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O GENOCÍDIO NORDESTINO DURANTE O FLAGELO DAS SECAS E DO CANGAÇO

Entre os anos de 1877 a 1930/35 milhares de nordestinos foram dizimados pelo flagelo das secas prolongadas e em campos de concentração por falta de amparo do governo imperial e dos presidentes das províncias. Levas de mendigos se refugiaram nas capitais, principalmente em Fortaleza, no Ceará, e lá foram abandonados à própria sorte, vítimas de um verdadeiro genocídio.

Além das estiagens que mataram milhares de fome, os sertanejos nordestinos ainda tinham em seu encalço os bandidos cangaceiros que extorquiam o povo miserável e ceifavam vidas. Para ficarem livres desse incomodo social, os governantes, no final do século XIX e nas primeiras décadas do XX, incentivaram e levaram os famintos para os seringais amazonenses onde centenas foram mortos pelas doenças da floresta.

A concentração de terras nas mãos dos latifundiários e as violentas disputas políticas foram outros fatores que contribuíram para as matanças dos pobres sertanejos, apesar da prosperidade e abundância de dinheiro nos cofres públicos de algumas cidades, consideradas como terras “selvagens”, como Canhotinho, Garanhuns e Pesqueira, em Pernambuco.

A atuação de jagunços e cangaceiros foi explícita, culminando em 1917 com o episódio conhecido como a “hecatombe”, quando um grande número de bandoleiros do cangaço entrou em Garanhuns e massacrou diversos cidadãos.

Quem fala dessa situação de horror no sertão e agreste nordestino é o pesquisador Luiz Bernardo Pericás em sua obra “Os Cangaceiros”. Sobre a ação das estiagens inclementes, ele cita que no Rio Grande do Norte, após a dizimação de 70% do rebanho bovino, durante a seca de 1915, o algodão atuou como uma força na economia do Nordeste.

Pericás considera as condições climáticas adversas como possíveis responsáveis pela deterioração na produção, fome, aumento da pobreza e consequente incremento nas atividades dos bandidos. No século XX, de acordo com seu estudo, ocorreram estiagens prolongadas em 1900, 1903, 1915,1916 e 1932, “mas foi no período em que não aconteciam secas que o cangaço se mostrou mais robusto”.

No ano de 1877, talvez a mais dura seca do século XIX, houve um incremento nas pilhagens e saques, sobretudo na região do Cariri. No seu entendimento, grande parte dos roubos e furtos em períodos de secas era praticada por gente comum, por retirantes e flagelados.

O principal efeito das secas foi o êxodo para as grandes cidades, inclusive para as capitais das províncias. A população do Ceará, por exemplo, em 1877, foi reduzida a um terço. No entanto, a capital inchou. Em 1872, Fortaleza tinha 21 mil habitantes. Em 1877 emigraram para lá 85 mil pessoas. Um ano mais tarde esse número ultrapassou os 100 mil. A cidade de Aracati, que tinha uma população de cinco mil moradores, em 1878, chegou a 60 mil.

“Como resultado da grande estiagem de 1877, chusmas de mendigos percorriam as ruas em busca de algum tipo de caridade. Uma carta de um leitor de “O Cearense”, daquele ano, dizia que o povo está em desespero e logo as pessoas começarão a esmolar pelas portas, ou, como último recurso, iniciarão a rapinagem”.

Um artigo de “A Opinião”, da Paraíba, de 11 de novembro de 1877, afirmava que os sertões estão ficando desertos pela emigração para os brejos, impelida pela seca, a procura de recursos para manter a própria vida; e nos brejos surge a miséria pela superabundância de emigrantes que de tudo precisam, e nada conduzem.

O mesmo jornal, um mês depois descrevia que a seca lança consternação no seio de todas as famílias, e os criminosos e desordeiros roubam o que ainda nos resta, mesmo a honra e a própria vida. “Em todas as ruas veem-se cadáveres ambulantes e nus, sem forças para implorar uma esmola.

O jornalista Rodolfo Teófilo, falando do Ceará, citava que os comissários, distribuidores de socorros, tinham a ordem de dar uma ração ao retirante unicamente no dia da chegada. No dia seguinte, se quisesse ter direito a ajuda, deveria ir à pedreira de Mucuripe, seis quilômetros da capital, carregar pedras. Aquilo era bastante para roubar-lhe a vida – ressaltava

Escreve Pericás que, de abril a dezembro de 1877, cerca de 500 mil flagelados precisavam do auxílio do governo, que enviou 2.700 contos, uma quantia insuficiente para resolver a questão. Conforme pesquisas da época, a seca de 1877/79 matou mais de 500 mil pessoas. No período entre 1877 e 1907 houve um desfalque populacional superior a dois milhões de habitantes.

