FOTOS DE JEREMIAS MACÁRIO

Quase todos os dias entro em contato e dialogo com meus quadros fotográficos no Espaço Cultural A Estrada, os quais falam dos sertanejos agrestinos e da vida do homem do campo em geral.

Certa vez meus amigos Dal Farias e Manno me indagaram se eu ainda sabia de cada local e suas histórias. Sempre existiu, por parte de determinadas pessoas, aquela curiosidade por algumas fotografias que chamam mais atenção.  Fico gratificado por isso.

São cenários cinzentos da sequidão da terra rachada, capelas, cargas humanas em caminhões, do tipo pau-de-arara, mandacarus, depredação da natureza, a miséria de pedintes nas estradas, antigas estações e linhas ferroviárias, a luta do homem pela sobrevivência e paisagens floridas nas épocas das chuvas. São faces do Nordeste.

Elas me fazem lembrar dos tempos das minhas andanças como jornalista repórter de redação ao lado do meu companheiro de trabalho, José Silva, ou “Zé Silva”, o fotógrafo da fotojornalismo que, de suas lentes, também tirava o olhar crítico onde a imagem se transformava em fortes legendas ou em mil palavras.

Além de serem poéticas em suas essências enigmáticas, só visíveis aos olhos de poucos, cada foto tem sua história e lugar preciso estático, como se estivesse só esperando pelo clique da máquina para dali ser transportada para um outro mundo imaginário da arte, ser apreciada e refletida na mente das pessoas.

Todas essas fotos são crônicas do tempo com seus casos, causos e histórias, como do sertanejo durante o rigor da seca tangendo seu gado para matar a sede em algum barreiro ou tanque distante. Lá estão o jumento com a carga de garotes de água e o carro-de-boi transportando a produção do feirante.

Durante cada narrativa, o nordestino, de tanto sofrer e apanhar, só acredita na providência divina porque o político lhe enganou através das vãs promessas. Com fé e esperança, ele levanta com suas mãos o chapéu em direção aos céus e pede clemência a Deus para que mande logo as chuvas para molhar o chão e plantar sua lavoura para colher o pão.

Tem a mulher, o menino e a menina com feixes de lenha e latas d´água na cabeça, vindos de bem longe no sol inclemente, que nem demonstram cansaço porque o corpo já se habituou com a labuta. Tem também aquela senhora de corpo frágil extraindo areia ou quebrando pedras da Serra do Periperi para ganhar um dinheiro do patrão explorador e depredador do meio ambiente.

Crianças e mães maltrapilhas pedem dinheiro nas pistas assassinas da Rio-Bahia (BR-116). Cada moeda jogada da boleia é um alento e se mistura com o asfalto. Cargas humanas em carrocerias de caminhões atravessam estradas da região, correndo o risco de morte porque não têm outras saídas.

O catingueiro, em seu desespero para encontrar água para matar a sede, forma um adjutório para cavar o terreno seco, de forma manual, no antigo estilo conhecido como “banguê”. Pela experiência secular do homem do semiárido, ali tem olho d´agua. Nem é necessário o aparelho da engenharia.

A trator, quase sempre, vai para o açude do fazendeiro ou do aliado político. O carro-pipa eleitoreiro, que levanta poeira por onde passa, deixa muitos de fora. Alguns ainda se amparam nas cisternas, mas elas não resistem por muito tempo. As capelas nos povoados e distritos são símbolos de uma religiosidade forte que acredita que as coisas vão melhorar um dia.

Nas conversas, bate-papos e prosas com todas essas gentes, de um modo geral, as histórias são parecidas, como das famílias de retirantes que rumaram para o Sul ou terras melhores, das “viúvas das secas”, cujos maridos não mais retornaram, das plantações perdidas, das brigas por terra, mas cada caso é um caso que nos faz partir o coração.

Apesar de todo sofrimento, são pessoas cordiais, cordatas, prestativas e receptivas. A senhora dona de casa nos recebe com prazer, mas enche os olhos de lágrimas quando nos leva até à sua cozinha desprovida de alimentos. Recordo de muitas delas, cheias de filhos pequenos, que me mostraram só uma panela no fogão a lenha com alguns caroços de feijão a borbulhar na fervura da água barrenta.

– É meu filho faz quase um ano que não chove; meu gadinho morreu de fome e sede; vendi um pedacinho da terra, mas o dinheiro está acabando. Só Deus para nos acudir – desabafou o senhor de rasgadas rugas queimadas profundas, com aquele triste olhar fitado no longínquo horizonte.

As fotos e as imagens me trazem essas recordações dos tempos de repórter e se unem e se interagem aos autores escritores, aos chapéus, aos artesanatos em noites de saraus culturais para escutarem as cantorias de violeiros, declamações de poemas, casos, causos e crônicas da vida, na troca do conhecimento e do saber.