LEMBRO AINDA MENINO
Poema de Jeremias Macário, incluso no CD Sarau e declamado pro Edna
Quando no peito a dor explode
De gente vaga e de pele pálida,
Lembro ainda quando menino
Alegre contente vira-lata latino,
Saído do ventre mãe camponesa,
Da poeira da terra rala e árida
Onde o fruto da chuva eclode.
Mãe senhora, santa piedosa!
Labuta a roça sem temer a hora,
Com sua alma doce e carinhosa,
Que nem o tempo lhe devora.
Nesta patrulha de tanta canga,
Do povo descrente em sua gente,
Lembro ainda moleque menino
O raiar do dia sereno e quente,
Daquele rosto enrugado ofegante,
Com uma enxada e sua capanga,
Clamar ao seu Supremo Divino
Pra forças ter na lida escaldante.
Lembro do meu pai rogar aos céus
Para o Deus de nós compadecer,
Molhar o solo, plantar a semente
Para um dia o alimento colher
E matar a fome de todos os seus.
No algoz capital de várias caras,
De multidões querendo vencer,
Lembro ainda descalço menino
A flor ditosa daquele roxo Ipê
Na matinha ao lado do sol a pino,
Espraiando a seca no chão lunar,
Do Ouricuri, o Sofrer partindo
Do açoite verão das coivaras.
Lembro que vi o aguaceiro bater,
No gravatá pousar o beija-flor,
O canto da Juriti nas matas raras,
As araras acordando o amanhecer,
O voar de arribação das passaradas,
Renovar a vida verde nas caiçaras,
E todo o sertão se derramar em cor.











