Nossos contrastes e paradoxos estão visíveis em todas as partes no campo político, social, econômico e educacional. A começar, somos uma país rico de um povo historicamente pobre e desigual. As riquezas naturais são imensas e belas, mas estão sendo destruídas, casos específicos dos nossos biomas pantanal e amazônico, sem falar do cerrado, da caatinga, da mata atlântica e dos pampas.

O Brasil é um dos maiores produtores de alimentos do mundo, o vice-campeão, mas é também um país de gente famélica de cerca de 50 milhões de habitantes que têm profundas deficiências nutricionais. Uma grande parte populacional vive à base do feijão com arroz, isto quando consegue comprar esses produtos, agora os vilões dos altos preços.

O Nordeste é a região que mais passa fome (só na Bahia quase um milhão), tanto que seu povo apresenta deficiências em sua estrutura física em termos de tamanho e massa corpórea. Morre-se mais cedo. É onde está o maior índice de brasileiros que vivem abaixo da linha de pobreza, que mal fazem uma refeição por dia. Nossas crianças já nascem sem futuro.

Tudo isso é muito irônico e vergonhoso quando o Brasil é o maior produtor de café, de soja e carne bovina do mundo.  É também um dos maiores na produção de frutas, hortaliças, milho, cana-de-açúcar, carne suína e avícola. Temos comida para abastecer parte do mundo.

Mesmo com essa grandeza, falta alimento na mesa de milhões de brasileiros, principalmente agora com a alta inflacionária que incide sobre esses produtos, a maioria com preços cotados no mercado internacional. O economista pode até explicar esse processo cambial do sistema capitalista da oferta e da procura que faz os preços oscilarem, mas não convence o pobre quando se trata de barriga vazia. Nas sinaleiras crescem o número de cartazes avisando “Tô com fome, ajude!

Além dessas matérias-primas agrícolas de exportação, onde o Brasil é autossuficiente, existem produtos, a exemplo do arroz, que o país é deficitário, isto é, o consumo é maior que a demanda, mas, mesmo assim, a preferência é exportar para o exterior. O contraste é que toda produção é vendida lá fora, e o governo é obrigado a importar o arroz de outros países asiáticos a um custo maior. Lá se vão nossas reservas cambiais.

A agropecuária no Brasil é altamente subsidiada, a começar pelo crédito a juros mais baixos, e quase tudo que produz é comercializado para fora, na cotação internacional. Então, o brasileiro de menor poder aquisitivo paga o mesmo valor de outro país, cujo povo possui melhores condições financeiras.

Outra ironia que pagamos por essa política de priorizar o mercado externo é que os produtores sempre se fazem de “bonzinhos”, dizendo que são responsáveis por colocar comida em nossas mesas, o que é uma mentira. Acima de tudo, o negócio deles são os dólares, e quem puder que siga o câmbio. Os outros que passem fome. Isso, no mínimo é desumano.

Existe também outra ironia e paradoxo. Para o exterior, os alimentos de melhor qualidade, como a manga, o mamão, o melão, a carne e outros itens, que são selecionados para esse fim. O consumidor brasileiro fica com a parte inferior, com o refugo e as sobras, pagando o mesmo valor. As frutas, principalmente, estão carregadas de agrotóxicos venenosos.

Quem ainda ameniza essa situação de penúria e não é reconhecido pelo governo, especialmente o atual, é o agricultor familiar que dá um duro danado, sem recursos para aumentar a produtividade e enfrentar as adversidades climáticas. Este ainda é roubado pelo atravessador; termina ficando praticamente sem nada; e passa necessidades também, inclusive fome.

O familiar ainda tem a virtude de preservar o meio ambiente. O contrário do agroindustrial que derruba e queima nossas florestas para plantar soja para a China. Para quem está distante dessa cruel realidade fica até com pena quando vê um empresário desse setor se queixando e derramando “lágrimas de crocodilo”. Eles não estão nem aí para quem está passando fome. É a lei do mais forte. Como educar um país famélico? Sem educação não existe desenvolvimento, e as desigualdades sociais só aumentam.