A RUA É UM LABORATÓRIO HUMANO
A grande maioria das pessoas não observa porque vive na correria e preocupada em resolver seus problemas, mas a rua é um laboratório humano onde você vê tipos interessantes, exóticos, diferentes e caricaturais que rendem boas crônicas.
Ontem mesmo (quinta-feira dia 30/04/25) fui às ruas de Vitória da Conquista e constatei cenas comportamentais hilariantes que me chamaram a atenção. Estive em algumas casas de materiais de construção na Patagônia apreçando umas portas e janelas e depois fui ao centro financeiro, na Praça Barão do Rio Branco.
Uma figura folclórica que ronda aquelas imediações diariamente é o ambulante conhecido como “Calango” que vende facas, canivetes, lanternas e outras bugigangas. Ele não pode me ver que atravessa a rua ou a praça e me cerca para me oferecer seus produtos paraguaios.
Por uma adaga ele me pede 100 reais e depois vai baixando o preço até 40 ou 30 reais. Por mais que eu negue sua oferta, ele não arreda o pé e me toma um tempo danado. O jeito é eu dar as costas e dizer: “Já fui banda mel”. É tão insistente que continua atrás de mim para me convencer a comprar.
Existem também os pedintes para atanazar sua vida e cenas de miséria que são a cara do nosso Brasil. Por volta das 11 horas, ao lado do Banco do Brasil, onde funcionava o Mercantil, pessoas esmolambadas, andarilhos ou moradores de rua dormiam na calçada. O triste quadro me fez lembrar uma cracolândia.
Na escadaria do BB sempre tem uma mulher postada, às vezes com um bebê, com a mão estendida de uma esmoler faminta. Lá dentro, os usuários da instituição nos transmitem a impressão de assustados com alguma coisa, uns nas filas, a maioria de idosos aposentados fraudados pelo INSS, e outros fixados nas telas dos caixas, desconfiados e decepcionados com seus saldos em conta no final de cada mês.
Às vezes, a máquina encrenca com seu cartão e o dinheiro não sai. Aconteceu isso com uma mulher e ela entrou em desespero e pânico, berrando de lá para o atendente do banco lhe socorrer.
– Calma, minha senhora, vamos solucionar seu problema. “Cadê meu dinheiro e meu cartão, o banco me roubou! ” – Reclamava a cliente. Não é para menos. Já imaginou a burocracia se o caixa registra um desconto em sua grana que ela não recebeu?
Coisa é quando você parte para resolver uma questão financeira, lá embaixo, com os caixas presenciais! Peguei minha senha de prioritário na entrada e quando passei por aquela porta rolante (antes tem que deixar todos materiais de metais, especialmente o celular) tomei um susto como se tivesse visto almas penadas no purgatório.
Bem, a essa altura todos já sabem no que vou falar. A sala estava superlotada que não havia nem mais lugar para sentar (muitos estavam em pé). Uma coisa de louco, meu amigo, quase todos de celular na mão. Tinha um cara que nem estava aí e falava alto no telefone como se estivesse no quintal da sua casa. Dava para se ouvir tudo, até seu chamego com uma amante ou sua mulher, sei lá. Está tão zonzo que nem parei para escutar tudo.
Passei as vistas no tapume que separa os caixas e só vi dois em atuação. Pensei logo que só iria sair dali no final da tarde. Uma pessoa andava agoniado de um lado para o outro. Advinha quem era? Só não sai imediatamente porque estava com minha esposa Vandilza que aconselhou esperar, visto que já estávamos ali.
Ah, meu camarada, ficamos uma hora e nada de chamar minha senha prioritária. Comecei a resmungar e a questionar sobre a lei dos quinze minutos bancários que todo mundo esqueceu e não existe mais aquele sindicato para fiscalizar a medida.
Depois de uma hora de espera fomos embora, espumando de raiva, ainda mais por ter pago quase 10 reais de estacionamento porque aquela zona azul nunca tem vaga. Nem é assim tão rotativo como num cabaré ou num motel. Ufa, que sufoco viver em cidade grande! Era mais de 12 horas e até a fome tinha ido embora. Não aguentou também esperar. O destino era o caminho de casa, mas, como sou por demais um sertanejo catingueiro teimoso, decidimos passar na agência da Olívia Flores.
Logo na fila para pegar outra senha com uma funcionária distinta, me deparei com uma figura esquisita. Um “veiozinho” baixo, barbudo, com um “calçaozão” o” e uma camisa sujas folgados, feio como o “cão”, conversava como a “nega do leite”. “Véio” adora prosear em filas e salas de clínicas e hospitais para contar histórias da vida.
Ele estava com uma muda de árvore de mais de um metro de altura. Entrou conversando alto e sentou bem em frente de um vigilante. Ele não parava de falar e foi logo dizendo ter sido professor do governador Jerônimo. Depois emendou outros papos sobre coronéis de Conquista, citando a família dos “Gumões” como os antigos chefões brabos que mandavam na cidade.
O “véio” parecia mais uma matraca. A funcionária foi até ele e avisou sobre a muda que havia deixado lá fora e que alguém poderia levar. “Vixe, essa planta vale mil reais”! A senhora do banco foi até prestativa e solicitou ao guarda que a colocasse lá dentro. Ele estava mais interessado em contar suas histórias, muitas das quais desencontradas e sem fundamento, do que com a muda.
Depois de toda essa labuta, de banco em banco, cortando ruas e travessas entre essa nossa gente conquistense, baiana e brasileira, chegamos em nosso lar mortos de cansados por volta de duas horas da tarde. A maior idiotice do dia foi ouvir o termo “Suiça Baiana” quando alguém se referiu a Conquista.