Antônio Novais Torres

Vésperas de eleições majoritárias. O prefeito local era correligionário e amigo do governador e tinha a pretensão de instalar uma agência do Banco do Estado na sua cidade. Fez ciente o Governador desse desejo e recebeu sinal verde, desde que conseguisse um imóvel adaptável e no centro da cidade.

Dentre os imóveis apresentados, foi escolhido o de um conhecido cidadão, intermediado por injunções de políticos. Os trâmites legais foram cumpridos, e a obra teve início com inauguração marcada para antes da realização do pleito, rendendo dividendos eleitorais para o Prefeito, o Governador e os políticos que gravitavam em torno destes.

O contrato foi feito atendendo às exigências do locador, inclusive quanto ao prazo e à cláusula da sua renovação. Por ocasião da renovação do contrato, a agência local, através do seu gerente, manifestou-se impossibilitada de fazê-lo, vez que o contrato inicial fora feito em Salvador pela diretoria do banco e, sendo assim, só a diretoria poderia renová-lo.

Diante desse impasse, o proprietário do imóvel, que era amigo do presidente da Assembleia Legislativa da Bahia, solicitou deste que agendasse uma entrevista com o presidente do banco para tratar do assunto, visto que reivindicava uma renovação contratual e reajuste do aluguel defasado, atualizando-o em conformidade com o valor vigente no mercado.

Depois de agendada a entrevista por intermédio do presidente da Assembleia Legislativa, o assessor deste levou os interessados, pai e filho, até a sede do banco e, após serem revistados pelo segurança, mantiveram contato com o presidente da instituição que os encaminhou para o diretor de agências do interior, solicitando que fosse resolvida a pendência.

Lá, o locatário fez as suas ponderações e disse ao diretor que o aluguel precisava ser atualizado, porquanto tinha oitenta e cinco filhos para criar e dependia dessa renda para cumprir as suas obrigações. O diretor, surpreso com a declaração do proponente, voltou-se para o filho deste e perguntou-lhe se o pai estava brincando ou se a revelação era verídica, sendo confirmada a sua veracidade.

Ao tomar conhecimento desse fato inusitado, ele ligou para a esposa, talvez pela impossibilidade de terem filhos, dizendo-lhe estar diante de um senhor do interior que fora solucionar problemas relacionados com o banco e lhe contou que tinha oitenta e cinco filhos, um caso inédito, em sua opinião. Passou, então, o telefone para o fecundo pai, dando à esposa a oportunidade de uma conversa com o mencionado, já que o casal não tivera a graça de conceber um rebento.

Depois dos cumprimentos de praxe e alguns comentários, ela, confiante, pediu-lhe um dos filhos para criar. A resposta, porém, desencantou a mulher, pois o protagonista disse que só daria de seis filhos em diante, um só não lhe convinha, frustrando a pretensão da senhora, pois a quantidade oferecida era inviável.

O contrato foi renovado por um valor que satisfez às partes. Pela cordialidade do encontro, os visitantes saíram de lá portando cheque especial com o limite igual ao que era oferecido à diretoria, um valor bastante superior ao da competência das agências, que não tinham autonomia para tanto.

Folclore ou não, o protagonista dava asas à imaginação das pessoas quando lhe era perguntado sobre a quantidade dos filhos. Com isso, alimentava a ideia do fato e difundia a sua propalada concupiscência. Aos indiscretos respondia que a sua “turma” era produto de várias mulheres que possuíra, calando a curiosidade dos inquiridores.

Certa feita, uma moça, hoje senhora casada, contou que a fama de conquistador do indigitado lhe causava medo. Quando o via, ela corria para o outro lado da rua, como o diabo foge da cruz, pois lhe disseram que ele tinha “olho de lobo”. Ao fixar o olhar numa mulher, esta era atraída pela força da sua intenção e terminava como sua presa. Segundo ela, ele era visto como o bicho-papão das mulheres sugestionáveis. “Quem tem fama… Deita na cama”.

Devido à fama de conquistador que lhe imputaram, confessou que eram as mulheres “interesseiras” quem o procuravam. Todavia, sempre manteve o respeito com todas, mantendo-se a distância, comedindo gestos e palavras.

Ele dizia que muitos preconceituosos não relevavam as atividades de valores positivos dos feitos que ele engendrara para o engrandecimento da cidade onde mourejou. Dotado de inteligência profusa e com visão de perspectivas futuristas – Brumado seria a cidade do futuro –,ele desenvolveu, com muita dedicação, um relevante trabalho voltado para o engrandecimento social, caritativo, político, religioso, comercial, esportivo e cultural de Brumado. Os inoperantes viam apenas o que julgavam ser o seu lado negativo.

Não está em poder das pessoas explicar o comportamento daqueles que as cercam, pois é o destino que se encarrega de determiná-lo. Esse procedimento de falar mal do seu semelhante faz parte da dimensão social e da vida humana. E assim acontece. O indivíduo critica e age conforme acha justo, segundo as suas avaliações. Ele vê, normalmente, o lado negativo do seu próximo, menosprezando o positivo. Coisas da vida.

O indivíduo é responsável pela qualidade moral de vida que constrói na sociedade e pelo tipo de relações humanas que cultiva. Ele deve assumir a responsabilidade do que faz sem se omitir, em sintonia consigo e com as suas atitudes.