Prometi a mim mesmo não mais tecer comentários sobre esta bandalheira de nome política, nem falar desses cafajestes e canalhas que nos despiram e vergastaram seus chicotes em nossos corpos até deixar nossas carnes penduradas em retalhos. No entanto, a indignação falou mais alto e, no meu refúgio de angústia e revolta, diante de tanta humilhação, resolvi dar o meu soco e lançar minha cusparada, enquanto ainda tiver forças para tanto.

As malas, as sacolas e os bolsos abarrotados de propinas no país das olimpíadas do roubo e da face monstruosa do fascismo que está entregando nosso patrimônio público, inclusive nossa Amazônia, para os rentistas e financistas nacionais e estrangeiros, fizeram com que eu revisse o propósito de não mais tratar desta sujeira que tanto nos enoja e deprime. De tanto apanhar, ser torturado, ser dividido por falsos profetas e ser ignorado sem instrução, o nosso povo perdeu o ânimo de reagir e preferiu, lamentavelmente, se calar.

As paradas gays, os movimentos evangélicos e comemorações em louvor ao samba arrastam para as ruas cerca de um milhão de pessoas e faz barulhos, mas diante de tanto caos e desmandos o que se vê é silêncio e a omissão na hora de protestar contra os usurpadores dos nossos direitos e os que atentam contra a democracia. Nas redes sociais fazem mensagens fajutas e riem em relação aos fatos absurdos, quando o momento deveria ser de seriedade e lamento. Muitos desses autores até, então, apoiavam esses personagens detentores das espetaculares corrupções.

No país que não se fez nação e permanece dependente desde a dita independência do 7 de setembro (nada a comemorar), o povo continua emparedado pelo legislativo repugnante do Congresso Nacional, pelo executivo e pelo judiciário patrimonialista e corporativista. A esta altura, ainda existem categorias isoladas e individualistas que falam de empoderamento, talvez pelo modismo de acharem o termo muito bonito.

Como disse o jornalista Mino Carta, vivemos num Estado medieval e insignificante, colônia exportadora de matérias-primas e terra vendida, na superfície e no subsolo, a preço de liquidação. Só me estarrece e me decepciona quando ele mesmo chama o PT de clube recreativo dispensável como os demais e, ao mesmo tempo, coloca o Lula na galeria de autêntico líder nacional, ao lado de Getúlio Vargas. Só pode ter interesses financistas particulares.

Se os poderes da República foram entregues aos capi, concordo com quem defende que a saída é a revolta popular, no sentido de exigir a instalação de uma autêntica Assembleia Constituinte e não congressista, para banir de vez esta corja que humilhou interna e externamente a nação e a colocou de joelhos. Engana-se quem pensa e imagina que as eleições diretas de 2018 vão tornar o país palatável, restabelecer a ordem e nos devolver a autoestima, a moral e a ética. Nem a Operação Lava Jato vai fazer isso.

Diante de tantas safadezas e trapalhadas, não sei o que mais nos constrange, se as pessoas que apoiaram o afastamento de Dilma, as que se arrastam como serpentes venenosas ao lado de Lula, as que defendem a turma do Mordomo de Drácula, as malas cheias de dinheiro, a corrida olímpica do roubo entre Maluf, Cabral, Gedel e o imperador do COB (Comitê Olímpico Brasileiro), Carlos Arthur Nuzman, o Congresso Nacional sem moral e que não nos representa mais, ou apiedamos de nós mesmo por sermos cumplices dos crimes praticados contra nosso próprio país.
Demos um passo à frente nas décadas 50 e 60, avançamos mais entre final do século passado e início do atual, e agora estamos caminhando em retrocesso, caindo nas trevas das reformas fascistas que escravizam o trabalhador, crucifica o aposentado, reduz os programas sociais e entrega o patrimônio do país de bandeja para o capital estrangeiro, como a  Eletrobrás, os ativos da Petrobrás, campos de petróleo do pré-sal, cemitérios, companhias de saneamento, as usinas hidrelétricas, os portos, aeroportos, rodovias e até a Casa da Moeda, inclusive a floresta Amazônica (extinção da Reserva Nacional  do Cobre e Associados – Renca, com mais de 46 mil quilômetros quadrados) com todos seus recursos naturais e minerais.

A venda da Eletrobrás, por exemplo, é um caso de comunhão de bens entre poder político e econômico, com a justificativa de tapar o rombo feito pelos pilantras que banqueteiam em seus palácios com o nosso suado dinheiro. O Grito do Ipiranga se transformou em tristeza e pode bem lembrar o fortalecimento da dependência. Dezenas de bens públicos estratégicos foram colocados à venda e concedidos a compradores estrangeiros. Para se ter uma ideia do desmonte, o setor industrial que na década de 70 representava 30% do PIB, hoje não chega a 10%.

Vivemos uma reprimarização cada vez mais acentuada através de grãos (soja, milho) e minérios de ferro. Sobre esta questão, veja o que disse Oswaldo de Andrade em 1948: “O Brasil é não só o país da sobremesa, produzindo frutas, açúcar e café, mas também a própria sobremesa dos banquetes imperialistas”.

Os criminosos da elite parlamentar queriam o fim do governo Dilma e não da corrupção, com prazo de validade para a Operação Lava Jato e o fim das investigações. Agora eles tramam para usurpar o voto popular e permanecerem no poder. A marcha indica que tudo vai continuar degenerado num ambiente de baixo nível de promiscuidade, das mais bregas do mundo.

A filósofa Hannah Arendt disse no livro “Crises da República” que “as mentiras são frequentemente mais plausíveis, mais clamantes à razão do que a realidade. O mentiroso tem a vantagem de saber de antemão o que a plateia deseja. Ele prepara sua história com cuidado para consumo das massas”. As nossas são incultas e destituídas de consciência política.

Após as eleições de 2014 o baixo clero da direitona retrógrada escravista e conservadora perdeu a vergonha e saiu do armário. Agora fala abertamente a favor do capital financeiro rentista de exploração do trabalhador, sacrificando-o para pagar o roubo que deixou um enorme buraco nas contas do governo, se bem que a dita esquerda lá atrás fez os conchavos delituosos com as grandes empresas, mentindo descaradamente que estava tirando dos ricos para dar aos pobres. Deu migalhas assistencialistas. Engordou o comodismo e as nossas universidades públicas foram sucateadas.

Numa palestra do deputado Jair Bolsonaro, os judeus brancos e afortunados riam quando o nazifascista referia-se aos negros como pesadas em arrobas ou quando atacava homossexuais. A face monstruosa dessa política do Estado mínimo está nas profundas desigualdades sociais, na máquina de genocídio contra as classes populares e o sistema prisional e, sobretudo, nos corredores sujos e pestilentos dos hospitais que exibem amontoados de mortos-vivos, mais parecendo zumbis saindo das catacumbas.

Só para reflexão, o articulista André Barrocal afirmou em “Carta Capital” que o predomínio da riqueza na política é constatável pelas fortunas pessoais. Com a mercantilização das eleições via propinas, não existe nenhuma chance de um cidadão popular, honesto e de bem ascender na política e vencer uma campanha.

Veja trecho da Carta Testamento de Getúlio Vargas antes de se matar em agosto de 1954: “Contra a justiça da revisão do salário mínimo se desencadearam ódios. Quis criar liberdade nacional na potencialização das nossas riquezas através da Petrobrás e, mal começa esta a funcionar, a onda de agitação se avoluma. A Eletrobrás foi obstaculizada até o desespero. Não querem que o trabalhador seja livre. Não querem que o povo seja independente”.