CAIU UMA ESTRELA NO QUINTAL
(Chico Ribeiro Neto)
Olhar o sol contra as bolas de gude me deu a primeira ideia de infinito, aquela luz lá bem longe.
O quintal é um tesouro. É só aprender a cavar. Veja as minhocas como saem junto com a terra. Parece que dançam! As formigas saem dos buracos. Sinal que vai chover.
A lagartixa tá quentando o sol. Quando vê a gente, se pica. Em Porto Alegre, quando faz um solzinho no inverno, o pessoal senta nos bancos dos jardins para tomar sol. O gaúcho diz que está “lagarteando”.
De manhã cedo tem muito passarinho no abacateiro. Titia manda eu sair de perto porque está com um ferro em brasa passando roupa.
A água da chuva escorre das bicas para o tanque de cimento que vôvô Chico mandou fazer perto do quintal. Era a água de gasto. A de beber vinha de uma fonte, trazida pelos burros em carotes de madeira.
Tem uma hora da tarde em que tudo fica parado, nem as moscas se mexem, as folhas não se mexem, as pessoas dormem.
Aqueles joelhos são da professora de Francês, a primeira mulher a ensinar no Ginásio São Bento, onde até então todos os professores eram homens. A capa de chuva, de nylon, tinha um buraco na frente e a vida sorria no ginásio.
Volto ao quintal. É de noite. Tem uma coisa brilhando lá no meio. Será o sapato da Primeira Comunhão, uma estrela que caiu ou um balão pegando fogo?
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