No livro “Pele Negra, Máscaras Brancas” (1951), do psiquiatra martiniquense Frantz Fanon, o racismo não é visto como algo específico de certas sociedades, como costumava analisar à época. Na obra, o autor examina o racismo dos franceses.

De acordo com o professor Muryatan Barbosa, em “Intelectuais das Áfricas”, Fanon chega à conclusão de que, na verdade, existe uma essência racista, que pode se apresentar na aparência de formas diversas. Isso ocorre, ainda conforme o autor, porque os processos de racialização são sistêmicos. “Eles prenderiam tanto negros quanto brancos em uma lógica binária e maniqueísta”.

Ao abordar a questão natural da inferioridade de uns negros em relação a outros brancos, para Fanon, o racismo nega a dialética do Eu e do Outro, que seria a base da vida ética. “A consequência disso é que todo processo de desumanização é aceitável”. Ele entende que o racismo é fruto do colonialismo.

“Se há um complexo de inferioridade, este surge após um processo duplo: econômico, inicialmente; em seguida, pela interiorização, ou melhor, epidermização dessa inferioridade” – destaca Fanon.

Na análise do professor Barbosa, em 1952, o Partido Comunista Francês ainda possuía uma posição dúbia quanto a questão colonial francesa, sem defender abertamente a necessidade das descolonizações africanas. Diante desse aspecto, muitos intelectuais negros saíram do partido, como Aimé Césaire, em 1956.

Em sua luta revolucionária na libertação da Argélia, Fanon sempre se colocou contra a exploração, a miséria e a fome. No início da guerra, o psiquiatra tratava cada vez mais pacientes colonialistas e colonizados, que tinham passado por processo de violência extrema, torturados e torturadores, dada a insanidade da insurgência francesa.

Em 1956 escreveu uma carta pública se demitindo do hospital argelino onde trabalhava. Isto foi o início de um novo ciclo revolucionário, afastando-se das relações com a maior parte da esquerda francesa, que não se posicionava contra o colonialismo.

A partir dali, Fanon buscou só manter relações pessoais com os que tinham o mesmo compromisso político que ele, ou que poderiam ser importantes para divulgar a revolução argelina no exterior. Em 1957 se entregou de vez à Frente de Libertação Nacional (FLN), como ministro da Informação e representante do Governo Provisório Argelino no Exterior.

Mesmo assim, ele e outras lideranças, entre 1958 e 1959, foram secundarizados pelo grupo hegemônico do primeiro presidente argelino Bem Bella. Nesses anos, exerceu com afinco a função de editor do jornal El Moudjahid.

No I Congresso dos Escritores e Artistas Negros, em Paris (1956), Fanou escreveu o texto Racismo e Cultura onde defendeu uma questão primordial: o racismo deve ser entendido desde uma abordagem sistêmica e histórica. “Ele é parte integrante de uma condição de hierarquização sistêmica, perseguida de maneira implacável, visando um trabalho de escravização econômica, ou mesmo biológica, de um grupo populacional sobre outro”.

Em seu entendimento, o elemento mais visível do racismo está na opressão sistematizada de um povo. “Ele é a norma desta sociedade e desta cultura que busca inferiorizar e desumanizar povos subalternizados”. Em seus ensaios, Fanon afirmou que o racismo é próprio de um processo de opressão, de desumanização e de hierarquização sistêmica num sistema determinado. O colonialismo é uma das formas dessa opressão, mas não a única.

Em um trecho de seus textos, ele chegou a dizer que a opressão militar e econômica precede, possibilita e legitima o racismo. Fanon aponta duas características de racismo, a capacidade de introjeção e naturalização, bem como, por ser funcional. Nesse caso, o racismo precisa estar sempre se remodelando. Antes justificava-se com argumentos biológicos. Nos tempos atuais são justificativas mais sofisticadas, como culturais e ou psicológicas atribuídas aos grupos inferiorizados – assinala o escritor.

Fanon faz um paralelismo entre as sociedades coloniais e racista. Para ele, ambas são fruto de um mesmo processo de subjugação de alguns grupos populacionais sobre outros. Os termos usados por ele seriam parte de um mesmo processo de dominação que possuiria um mesmo caráter  estrutural, num sistema determinado, que nasce com o colonialismo, mas não morre com ele.