CONCLAVE, “CONCHAVOS” E O CONGRESSO
IMAGINE OS BRASILEIROS FECHAREM TODAS AS PORTAS DO CONGRESSO NACIONAL, DAS ASSEMBLEIAS ESTADUAIS E DAS CÂMARAS DE VEREADORES E DEIXAREM ESSES POLÍTICOS LÁ DENTRO TRANCADOS ATÉ QUE DECIDAM LEGISLAR EM BENEFÍCIO DO NOSSO POVO, SEM CORRUPÇÃO E MALFEITOS! SERIA UMA ESPÉCIE DE CONCLAVE POLÍTICO – SUGERIU UM AMIGO.
Essa ideia veio à tona enquanto conversava com um camarada amigo sobre a história do primeiro conclave papal (em latim, cum clavis, literalmente, com chaves), na cidade de Viterbo, na Itália, isto há mais de 700 anos, que levou 1006 dias (dois anos e nove meses) para eleger o Papa Gregório X, quando a população da cidade se irritou com a demora e resolveu trancar os cardeais para agilizar a decisão da escolha do pontificado.
Como eram os habitantes que pagavam (nós também custeamos os poderes) as despesas com alimentos e outros itens, as lideranças fecharam a porta principal do recinto e ficaram com as chaves. Passaram, então, de forma torturante, somente fornecer pão e vinho visando apressar a eleição que parecia não terminar por causa dos conchavos entre eles para indicar um nome.
Estava eu a contar essa passagem histórica quando o amigo espirituoso veio lá com sua ideia estapafúrdia e utópica de se fazer o mesmo com o Congresso Nacional até que os parlamentares tomassem vergonha na cara; reduzissem o número de seus membros; cortassem seus salários, mordomias e verbas de indenização pela metade; eliminassem as emendas; votassem somente projetos de interesse da população; acabassem com os conchavos do “toma lá, dá cá”; e elaborassem uma reforma eleitoral séria e limpa.
Ele sugeriu que os brasileiros, que também sustentam os políticos, fechassem as portas do Congresso, de suas assembleias estaduais e de suas câmaras de vereadores e só fornecessem pão e água (nada de vinho) até que eles atendessem as aspirações do povo. Depois do que aconteceu em Viterbo, o Gregório X aprendeu a lição e estabeleceu regras para o conclave no Concílio de Lyon, em 1274, e outros sucessores introduziram novas regras.
– Cara, em se tratando do Brasil, com um dos Congressos (513 deputados e 81 senadores) mais caros do mundo, onde um parlamentar recebe cerca de três milhões de reais por ano do nosso orçamento, esses cabras não largariam o osso. Eles iam preferir morrer tísicos de fome. A ganância deles não tem tamanho e não medem as consequências – respondi, depois de refletir um pouco sobre a questão.
Um outro sujeito ao lado da mesa do bar que acabara de ouvir o papo “maluco beleza” concordou e ainda acrescentou que eles arranjariam um jeitinho de fugir ou subornar brasileiros traidores para tirarem cópias das chaves e soltar a cambada toda. Pior é a vingança que viria depois – completou.
Raciocinei melhor e retruquei que nessa terra tupiniquim do Pau Brasil ou da Vera Cruz, de 525 anos invadida pelos portugueses degredados e malfeitores, essa proposta do amigo revolucionário não iria para frente e seria até ridículo.
– Ora, por que não, se deu resultado com os cardeais lá na cidade de Viterbo há mais de 700 anos? Acostumados com a fartura de mesas recheadas de produtos caros importados, eles não aguentariam passar fome com pão e água.
– Quando você tirou da sua cabeça essa sugestão esquisita de bêbado, não se tocou que a maioria desses parlamentares não frequenta as sessões. As votações agora são virtuais, lá de suas confortáveis mansões. Além do mais, outros nem vão lá, passam o tempo gazeteando e viajando, com atestados fajutos e comprados -argumentei.
– Outra coisa que você não parou para pensar é que os adeptos das bancadas ruralistas, evangélicas, da bala e até traficantes da pesada iriam para as portas desses legislativos com cartazes pedir o fim do conclave, ou com chaves. Essa coisa ia virar um fuzuê danado, sem falar na polícia que iria baixar a porrada. Enquanto isso, lá dentro era ladrão roubando ladrão, tramando seus conchavos.
– Bem, foi apenas uma ideia que passou pela minha cabeça como forma de acabar com essa ladroeira desse poder legislativo brasileiro que atravanca o desenvolvimento do Brasil, mas aqui a sociedade é toda dividida e uns passam o tempo odiando os outros, ao invés de se unirem.
– Esquece o que falei e vamos tomar nossas geladas, sem traumas, sem conclave, de portas abertas mesmo – finalizou o amigo, meio que sem graça. Você que veio com esse tal de conclave de cardeais que elegeu um leão XIV.