:: ago/2025
“AS FEIRAS DE TRABALHADORES”
Ao lado dos feirantes comuns que levavam suas produções, como farinha, feijão, milho, carnes e verduras para comercializar, pouca gente tem conhecimento do que eram “as feiras de trabalhadores” no Nordeste que aconteceram até meados do século XX.
Essas feiras representavam a exploração deplorável da miséria nordestina pelos senhores de engenhos, coronéis fazendeiros e até poderosos políticos, tudo em regime de escravidão explícita, não daquela africana do tronco e da chibata que perdurou por mais de 300 anos no Brasil.
Sem trabalho para sustentar suas famílias, principalmente em épocas de seca, trabalhadores com suas enxadas, foices, machados e outras ferramentas se dirigiam aos povoados, vilarejos e cidades. Um amontoado de esfarrapados operários, com fome e sede, ficava exposto ao sol ardente como mercadorias à espera de que aparecesse um senhor engravatado para contratar seus serviços.
Essas feiras funcionavam como mercados de compra e venda de mão-de-obra barata, só que menos violenta do que nos tempos da escravidão, mas não deixavam de ser cruéis para aqueles famintos que se sujeitavam a oferta de qualquer preço porque não tinham outra saída diante de tanta oferta e pouca procura.
Como nos barracões de escravos, os donos de engenhos e os coronéis transitavam soberanos entre aqueles homens, inclusive crianças e jovens, e escolhiam os mais robustos e fortes que aguentavam pegar no pesado por cerca de doze horas de trabalho duro e forçado.
Os mais fracos e aqueles com idade entre os 40 ou 50 anos eram rejeitados por aqueles patrões que pagavam uma mixaria aos outros e mal davam um prato de comida, na maioria restos de carne, buchos ou até vísceras de animais. Essas pessoas dormiam em locais precários e sujos, sem nenhuma dignidade humana.
Sem serviço, muitos caiam no cangaço e se tornavam bandoleiros, isto é, partiam para a criminalidade, ou viravam retirantes em paus-de-arara para o sul do país, sobretudo São Paulo onde também eram submetidos à escravidão nas grandes capitais. De um modo geral, o nordestino pobre e miserável tinha uma vida curta em torno dos 50 anos.
Portanto, não era somente a seca que provocava a retirada dos nordestinos em busca de trabalho em outros estados. Quem tinha uma pequena propriedade se tornava vítima de grilagem dos senhores poderosos ou era obrigado a vender seu pedaço de terra para aumentar o latifúndio do “coronel” e do senhor de engenho da zona da mata.
Não como antes, de forma bastante institucionalizada pela pobreza extrema, essas “feiras de trabalhadores” deixaram seus resquícios. Quando ainda moleque na roça do meu pai, muita gente ia às feiras tão somente para procurar um trabalho, não mais com a enxada e uma foice na mão.
As coisas melhoraram bastante com relação àquela época, mas o nordestino catingueiro continua a sofrer e sendo explorado por esses rincões a fora, tanto é que ainda existe o trabalho análogo à escravidão em pleno século XXI.
“As feiras dos trabalhadores” estão hoje camufladas por contratantes de mão-de-obra para lavoras, carvoarias e outras atividades. Eles prometem bons salários e outros benefícios, só que a realidade é bem diferente.
OS LADRÕES DE LIVROS
Estava na Feira Literária de Itapetinga e papo vem, papo vai, pintou a conversa sobre a questão da leitura que anda desmilinguida e definhada no Brasil. Falei sobre os antigos ladrões de livros que hoje são escassos nas livrarias e sebos. Um colega de lá sugeriu que eu escrevesse uma crônica sobre o tema, e aqui vou eu com essa incumbência delicada e difícil.
– Vambora cumpadi, que na pista tombou um caminhão! Tão dizendo que é de carne, frutas, feijão, milho, celulares ou de bebidas. Nesses casos, o saque é repentino e a polícia não tem condições de controlar a multidão, como ocorreu recentemente numa zona do Rio de Janeiro.
Em pouco tempo os moradores da redondeza ocuparam o local da serra, como abelhas em enxames. Não se sabe de onde apareceu tanta gente em questão de minutos. A notícia corre com rastilho de pólvora.
Para surpresa ou decepção, era um caminhão de livros que estava indo em direção à capital e perdeu o controle na descida de uma ladeira.
