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O CRONISTA FOTÓGRAFO

Fotos de José Carlos D´Almeida

Com sua perspicácia e sensibilidade de ver o que muita gente não consegue enxergar, o fotógrafo José Carlos D´Almeida, filho de Itapetinga, mas conquistense por adoção, é um cronista do tempo através de suas imagens clicadas de suas lentes, numa harmonia entre o obturador e a luz. Ele consegue muito bem preencher os espaços para uma reflexão, num colorido com mais destaques para o preto e o branco.

Ao captar pessoas, objetos, animais, prédios, a natureza e a vida cotidiana na cidade e no campo, suas fotos são reportagens e matérias jornalísticas, mas também delas brotam sentimentos, razão e emoção, como as que estão expostas na entrada do centro comercial Itatiaia, retratando, principalmente, os momentos difíceis de todos nós no período do isolamento social por causa da Covid-19, entre o meado do ano passado e em 2021.

Suas crônicas fotográficas se eternizaram no campo político e social em diversos jornais e revistas regionais, e até no exterior quando D´Almeida, como assim é mais conhecido, esteve por uns tempos em contato com a cultura europeia entre a França, Portugal e a Bélgica. De lá, com sua analógica, não muito sofisticada, trouxe na bagagem um monte de negativos que podem dar grandes exposições.

Conheci D´Almeida com sua máquina na mão produzindo suas crônicas fotográficas logo quando aqui cheguei, em 1991, para assumir a chefia da Sucursal “A Tarde”, sempre com aquele jeito simples e humilde, sacando do seu alforje uma novidade de mais uma imagem captada pela sua lente, com um olhar diferenciado. Pode também ser considerado de caçador de imagens.

Não é um literato do romance, da história, ensaísta ou ficcionista, mas é um escritor jornalista da fotografia onde suas imagens valem por mil ou mais palavras. A sua exposição no Itatiaia revela isso nas ruas e lugares por onde transitou, quase que desertos por causa da pandemia, mas as fotos registradas por sua máquina têm significado profundo, lírico, expressionista e, às vezes, um melancólico surreal.

O POVO ADORA SER ENGANADO

A Black Friday diz que o frete é grátis e que o produto é dividido em 24 meses sem juros. A carneirada entra na onda do supérfluo, cai dentro e compra sem precisar. Diz que é tudo uma maravilha nos preços. A Justiça Eleitoral faz a propaganda de que seu voto vai tudo mudar. O político fala do tudo pelo social, com a promessa de dias melhores.

A impressão que se tem é que o povo brasileiro adora mesmo é ser enganado e acredita em fake news, que a terra é plana, que o cara foi eleito por Deus. Isso só pode ser masoquismo. Como diz a canção, tudo muda para ficar em seu lugar. As propagandas na mídia estão cheias de enganação. O sistema é assim, constituído para encher a pança dos mais ricos na acumulação de bens.

Há séculos que o povo brasileiro é enganado, e basta chegar a época das eleições para começarem as enxurradas de mentiras. A lista de enganação é extensa porque a nossa população, a maioria inculta e iletrada, é uma presa fácil. Você acredita que todos são iguais neste Brasil? Que não existe racismo, e que somos todos solidários? Que a flexibilização segue os protocolos, quando a fiscalização é deficitária?

Quando arquitetaram a reforma trabalhista, os patrões do capital disseram que ela iria abrir mais vagas no mercado. O desemprego aumentou; acabou a negociação salarial; o rendimento do trabalhador caiu; a informalidade subiu e a reforma se transformou numa escravidão moderna onde o funcionário, chamado de colaborador (outra enganação), é explorado sem piedade.

Os termos mudam para se dizer que está havendo uma evolução. Tiraram o subdesenvolvido e colocaram o emergente que se afundou. A Secretaria de Transportes é agora de Mobilidade. Mas tudo continua ainda pior. A palavra mais em moda nos tempos atuais é resiliência, mas como ter se não lhe é dada a oportunidade para vencer, quando se joga a meritocracia no lixo.

