NÃO FAÇA DEBOCHE COM NOSSO NORDESTE
Somos Bahia, Alagoas, Sergipe, Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte, Piauí, Maranhão e Ceará; de terra árida, semiárida; de espinhaço sertanejo cinzento retorcido pela seca e colorido de paisagens floridas das chuvas; de gente brava e forte; de pele negra e mestiça que nas veias corre o sangue da cultura popular, da poesia cantada em versos, do repente, do cordel, da oratória e dos intelectuais escritores que encantaram o Brasil e o mundo com suas lendas, mitos, seus contos e histórias. Somos o Nordeste rico e desértico empobrecido pelo abandono das políticas discriminatórias de governos a serviço do lucro do capital.
Somos sim, todos “Paraíbas” de Ariano Suassuna, de José Lins do Rego, de Geraldo Vandré, de Zé Ramalho, de Elba Ramalho, de grandes repentistas, cancioneiros e forrozeiros, e não do seu conceito chulo, ridículo e pejorativo, sr, capitão-presidente, que nega que exista fome no Brasil; desmente pesquisas de instituições renomadas como do IBGE, do Inpe que mapeia os desmatamentos, do Ibama e do IcmBio que querem preservar o meio ambiente; que pretende censurar nosso cinema e extinguir a Ancine; e que ainda insiste em dar um file mignon ao seu filho, colocando-o como Embaixador do país nos Estados Unidos porque aprendeu fritar um hambúrguer e entregar pizza em Washington.
A REPULSA NORDESTINA
Essas coisas sim, são ridículas e não merecem muitos comentários, mas a repulsa dos nossos nordestinos e do Brasil, que está com sua imagem ferida, dilacerada e mal vista lá no exterior por ter um presidente de ideias retrógradas em gênero e grau, e que deseja destruir a natureza indicando uma jovem fazendeira inexperiente para cuidar de um parque de preservação. Nós nordestinos condenamos o retrocesso de pensamento e o preconceito contra o nosso povo trabalhador e honesto que construiu São Paulo, o sul e, para matar sua fome, serviu de escravo na extração da borracha no Amazonas para os senhores estrangeiros capitalistas. Milhares foram tratados como bichos, mortos e esquecidos nas florestas infernais infestadas de doenças.
Não venha avacalhar com sua mesquinhez nossa sofrida região, castigada pelas secas, e depois pedir desculpas cínicas, afirmando que adora o Nordeste durante a inauguração do Aeroporto Glauber Rocha (baiano) de Vitória da Conquista que, por sinal, foi um fiasco em termos de representação (nem as filhas Ava e Paloma do homenageado compareceram). Em repúdio ao ato do capitão-presidente, “pois considero oportunismo político o uso indevido do nome do meu pai” – disse Paloma Rocha, que achou melhor não vir ao evento. Seu protesto se estende contra o golpe à cultura e ao cinema brasileiro. A Câmara de Vereadores de Conquista não compareceu em decorrência da falta de participação popular na inauguração, e porque teve dificuldades para o credenciamento de seus membros, autoridades e da própria imprensa.
Então, sr. Capitão, não venha com este papo de Nordeste cabra da peste para agradar seus bajuladores, que não é essa a nossa identidade como gente decente. Para gostar e amar esta terra, esta região de tantas bravuras e conquistas, a revitalização do Rio São Francisco, o “Velho Chico”, cansado dos maltratos dos homens e do poder público que nele joga lixo e esgotos, já seria um gesto suficiente que redimiria sua sandice e seu desconhecimento sobre nós nordestinos, onde aqui aportou as primeiras naus de Cabral e os ancestrais da Ásia.
SOMOS NORDESTINOS
Fotos do jornalista Jeremias Macário. O mundo admira as belezas da Chapada Diamantina, no Nordeste
Sinto-me orgulhoso de ser nordestino, sertanejo-catingueiro, e seu deboche me ofendeu profundamente, sr, capitão! Somos Bahia de Ruy Barbosa, de João Ubaldo Ribeiro, de Irmã Dulce, de Caetano Veloso, de Castro Alves, de Gil, de Jorge Amado, de Luiz Alberto Muniz Bandeira, de Gregório de Matos, de Euclides Neto e de tantos outros que honraram e ainda honram esta terra de pele negra, mulata e branca; do maior polo petroquímico da América do Sul, do sincretismo religiões, do carnaval, do samba, de belas praias litorâneas, da Chapada Diamantina, a mais admirada do mundo, do cacau, do café e outras tantas riquezas naturais, minerais e industriais.
Somos o Nordeste das lutas e rebeliões pela independência do Brasil na Bahia, em Pernambuco e no Maranhão. Somos o Nordeste de Sergipe, de Tobias Barreto, de Alagoas, de Graciliano Ramos, de Pernambuco, de Gilberto Freire, Manuel Bandeira, João Cabral de Melo Neto, Patativa do Assaré, do rei do Baião Luiz Gonzaga e do Movimento Armorial de Ariano Suassuna com o resgate da nosso cultura do colonialismo estrangeiro, do Rio Grande do Norte, de Câmara Cascudo e do Ceará, de José de Alencar.
Somos o Nordeste do Maracatu, dos reisados rebequeiros, da cultura da gravura popular, da expressão cultural ibérica, negra e mestiça, do frevo, do forró, do Bumba Meu Boi, da resistência contra a ditadura e o fascismo que limitam e oprimem nossas mentes, do sol que clareia todo o Brasil, do turismo mundial, das capitais encantadoras, dos lençóis maranhenses, do Parnaíba, no Piauí, de Belchior, Fagner, Alceu Valença, do celeiro de frutas que abastece o país e manda para o exterior. Somos o Nordeste que não perde a fé em sua gente.
Somos o Nordeste que engrandece este Brasil tão roubado e sugado pelas elites e as castas da corte que não desapegam dos seus privilégios e mordomias, para restituir a dignidade e a justiça para o nosso povo brasileiro, principalmente o nordestino que muito tem a receber. Seu preconceito, sr. Capitão, só faz agravar e aumentar mais ainda a dívida social, política e econômica secular e bilionária dos governantes para com o Nordeste.