– É cumpadi, perdemo a viagem. Só tem livro espalhado pelo asfalto! Coisa pra doutor! Esses papéis não serve de nada pra noís. Queremo é comida, bebida e celular. Nem pra ser de cigarro ou outro produto de contrabando.
Alguns começaram a esbravejar e até ensaiaram xingamentos. Coisa foi ver a cara do malandro que jogou óleo na estrada para provocar o acidente! Quem ia imaginar que aquela carreta estava cheia de livros! Azar da peste! – Gritou alguém irritado.
A carga permaneceu intacta sem ninguém tocar. Um olhava para o outro com o semblante de frustração e ia saindo de mãos vazias para suas casas. O policiamento só observa de longe e o carregamento foi salvo, sem precisar acionar o serviço do seguro.
Essa conversa rolou em tom de gracejo num realismo-fantástico nos dias de hoje, mas lembramos das eras dos anos 50, 60 e até início dos 70 dos ladrões de livros. Não era coisa surreal.
Eles tinham até o apelido de ratos de livrarias, sebos e bibliotecas. Os donos e funcionários responsáveis ficavam de olhos atentos, mesmo porque nem existiam câmaras para vigiá-los, como atualmente.
– Hoje não existem mais ladrões de livros como antigamente quando se levava uma obra debaixo do braço para se ler e discutir com um amigo-parceiro num botequim, bar ou restaurante – disse para um companheiro escritor.
– Você que pensa assim, mas ainda tem alguns soltos por aí. O Raí, do sebo, me contou que fica bem atento porque vez ou outra, numa feira literária, alguém lhe furta um exemplar – retrucou o amigo.
Para não perder a viagem imaginária sobre a queda de leitores e a importância do livro na vida das pessoas, tive que sair pela tangente.
– Naqueles tempos, ainda menino moço, presenciei um assalto inusitado a mão armada na cidade grande. Enquanto um jovem concentrado lia num banco de jardim, aproximou-se um sujeito mascarado de revólver na mão:
– Perdeu, meu camarada, passe o livro de Fiódor Dostoiévsk. O ladrão foi quem perdeu porque se tratava de uma obra de um autor brasileiro, o nosso maior Machado de Assis.
Aí ninguém aguentou e caiu na risada, mesmo insistindo que foi fato verdadeiro e citei até o dia, a hora e o ano, inclusive retratei o local. Nem assim acreditaram.
– Isso não passa de uma lorota. Você deve ter avançado pelo túnel do tempo futurístico e se esborrachado no celular onde tem ladrão por toda parte e um monte de gente dando bobeira, batendo com a testa até em poste e tropeçando em calçadas.
Quanto ao livro, você pode ficar em pé ou sentado num banco da praça com ele aberto e lendo que ninguém encosta. Vão é te chamar de maluco desajuizado da cabeça que anda no mundo da lula. Você já viu alguém assim por aí?
– É, mas que existem ladrões de livros, existem, mesmo raros – falou o portuga entre uma discussão e outra, para passar o tempo durante a falta de leitores interessados em comprar uma obra.
O LIXÃO CRIMINOSO DE ITAMBÉ
Só poluição, fumaça e sujeiras
Ainda nos tempos atuais, a Prefeitura de Itambé, distante cerca de 50 quilômetros de Vitória da Conquista, mantém às margens da BA-263, um lixão criminoso numa clara e explícita agressão à natureza, sem falar no flagrante desrespeito e desobediência ao código ambiental.
Como se não bastasse, esse lixão a céu aberto, cheio de urubus, materiais orgânicos, plásticos e até restos de animais mortos, queima diariamente soltando uma fumaça que atrapalha a visão dos motoristas, podendo provocar acidentes graves.
É um absurdo que as autoridades, como o Ministério Público, os movimentos sociais, as entidades, os segmentos da sociedade, os defensores do meio ambiente e o próprio Governo do Estado através do Derba não tomem uma providência para acabar de vez com um lixão que já perdura há tempos logo depois da saída da cidade.
Uma imagem aterradora de escombros
Mesmo com todo mau cheiro que exala dos monturos da lixeira, ainda tem gente que aparece no local para catar alguns objetos. Sabemos que existe uma lei, prorrogada por várias vezes, (coisas do Brasil) onde estabelece que todos os municípios construam seus aterros sanitários.