As duras condições climáticas de 1915 foram responsáveis por ceifar a vida de 30 mil cearenses e de expulsar do estado 42 mil flagelados. Aliado a tudo isso, houve um significativo aumento nos preços dos alimentos.

“A população civil, esfomeada, sem ter dinheiro nem condições de esperar pela distribuição da comida, acabava saqueando os armazéns de depósitos. Políticos e cangaceiros incitavam o populacho a tomar posse dos alimentos. Alguns cangaceiros davam alimentos em busca de apoio dos sertanejos”.

Segundo dados, de 1869 até o final do século XIX, mais de 300 mil pessoas saíram do Ceará, sendo mais de 250 mil para a Amazônia e mais 45 mil para o Sul do país. Por causa da seca, mais de 50 mil retirantes saíram do Rio Grande do Norte entre 1895 e 1910 para outros estados, inclusive para a região amazônica.

O Maranhão foi outro estado de destino dos retirantes, sobretudo entre 1900 e 1920. Os estados que continuaram mandando mais gente para fora do que recebendo, entre 1920 e 1940, foram Piauí, Pernambuco, Alagoas, Sergipe e Bahia, em geral para o Sul do país.

No Passeio Público de Fortaleza, no ano de 1915, três mil miseráveis se apinhavam em péssimas condições. O jornalista Tomaz Pompeu Sobrinho narra aquela cena como um espetáculo inédito que atraia muitos curiosos. Dizia ele que era um local de promiscuidade e imundície aos olhos de milhares de expectadores e exploradores da miséria.

Incomodado com a situação deplorável, o presidente da província determinou que os retirantes fossem transferidos para o Sítio do Alagadiço, situado ao lado norte da rua Bezerra de Menezes. O local se transformou num verdadeiro campo de concentração de milhares de pedintes, sobretudo de mulheres com seus filhos pequenos ao colo, sujos, nus ou maltrapilhos. O campo se tornou insuficiente, apesar de comportar cerca de oito a nove mil almas.

Como forma de “solucionar” o problema, o presidente resolveu fomentar a emigração para os seringais da Amazônia. Ali, o paludismo e o beriberi completavam a obra de destruição das miseráveis vítimas das secas.

“A situação era desesperadora. Crianças desnutridas, enfermidades, cadáveres empilhados em grande quantidade em caminhões, e a ajuda do governo era precária e ineficiente”. Em 1932, ano de seca intensa, ocorreram a batalha de Mranduba, a prisão de Volta Seca e escaramuças de cangaceiros com a polícia.

Para Luiz Pericás, uma parcela significativa da população pobre não entrava para o cangaço, mas os cangaceiros atacavam o povo humilde do sertão.

Em dezembro de 1932, por causa do desespero causado pela dura estiagem e atacados pela fome, Corisco, sete “cabras” e duas mulheres entraram em Mocambo, perto de Pindobaçu, e saquearam as casas de todos os moradores, comendo tudo que encontraram pela frente. O fenômeno do cangaço acabou, mas as secas e a miséria continuam.

SERÁ QUE AINDA VAI EXISTIR UM CONGRESSO PIOR DO QUE ESTE?

Naquela época, há 35 ou 40 anos, o saudoso deputado presidente da Constituinte de 1988, Ulisses Guimarães, previa que cada um seria pior que o outro, mas o atual Congresso Nacional se superou a todos, com um bando de canalhas (nem todos) que está escancarando para o Brasil a sua face horrorosa de um Frankenstein.

A pauta não é do povo brasileiro, mas deles que se transformaram em seres impunes com uma PEC (Projeto de Emenda Constitucional) onde seus crimes, malfeitos e ações irregulares terão que passar pelo crivo deles em votação secreta. Os julgamentos e as sentenças judiciais não terão mais validade.

Essa PEC, chamada por muitos de vergonhosa, coloca os parlamentares no Olimpo grego dos deuses superiores intocáveis que devem ser venerados pelos seus súditos, ou como reis divinos. É difícil imaginar ter outro Congresso ainda pior que este.

Tudo isso que está acontecendo não se trata mais de uma afronta e subestimação da nossa inteligência, mas uma ação clara de que o povo não passa de marionetes em suas mãos. Nos aniquilaram ao mais baixo nível e é uma demonstração de reconhecimento de que não há mais reação popular de enfrentamento, de mobilização de protestos como antes.

Considero essa maldita PEC como mais um golpe desferido contra a nossa democracia, já que a tentativa de uma intervenção militar como queriam os extremistas bolsonaristas não deu certo porque não contaram com a adesão total das forças armadas.

Nesse embalo de deterioração social e política, de esgarçamento constitucional, com o princípio de que todos são iguais perante as leis (uma ilusão utópica), agora querem aprovar anistia geral e irrestrita para todos que tentaram um Golpe de Estado.