Somos enganados em tudo. É como uma embalagem bonita, colorida e chamativa num produto sem conteúdo. Tudo porque deixamos nos iludir pela emoção do momento, e caímos no conto do vigário. Somos vítimas do estelionato e da falsidade ideológica em todos setores, a começar pela política. O preto pode se tornar branco, e o vermelho em verde.

Tudo que acontece de mal e ruim colocamos Deus no meio para resolver as pendengas. O homem predador destrói o planeta, e o fanático diz que é Deus que assim quis. O fiel acredita em tudo que o pastor fala, até que o caroço de um feijão cura a Covid. Tem uma outra canção que diz que é preciso morrer para poder viver.

E assim continuamos vivos-mortos, sendo o tempo todo enganados pelos mais astutos e mentirosos. Não passamos de uma manada conduzida pelo boiadeiro para o matadouro. Somos todos os dias enganados por esse emaranhado de leis, cheias de brechas que só servem para a elite. Está aí o consumismo desvairado e irracional que cada vez mais detona o nosso meio-ambiente.

Você acredita nessas reuniões do clima entre o capitalismo, que promete reduzir o metano e o dióxido de carbono no ar, mas com suas metas de cada vez mais aumentar o Produto Interno Bruto do seu país? Só uma coisa é certa, que a destruição do planeta não tem volta.

 

 

OPERAÇÃO VINDICTA: PMS SÃO ACUSADOS DE EXTORQUIR 200 MIL DE FAMÍLIA DE CIGANOS

Por Anderson Ramos e Gabriel Lopes 

Os policiais militares que foram presos na manhã nesta sexta-feira (26) (leia mais aqui), em Seabra e Serrinha, durante a Operação Vindicta, são acusados de extorquir R$ 200 mil de uma família de ciganos. A informação é da Polícia Civil.

Conforme a polícia, dos quatro mandados de prisão, apenas dois foram cumpridos. Os outros dois PMs que não foram encontrados são de Salvador e estão lotados em Paripe, ainda de acordo com as informações.

No início da manhã, o Coordenador de Repressão a Extorsão Mediante Sequestro, delegado Adailton Adan, afirmou que os policiais “fazem parte de uma quadrilha envolvida em extorsão mediante sequestro que atua em Salvador e Interior do estado”.

A quadrilha extorquiu a quantia de R$ 200 mil de uma das vítimas e a mantinha em um cativeiro. A Polícia Civil informou, ainda, que o sequestro ocorreu no dia 22 de agosto e a vítima foi libertada no dia seguinte.

A operação foi deflagrada pela Coordenação de Repressão a Extorsão Mediante Sequestro do Departamento de Repressão e Combate ao Crime Organizado (Draco), 13ª Coordenadoria Regional de Polícia de Interior (Coorpin/Seabra), a Coordenação de Operações Especiais da Polícia Civil (COE) e a Corregedoria da Polícia Militar (relembre aqui).

 

UM ESTRATEGISTA QUE LUTOU PARA UNIR DUAS POPULAÇÕES AFRICANAS

De formação binacional, de Cabo Verde e Guiné-Bissau, Amílcar Cabral foi um estrategista de visão nacionalista que procurou driblar os esquemas de repressão dos colonialistas portugueses, visando unir dois povos com etnicidades diferentes. Seu assassinato até hoje não ficou esclarecido, mas existe uma forte versão de ter sido a mando de autoridades de Portugal.

Quem fala sobre ele no livro “Intelectuais das Áfricas” é o professor Fábio Baqueiro Figueiredo, doutor em Estudos Étnicos e Africanos pela Universidade Federal da Bahia. Cabral, em sua descrição, nasceu em Bafatá, leste da Guiné-Bissau, em 1924, e era filho de dois cabo-verdianos, cuja nação já estava integrada ao império, enquanto na Guiné, os portugueses lutavam para consolidar a dominação territorial.