O poder executivo de Itambé, e não é somente do atual mandato, segue na contramão e não se estrutura para pôr fim a uma situação tão lamentável e constrangedora, sem contar o mal que está provocando à natureza e à saúde das pessoas que reviram o lixão.
Há muito tempo que não que não viajo pelas aquelas bandas. Na semana passada fui à Itapetinga participar da Feira Literária e fiquei horrorizado com o cenário que não deveria mais existir. As imagens das nossas lentes falam mais que mil palavras.
Aquilo ali representa o total desleixo do poder público para com o meio ambiente, bem como a omissão dos órgãos que que também não tomam medidas urgentes para proibir de vez com aquele lixão nojento à beira de uma estrada tão movimentada.
É assim que estamos contribuindo para amenizar o aquecimento global? O lixão de Itambé é uma vergonha, não somente para os moradores do município, como também para quem passa pelo local, inclusive turistas que vêm de outros estados em direção ao litoral. Aquele lixão criminoso simplesmente mancha a imagem da cidade e da região.
A fumaça do lixão de Itambé pode provocar acidentes graves na pista e ainda tem gente que se arrisca como catador
TEM CABIDE NO MOTEL?
(Chico Ribeiro Neto)
Todo mundo tem uma história engraçada de motel que viveu ou ouviu contar.
Antes dos motéis surgirem em Salvador, frequentava-se muito os hotéis da Travessa Bom Gosto da Calçada (nome sugestivo) que antes recebiam os passageiros dos trens da Viação Férrea Federal Leste Brasileiro. Recebiam, agora, os passageiros do amor.
Fui a um desses hotéis um dia, à tarde. Antes de chegar no quarto, passamos por uma mulher batendo vitamina no liquidificador, menino fazendo dever e uma senhora passando roupa. O quarto era lá no fundo do corredor.
Conheço um casal que, quando foi a um motel pela primeira vez, ela levou uma sacola. “O que é isso?, perguntou o namorado quando entraram no quarto, e ela respondeu:
“Você acha que eu vou deitar em lençol de motel, que eu vou botar minha cabeça em travesseiro de motel e que eu vou me enxugar com toalha de motel?” Ela levou não só lençol, fronhas, toalhas e sabonete, mas também dois travesseiros.
Uma vez, a revista “Playboy” fez uma matéria com garçons de motel. Havia histórias hilárias, como essa: sexta-feira à noite era uma grande fila de espera de carros na parte interna do motel e os garçons atendiam nos veículos os casais que estavam á espera do amor. Mais de uma hora depois o garçom foi avisar ao primeiro da fila que o apartamento 9 estava disponível, e o motorista respondeu: “Agora não precisa mais. Obrigado.” Fez a volta e foi embora.
E tem a de Roberto Carlos. Um colega jornalista arranjou uma namorada e foram pro motel. Ainda estavam nas preliminares quando o som na cabeceira do quarto tocou “Detalhes”, com Roberto Carlos. Ela não aguentou: “Eu não posso, buá-buá, ouvir essa música, buá-buá, porque lembro logo, buá, do meu noivo. A gente acabou o noivado tem menos de um mês, buá-buá, não consigo mais fazer amor, buá, quero ir embora, buáááá. Dito e feito, nada pra ninguém.
Aconselhei ele que, sempre que fosse a um motel, perguntasse na portaria: “Aí toca Roberto Carlos? Se tocar, eu não entro”.
Havia um velho repórter em Salvador que perguntou a um fotógrafo boêmio se ele conhecia algum hotel de encontro no centro da cidade. Ele deu o endereço do hotelzinho de um amigo e recomendou: “Peça o quarto 7, que é o único que tem janela”.
Uma semana depois o fotógrafo encontra o dono do hotel na rua e pergunta:
“Mandei um amigo lá outro dia, você viu?”
“Porra, que velho chato da porra!”
“Por que? O que foi que aconteceu?”
“O velho vem transar e fez o maior escarcéu porque não tinha cabide no guarda-roupa. Ligou pra portaria e só sossegou quando levaram um cabide.”
Dias depois, encontro o velho repórter e pergunto pela história:
“Foi isso mesmo?”
“Foi, sim senhor. Eu ia pendurar minha calça aonde?”
