O FIM DOS ESTADUAIS
Carlos Albán González – jornalista
A Confederação Sul-Americana de Futebol (Conmebol) decretou a morte lenta dos campeonatos estaduais, com o beneplácito da CBF, ao determinar que, a partir de 2017, o período de disputa da Taça Libertadores da América passe de 27 para 42 semanas, entre os meses de fevereiro e novembro, além de aumentar o número de participantes. Maior beneficiado, o Brasil passa de cinco para sete representantes (seis classificados no Campeonato Brasileiro e o campeão da Copa Brasil). O vencedor da Copa Sul-Americana também ganhará uma vaga na “Libertadores”, sem necessidade de encarar os “mata-mata”.
Como não houve protestos de argentinos, colombianos e chilenos, contemplados com apenas uma vaga, e dos uruguaios, que não foram beneficiados, a Conmebol não explicou o apadrinhamento ao futebol brasileiro. Os clubes da Argentina têm 23 títulos na “Libertadores”, contra 17 do Brasil. Com relação à Copa América, a seleção uruguaia tem 15 campeonatos, a argentina 14 e a brasileira oito.
A CBF ainda não divulgou seu calendário para o próximo ano. É certo que contará com poucas datas para incluir a Taça Libertadores, Copa Sul-Americana (de junho a dezembro), os quatro grupos do Campeonato Brasileiro, a Copa do Brasil e dois torneios regionais (Copas Nordeste e Verde). As perguntas que devem estar fazendo os clubes considerados médios e pequenos, assim como milhares de profissionais da bola, são as seguintes: “Como vamos sobreviver durante os 365 dias do ano”? “Estamos fadados a fechar as portas”?
As federações estaduais deveriam questionar a CBF, mas como os seus presidentes, há décadas no cargo, sempre dizem “amém” ao poder central, o mais provável é que promovam os altamente deficitários torneios caça-níqueis, com duração máxima de 45 dias. Como exemplo, cito a Taça Governador do Estado da Bahia.
No seu primeiro jogo, realizado no último dia 9, no Estádio Lomanto Júnior, o Vitória da Conquista, que empatou com o Fluminense de Feira de Santana em 2 a 2, teve que desembolsar mais de R$ 250 para fechar o balancete da Federação Bahiana de Futebol (FBF). Mesmo com direito a rodada dupla (a seleção conquistense venceu Paratinga pelo Torneio Intermunicipal), de um total de 1.430 ingressos colocados na bilheteria, foram vendidos apenas 483, proporcionando uma renda de R$ 4.403,50. O “time” das despesas arrecadou mais, incluindo taxas, cota de arbitragem (R$ 1.800) e lanche dos policiais.
“Os campeonatos estaduais terão que se submeter às ordens superiores. Menos datas, menos partidas. Em compensação, jogos mais importantes e decisivos, que atrairão interesse dos torcedores”, explicou o presidente da FBF, o conquistense Ednaldo Rodrigues Gomes, há 14 anos no cargo, com mandato até 2019, aclamado por um colegiado formado por cerca de 300 presidentes de ligas do interior e representantes dos clubes profissionais. O “Baianão” (ou “Baianinho”) deste ano contou com 12 clubes e um total de 56 jogos. O do próximo ano, admitiu o mandatário, sofrerá um enxugamento, e o de 2018 terá 10 clubes.
Propina
Conmebol, CBF e federações estão com os cofres abarrotados. Os clubes, mesmo os considerados grandes, estão com dificuldades para fechar suas contas, aguardando com ansiedade a abertura do mercado europeu para negociar seus melhores jogadores, alguns deles com salários mensais que chegam aos R$ 500 mil. No outro foco da crise, jovens boleiros emigram para as mais distantes regiões do planeta, fugindo do fantasma do desemprego, que compromete o futebol brasileiro.
Retirar do orçamento doméstico o entretenimento é a primeira medida que o brasileiro da classe média toma quando a inflação começa a corroer o seu salário. O Bahia é o primeiro colocado na série B do “Brasileirão” em média – 13.316 pagantes – de público. Números irrisórios comparados com os de outras épocas. Cito apenas um exemplo: no dia 12 de fevereiro de 1989, a Fonte Nova recebeu um público pagante de 110.438 torcedores, na partida Bahia 2 x Fluminense 1.
Hoje, a imprensa esportiva destaca a presença de 30 mil pessoas num estádio, enquanto na Espanha o número de aficionados nos jogos varia entre 40 mil e 90 mil. Vale ressaltar os 60 mil fanáticos tricolores do Fortaleza que, infelizmente, viram na semana passada a derrota do seu time para o Juventude, nas semifinais da série C.
Para evitar os estádios vazios, grandes clubes da série A do eixo Rio-São Paulo, em especial o Flamengo, passaram a comprar o mando de campo dos adversários, levando os jogos para cidades onde é enorme sua legião de torcedores. Manaus, Cuiabá, Volta Redonda (Rio), Londrina (Paraná), Brasília e Cariacica (Espírito Santo) são os locais preferidos; um Fla-Flu foi disputado no Pacaembu, em São Paulo.
A manobra, até certo ponto escusa, chamou a atenção da CBF, determinando que, “com base no artigo 1º do Regulamento Geral das Competições, que busca os princípios de integridade, estabilidade e segurança desportiva dos campeonatos, resolve vetar a saída de clubes mandantes dos seus estados de origem”.
A portaria da entidade provocou questionamentos. Os clubes que aceitam propina (o termo está em moda), o Santa Cruz, por exemplo, alegam que estão devendo quatro meses de salários aos seus empregados, e que não veem chances de fugir do descenso. Os que oferecem vantagens justificam que os “elefantes brancos” – arenas de Brasília, Manaus e Pantanal – vão ser transformados em depósitos de ferro velho, porque os clubes locais não atraem os admiradores do futebol.
“Por que não proporcionar, uma vez na vida, alegria a milhões de rubro-negros espalhados por todo o Brasil, levando nossos craques até eles para disputar um jogo oficial?”, pergunta um dirigente do Flamengo, levantando outro tipo de questão.
A sinceridade e a imparcialidade não vão impedir que, no final desse comentário, eu tenha que afirmar, mais uma vez, que os estádios, na maioria das cidades do Norte e Nordeste, só recebem um bom público em partidas de times do Rio e São Paulo.
Os 483 torcedores que foram ao “Lomantão”, domingo passado, seriam multiplicados por 50 se o adversário do Vitória da Conquista fosse o Fluminense, Flamengo, Vasco, ou Corinthians, que têm torcidas organizadas, estouram foguetes nas vitórias e choram nas derrotas. Vamos acabar com o complexo de vira-lata; vamos trocar o verde do Palmeiras pelo verde do Conquista.











