Poema de autoria do jornalista e escritor Jeremias Macário que fala do suicídio de Getúlio Vargas, dos abutres pelo poder e dos golpistas que sempre aproveitaram dos momentos mais difíceis do país.

Corvos agouram os céus do palacete;

um tiro vara o peito do destino fatal,

vergando o corpo no cobiçado Catete,

naquele agonizante agosto nacional.

 

Um abutre vigiava o seu aposento,

voando em círculos no céu cinzento,

mas um estrelado conteve o tropel,

para não quebrar o verso do cordel.

 

Nasceu no planalto um traçado raro,

das mãos de um jovem visionário,

que sonhou com o grande pássaro,

e morreu depois como um solitário

 

Povo galopado no galope da vassoura,

de um lunático que se armou de tesoura;

tomou um uísque e fi-lo só porque quis,

que de lá saiu da ressaca rumo a Paris.

 

O gaúcho lá dos pampas tomou um susto;

o chimarrão espatifou-se nas terras de Mao;

os quartéis se armaram para o quebra-pau,

cada caudilho queria arrematar o seu busto.

 

Depois de muita peleja pela Legalidade,

Brizola pontuou bem sua viola em Cadeia;

os sargentos armados cercaram toda cidade,

e o homem entrou pelo sul com praça cheia.

 

Concordou parlamentar com os generais,

e ficar uns tempos até poder presidenciar,

mas a panela começa ferver lá nos Gerais,

e Lacerda lacera e rouba o gordo Adhemar.

 

As idéias cruzam os sessenta vermelhos;

as esquerdas se apressam para revolucionar;

Grupo dos Onze rende mais que coelhos;

todos pedem reformas ao senhor Goulart

 

Estouram as marchas sociais e marxistas;

foi o mesmo que bulir na casa de vespeiros;

uns excomungando os velhos comunistas,

e outros pontuando nos levantes marinheiros.

 

Ventos e raios partem das altas montanhas,

derramando ódios até a Central do Brasil,

e no Automóvel Clube assanha as aranhas;

da serra desce Vaca Fardada de vazio fuzil.

 

Um Castelo de peças começa a ser montado,

na ponta de uma mortífera estrela de espada,

com Atos até de um desatino cruel malvado,

de um Costa morto de isquemia emparedado.

 

Nos porões trevas de sussurros agonizantes;

açoite de choques ditando o proibido pensar;

elétricas cadeiras onde padecem os amantes;

guerreiros perdidos da selva de algum lugar.

 

No inferno dos dragões treme a carne e arde;

algozes fazem dos corpos montes de trapos;

perde-se o domínio do existir para o covarde,

e o torturador desseca o espírito aos sopapos.

 

Nos estádios vibra o vilão com cara de ferro;

celebrações de vitórias do mundo campeão;

gemidos nos cárceres abafados pelo o berro,

e o fogo da bala abate mais uma organização