O presidente do Congresso, Hugo Mota, disse, com a maior cara de pau, que as ações do 8 de janeiro de 2023 de invasão e depredação dos três poderes têm visões distintas. Como assim? Só existe uma que era tomar o poder na base da força, inclusive com assassinatos dos eleitos pelas urnas.

A audácia desses parlamentares “patriotas”, que agora apelam para uma intervenção estrangeira dos Estados Unidos contra a própria pátria, é tão absurda que eles agora estão falando num meio terno de reduzir as penas dos agressores da democracia.

Como o impeachment do presidente da República está muito manjado, a intenção deles é transformar os três poderes num só todo poderoso, no que está conseguindo através do efeito da ingovernabilidade presidencialista.

Esse tsunami, ou terremoto de grandes magnitudes não está ocorrendo apenas no Brasil, mas em diversas partes do planeta, como o genocídio dos judeus na Faixa de Gaza, onde o facínora do Netanhayuo, o “Bibi” está exterminando os palestinos através das armas e da fome.

Os Estados Unidos, do Trump, estão vivendo um ensaio ditatorial como nunca visto em toda sua história desde a colonização. Além da liberdade de expressão, as minorias e os imigrantes estão sendo esmagados.

Por intermédio de grupos bolsonaristas, o Brasil é a bolça da vez em suas tentativas de impor suas arbitrariedades autocráticas e tiranas. A Rússia, a Hungria, a Bielorrússia e países asiáticos, até latinos, estão na mesma linha de fogo dos tiranos e das matanças indiscriminadas.

Aqui no Brasil ainda não chegamos a esse ponto tão crítico em que vive a humanidade, mas o Congresso Nacional parece seguir a cartilha dos demolidores da democracia e temos um campo fértil de divisões fraticidas, bem como uma massa acéfala facilmente manipulável pelo seu baixo grau de conscientização política.

Aqui prevalece a ignorância brutal, o individualismo, o silêncio dos intelectuais e uma “esquerda” que se aburguesou. Aqui prevalece a anormalidade que se tornou normal, o errado que virou coisa comum. Aqui, as multidões das ruas foram todas para os estádios de futebol ou para os shows das alienações musicais.

 

 

CARA TODA MELADA DE MANGA

(Chico Ribeiro Neto)

Tenho saudade do ingá, comprado na feira de Ipiaú, Bahia. Era barato, aquela vagem onde a gente tirava a polpa branca do caroço. Pouca coisa, mas dava sabor e alegria.

Maçã, uva e pera só quando ficava doente.

Melancia. Minha primeira babá, Agostinha, fazia bonecos com a casca da melancia utilizando apenas uma faquinha. Em segundos fazia logo a cabeça, os braços e as pernas e depois vinham os detalhes.

Ainda no interior, chupar cana no quintal, no fim da tarde, e jogar conversa fora.

Quando chegou o liquidificador, a novidade era vitamina de banana com Nescau. Hoje não aguento nem ver.

Chupar umbu até os dentes ficarem trincando. E o delicioso caju? “Cuidado, menino, pra não pingar na camisa. Isso deixa uma nódoa que ninguém tira”. Alceu Valença foi perfeito ao dizer que a “pele macia” da Morena Tropicana “é carne de caju”. Alguns meninos faziam tatuagem com o leite da castanha do caju.

Já em Salvador, os mamões, jacas e mangas roubados nos quintais das mansões da Vitória, onde a gente entrava pela praia. A mordida na manga rosa ou espada. O sumo escorrendo pelo queixo e molhando a camisa.

Comendo com casca e tudo. Com a cara amarela de tanta manga (a gente chupava duas ou três facinho, facinho) e o caroço seco na mão, mergulhava no mar do Unhão.

Ao voltar da praia do Unhão a gente arrancava do meio do mato, nas encostas que hoje sustentam a Avenida Contorno, os cachos de melão de São Caetano. Chupava aquela pelezinha vermelha que cobre as sementes. Quase não tinha o que comer, era aquela lãzinha.

Hoje vejo na Internet: “O melão de São Caetano serve  como um remédio popular para várias condições, incluindo o auxílio no controle da glicemia e no tratamento da diabetes, além de possuir propriedades anti-inflamatórias,  antioxidantes e laxativas”. É consumido principalmente na forma de chá, suco ou em cápsulas.

A goiaba a gente comia com bichinho e tudo. Madurinha e cheirosa. Vai deixar, é?

Na década de 70, na Praça da Sé, havia vendedores que usavam uma maquininha pra descascar a laranja. Era um negócio parecido com um espremedor de batata. Ele colocava a laranja ali, ia girando uma manivela e num instante a laranja estava descascada e perfeita, sem ferimento, como se diz.

