Sentei num bar na orla de Juazeiro e veio logo àquela vontade de saborear um peixe, de preferência um surubim. Gosto demais!

Chamei o garçom e pedi a iguaria, sem me atentar do desastre ecológico provocado pela irracionalidade do homem.

Para minha decepção, prontamente o garçom respondeu que tinha carne bovina, de caprino, algumas aves, frango, menos peixe, meu senhor.

Mas, moço! Vocês aqui às margens do Rio São Francisco e não tem um peixe para servir?

O Velho Chico está aí morrendo ao lado – apontou para o rio o garçom, um tanto triste e envergonhado.

É essa a situação em que se encontra o Rio São Francisco, vivendo seus últimos dias em estado agonizante, enquanto os safados lá em cima roubam, inventam de fazer transposição de suas águas, canais, adutoras para comprar votos e desviam os recursos que deveriam ser investidos na sua revitalização.

Por coincidência, minutos depois do meu rápido diálogo com o garçom, sentou ao meu lado o primo Washington Macário de Oliveira, técnico- agente do Inema que luta para preservar o que ainda resta da destruição, e isso sem a estrutura ideal que deveria receber do órgão estadual.

Relatei do meu espanto por não encontrar nenhum tira-gosto de peixe para acompanhar a cerveja gelada. Fiz um discurso sobre a inconsequência do homem frente à natureza e destilei toda minha ira nos governantes e políticos.

Ele concordou, acrescentou outros pontos concretos com base em suas andanças de trabalho de fiscalização. Para meu consolo, informou que as águas do Velho Chico subiram um pouco em Bom Jesus da Lapa, na Bahia, com as últimas chuvas.

Como já estava revoltado mesmo, disse secamente que São Pedro não deveria mandar mais chuvas nas cabeceiras do Velho Chico. Chega de depender dele!

O que é isso, cara! Falou o primo com expressão de horror indo de encontro à minha afirmação, até certo ponto maluca.

Expliquei que, se os mandatários perdulários já se acomodaram quanto à renovação do rio em todo seu leito, ai é que não vão fazer nada mesmo com a chagada das chuvas. Vão continuar sempre esperando pela divina providência, enquanto o rio morre ano a ano, Se as águas retornam ai é que eles recolhem novamente os projetos para suas respectivas gavetas.

Em seguida fiz uma indagação: E quando a seca bater novamente no sertão? Vamos sempre ficar dependentes das chuvas e cada vez mais retirando água do rio de forma desordenada, com esse ímpeto avassalador de destruição? Não são as chuvas passageiras e temporárias que vão ressuscitar o Velho Chico e fazer com que eu chegue aqui e tenha a satisfação de comer um peixe nessa margem que já foi bela.

Com minha tirada inesperada, levei o primo a fazer uma reflexão e, em parte, concordou comigo, contando mais outras de suas histórias do trabalho incansável de fiscalização para impedir que o homem estúpido primitivo faça mais desgraça contra a natureza.

ARRASTÃO DE PEDINTES E AMBULANTES

Ainda continua linda a paisagem que resta do “Velho Chico” debruçado entre as cidades de Juazeiro e Petrolina. Não é mais o tempo dos navios vapores e as chalanas. Não mais o encanto de antes. Mesmo assim, ficamos  ali pensando e imaginando coisas, inclusive das nossas vidas.

Tudo respira poesia, infelizmente até a pobreza com seu grito de socorro. Mudamos de conversa e observei outra revoltante degradação humana, provocada pela demagogia e desleixo dos mandantes egoístas que só cuidam de si.

Primo, já percebeu quantos pedintes e ambulantes passaram em nossa mesa nesses poucos momentos em que estamos aqui? – Perguntei.

Outro papo de reflexão. A cena que constatei na orla de Juazeiro mais parecia um arrastão de pedintes esfomeados e outros vendendo tudo quanto é bagulho e miudezas para conseguir uns trocados.

É bom que fique claro que isso não acontece apenas em Juazeiro, mas, em todas as cidades multiplica a cada dia o número de pessoas vivendo na extrema pobreza. Estamos em plena marcha ré do retrocesso acelerado imposto pelas políticas fascistas do lucro a qualquer preço, empurrando o brasileiro para a escravidão. Cada um só pensa em si e o resto que se dane.

A orla de Juazeiro é apenas um dos tristes exemplos de cenas de agressão social e também ecológica, com sujeiras nos passeios e nas margens do rio que tanto abasteceu o homem com suas generosidades. Retribuímos com o instinto perverso e assassino do mal.