A EXTINÇÃO DOS JUMENTOS JÁ VEM ACONTECENDO HÁ CINQUENTA ANOS
Quando vejo e leio algum vídeo ou matéria sobre a extinção dos jumentos, animais símbolos de resistência do Nordeste, sempre lembro desse equino valoroso que meu pai possuía e cuidava com muita dedicação porque era instrumento do seu trabalho. Era seu ganha pão.
Certa vez, isto há cerca de 50 anos, quando já havia um matadouro de cavalos em Senhor do Bonfim, apareceram uns sujeitos no município de Piritiba comprando esses animais para matar e foram bater em nossa roça.
Com seu jeito rústico de ser, meu pai os enxotou de casa, dizendo que não ia sacrificar seu jumento que tanto lhe ajudou na lida. “O meu jumento vai morrer velho em meu pasto. Não há dinheiro que me faça vender”.
Portanto, essa maldita extinção já vem ocorrendo há mais de 50 anos em todo Nordeste, de forma cruel, como mercadoria de negociação para satisfazer os chineses.
O alerta tem sido tímido e vez por outra surgem alguns defensores protestando contra este ato criminoso, mas os governantes nada fazem para proibir essa matança.
Agora estou lendo nas redes sociais que um grupo de doze cientistas de universidades brasileiras e internacionais, reunidos em Maceió (Alagoas) declarou estado de emergência diante da iminente extinção do jumento nordestino. Ora, somente agora eles estão vendo isso? Até parece que descobriram a pólvora chinesa!
Esses animais são abatidos nas cidades de Amargosa, Alagoinhas e Senhor do Bonfim, para extração de suas peles, utilizadas na produção de ejiao, uma substância da medicina chinesa feita a partir do colágeno do couro. Dizem que o produto serve para o rejuvenescimento e revigorante do ser humano.
Há 30 ou 40 anos, o que mais se via nas estradas de chão batido e nas feiras eram jegues transportando a produção dos pequenos e médios lavradores, com cargas pesadas de farinha, milho, feijão, frutas, hortaliças e outras variedades de cereais. Recordo muito bem daquela época, e eu próprio já fui um tropeiro com meu pai tocando esses animais na madrugada até a feira.
Nos tempos atuais, o jumento, o burro e até o cavalo foram substituídos pelas motocicletas. Rodando por essas estradas do nosso sertão, dificilmente você ver alguém montado na cela de um jegue para ir à cidade. Aliás, talvez seja a coisa mais rara.
No encontro de cientistas, em Maceió, eles calculam que houve uma redução de 94% da população desses animais nas últimas três décadas. Me atrevo a dizer que é bem mais que isso, e essa extinção tem muito mais tempo. Você, por acaso, já viu algum desses cientistas montados num jumento?
Nessa discussão, eles apontam mais dados sobre essa situação, inclusive que só restam cerca de 78 mil jumentos no país, estatística essa extraída da ONU (Organização das Nações Unidas) e do IBGE. Em 1999 existiam mais de um milhão.
Se a ONUN não resolve os problemas das guerras genocidas, pelo mundo a fora, imagina se está lá preocupada com o nosso irmão jumento, como fala a bela canção entoada pelo rei do baião, Luiz Gonzaga. Desde aquela época, ele já homenageava o nosso símbolo nordestino.
De acordo com a matéria “, o documento também aponta riscos sanitários, trabalho infantil, más condições de transporte e impactos negativos à imagem do agronegócio no exterior”. Esqueceram de acusar os maltratos impostos a esses animais em currais sujos, sem comida e bebida antes de serem sacrificados.
Reportam ainda que entre 2018 a 2024, pelo menos 248 mil jumentos foram abatidos na Bahia, onde ficam os únicos três frigoríficos. Na Assembleia Legislativa Baiana existe um projeto na Comissão de Saúde à espera de votação dos deputados visando a proibição do abate.
Esse absurdo, como já dizia um ex-governador, se não me engano Otávio Mangabeira, só poderia acontecer na Bahia. Esses chineses lucram com a morte desses animais.
Cadê os defensores dos animais e do meio ambiente? Sabe-se que uma ONG britânica, ao lado de universidades, tem feito campanhas pela proibição desse abate criminoso. Existe um projeto de lei visando a proibição, mas foi engavetado.