(Veja crônicas anteriores em leiamaisba.com.br)
AQUELA MOÇA DA PENHA
Poeminha de autoria do jornalista e escritor Jeremias Macário
Eu vi
Aquela moça da Penha,
No arrasto dos joelhos,
Como guia, pela corrente
Sua mente seguia
Pelos quatrocentos degraus,
No segredo da sua senha:
Imaginei ser fé e devoção,
E ela riu pra mim,
Com aceno da sua mão.
Eu vi
Aquela moça da Penha,
Adiantei meus passos,
Do alto fiz meus laços,
Na Igreja, o padre
Ministrava um batizado,
Pedia a todos fiéis
Renegar o satanás;
Fotografei todo geral;
Lembrei de Jesus e Caifás,
Entre os bons e os maus.
Eu vi
Aquela moça da Penha,
Tão singela e contente,
De alma doce valente
E não mais perdi seu reflexo
Daquele mágico momento
Ao lado do Complexo
Santo e violento.
AGORA É INTERVENÇÃO ESTRANGEIRA
Antes eles desfilavam nas ruas, praças e avenidas com cartazes e camisas amarelas da seleção de futebol pedindo uma intervenção militar, só que as forças armadas não embarcaram nessa barca furada. Agora, os extremistas “patriotas”, como se auto determinam, querem uma intervenção estrangeira, no caso dos Estados Unidos, do Trump autoritário.
Durmam com um barulho desse, coisa de indivíduos vítimas de lavagem cerebral. Tudo para livrar a pele do mentor e sua turma que tramaram um golpe de Estado onde estava no script do filme de terror o assassinato do presidente da República, do vice e do ministro do Supremo Tribunal Federal.
Que “patriotas” são esses que instigam os republicanos norte-americanos e seu presidente destrambelhado a intervir em decisões judiciais internas de outro país, ferindo com suas adagas afiadas a soberania nacional? Que causa esses fanáticos estão defendendo?
Para completar, ainda vilipendiam as mesas diretoras da Câmara e do Senado, impedindo o andamento de seus projetos de lei e prejudicando milhões de brasileiros, como a isenção do imposto de renda para quem ganha até dois salários mínimos. Deu a louca na cabeça desses caras!
Esses traidores da pátria estão, mais uma vez, se metendo em outra atrapalhada perigosa, como se fossem salteadores da democracia. Além da intervenção estrangeira, eles ainda estão exigindo que o Congresso Nacional aprove a lei de anistia geral e irrestrita para os golpistas de oito de janeiro de 2023, bem como o impeachment do ministro Alexandre de Morais.
Como forma de punição e em defesa do ex-presidente capitão Bozó, um nazifascista, xenófobo, homofóbico, misógino e racista por natureza, o Trump aplica um tarifaço de 50% sobre os produtos brasileiros de exportação e ainda manda um recado para que parem com o processo contra o cabeça do golpe.
Os atos extrapolaram todos os limites e não se trata mais de liberdade democrática porque é a nação que está sendo sangrada como um porco. Portanto, têm que ser tratados como traidores. Na história da humanidade, o traidor sempre foi julgado e sentenciado à cadeia e, em muitos casos, mortos, sem piedade.
Nessa novela macabra onde só tem personagens criminosos, os brasileiros a tudo assistem em silêncio em seus confortáveis camarotes. Na plateia ainda existem os inocentes úteis que aplaudem a alcateia de lobos ferozes e carniceiros.
Fico também estarrecido com essa esquerda desbotada e pálida que não se mobiliza contra essas vespas venenosas, salvo algumas falas aqui e acolá condenando essa casa de horrores e maldades. No mesmo ritmo segue a mídia burguesa que historicamente foi sempre tendenciosa e passa um mel de coruja nos fatos tão agressivos.
Enquanto isso, o povo segue sua rotina de festas, feriadões, em suas cachaças de finais de semana e cuidando apenas de suas individualidades pecuniárias como se nada estivesse acontecendo de gravidade. Está ocorrendo uma barbárie e ninguém quer se envolver nela.
Infelizmente, desde os tempos coloniais regidos pela coroa portuguesa, esse território tão rico foi quintal de outras potências. Antes era da Inglaterra, depois passou a copiar a cultura francesa e, há muito tempo a dos Estados Unidos. Em nosso DNA carregamos o sadismo da humilhação. Na escola primária, aprendi a lição de que aqui se chamava Estados Unidos do Brasil.
