DAS BRASAS DA INQUISIÇÃO AO LEITO DA PEDOFILIA
Pesquisador e conhecedor dos meandros da Inquisição da Igreja Católica Apostólica Romana, que durou seiscentos anos, o advogado Evandro Gomes Brito, ativista estudantil na época do golpe civil-militar de 1964, faz mais uma reflexão sobre o tema em “Das Brasas da Inquisição ao Leito da Pedofilia”.
Trata-se de mais uma produção independente e esclarecedora sobre um capítulo tenebroso da Idade Média quando a Igreja Católica criou o Tribunal do Santo Ofício para punir os chamados infiéis, hereges e todos aqueles que contrariavam ou não concordavam com os ensinamentos e dogmas da instituição religiosa.
Para elucidar os fatos, Evandro Gomes cita Anita Novinsky, autora de “Inquerindo a Inquisição,” especialista no assunto e fundadora do Centro de Estudos Inquisitoriais. Segundo ele, a censura escolar não permitiu que a história verdadeira fosse debatida nos estabelecimentos de ensino.
Conforme descreve Gomes, o Tribunal foi instalado no final do século XII, para investigar e combater as heresias, doutrinas contrárias aos ensinamentos da hierarquia romana. Sua origem seu deu no Concílio de Verona, em 1184, pelo papa Lúcio III (1182-1185) como inquisição episcopal.
Do final do século XII ao início do XIII, o destaque foi o papa Inocêncio III (1198 – 1216), que mandou Domingos de Gusmão, depois canonizado São Domingos, dizimar os albigenses no sul da França. O feito histórico foi enaltecido no Concílio de Latrão, em Roma (1215).
Mais tarde, em 1229, no Concílio de Toulouse (França), o papa Gregório IX (1227 -1241) oficializou a “empresa macabra” ao fundar a “Inquisição Delegada”, através da qual a Santa Sé enviava representantes aos lugares “infectos” na luta contra os dissidentes da Igreja Católica. O papa Inocêncio IV (1243 – 1254), com a bula Ad Extirpanda, permitiu o uso da tortura, em 1252.
O padre Girolamo Savonarola foi garroteado e em seguida queimado na fogueira por ordem do papa Alexandre VI (Rodrigo Bórgia 1492 – 1503), por ter combatido a devassidão do pontífice romano que oficialmente ostentava duas amantes Vannozza Catanei e Giulia Farnese, tendo com a mesma, seis filhos, destacando César Bórgia e Lucrécia Bórgia. Alexandre VI foi o segundo filho do cardeal Rodrigo Bórgia com Vannozza e seguiu os passos do pai. O papa Inocêncio VIII (1484 – 1492) teve oito filhos.
Em 1536, o papa Paulo III (1534 – 1549) instalou a Inquisição em Portugal que só terminou em 1821, como consequência da Revolução do Porto, em 1820. Um ano depois disso, o poder legislativo de Portugal extinguiu o Tribunal do Santo Ofício. De acordo com Evandro, a Inquisição foi dividida em duas: A Medieval e a Moderna.
A primeira se baseava no fanatismo religioso e se preocupava em queimar bruxas vivas nas fogueiras, comandada pela Ordem de São Domingos. A segunda visava o confisco de bens dos judeus ricos. A Idade Média terminou em 1453 com a tomada de Constantinopla pelos turcos. No século XVI, os jesuítas assumiram o comando da Inquisição.
Na inquisição de Portugal, Evandro, autor de “Carrascos Canonizados”, assinala em seu trabalho de pesquisa que São Francisco Xavier, jesuíta subordinado a Santo Inácio de Loyola, fundador da Ordem dos Jesuítas, com o nome de Companhia de Jesus São Francisco Xavier, pediu fogueira para Goa, na Índia, queimando centenas de inocentes.
Na Espanha, a Inquisição começou antes, em 1478 por bula papal de Sisto IV (1471 – 1484) e só terminou em 1834. O arcebispo Dom Tomas de Torquemada, da Ordem de São Domingos, notabilizou-se como grande inquisidor cruel e torturador. Segundo estudos, ele mandou para a fogueira 10.220 pessoas. A sua figura inspirou o drama “Torquemada”, escrito por Victor Hugo.
Entre os séculos XVI e XVIII, a Inquisição investigou o Brasil mandando para Lisboa mais de mil pessoas, sendo 29 queimados nas fogueiras. Entre as vítimas, Guiomar Nunes foi acusada de judaísmo, depois garroteada, estrangulada com uma espécie de torniquete, e seu corpo queimado na praça do Comércio, em Lisboa, diante de uma multidão, em junho de 1731.
Lembra a história que em 1580 Portugal passou para o domínio da Espanha, formando a União Ibérica. A restauração lusitana só aconteceu em 1640 com D. João IV. No período, os jesuítas exerceram grande influencia inquisitorial (Inquisição Moderna).
Outro detalhe da Inquisição é que se a vítima pedisse perdão seria garroteada antes de ser queimada. Caso contrário, seria queimada viva. O padre baiano Manuel Lopes de Carvalho foi um dos brasileiros queimado vivo, em 1726. Antônio José da Silva, carioca, conhecido como “O Judeu”, pediu perdão, e por isso foi garroteado antes de ser queimado.
Na década de 1550, em Salvador, o bispo Dom Pedro Fernandes Sardinha, o primeiro do Brasil, exerceu funções inquisitoriais. Em 1546, o donatário da Capitania de Porto Seguro, Pero de Campo Tourinho, foi denunciado por ter afirmado que em suas terras ele era o papa e que trabalhador não tiraria folga nos domingos e feriados. A Inquisição investigou 1076 pessoas no Brasil e condenou 29 à fogueira (quase 30 mil processados em Portugal). O padre Antônio Vieira, o grande orador sacro, chegou a ser preso, em 1662.
Havia uma procissão chamada auto de fé em direção a um templo católico romano onde os condenados assistiam a missa, ouviam sermões e depois desfilavam em direção a um ponto tradicional do lugar, sendo queimados vivos nas fogueiras, ou garroteados antes do ato. Às vezes, as punições se resumiam a prisões, mas eram obrigados a vestir um traje horrível, com desenho do satanás, chamado Sambenito. Quem optasse por morrer na lei de Moisés era queimado vivo, e na lei de Cristo, era garroteado e depois queimado. Jacques de Molay, Giordano Bruno, Jerônimo de Praga e João Huss foram queimados vivos.
Sobre a pedofilia, Evandro Gomes apresenta trechos de matérias de jornais e revistas sobre o assunto no Brasil, nos Estados Unidos, Irlanda, Holanda, Alemanha e outros países, crimes estes praticados por padres que, na grande maioria, ficaram impunes, quando muito foram transferidos para outras paróquias.
Em sua opinião, uma das causas da pedofilia está no celibato imposto pela Igreja Católica e defende o casamento dos sacerdotes. Quanto a esta questão, cita o grande cisma ocorrido entre a Igreja do Oriente (Ortodoxa), na Ásia, e a Igreja Romana, na Europa, em 1054. O bispo de Constantinopla, Miguel Ceruláreo, chefiava o lado oriental, e o de Roma, o papa Leão IX (1049 – 1054) representava o Ocidente. Na discussão, a Igreja Oriental não aceitou o celibato obrigatório, mas o papa ordenou que a partir dali os padres não podiam mais se casar. Foi aí que um excomungou o outro.













