AS CURIOSIDADES DO MUNDO GREGO NA REVOLUÇÃO DOS FILÓSOFOS (V)
SOFISTAS – Com o tempo tomou significado depreciativo, mas na Grécia, o termo “sofistas” significava mestres da sabedoria. Assim foi Protágoras de Abdera, que em Atenas fundou uma escola. Os sofistas prezavam a argumentação e a dialética, coisas que hoje são vistas como sofisma. Um dos que se refugiava no sofisma era Sócrates, conforme enfatiza o autor Indro Montanelli em seu livro “História dos Gregos”.
Pode-se dizer que Protágoras foi o inventor do método socrático. O que mais preocupava a mente dos gregos era o problema da origem das coisas. Tanto assim que quase todos seus livros se intitulavam “Da Natureza”, que procuram esclarecer a formação do mundo e as leis que a regem. O bem e o mal, e o próprio deus não passavam de verdades subjetivas, sujeitos a contestações?
Protágoras respondeu que sim. Diante disso, o governo o expulsou. Confiscou seus bens e queimou seus livros em praça pública. Embarcou para a Sicília e tudo indica que morreu num naufrágio. Dizia não acreditar em deus. Deixou esse germe da dúvida no seio do povo ateniense.
Em seu lugar ficou Górgias. Seu ceticismo se resumia em “nada existe fora do que o homem pode perceber com os sentidos; se alguma coisa existisse, nunca a perceberíamos; e mesmo que a conseguíssemos perceber, não o conseguiríamos comunicar aos outros”.
Antes de morrer, Górgias teve o bom senso de gastar todo o seu patrimônio. Depois deles vieram muitos sofistas menores. Eles estimularam o espírito dialético. Ensinaram os atenienses a raciocinar por esquemas lógicos e contribuíram para formação de uma língua precisa.
Sem eles, o Sócrates não teria se tornado no que se tornou. Fundaram o “Clube do Diabo” onde se dedicavam a solenes comilanças nos dias em que o calendário recomendava jejum. Sócrates condenava essa atitude por parte dos sofistas, no sentido de suprimir a tradição e as superstições.
Na verdade, eles lançaram as bases do grande conflito filosófico, que dura até hoje, entre o idealismo e o materialismo. Um deles foi Parmênides com seu sarcasmo e mordacidade. Implicava com todos, especialmente com Pitágoras, a quem acusava de histerismo. Inverteu a tese de Heráclito, para quem tudo passa e se transforma. Na sua ótica, tudo permanece, e a transformação é apenas ilusão de nossos sentidos. Nada começa, nada “se torna”, nada se “acaba”.
O seu aluno Zenão o vulgarizou num livro de paradoxos, quando disse que a flecha que voa, na realidade está parada no ar, porque a cada instante de sua aparente corrida, ela ocupa um ponto parado no espaço. Logo, sua parábola nada mais é do que o engano dos nossos sentidos. Segundo ele, o corredor mais veloz não pode ultrapassar uma tartaruga, porque toda vez que alcançar a posição dela, ela já a passou.
Leucipo foi outro que veio de Mileto para Eléia pelo ano de 435 a.C. e, depois, em Abdera, abriu uma escola para desenvolver o conceito do não ser, do vácuo. A criação é uma combinação de vácuo e de átomos. A alma, por exemplo, não passa de uma combinação de átomos.
O conceito materialista desenvolveu-se ainda melhor com Demócrito. Aproveitou a herança do pai para viajar pelo mundo (Egito, Etiópia, Índia) e dizia que a pátria de um homem sensato é o mundo. Para ele, é mais sensato conquistar a verdade do que um trono.
Em Atenas, onde viveu muito tempo isolado, se ocupava de escrever tratados de medicina, astronomia, matemática, música, física e outras áreas. Na opinião de estudiosos, foi o maior dos pensadores antigos, superando até Aristóteles e Platão. Já velho, voltou para Abdera e escreveu “O Grande Mundo”.
Dizem que ultrapassou os cem anos. Um dia percebeu que estava morrendo e disse à irmã. Ela respondeu que não devia fazer isso por aqueles dias, pois teria que ir ao templo para as festas de Tesmofória. Demócrito afirmou que poderia ir sossegada, mas que todas as manhãs ela trouxesse um pouco de mel para passar em suas narinas, respirando a fragrância. Sobreviveu até o final das festas. “Agora posso mesmo ir”.
Muito estudioso da filosofia, Empédocles, aluno de uma escola dos pitagóricos, concentrou-se na transmigração das almas. Descobriu ter uma alma de peixe por ser grande nadador; a de um pássaro porque corria como uma flecha. Revelou seus sofrimentos a pessoas fora do colégio e foi expulso porque era proibido. Convencido de que era um divino, pôs-se a percorrer o mundo, com sandálias douradas, manto de púrpura e coroa de louros na cabeça, oferecendo-se como médico e adivinho. Dizia ser irmão de Apolo.