Mamãe Cleonice adorava sapoti. Sempre foi difícil de achar e, quando encontrava um vendedor na Avenida Sete, comprava logo uns seis pra ela.

As enormes pilhas de abacaxi e melancia na Rampa do Mercado, durante a festa da Conceição da Praia em 8 de dezembro, em Salvador. Nunca vi abacaxi combinar tão bem com cerveja!

Na minha cabeça pulam cores, cheiros e sabores. Ah, que vontade de chupar aquela manga rosa, abrir um mamão com a mão e dar um mergulho no Unhão.

(Veja crônicas anteriores em leiamaisba.com)

O GAVIÃO E OS TERRENOS LIXEIRAS

Coisa rara ver um gavião na cidade, mas tanto ele como seu primo carcará, são aves símbolos nordestinos de voos rasantes desse nosso sertão-agreste, comedores de pintos e até de animais mortos. Nossas lentes flagraram este faminto gavião que saiu do seu habitat natural para procurar comida num terreno baldio, ou lixeira de plásticos, garrafas, entulhos, ratos, escorpiões e cobras. Não é meu intuito fazer aqui depreciações, mas Vitória da Conquista está se tornando na capital desses terrenos abertos, cheios de sujeiras, matagais e criadouros dos mosquitos da dengue, verdadeiros atentados à saúde pública, podendo levar pessoas a óbito, sem exageros. A maior culpada de tudo isso é a administração pública que tem leis nas mãos para fiscalizar, aplicar punições e multas aos donos dessas áreas abandonadas. Muitos deles são usados por bandidos ladrões, estupradores e usuários de drogas. Neles fazem seus barracos, como num deles no loteamento Sobradinho (Zabelê). É uma vergonha para uma cidade que é a terceira maior da Bahia. Quando algum morador, que não mais suporta conviver ao lado desses terrenos, toca fogo no matagal, é logo chamado de criminoso. No entanto, quem é mesmo o maior criminoso?  Não vou aqui responder porque todos sabem. Por que a prefeitura se cala e não resolve logo esse problema que atormenta nossa população? Por que não faz uma força tarefa contra esses proprietários especuladores de imóveis, criadores de lixeiras em diversos bairros e pontos da cidade?  Cadê o Ministério Público e a Câmara de Vereadores? Ainda bem que, vez ou outra, aparece um gavião, ou até um urubu, que ajuda a fazer alguma limpeza e se alimenta de algum animal peçonhento venenoso que poderia ser mais um invasor das nossas casas. As reportagens jornalísticas e o clamor do povo em nada adiantam, mas o executivo quer aumentar a taxa de iluminação pública. Nós somos mesmo sacos de pancadas! O negócio é reclamar com o Papa.

AMÉRICAS IBÉRICAS!

Poema de autoria do jornalista e escritor Jeremias Macário

Sou filho das Américas

Do Sul e Central,

De Colombo e Cabral,

Das caravelas ibéricas,

Dos capitães piratas,

Que singraram mares

Atrás do ouro e das pratas,

Que fizeram matanças,

Cativaram nativos,

Deles roubaram seus colares,

Impuseram suas crenças,

Encheram suas panças

Nas Américas Ibéricas,

Américas Ibéricas!

 

Do México a Patagônia,

Terra do fogo,

Do Caribe à Amazônia,

Sou filho dos tupis-guaranis,

Dos Maias, Incas e Astecas,

Dos Tupinambás, Tapuias e Cariris,

Sou das Américas Ibéricas,

Américas Ibéricas!

 

Sou mestiço, caboclo e mameluco,

Até cabra cafuzo maluco,

Branco, pardo e negro,

Árabe-judeu, mouro ibérico,

Nações famélicas

Das Américas Ibéricas.

Américas Ibéricas!

 

Sou fruto do índio-português,

Dos antepassados ancestrais,

Das tribos canibais,

Das Américas Ibéricas,

Américas Ibéricas!

 

Sou filho dos deuses guerreiros,

De Montezuma e Atahalpa,

Dos espanhóis prisioneiros,

Nas Américas Ibéricas,

Américas Ibéricas!

 

Não sou filho norte-americano,

Imperialistas ianques,

Invasores de territórios soberanos,

Com seus foguetes, drones e tanques,

Sou das Américas Ibéricas,

Américas Ibéricas!

 

Sou da África, africano,

Nordestino latino,

Com nossas culturas “bélicas”

Das Américas Ibéricas,

Américas Ibéricas!