NUMA FEIRA LITERÁRIA
Tudo pode acontecer de inusitado numa feira literária, principalmente quando é realizada em cidades do interior. É só observar e escutar os detalhes. Uma coisa é certa, o escritor, escritora, poeta ou poetisa, gasta mais saliva para explicar detalhes sobre sua obra do que vende.
Tem uns que narram toda história do seu romance, conto, da sua prosa ou causo e até declama sua poesia. Cada um tem sua maneira de vender o seu “peixe”, ou sua obra depois de algum tempo queimando os neurônios. De artista o cara passa a ser vendedor de livros, só que da sua autoria.
– O senhor, ou senhora, fez tudo isso? Como é feito? E tem as curiosidades das crianças sobre sua vida e como é escrever e colocar tudo naquele papel. É muita conversa para pouca vendagem, mas uma feira dessa natureza não é somente isso. É também encontro, um instrumento de projeção do seu nome, troca de ideias, projetos e, sobretudo, conhecimento, saber e aprendizagem.
Existem aqueles que vão só visitar, passam, olham e vão embora. Nas cidades pequenas e médias, muitos aparecem das periferias e até das zonas rurais sem o mínimo conhecimento do que é uma feira literária. Ficam encantados quando vê tantos livros nas estantes e bancas. Tem aqueles que expõem seus trabalhos no chão, sentados num tamborete. É uma competição saudável.
Tem aquele personagem chato que não tem nada para fazer e fica em seu pé dando uma de sabichão intelectual, de sabe tudo, dizendo o que deve ou não ser feito, mesmo de forma desconexa. Por vezes surge um bêbado para abrir a boca e falar besteiras, de que tudo aquilo ali não vale de nada.
O destaque é a criançada que chega com aquela algazarra e deixa o expositor atordoado. Por falar em crianças, os livros mais vendidos são os infantis. Passou mais a onda dos gêneros de autoajudas. Tem escritor até pretendendo mudar de estilo para enveredar no infantil que é mais comercial.
Nesses tempos modernos da tecnologia do celular e da febre das redes socais, dos cursos técnicos para atender a demanda do mercado, fico aqui a imaginar se esse público vai dar continuidade à leitura mais tarde quando jovens e adultos. Tenho minhas dúvidas, mas se vingar um por cento de 100, a feira já alcançou seus objetivos e deixou sua mensagem marcada.
Numa feira literária aparece todo tipo de visitante, do intelectual, do leitor assíduo ao que nunca viu um livro. Tem aqueles que acham que é fácil escrever, juntar as palavras para que elas se encaixem certas e virem artes.
Tem o que compra a obra do autor somente por afinidade e amizade, para agradar. Esse tipo, com certeza, não lê o livro e termina jogando no lixo ou, no máximo, passa para alguém.
Na recente Feira de Itapetinga, a II FLITA, observei um fato inédito. Uma senhora comprou o livro de poesia do amigo conterrâneo, pagou e, simplesmente, não quis levar a obra, mesmo autografado.
Ele insistiu que levasse e ela dizia que vendesse para outro. A compra foi como um tipo de ajuda financeira. Foi tão hilário que o autor foi atrás dela até colocar o livro em sua mão.
Esse fato me fez lembrar de outro, ainda mais absurdo que ocorreu aqui em Vitória da Conquista. Um grande poeta conhecido lançou seu trabalho em sua empresa onde trabalhava.
No evento, apoiado pelos colegas, chegou um “amigo”, apertou sua mão, deu tapinhas nas costas e pediu que autografasse um exemplar. Tirou foto e saiu pelo corredor da firma. Na primeira lixeira que encontrou jogou o livro como se fosse qualquer resto de comida ou coisa imprestável.
No outro dia, passou o faxineiro fazendo a limpeza geral e, para sua surpresa, lá estava a obra que ele guardou com todo carinho para ler depois. A burrice do indivíduo foi tão grande que o falso e suposto “leitor” não se deu conta que o livro poderia ser encontrado na lixeira.
Pelo menos levasse para casa, deixasse lá, jogasse fora em outro lugar ou ofertasse para alguém com lucidez pela literatura. Claro que o autor, quando soube do menosprezo, se sentiu arrasado, humilhado, decepcionado e frustrado diante de tanta estupidez do indivíduo farsante.
