que têm, muitos chegam a dizer que o abrigo de Conquista é o melhor do Brasil. Além desse estabelecimento, existe outro que serve almoço e outros serviços ao desabrigado, sem contar a Casa do Andarilho que recebe recursos administrativos do poder público.

Nem chame uma pessoa dessa para trabalhar que ela não aceita. Esse tipo de política assistencialista – a não ser que tenha outro nome – dignifica e muda o ser humano? Esse pessoal que chega aqui roda o Brasil todo e muitos reaparecem tempos depois na mesma situação de pobreza e miséria.

Não dá para entender essa política (são gastos milhões e até bilhões de reais por ano) quando a educação e a saúde vivem com um cobertor curto e limitado para dar mais aprendizado e atendimento médico. Nem é preciso falar da situação precária das unidades de saúde e das escolas, não somente em Vitória da Conquista, porque todos conhecem muito bem.

 

O LEÃO POBRE E O IMPERIAL REI

Histerias, gritos, choros, pulos, exaltações, delírios e correrias nas ruas de Roma e na Praça do Vaticano, numa profusão de emoções, todos como súditos fiéis misturados em nacionalidades diferentes para verem o novo Papa Leão XIV, cujo nome simboliza rei e poder.

Os termos e as imagens televisivas nos dão a impressão de que entramos no túnel do tempo da idade média imperial dos reis que apareciam da sacada de seus palácios para saudar seus plebeus e por eles ser idolatrado como um enviado de Deus.

As pessoas ficam tão empolgadas, muitas por ignorância e outras por viverem numa época tão conturbada, desumana e sem esperanças, que acham que o novo papa vai acabar com as guerras, com a violência e os conflitos humanos.

Em muitas civilizações, todos faziam reverências e se ajoelhavam diante da sua majestade “divina”. Não foi o caso, mas só faltou esse gesto da multidão eufórica durante os três atos da fumaça branca, do habemus papam e da aparição do escolhido (Pai, Filho e Espirito Santo) pelo conclave (sem chaves) dos velhos cardeais.

Após ser indicado, o cardeal decano indaga “quo nomine vis vocari”? Robert Francis Prevost respondeu Leão XIV, em admiração ou vontade de ruptura com o seu predecessor Leão XIII, agostiniano que esteve à frente da Igreja Católica por 25 anos, entre 1878 a 1903.

O nome Leão, que em latim significa Leo e em italiano Leone, compreende rei, poder e aquele que governa sobre os outros. Na Bíblia, Leão de Judá seria o Messias Salvador que unificaria todas as nações. Leão I, o Grande, governou nos anos 440 a 461. Ele foi um defensor das doutrinas cristãs durante as invasões bárbaras e teve um encontro com Átila, o Huno, e convenceu o líder tirano a poupar Roma.

O Leão XIII, o italiano Vicenzo Giocchiino Rffaele Luig, para quem ainda não sabe, apoiou o fim da escravidão no Brasil e tinha um forte compromisso com os desafios do mundo moderno pós revolução industrial. Morreu com 93 anos e foi o segundo mais velho da história papal. Seu reinado foi o quarto mais longevo.

Conta que Leão XIII certa feita foi acometido de visões de espíritos demoníacos do satanás, reunidos sobre Roma que prometiam destruir a Igreja e levar o mundo ao inferno. Esses espíritos teriam desafiado Deus a recuar por 100 anos. Foi então que Leão XIII criou a oração de São Miguel Arcanjo para espantar os demônios. Dizem que essa oração defende as almas das forças malignas.

O nosso Leão XIV pertence à Ordem de Santo Agostinho, um grande filósofo e teólogo da Igreja que nasceu em Togasto, na Argélia, em 354 e morreu em 430. Santo Agostinho é padroeiro dos cervejeiros, impressores e teólogos. Foi doutor da Igreja pelo Papa Bonifácio VIII, em 1298. Durante sua vida monástica, escreveu “Confissões”, “A Cidade de Deus”, dentre outras obras doutrinárias. Seu dia é comemorado em 28 de agosto.

Essa Ordem foi criada em 1244 pelo Papa Inocêncio IV (1195-1254). Eram frades medicantes que fizeram votos de pobreza e sobreviviam de doações. A Ordem segue a linha de pensamento de Santo Agostinho e se dedica às orações e aos estudos. Ela está presente em 50 países e conta com cerca de dois mil religiosos.

Bem, o novo papa começou seu discurso, em sua primeira homilia, defendendo uma Igreja aberta para os pobres e trabalhadores, contra as injustiças sociais e rogando pela paz no mundo.  Nos tempos modernos de hoje, essas posições, além da defesa do meio ambiente, não mais bastam para caracterizá-lo como um progressista.

Com esses pontos de vista e pelo seu perfil, o Leão XIV deverá prosseguir na caminhada do Papa Francisco, mas, no sentido interno dos dogmas da Igreja, entendo que será um moderado, mais de viés conservador e até linha dura em determinadas questões no que se refere a mulher e aos grupos LGBTS.

Não devemos esperar muito do Papa Leão XIV quanto a uma maior abertura e diálogo da Igreja com esses gêneros nos quesitos casamento gay e até na elevação feminina ao sacerdócio, como vinha ensaiando o Papa Francisco, mesmo sofrendo resistência dos conservadores. Será um papa fechado nessas relações mais complexas onde a Igreja ainda permanece arcaica e distante das mudanças do mundo atual.





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