“REVITALIZAR O CENTRO É REVITALIZAR A CULTURA E A HISTÓRIA”

A  lógica do mercado não pode sufocar a memória, a arte e a vida coletiva de Vitória da Conquista

Por Herberson Sonkha[1]

Este artigo de opinião foi motivado pela leitura interessantíssima da matéria do jornalista Jeremias Macário, intitulada “A REVITALIZAÇÃO DO CENTRO DA CIDADE NÃO É NENHUMA NOVIDADE”, publicada no site www.aestrada.com.br em 16 de setembro de 2025, às 23h08. Parto dessa abordagem cirúrgica imprescindível de Jeremias para não apenas reafirmá-la, como também tentar contribuir com essa discussão necessária e urgente para o futuro de nossa cidade.

A recente audiência pública da Câmara de Vereadores sobre a revitalização do centro de Vitória da Conquista traz à tona um debate antigo, já discutido há mais de duas décadas. Como bem lembra Macário, não se trata de novidade, mas da retomada de um projeto que nunca saiu do plano do discurso ou foi reduzido a arremedos cosméticos: calçadões improvisados, intervenções superficiais na Praça Nove de Novembro e nada que toque na essência da vida urbana.

A cidade, como nos adverte Henri Lefebvre em O Direito à Cidade (1968), “não é uma coisa, mas uma obra; obra de uma história, de uma coletividade, de uma vontade”. O centro de Vitória da Conquista não pode ser reduzido a um “shopping a céu aberto” para atender consumidores, pois isso reproduz a lógica do capital que transforma tudo em mercadoria e esvazia a experiência coletiva de viver a cidade.

O centro como espaço de memória e cultura

Ao demolirem casarões, destruírem a Rádio Clube e transformarem patrimônio em estacionamento, o que se retira não é apenas uma construção física, mas camadas de história e identidade coletiva. Walter Benjamin, em suas Teses sobre o conceito de história (1940), advertia que a modernidade capitalista promove um “progresso destrutivo”, em que a ânsia por lucro imediato corrói a memória social. Vitória da Conquista corre o risco de se tornar apenas um entreposto comercial, sem centro histórico, sem alma, sem memória.

Revitalizar significa, antes de tudo, recuperar a cultura. O fechamento do Teatro Carlos Jheovah, do Cine Madrigal e da Casa Glauber Rocha é mais que descaso: é sintoma de uma lógica economicista que considera a arte inútil porque “não dá lucro nem voto”. Karl Marx já denunciava, em Manuscritos Econômico-Filosóficos (1844), que a lógica do capital reduz o ser humano ao trabalho alienado e à produção de mercadorias, ignorando suas necessidades essenciais: “A desvalorização do mundo humano aumenta em razão direta da valorização do mundo das coisas”.

Cultura como produção de vida

A economia marxista ensina que a riqueza não se resume ao lucro privado, mas ao conjunto de bens materiais e imateriais produzidos pela coletividade. A cultura é parte essencial dessa riqueza social, pois forma consciência crítica, constrói identidade e fortalece laços comunitários. Eric Hobsbawm, em A Era dos Extremos (1994), sinaliza que as cidades floresceram historicamente como espaços de efervescência cultural: “Sem os centros urbanos, não haveria a vida intelectual, artística e política que moldou a modernidade”.

A antropologia urbana de Milton Santos também reforça essa visão. Em A Natureza do Espaço (1996), o geógrafo baiano afirma: “A cidade é o espaço da coexistência, da multiplicidade, onde o valor de uso deveria prevalecer sobre o valor de troca”. Ou seja, Conquista só será plenamente cidade quando a população se reconhecer nela como produtora e usuária, não apenas como clientela de lojas.

A cidade que queremos

A Praça Nove de Novembro e a Barão do Rio Branco não podem ser apenas vitrines para carros ou cenários de consumo restrito ao São João e ao Natal. Elas precisam ser espaços permanentes de expressão popular: música, teatro, literatura, saraus, dança, exposições, feiras culturais. Isso não é gasto, é investimento social.

David Harvey, em Cidades Rebeldes (2012), é categórico: “O direito à cidade não é apenas o direito de acesso ao que já existe, mas o direito de mudar a cidade de acordo com o nosso desejo de corações e mentes”. Ao exigir a reabertura dos equipamentos culturais e uma programação permanente, os artistas de Conquista, respaldados por quatro mil assinaturas, não pedem favores: reivindicam o direito ao uso social da cidade. É uma luta por dignidade e participação.

Revitalizar é resistir ao esvaziamento neoliberal

Se a Câmara e o Executivo pretendem revitalizar o centro de Vitória da Conquista, não podem se limitar a fachadas e calçadões. É preciso resistir à lógica neoliberal que transforma ruas em estacionamentos, casarões em ruínas e cultura em mercadoria descartável. Revitalizar o centro significa revitalizar nossa memória, nossa cultura e nossa identidade coletiva.