Existe de tudo que você imaginar numa feira literária. Tem aquele que passa, faz várias perguntas, folheia e ler alguns trechos e se mostra aparentemente interessado.
O escritor fica animado com aquela boa expectativa e até pega na caneta para dar o autógrafo, mas ele lhe derruba quando diz que vai dar uma volta, passa depois ou no outro dia. Esquece que já era.
Tem gente que aparece com um quilo de alimento ou outro objeto para fazer o escambo. Ainda existe aquele que pergunta se é de graça, se é doação.
Difícil é pintar um ladrão de livro, como antigamente, quando se tinha o hábito constante da leitura. Esse personagem desapareceu há muito tempo do nosso cenário. É coisa das décadas de 50, 60 e início dos anos 70. Com a ditadura tudo mudou.
A FLITA DE ITAPETINGA FOI MAIS UM MOVIMENTO DE RESISTÊNCIA CULTURAL
As crianças e os jovens estudantes foram os maiores destaques da II FLITA, a Feira Literária de Itapetinga, além, é claro, dos escritores e editoras que se fizeram presentes ao evento, registrando assim mais um movimento de resistência cultural num país onde este setor vem sendo aos poucos abandonado pelo poder público.
A II FLITA, realizada na Praça Dairy Valley, mais conhecida como “Praça do Boi”, entre os dias 30 de julho a 2 de agosto, contou com uma vasta programação de lançamentos de livros, rodas de conversas com escritores, entrevistas, shows musicais, palestras e contação de causos através da Flitinha, num palco reservado para a criançada.
Muitas editoras, como a Nzamba, Literattum, Cogito, dentre outras, apresentaram variadas obras de gêneros diferentes ao gosto dos leitores, inclusive com temas de terror e suspense, No entanto, os livros infantis foram os mais procurados pelas crianças, incentivadas, em sua grande maioria, pelas mães. O objetivo é que essas crianças continuem cultivando a leitura quando se tornarem jovens e adultos.
Na ocasião, a cultural popular, como os cordéis de Antônio Andrade, os ternos de reis, oficinas e outras atividades ligadas ao Nordeste tiveram seus espaços. Vários bate-papos com escritores de Salvador, Vitória da Conquista, de Sergipe, de Itabuna, Ilhéus e cidades do médio sudoeste foram realizados na Academia de Letras de Itapetinga, na Loja Maçônica e no palco principal.
Além da sua função de venda e estimulo aos escritores, principalmente os novos, uma feira literária visa também o intercâmbio de ideias, projetos e conhecimento. Esses objetivos, com certeza, foram alcançados, num clima de amizade, ética e respeito a cada um.
Outro destaque foi a realização de uma roda de conversa com os estudantes sobre os povos originários. De Conquista se fizeram presentes os escritores e poetas Antônio Andrade, Jeremias Macário, Ybione, Luís Altério e a professora Lídia, representando a Editora Nzamba.
Sob a direção de Roberta (Beta), a programação da curadoria transcorreu com sucesso durante os dias da Feira Literária, se bem que algumas atividades precisam ser corrigidas na próxima edição, garantida para o próximo ano, com uma estrutura maior e melhor organizada.
A II FLITA foi aberta no dia 30 e teve o apoio da Prefeitura Municipal, através da Secretaria de Educação, do Governo do Estado e outras entidades locais. A programação começou pela manhã do dia 30 de julho quando ocorreu o desfile da FLITA pelas ruas da cidade, com o tema “Ler o Mundo com Criticidade para Cidadania, Liberdade e Democracia”.
O desfile foi composto do terno de reis de Dona Totinha (Itarantim), Sociedade Civil de Itapetinga, projeto estruturante, Fanfarra de Itambé e Junina Balancê. As estantes dos escritores ficaram no pavilhão de Dona Silvana, em homenagem a uma mulher simples do povo que deixou um vasto conhecimento de suas tradições populares, inclusive na área musical.
Mesmo diante de todas dificuldades, a Feira Literária de Itapetinga deixou sua marca como mais um movimento de resistência cultural. O evento também abriu espaço para os artesões da região, com mostra de seus produtos, as artes plásticas e a escultura.
Todas as artes foram contempladas, inclusive o cinema com a apresentação do filme “Torto Arado”. No palco principal, além dos festivais de música entre os jovens estudantes, a dança e outras expressões culturais tiveram o seu lugar durante a II FLITA.