NARIZ DE PALHAÇO
(Chico Ribeiro Neto)
As luzes se apagam. A orquestra ataca, acendem só as luzes do picadeiro e o coração bate mais ligeiro. Começa o desfile de todas as atrações do circo: palhaços, malabaristas, trapezistas e os dois caras do Globo da Morte. “Senta aí, meu irmão!”
O encantamento do circo faz até a pipoca ficar mais gostosa. Tudo é lindo, tudo emociona, e ninguém liga se tem um buraco na meia da trapezista.
Em Ipiaú (BA), onde nasci, quando o circo chegava dois palhaços de perna de pau percorriam a cidade, enquanto outros marcavam os pulsos das crianças com uma cruz de carvão, o que garantia o acesso gratuito ao espetáculo da noite. “Gosto muito de mentiroso, doido e palhaço”, dizia o escritor Ariano Suassuna.
Gostava de ir ver o circo de manhã, na hora da faxina. O mágico fazendo a barba e a trapezista, de short, dava banho de mangueira no elefante. Achava tudo diferente e bonito. Quem nunca teve vontade de fugir num circo?
Lembro mais dos circos Nerino e Tihany. Fundado pelo casal Nerino e Armandine Avanzi, em 1913, o Circo Nerino percorreu todo o Brasil até setembro de 1964, quando encerrou as atividades.
O fundador, Nerino Avanci, criou o palhaço Picolino, mais tarde sucedido pelo filho Roger. A Escola Picolino de Artes do Circo (hoje o Espaço Multicultural Circo Picolino), em Salvador, recebeu este nome em homenagem a Roger Avanzi, fundador da primeira escola de circo do Brasil. O admirável trabalho do Circo Picolino já completou 40 anos.
Veja um trecho da entrevista do palhaço Plim-Plim (José Carlos), postada no congressoemfoco.com.br, em 12 de dezembro de 2009:
“Em manifestações, por que o nariz de palhaço te incomoda?”
“Eu, sinceramente, quando vejo uma cena com alguém com um nariz de palhaço, sem estar no ofício, eu me sinto ofendido. Tenho isso como profissão e as pessoas colocam como uma coisa banal. Eu vivo daquilo. O cara vai lá fazer um protesto de saúde e usa um nariz de palhaço. Eles poderiam usar uma máscara da gripe, mas usam o nariz de palhaço como banalização”.
Nenhum palhaço gosta quando se usa o termo “palhaçada” para se referir a uma atitude ou manifestação considerada ridícula, uma brincadeira de mau gosto, presepada.
Nunca esqueço o que o ator Bemvindo Sequeira me contou uma vez. Ele, para se aprimorar como ator, resolveu passar uns dias num circo mambembe no subúrbio de Periperi. Teve uma noite em que o bebê do palhaço estava com febre alta. O palhaço fazia sua apresentação no picadeiro e no intervalo corria para trás da cortina, onde estava o berço, para tomar a temperatura do filho. Minutos depois, voltava pra fazer graça.
O circo é uma lição de vida. É bom fazer sempre uma graça, mesmo que tenha uma febre atrás da cortina.
(Veja crônicas anteriores em leiamaisba.com.br)