Como diria Antonio Gramsci em Cadernos do Cárcere (1932-1935): “A crise consiste precisamente no fato de que o velho está morrendo e o novo não pode nascer; neste interregno, surge uma grande variedade de sintomas mórbidos”. A crise cultural de Vitória da Conquista é esse interregno: ou revitalizamos a cultura como nova base de desenvolvimento, ou sucumbiremos a sintomas mórbidos do mercado, que reduz a cidade a concreto e vitrines.

Vitória da Conquista precisa escolher: ou um centro vivo, pulsante, cultural e humano, ou um deserto de concreto, sem memória e sem povo.

[1] Herberson Sonkha é um homem negro de cor parda, militante social do movimento negro há mais de três décadas. É vinculado aos Agentes de Pastoral Negros e Negras do Brasil (APNs) e ao Movimento Negro Unificado (MNU) de Vitória da Conquista, além de ser filiado à Unidade Popular pelo Socialismo (UP). Atua como colaborador do Movimento Coletivo Ética Socialista (MCOESO), é poeta, compositor, escritor e militante da cultura no Movimento Cultura Conquista. Recentemente passou a integrar a construção coletiva do Sarau A Estrada. Atualmente é pesquisador marxista do Núcleo de Estudos e Pesquisa em Trabalho, Política e Sociedade (NETPS/Uesb) e graduando em Economia pela Uesb.

“O GÁS MAIS CARO DO BRASIL”

Na sessão de ontem (dia 17/09) da Câmara Municipal de Vitória da Conquista, os parlamentares destacaram diversos assuntos no âmbito local, estadual e nacional, isso em meio ao barulho de conversas paralelas na plenária. Muitos tiveram que parar suas falas e pedir silêncio para serem ouvidos.

O vereador Hermínio de Oliveira, por exemplo, abordou a antiga questão dos preços dos combustíveis em Conquista como sendo os mais altos da Bahia e do Brasil. Com relação ao gás de cozinha, chegou a denunciar que é o “mais caro da Bahia e do Brasil”.

Edinilson Pereira convidou a todos para a audiência pública sobre a comunidade de surdos que será realizada no próximo dia 26, às 19 horas. Aproveitou ainda sua fala para se referir à reposição de lâmpadas no Bairro Lagoa das Flores e elogiar o poder executivo pelas obras de pavimentação asfáltica no Jardim Guanabara, “se bem que o bairro ainda carece de outros serviços”.

O parlamentar Andreson aplaudiu a iniciativa do colega Dudé que está criando, em Conquista, a Missa do Vaqueiro, uma antiga tradição cultural do nosso sertão. Também elogiou o lançamento do projeto de revitalização do centro comercial, uma proposta do vereador Edivaldo Ferreira.

No âmbito nacional, Andreson fez duras críticas à PEC da Câmara dos Deputados que blinda ações criminosas dos parlamentares com a impunidade, dizendo se tratar de “projeto da vergonha”.

Ricardo “Babão” destacou as obras estaduais que estão sendo executadas no município, como o asfalto do distrito de Bate-pé, José Gonçalves a Caetanos e a Avenida Getúlio Vargas, com extensão à pista até o município de Barra do Choça. Segundo ele, Jerônimo tem sido o melhor governador entre todos estados brasileiros.

O vereador “Bibia” agradeceu a prefeita pelas obras de limpeza que estão sendo feitas em diversos bairros de Conquista. Diogo Azevedo reclamou da interrupção da linha urbana de ônibus D41 e solicitou uma reavaliação por parte do poder público porque muitos usuários ficaram prejudicados.

Edivaldo Ferreira rebateu a nota de repúdio da Adusb (Associação dos Docentes do Uesb sobre um culto dos batistas (II Semana Universitária dos Batistas) que ocorreu no espaço interno da universidade. Na oportunidade, apresentou vídeos onde a instituição realiza diversas ações referentes a cultos afros. No entanto, de acordo ele, não houve notas de repúdio. “O povo cristão também quer direitos iguais a todas religiões”.

A vereadora Leia de Quinho condenou o projeto que aumenta a taxa de iluminação pública para os moradores conquistenses e revelou que vai votar contra a medida. Vou ficar ao lado do povo que não suporta mais elevação de impostos – disse a parlamentar.

Sua colega Lara informou ter ido semana passada à Brasília onde conseguiu trazer recursos de emendas que vão beneficiar o município em diversos setores, principalmente na área da saúde que receberá 440 mil reais.

A REVITALIZAÇÃO DO CENTRO DA CIDADE NÃO É NENHUMA NOVIDADE

O tempo é o mesmo, os ponteiros do relógio giram no mesmo compasso, a terra mantém sua rotação na mesma velocidade, mas temos a impressão que tudo hoje passa mais rápido em função da tecnologia e da vida corrida, ao ponto de muitos fatos caírem depressa no esquecimento.