Cabral, de acordo com o professor, deveu sua formação inicial às estruturas escolares instaladas em Cabo Verde, para onde emigrou em 1932, junto com a família. Em 1945, após terminar o sétimo ano do liceu, obteve, por concurso, uma bolsa para o Instituto Superior de Agronomia em Lisboa. Dos 220 ingressantes, Amílcar era o único negro da turma.

Na época da ditadura salazarista e depois da II Guerra Mundial, Cabral participou do Movimento de Unidade Democrática da Juventude e, na Casa dos Estudantes do Império, chegou a ser vice-presidente da unidade, ao lado de Acácio Cruz. Essa nova direção reforçou o papel da instituição como espaço dinamizador de debates sobre a realidade colonial.

A Casa rendeu um núcleo importante de intelectuais de diversas correntes, inclusive marxista, mas houve uma separação, por vontades próprias e imposição da repressão estatal, a partir da década de 1960. No entanto, eles continuaram se correspondendo e se agruparam no Movimento Anticolonial que se transformou em movimentos nacionalistas articulados por uma organização unitária denominada de Frente Revolucionária Africana para a Independência Nacional.

Essa Frente foi substituída pela Conferência das Organizações Nacionalistas das Colônias Portuguesas. Nesse tempo, Cabral publicava duras críticas ao governo ditatorial português e se recusava a negociar a independência de suas colônias nos órgãos de esquerda da imprensa internacional. Ele foi nomeado diretor Adjunto dos Serviços Agrícolas e Florestais da Guiné.

No interior, ele teve contatos com a realidade da maioria camponesa da população e com as diversas etnias balantas, fulas, manjacos, mandigas e outras que eram usadas pelos portugueses para se dividirem em torno da independência nacional. Foi aí que Cabral também usou da sua estratégia em torno de uma união nacional, sempre se expressando em nossos povos e nossas populações. Ele procurou unir as tribos em torno de um ideal nacionalista comum.

Em 1960 viajou a Tunes para a II Conferência Pan-Africana onde se uniu a antigos colegas de Lisboa, para abrir escritórios oficiais das organizações nacionalistas nos países já independentes. O primeiro ponto de apoio foi em Conari, ex-colônia francesa da Guiné. A essa altura, passou a ser o líder da organização nacionalista.

A luta armada, conduzida pelo Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC), desenvolveu-se, exclusivamente, no território da Guiné, e foi iniciada em 1963. Dez anos depois, o Partido já dominava maior parte do território guineense, declarando, unilateralmente, a independência, acelerando a queda da ditadura portuguesa. Entretanto, não viu esse dia, pois foi assassinado, em 20 de janeiro de 1973, em Conari, por guerrilheiros do seu próprio partido, em circunstâncias nunca esclarecidas.

As versões do seu assassinato apontavam para a polícia secreta de Portugal e para o governador da Guiné, o general Antônio de Spínola. Outros disseram que não passou de um acerto de contas entre guineenses e cabo-verdianos no seio do partido por pessoas que buscavam cargos em postos superiores. Existe também a versão da participação do presidente da Guiné-Conari, Ahmed Touré, que tinha a intenção de anexar a Guiné ao território do seu país.

Diz o professor Fábio, que Cabral permaneceu sendo o líder intelectual do processo político e militar guineense, e referência para o pensamento nacionalista africano. “Cabral deu uma contribuição teórica original e, na maior parte das vezes, mais coerente e estruturada que outros intelectuais africanos diretamente envolvidos na política”.

 

MINHAS ARTES!

Entre um texto político, social ou qualquer assunto que vier na cabeça, uma leitura e uns versos sobre a vida, vou temperando  o tempo com minhas artes de marcenaria (herança do meu velho sábio pai) e algumas “esculturas” trançadas de cipó que aproveito do muro do terreno vazio, por sinal cheio de entulhos, vizinho da minha casa. Assim vou ocupando esse vazio existencial brasileiro, turbinado de ódio e intolerância nas redes sociais (não tenho smartphone). O passatempo resultou em mais de dez peças, entre elas mesas, estantes, bancos, cinco esculturas de cipó ,e a aventura de montar um oratório que, na minha concepção, terminou sendo uma capela-oratório. E olha que nem tenho religião! Assim vou cumprindo o meu dever de passageiro da vida, circulando num trem que ainda não chegou à minha estação de saltar. Do espaço das janelas vou apreciando as paisagens, umas secas, áridas, outras verdes floridas, morros, planaltos e planícies, ora com momentos alegres, tristes e melancólicos. Não faltam as reflexões, e só delas esqueço quando estou fazendo alguma coisa na espera do meu destino. Não sei o que virá depois, e se terá amanhã, mas vou fazendo as minhas artes.

