UM BRASIL FALSIFICADO
Como se diz no jargão jornalístico, vou pegar aqui um “gancho”, ou no popular mesmo, uma “ponga” do meu colega Chico Ribeiro Neto, com suas exímias crônicas, com quem tive o privilégio de trabalhar na redação do jornal A Tarde, lá em Salvador, por muitos anos, para falar um pouco desse nosso Brasil falsificado e misturado.
Para começar, a gente costumava tomar umas pingas nuns botecos cavernosos depois das matérias, mesmo sabendo que se tratava de cachaça “batizada”. Muita doideira depois de um dia de estresse correndo atrás do fato! No outro dia era aquela ressaca danada e batia aquela enxaqueca.
– Fala sério, meu caro e cara, dá para confiar nos produtos brasileiros, no que você come e bebe, principalmente nos dias quadrilheiros de hoje? Poderia fazer aqui uma lista de itens falsificados que atravessaria o Oceano Atlântico até a Europa, inclusive remédios. Nem vamos falar da gasolina!
Quando se adquire um objeto imprestável que dura poucos dias, sempre quem leva a fama é o nosso país vizinho, aqui bem do nosso lado. “Isso aqui é paraguaio, meu irmão”! Quem mistura e falsifica mais? Pode dar empate – respondeu de lá, o meu camarada.
Quando era repórter da Editoria de Economia, lá pelos anos 70 e 80, uma vez dei um “furo” de reportagem sobre exportadores baianos de sisal que colocavam bagaços e até pedras nos fardos para pesar mais. Isso causou um escândalo no exterior e muitos países deixaram de importar o nosso sisal. O mesmo se fazia com o algodão.
Essa coisa de falsificação e misturada vem desde 1500 quando Cabral aqui chegou e trouxe de Portugal presentes falsificados, de quinta categoria, para conquistar a curiosidade e a “confiança” dos índios. Com a chegada da Família Real, em 1808, a coisa piorou mais ainda.
Com a abertura dos portos para os ingleses, boa parte das compras era feita em ouro que foi logo se desvalorizando. Depois veio a prata que também sofreu uma queda drástica. Partiram, então, para as moedas de cobre. Com elas surgiu a macuta ou xenxém, que era o cobre falsificado.
Quando esse metal começou a faltar, aí entrou uma enxurrada de cobre falso no mercado interno. Em 1832, mais de 40% das moedas em circulação no país eram falsas. Até os governos pagavam os salários dos seus empregados com dinheiro falsificado e a coisa rolava de mão em mão.
Nos dias atuais estamos acompanhando aí os estragos do metanol nos destilados, com várias mortes e sequelas graves de cegueira. Nem o “santo” está querendo mais aquela “pinguinha” que o bêbado joga ao lado do balcão antes de dar aquela golada do copo.
Dizem por aí a fora que até o “suicida” está hoje desconfiado do veneno para se matar. Pode ser uma substância qualquer sem o efeito desejado. Por um lado, isso é até bom porque o indivíduo pode ter a chance de repensar sobre o lado prazeroso de se viver, mesmo diante de tantas falsificações e golpes.
Por falar em metanol, muita gente se esqueceu e também a própria mídia, com relação às mortes ocorridas em Iguaí, ou Ibicuí, aqui na Bahia, se não me engano, no final dos anos 90 e início de 2000. Ainda atuava na Sucursal do A Tarde, em Vitória da Conquista.
No início era um mistério, mas depois se descobriu que muita gente estava tomando cachaça misturada com metanol vindo de tambores que foram utilizados no transporte do líquido perigoso. Ninguém se atentou para este caso de repercussão nacional.
A humanidade se deteriorou ao ponto, em termos de maldade, tudo com a intenção de se obter lucros ilícitos, que não dá mais para se confiar em ninguém. Qualquer “bobeira” e você leva aquele tombo! Eu mesmo fui vítima de um recentemente.
Você não sabe ao certo hoje se o amigo ao seu lado numa mesa de bar é verdadeiro ou falsificado. Tem aquele olhar, aquele aperto de mão e aquele abraço falso com aparência de ser leal. Imagina político em época de eleições!
A pessoa hoje tem que treinar e aprender a dormir com um olho fechado e o outro aberto, e não pode piscar. Alguém por aí pode até achar isso um exagero, mas não é, meu amigo, confie desconfiando. “É, mas temos que confiar nas pessoas” – diz o positivista.