Vejamos, como exemplo, o caso da revitalização do centro da cidade, que não é nenhuma novidade. Essa iniciativa foi levantada há anos em Vitória da Conquista em governos passados, talvez há mais de 20 anos. A ideia era tornar o comércio num shopping center a céu aberto. Alguém aí lembra disso, inclusive a mídia?

De lá para cá fizeram alguns arremedos, construíram alguns calçadões e deram um mel de coruja na Praça Nove de Novembro. O projeto incluía a preservação do patrimônio público arquitetônico, fechar algumas transversais e transformar essa área urbana num ponto mais agradável e mais humano, sem muitos carros transitando no centro.

Agora, a Câmara de Vereadores, o que é louvável, realizou uma audiência pública com o propósito de revitalizar o centro da cidade, o que não é novo, mas torcemos que dessa vez seja para valer e o poder executivo abrace essa investida do legislativo.

Entendo, no entanto, que essa revitalização seja extensiva à cultura, caso contrário haverá um grande vácuo. Será que nessa revitalização está inclusa a abertura dos equipamentos culturais do Teatro Carlos Jheovah, do Cine Madrigal e da Casa Glauber Rocha que se encontram fechados há anos, ou a intenção é somente beneficiar o comércio?

Por falar em revitalização, a arte e a cultura estão necessitando urgentemente de um plano dessa natureza. Os artistas de Conquista, aqui abrangendo todas as linguagens, devem ser peças chaves nesses debates, mesmo porque neste centro estão localizados três importantes equipamentos culturais fechados que deveriam estar abertos para realização de ensaios e espetáculos.

Um centro da cidade não deve ser feito apenas de comércio apinhados de lojas para atender consumidores. Deve ser também um centro de efervescência cultural, com locais próprios para apresentação de shows musicais, peças teatrais, dança, artes plásticas, literatura, declamação de poemas e outras expressões artísticas.

A Praça Nove de Novembro, por exemplo, só é utilizada para shows nos períodos de São João e Natal quando deveria ter uma programação mais extensa durante todo ano porque o povo também é carente de cultura e consome se forem oferecidas as oportunidades.

Infelizmente ainda tem gente com a mentalidade atrasada de que cultura não dá lucro e nem voto. Quem pensa assim tem uma visão limitada de ser humano. Falei da Nove de Novembro, mas existe ao lado a Barão do Rio Branco com aquele amontoado de carros, onde ali deveria ser mais um ponto de lazer, cultura e entretenimento.

Ao invés disso, cometeram o crime de derrubar o antigo prédio da Rádio Clube. Estão destruindo os últimos casarões restantes, como uma casa na Praça Tancredo Neves. No local criaram um estacionamento para veículos. Aliás, Conquista não tem um centro histórico como a maioria das cidades do mundo.

Se vamos revitalizar o centro da cidade, vamos também aproveitar para revitalizar a nossa cultura. As reivindicações foram feitas, inclusive num documento com cerca de quatro mil assinaturas. Como resposta tivemos o silêncio através do engavetamento das propostas. Os artistas querem ser ouvidos e atendidos. A Câmara deve se atentar para isso.

O MEDO, A ALEGRIA E A TRISTEZA

Nós seres humanos de um modo geral temos medo de termos medo. Muitos evitam encarar a realidade e preferem viver como se estivessem num mar de rosas e se escondem atrás de uma máscara, tentando preencher as feridas com os “encantos” do superficial capital. Somos atraídos, na maioria das vezes, pelo canto da sereia.

O medo nos ronda, faz parte da vida, como aquele leão que temos que matar a cada dia. Nosso medo é interno, espiritual, e externo, principalmente nos tempos atuais de tanta violência, golpes virtuais e presenciais. Temos medo de confiar, de amar, de mudar, de acolher o outro e até de partir para outra dimensão. Temos medo de encontrar uma pedra no meio do caminho.

Além do medo, temos nossas alegrias e tristezas que também fazem parte das nossas vidas, só que destas últimas procuramos fugir e até não se relacionar com o outro “semelhante” quando está triste porque achamos que a pessoas assim é uma carga negativa, até uma ameaça ao nosso bem-estar. Não queremos ouvir e escutar seus motivos. Aquele cara lamenta demais! Dizem que a alegria e a tristeza são um estado de espírito. Não sei decifrar isso muito bem , ou digerir.

– Lá vem aquele chato falar de seus problemas – apontamos logo o dedo em riste. Só aturamos as pessoas alegres? Muita gente não gosta, por exemplo, de ler e ouvir um poema intimista e triste. “Seu poema fala de tristeza”. E daí? A melancolia está em todos nós, só que fingimos não a ter, mas não adianta. Vislumbrar a realidade não é ser pessimista.