Foi mais engenheiro, revolucionário e poeta, do que um filósofo. Na velhice, jogou fora as sandálias douradas, se despiu de toda pompa e se tornou um franciscano. Transformou-se num penitente que convidava os homens à purificação antes da reencarnação, renunciando ao matrimônio e as favas, como Pitágoras.
SÓCRATES – Agradeço a deus ter nascido grego e não bárbaro, homem e não mulher, livre e não escravo. Mas lhe agradeço, sobretudo, ter nascido no século de Sócrates – escreveu Platão. Aristóxenos de Taranto ouviu, certa vez, o pai dizer que Sócrates era um beberrão ignorante, cheio de dívidas e vícios. Realmente, a única educação que cultivava era militar e esportiva.
No verão e no inverno vestia sempre a mesma túnica surrada e remendada. De propósito, levantava o cotovelo com frequência. Xantipa, sua mulher, dizia que ele não se lavava.
Por não lhe dar um tostão e passar dias e noite fora de casa, Xantipa resolveu denunciar o marido no Tribunal por negligência dos seus deveres. Sócrates, no lugar de se defender a si mesmo, defendeu a mulher perante o juiz e dos seus discípulos. Disse que, como mulher, tinha toda razão. Afirmou ainda que ela merecia um marido melhor que ele.
Foi absolvido e voltou aos seus hábitos extra domésticos. Frequentava o salão intelectual de Aspásia, amante de Péricles, bem como a casa de Teodata, a mais célebre prostituta de Atenas. Todos estavam acostumados com seus pés descalços.
O filósofo dizia não ter ideias e pedia a todos que o ajudassem a procura-las. Julgo-me o mais sábio dos homens, porque sei que nada sei. Procurava fazer mais perguntas que dar respostas. Um dia inverteu, mas desistiu. Dizem que a comédia satírica de Aristófanes teve, em parte, responsabilidade em sua condenação de morte.
Para inventar a filosofia, necessitou afirmar o direito à dúvida, o que significou abalar todas as fés. Criticou a democracia e foi idealista como Platão, lógico como Aristóteles, cético como Euclides, epicurista como Aristipo e aventureiro da política como Alcibíades, Ao morrer, reconheceu que a democracia tinha razão de o matar e pronunciou um ato de fé democrático.
ANAXÁGORAS – Deixou Clazômenos e foi para Atenas em 480 a.C. Se espantou com o atraso da cidade nos estudos científicos. Atenas só progredira na geometria. Na astronomia, dava os primeiros passos. Cada cidade tinha o seu calendário e marcava o início do ano quando lhe agradasse. Seguia a divisão de Sólon, separando o ano em 12 meses de 30 dias.
Em Tebas, o pitagórico Filolau pregava que a terra não era o centro do universo, mas apenas mais um planeta que girava em torno de um fogo central. Anaxágoras era mais curioso pelas coisas celestes. Na época, novas ideias já circulavam a respeito do céu. Demócrito de Abdera dizia que a via láctea era apenas uma poeira de estrelas. Empédocles insinuava que a luz dos astros demorava certo tempo para chegar até nós. Parmênides que a terra fosse redonda.
De qualquer forma, dois milênios após, foram eles que ajudaram a Copérnico e Galileu fundar suas afirmações em bases experimentais. Todos os astrônomos que andavam pela Grécia divagavam, sem elementos de prova. Como pai da astronomia e inventor da ficção científica, Anaxágoras foi assim. Afirmou que os outros planetas eram habitados, como a terra, por homens em tudo semelhantes a nós, que constroem casas e cidades e aram a terra com bois.
Dizia que o cosmo se formara do caos a partir de um turbilhão que, com sua força centrífuga, separara os quatro elementos fundamentais: o fogo, o ar, a água e a terra. Determinou que o relâmpago é proveniente de um atrito, e o trovão pela colisão das nuvens. Ele nunca cita Zeus, como se este nada tivesse a ver com toda a evolução. Em seu tratado “Sobre a Natureza” introduziu um “nous” (uma mente), como pai do turbilhão que dera origem ao universo.
Os atenienses o apelidaram de “nous” e assim o chamavam quando passava nas ruas. Olá, “nous”, será que amanhã vai fazer bom tempo? Frequentava o salão de Aspásia. Contam que certo dia, durante um sacrifício, chegou às mãos dos sacerdotes um carneiro com um chifre só. Viram nisso algo de sobrenatural. Anaxágoras decapitou o animal e demonstrou que crescera um chifre só porque o cérebro se desenvolvera no centro, e não nos lados da testa..
Anaxágoras foi acusado de impiedade diante de um tribunal de inquisição que passou a investigar seu livro, admirado pela classe culta de Atenas. Diz uma versão que Péricles, quando viu o caso perdido, mandou que o velho mestre fugisse. Outra versão conta que Péricles o defendeu diante dos jurados. Depois de o ver condenado organizou a evasão. Refugiou-se em Lámpsaco, no Helesponto.











