FUTEBOL DO SUL, A PAIXÃO NORDESTINA
Carlos González – Jornalista
Os números da última eleição presidencial elevaram o clima de animosidade entre o Norte e o Sul do Brasil. Internautas paulistas, cariocas, gaúchos, paranaenses e catarinenses, utilizaram as redes sociais para ofender os nordestinos e para propor a separação do país, reivindicação que nos remota ao passado, com a Revolução Farroupilha, entre 1835 e 1845, e o levante de São Paulo, na década de 30 do século XX.
Os raivosos separatistas de hoje não cogitam, pelo menos, no momento, em pegar em armas, como fizeram, no passado, gaúchos e paulistas, que sonhavam em formar estados independentes, como quer, por exemplo, a Catalunha, na Espanha. As propostas de hoje visam, sobretudo, confinar o cabeça chata em seu território. Romeu Tuma Júnior, ex-secretário nacional de Justiça, sugere a construção de um muro, uma cópia do que foi erguido em Berlim após a 2ª Guerra Mundial, que se estenderia desde a fronteira do Acre com o Peru até o extremo sul da Bahia. A cantora paraibana Elba Ramalho declarou, certa vez, que, diante da secessão, o Nordeste adotaria, oficialmente, a obra prima “Asa Branca”, do compositor pernambucano Luiz Gonzaga, como o seu hino.
Uma das preocupações do movimento separatista catalão diz respeito ao esporte e, mas particularmente, ao futebol. O Barcelona, a maior força esportiva da região, seria excluído do milionário campeonato espanhol, impedido de medir forças com Real Madrid, Sevilla e Valencia, jogos que levam mais de 80 mil pessoas ao Camp Nou?
Provavelmente, nenhum dos indignados defensores de uma mudança radical na geografia do Brasil pensou no esporte. Desde a implantação dos torneios nacionais de futebol apenas dois clubes nordestinos, o Bahia e o Sport do Recife, colocaram os seus nomes entre os campeões brasileiros, sendo que o tricolor baiano foi o único representante do Norte-Nordeste na formação do Clube dos 13, responsável pela organização de competições nacionais.
Além do futebol, cujos representantes na série “A” lutam todos os anos contra o rebaixamento, o Nordeste não traz nenhuma contribuição para o esporte brasileiro. No ano passado, o Sport chegou a disputar a liga nacional de vôlei e o Maranhão formou uma razoável equipe de basquete feminino. Foram exceções.
Vamos tomar a Bahia como exemplo. No profissionalismo, Bahia e Vitória estão nas últimas posições no Brasileirão; na série “D”, o Vitória da Conquista não venceu nem uma partida, e a Jacuipense jogou em Feira de Santana por falta de campo em Riachão do Jacuípe. Com relação ao amadorismo faço unicamente um registro: para a construção da Arena Itaipava, a Bahia perdeu um ginásio de esportes, uma piscina olímpica e uma pista de atletismo. Junto com os escombros foram “sepultados” os nomes dos ex-governadores baianos Octávio Mangabeira, Antônio Balbino e Juracy Magalhães, que batizavam o complexo esportivo situado na Fonte Nova.
Nessa “briga”, torcedores nortistas e nordestinos, em sua maioria, ficarão contra a separação. Afinal de contas, eles só lotam os estádios locais quando por aqui se apresentam os times do Rio e São Paulo. No Brasileirão deste ano, onde a média de público no Maracanã não chega a 15 mil pagantes, o Botafogo pediu desculpas à sua torcida e levou seus jogos para Manaus e Natal.
Fluminense de Feira de Santana, Corinthians de Alagoas, Flamengo do Piauí, Botafogo da Paraíba, América do Rio Grande do Norte, revelam o amor do torcedor nordestino pelas cores dos clubes do Sudeste. Essa paixão vem desde a década de 40, quando as rádios Globo e Nacional levavam através de suas ondas poderosas o futebol carioca para todo o Brasil.
Testemunhei, como repórter esportivo de “A Tarde”, na cobertura do Torneio Roberto Gomes Pedrosa, que precedeu o Campeonato Brasileiro, a afeição profunda dos sergipanos pelos clubes cariocas e paulistas. Único representante do Nordeste na competição, o Bahia teve em 1971 seu mando de campo transferido para Aracaju porque o estádio da Fonte Nova estava em obras para colocação do segundo anel de arquibancadas. Desportistas locais formavam caravanas para ir ao aeroporto recepcionar as delegações do Sudeste, e, no “Batistão”, torciam contra os baianos.