Os profetas do Antigo Testamento deveriam ser insuportáveis para os reis guerreiros, como o Davi e Salomão. Mesmo assim, eram convidados como conselheiros e até adivinhavam sonhos. Chamam o Jeremias de profeta das lamentações.

Quantas vezes estamos numa festa, alegre por fora e triste por dentro, mas temos que disfarçar! Quando chegamos em casa, em nosso lar, tudo volta, às vezes com força maior. Fulano hoje está calado e diferente. Oh, temos que estar alegres durante todo tempo?

O ser de hoje procura ser forte, mesmo sendo frágil, e só nos superamos quando dialogamos cara a cara com a fraqueza. Uns são extrovertidos, outros introvertidos. O fechado que procura não se abrir porque tem receio de ser julgado, sobre bem mais.

Nem sei explicar muito bem porque hoje estou assim falando de medo, alegria e tristeza. Amanhã é outro dia de mais medos, alegrias e tristezas. Somos uma carga de mistérios e não nos conhecemos a nós mesmos, nem para onde vamos. Muitas vezes nos agarramos aos pensadores como âncoras da vida, mas nem tudo que reluz é ouro.

 

O CENTENÁRIO DE JOSÉ PEDRAL

Uma data que não pode passar em branco em Vitória da Conquista. No dia 12 de setembro de 1925 nascia José Fernandes Pedral Sampaio que, se vivo fosse, estaria completando 100 anos. Por três vezes prefeito, Pedral foi um divisor de águas e um marco na história administrativa, econômica, social e política de Conquista.

Nasceu na casa do seu avô “coronel” Gugé e, aos sete anos, foi estudar em Santo Antônio de Jesus. De lá partiu para Salvador onde fez a Faculdade de Engenharia Civil, na Universidade Federal da Bahia. Ainda jovem, com novos ideais contrários às suas origens oligarcas, retornou à sua terra natal e se candidatou a prefeito, em 1958, perdendo as eleições.

Em 1962, porém, se elegeu ao cargo aos 37 anos como o mais jovem prefeito. Não quis o destino que completasse o seu mandato porque se deparou com uma pedra no meio do seu caminho, no caso a ditadura-civil-militar de 1964, que cassou o seu mandato em seis de maio daquele ano.

Mesmo assim, nesse curto período, Pedral colocou em prática seus ideais socialistas, erguendo obras que beneficiaram os mais pobres, como o serviço de drenagem de escoamento das águas no Bairro Jurema que sempre sofria com os alagamentos em épocas de chuvas.

O mais novo prefeito apoiou as reformas de base defendidas pelo Governo Jango que, por seu intermédio, chegou a visitar Conquista, em 1963. Sua intenção maior era trazer muitos benefícios para o município, como uma barragem de abastecimento de água. Por se colocar ao lado de um governo federal que já era alvo de um golpe militar, pagou um alto preço.

Em seis de maio de 1964, as tropas militares do capitão Bendock invadiram a cidade e Pedral foi um dos primeiros presos políticos porque o novo regime o considerava subversivo e comunista. Nesse mesmo dia, na base da força, foi deposto de forma ilegítima. Logo depois ele teve seus direitos políticos cassados por 20 anos.

Nos bastidores, Pedral soube conduzir os avanços da cidade idealizando obras, como na área do saneamento básico, que depois vieram colocar Conquista como a terceira maior cidade da Bahia. No meado dos anos 80 foi novamente eleito pelo povo e depois secretário de Transportes do Estado durante a gestão do governador Waldir Pires.

Seu terceiro mandato se deu em meados dos anos 90, mas não foi bem-sucedido porque não contou com o apoio do Governo do Estado e alguns de seus secretários mancharam sua imagem de grande administrador e político sério e honesto.

Apesar de todas as dificuldades, Pedral deixou sua marca com obras estruturantes, como o Viaduto do Guarani, o Terminal de Ônibus da Lauro de Freitas, a Ceasa, dentro outras de grande porte, sempre com uma visão futurística, resolvendo, antecipadamente, os problemas de Conquista.

Como jornalista, não poupei críticas, mas sempre respeitou a democracia e não foi meu algoz. Fez suas ponderações e queixas, como em sua entrevista a mim concedida durante a elaboração do livro “Uma Conquista Cassada – cerco e fuzil na cidade do frio”, última obra lida por ele aos 89 anos no leito de morte.

Nesse centenário dos 100 anos, Pedral continuará sempre lembrado pelas antigas e novas gerações por ter deixado um grande legado para Vitória da Conquista, principalmente como um político ético, sério, honesto e honrado, predicados estes escassos nos tempos de hoje.





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