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:: 4/mar/2022 . 23:40

CURIOSIDADES DO TRÁFICO NEGREIRO (II)

O livro de Laurentino Gomes, “ESCRAVIDÃO” mostra muitas curiosidades do tráfico negreiro, muitas das quais de horror, mas que precisam ser conhecidas por historiadores, estudantes e todos brasileiros sobre o que aconteceu nos quase 350 anos de escravidão no Brasil.

Em prosseguimento aos relatos do autor, vamos destacar alguns deles:

Aos reis e chefes locais do continente africano, cabia organizar as expedições militares para captura dos escravos. Os chefes definiam os preços, controlavam a oferta, faziam alianças e fechavam negócios com diferentes interlocutores europeus, em geral, rivais entre si, de modo a evitar o monopólio de qualquer país ou grupo de compradores em seu território.

No vizinho porto de Ajudá, entre final do século XVII e o começo do século XVIII, traficantes europeus tinham de pagar o valor equivalente a 37 ou 38 escravos (cerca de 375 libras esterlinas) por navio negreiro em troca da autorização para ali comprar cativos. As despesas incluíam ainda impostos, pagamentos para altos funcionários reais e intérpretes locais.

Por fim, o próprio rei local tinha a prerrogativa de vender, em primeira mão e a preços mais elevados, um determinado número de escravos de sua propriedade. Só, então, começavam as outras negociações. De acordo com o historiador, John Russell-Wood, “os participantes africanos do tráfico incluíam os príncipes e os mercadores mais ricos e poderosos do continente. A elite africana estava profundamente envolvida com a venda de escravos”.

As dívidas assumidas em cada etapa dessa rede de suprimentos, segundo Laurentino, eram negociadas em letras de crédito (letras de câmbio) a serem quitadas na venda dos escravos. Essas letras eram tão comuns que em meados do século XVIII eram utilizadas como moeda corrente em Benguela (Angola).

A ponta mais avançada dessa rede de negócios era o próprio capitão do navio negreiro, responsável pela compra dos escravos na costa africana. Além de negociadores, os comandantes desempenhavam algumas funções extras na cadeia do negócio.

Em Portugal e no Brasil, os investidores do tráfico contratavam os capitães para cobrar e negociar dívidas, ou processar na justiça os caloteiros situados em regiões remotas. Os capitães, na verdade, eram donos de parcelas expressivas das cargas que transportavam, conforme assinalou o historiador Roquinaldo Ferreira.

Havia preferência por escravos a partir de determinadas regiões. Os angolanos, por exemplo, eram considerados dóceis e bons trabalhadores nas lavouras e no serviço doméstico. Os oriundos da chamada Costa do Ouro, ou da Mina (Gana) eram bons na mineração. Da Guiné chegavam africanos experientes nas atividades pecuárias e de pastoreio.

Segundo relato do padre jesuíta André João Antonil, alguns eram arrogantes e rebeldes. Para o Brasil vieram os congos, ardas, minas, São Tomé, Angola, Cabo Verde e poucos de Moçambique. Os ardas e minas são robustos. Os de Cabo Verde e São Tomé, mais fracos. Os de Angola e do Congo, mais capazes de aprender ofícios. Os mulatos são soberbos, viciosos e mais valentes.

Desde o início do tráfico, os europeus tiveram que se adaptar a um padrão monetário peculiar na África que usava conchas marinhas como moeda, em lugar de peças de metal ou papel. Uma dela era chamada de zimbo, coletada nas praias da Ilha de Luanda (Angola), sob regime de monopólio do rei do Congo. Eram tão populares que padres e bispos recebiam salários e doações em zimbos.

Essas conchas eram também encontradas nas praias da Bahia. Eram exportadas pelos portos de Salvador e Rio de Janeiro e usadas nas compras de escravos africanos. Eram tantas que provocaram uma desvalorização monetária.

Outra moeda-concha muito valorizada na África eram os cauris, espécie de búzios originários das Ilhas Maldivas, no Oceano Índico, mais apreciado no Golfo da Guiné do que as similares angolanas. Eram comprados na Índia por holandeses, franceses, ingleses e portugueses que exportavam para a África.

No auge do tráfico, no século XVIII, holandeses e ingleses importavam cerca de 40 milhões de búzios cauris por ano. Juntos teriam movimentado quatro bilhões de conchinhas entre 1700 a 1790. Por volta de 1650, em Aladá, se podia comprar uma galinha por cerca de dez conchas. Um século mais tarde, a galinha valia trezentas conchas.

Quase todos países europeus se envolveram no comércio de escravos, mas portugueses e brasileiros foram os maiores ao longo de quase quatro séculos.

 

 





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