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:: 24/jan/2019 . 23:32

O POVO DE BOQUIRA ENCURRALADO PELA MINA

Com base num fato real de uma matéria jornalística realizada no auge pesado da ditadura civil-militar de 1974 pelo jornal “Estado de São Paulo”, proibida de ser divulgada, o assunto virou livro “Boquira”, numa reportagem romanceada a partir da pena ligeira e denunciativa do amigo-companheiro jornalista Carlos Navarro Filho, que na época chefiava a Sucursal do periódico, em Salvador.

O relato é a fiel voz de desabafo de um povo do interior do sertão baiano que sofreu todo tipo de opressão de uma companhia multinacional de mineração e que dava toda cobertura ao regime militar em troca de benesses dos governos dos generais Médici e Geisel. A empresa tinha suas influências políticas até em Vitória da Conquista onde Renato Rebouças possuía participações em muitas decisões.

Naquele período já era repórter de economia do jornal “A Tarde” e conheci o dinâmico, competente e irrequieto colega Navarro em algumas andanças de coberturas, inclusive feitas em outros estados. Em meu livro “Uma Conquista Cassada” faço algumas referências ao caso “Boquira” e sua prestação de serviços à ditadura na captura do capitão Carlos Lamarca.

A obra começa com um comentário fidedigno do repórter Biaggio Talento sobre o ambiente redacional barulhento, insalubre e “fumacê” dos jornais daquele tempo, e as dificuldades para se passar um texto do interior. Sou como meu amigo Carlos Gonzalez da mesma geração das máquinas de escrever, do teletipo e do aparelho de telefoto que enviava as imagens reveladas num laboratório para filmes.

Para matar as saudades, concordo com Paolo Marconi, no prefácio, quando disse que “fomos felizes e não sabíamos”. Lembra ele do respeitado Jornal do Brasil e os tradicionais Estado de São Paulo, Folha de São Paulo e o Globo, bem como do famigerado Ato Institucional no 5. As críticas não podiam ser nem construtivas, mas elogiosas, como retrucou o marechal Arthur da Costa e Silva para os editores do JB.

Para Marconi, o livro é produto de uma desforra de quem viu seu jornal não publicar uma grande reportagem sobre Boquira/Cobrac – Companhia Brasileira de Chumbo, subsidiária da francesa Penãrroya Oxide S.A. Foi, na verdade, uma censura interna. “O livro é de denúncia e ainda atual por mais estranho que possa parecer”. Depois de paralisar a extração em 1992 em Boquira e fechar a fábrica de lingotes de chumbo em Santo Amaro, a Cobrac deixou um dos maiores passivos ambientais da história da mineração do país.  A Samarco, em Minas Gerais, talvez tenha superado em termos de danos.

Em redor da mina e margeando o município de Boquira, Marconi calcula que existam mais de seis milhões de toneladas de resíduos, sem qualquer contenção. Em Santo Amaro estão hoje 490 mil toneladas de material contaminado, com metais pesados. Os órgãos de controle ambiental tentam, desde 1993, condenar a Penãrroya. A primeira sentença condenatória foi proferida em 2014. Mesmo assim, em janeiro de 2016 houve recurso da ré.

O PADRE AVARENTO

Na narração de Navarro, em sua história “Boquira”, que tanto mal fez ao povo do povoado de poucas casas, tudo começou no ano de 1954 com o padre Nazário, um descontente com sua situação de pobreza, saindo de Oliveira dos Brejinhos  com destino à fazenda Pajeú, em Boquira, para dar a extrema-unção à idosa Neusina de Filó.

Ele descreve o cenário de calor infernal do sertão. Padre Nazário é um avarento e passa pelo Morro do Pelado onde se esbara com, seu guia Codó, com pepitas gigantes. Imagina que as pedras são ouro puro e não esquece do que viu na terra de pessoas ingênuas e ignorantes.

Na volta, ele recolheu amostras das pedras brilhantes que só serviam para fazer cercas de mureta para não deixar animal escapar. Aquela extrema-unção um dia veio a mudar a vida de toda aquela gente de Boquira. Dali em diante o estado de espírito do padre se renovara e atendia a todos com satisfação em Macaúbas e vizinhança. Aguardava ansioso a chegada do seu amigo farmacêutico Agenor, para levar as pedras para exame em Salvador.

Tudo calculado em sua mente traiçoeira. Três semanas depois o amigo retornou e o resultado dava alto teor de chumbo, mas as pedras careciam de exames mais precisos a serem feitos em São Paulo. O padre malandro continuava a celebrar suas missas em Macaúbas, mas sonhava ficar rico. Passou a namorar a filha do Agenor que dava uma de médico charlatão.

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