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:: 2/out/2025 . 23:05

A FELICIDADE NOS PÉS

(Chico Ribeiro Neto)

Par ou ímpar? Vai ser quatro na linha e um no gol. Deu ímpar, é você quem escolhe.

Vai começar o “baba” em cima dos paralelepípedos da Rua Gabriel Soares, no pé da Ladeira dos Aflitos, em Salvador. Uma trave era formada por um poste e uma pedra. Do outro lado do “campo” a outra trave tinha duas pedras. É início da década de 60. Tenho uns 12 anos.

A duração do “baba” era medida por tempo ou por gols. “Quem tomar o primeiro gol sai” era a lei quando havia outros times esperando. Muitas vezes não tinha duração, a gente jogava até cansar.

Sem juiz, o “baba” era apitado pelos próprios jogadores. “Não foi gol, não, a bola foi alta”. “Alta uma porra!” Não havia o travessão e bola alta ou gol era questão de interpretação. O VAR estava longe.

O “baba” era interrompido quando um idoso ou mulher com criança precisava atravessar a rua. “Para a bola”, “parou, parou”, gritava logo alguém. Parava também quando passava um carro, um Citroen preto ou um DKW Vemag.

O “baba” era interrompido também pela Polícia Militar, após telefonemas dos nossos vizinhos preocupados com seus jardins e vidraças. A gente corria com medo, mas os policiais só queriam a bola. Mas havia sempre outra de reserva.

Preparado pra bater a falta. Até que a bola saiu alta, quase é gol, mas a cabeça do dedão ficou lá no paralelepípedo. Joelho ralado era quase todo dia.

O jogador ruim era um “arranca-toco” que só sabia “dar nó (drible) de carroceiro”. Igualmente ruim era o dono da bola, geralmente escalado pra “pegar no gol”. Ninguém podia reclamar muito do seu desempenho, senão ele pegava a bola e ia embora.

Se der uma “dor de facão”, aquela “pontada aguda e lancinante na lateral do abdômen”, coloque umas três folhas verdes na cintura que passa logo. A zorra complicou na área e o zagueiro “deu um São João” (chutaço pra cima) pra aliviar a defesa.

Aquele cara tomou um “banho de cuia” (chapéu) da porra e o outro foi reclamar de falta. “Futebol é pra homem, porra!”

Quando havia muitas faltas dos dois lados era dado o grito de guerra: “O baba virou!” Era a senha pra se bater à vontade e as faltas estavam suspensas. Salve-se quem puder.

Aos domingos, a gente pulava o muro do Instituto Feminino, no Politeama, para jogar na quadra. Uma tranquilidade, pois não passava carro nem vinha a PM tomar a bola.

Fomos jogar contra o time do Politeama, 5 na linha e 1 no gol. Botamos logo 1 x 0 no começo. Aí nosso zagueiro deu uma raspada em André Catimba (mais tarde ídolo do Vitória e do Grêmio), que se estatelou no chão. Aí o bicho pegou. André já tinha fama de brigão e eles tinham o time e a turma em volta nos ameaçando. Nós éramos cinco, apenas o time.

Aí, toda bola dividida com André, o zagueiro saía de baixo e Catimba fazia o gol. Tomamos 8 x 1, mas saímos sem tomar porrada.

Chego na janela e lembro dos gritos de “olha o baba!” Era a hora de arregimentar os amigos para aquela festa em torno da bola. Uma aventura mágica, feliz e eterna. “Foi gol, porra!”

(Veja crônicas anteriores em leiamaisba.com.br)

 

 

 

O FLAGELO DAS SECAS E O SENSO ÉTICO

Entre a segunda metade do século XIX (1877) até meados do século XX (1932/35), principalmente, as secas no agreste nordestino, ao lado do cangaço bandido, ceifaram a vida de milhares de pessoas. Os governantes foram omissos e pouco fizeram para minimizar esse flagelo mortal.  Mesmo assim, poucos sertanejos se renderam ao banditismo do cangaço. Em seu livro “Os Cangaceiros”, o pesquisador Luiz Bernardo Pericás narra cenários de horror, onde demonstra que a maioria preferia morrer que cair na criminalidade. Sobre essa questão, o autor descreve que ”é bom lembrar que a maioria da população sertaneja, apesar da miséria, exploração e falta de emprego, não ingressou no cangaço. Em alguns casos, quando havia épocas de secas intensas, de fome e de miséria, muitos retirantes pobres chegaram ao ponto de vender as próprias roupas do corpo e fazer o percurso do Sertão cearense à capital completamente nus, só para que pudessem ter dinheiro para comprar alimentos. Outros flagelados optavam pelo suicídio a cogitar se tornar bandoleiros. Havia também aqueles que chegavam a comer ratos, cães, gatos, insetos, couro de boi e até mesmo a matar e comer crianças”.  Na intensa estiagem de 1932, cerca de 220 mil operários trabalharam como contratados do Ifocs (espécie de Dnocs daquela época) no Sertão, mas não existem indícios de que alguns daqueles homens tenham se incorporado aos bandos de cangaceiros. “A índole e o senso ético da maioria dos nordestinos não permitiam que decidissem entrar na marginalidade, mesmo em situações extremas”.

 

NÃO ESPEREM MAIS POR MIM

Poema de autoria do jornalista e escritor Jeremias Macário

O velho elefante,

Cansado e ofegante,

Se escora numa frondosa árvore,

Sente ser chegado seu fim;

Manda seu rebanho seguir em frente,

E diz não esperem mais por mim.

 

Quando o zunir do vento

Chicotear minha alma,

Ferir e dilacerar meu passado,

E o passo ficar mais lento,

Trocar o não pelo sim,

Digo que sigam em frente,

E não esperem mais por mim.

 

Quando o futuro encurtar meus planos,

O amanhã anunciar menos anos,

As flores murcharem em meu jardim,

Sigam em frente, gente!

E não esperem mais por mim.





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