ENTRE ENGAÇOS E BAGAÇOS (VII)

Na terra de Gregório, boca do inferno, nos embriagamos de vinho,

E com ele divulgar poemas de protesto pelas vias do Pelourinho,

Em oratório de igrejas, e até em quartos de “loucos” em sanatório;

Do erótico, colamos cartazes em bregas e em porta de cemitério;

Rodamos toda velha Bahia e tomamos mais uma na Praça da Sé,

Onde rola mistura de todas as religiões que vão nas pegadas da fé,

Como no canto profundo de Caetano, Capinam, Gil e de Tom Zé,

Que deram voz e força a todo o nosso povo massacrado do Brasil.

 

Em Salvaboa no trapiche da Gamboa, com a cara da mãe Lisboa,

Fui “Ouro de Tolo” como um besta do interior com o profeta Raul,

Do Seixas de “Sociedade Alternativa”, que me passou suas deixas,

Pra ser um cara libertário e não entrar em conversa mole de otário,

Como ser moleque de Jorge Amado e entrar em “Capitães da Areia”,

Em Dona Flor fui um dos maridos e Tenda dos Milagres um teste;

Rabisquei linhas de Seara Vermelha, Gabriela e Tieta do Agreste;

Me ensinou criar personagens e como sempre faço, dei forte abraço,

No Amado, Mário Cravo, Glauber cinema-poema e artes plásticas,

Deus e o Diabo que transaram na Terra com o Dragão da Maldade.

 

Ah! Não podia deixar de ir até Ipiaú conhecer a reforma agrária,

Implantada pelo humilde escritor comunitário social Euclides Neto,

Com quem bati um papo reto e com ele e outros arrastei A Enxada,

De um retado nas palavras de Prefeito, a Revolução e os Jumentos;

Corri sertão virado para ver Osório Alves em Santa Maria da Vitória,

A quem dei o meu pitaco lendário na história de Porto Calendário,

E em Bahiano Tietê e na Maria Fecha a Porta Prau Boi não te Pegar;

Passei na Lapa, fiz rezadeira e proseei em Caetité com Anísio Teixeira.

 

Na capital com morenas Além do Carmo curti em noites fantásticas,

Depois pedi a benção a mãe Menininha da Federação, lá do Cantoá,

Que em seu terreiro me deu reza e patuás para dançar com os orixás,

E ainda brindei um trago do raro cordel com Cuíca de Santo Amaro.

 

Bahia caraíba-tupinambá de João Ubaldo em “Viva o Povo Brasileiro”;

Com ele comi lagarto, bebi água da bica e uma cachaça em Itaparica,

E fui à grande freira com Milton Santos, o mestre da geografia social,

Que me indicou visitar o historiador Luiz Alberto Moniz Bandeira,

Baiano profundo e conhecedor da Formação do Império Americano,

De Marti a Fidel e de A Casa da Torre de Garcia, indicado ao Nobel,

E de sua biblioteca sai zonzo de tanto conhecimento e pinga com mel.

 

GRUPOS AFROS REIVINDICAM MAIS DIREITOS EM SESSÃO ESPECIAL DA CÂMARA

A chamada “suíça baiana” ainda deixa muito a desejar e está longe de reconhecer, como deveria, a importância identitária da cultura e da religiosidade negra exercida no município de Vitória da Conquista que abriga dezenas de territórios quilombolas, terreiros de candomblé, entidades de capoeira e outras comunidades que expressam suas linguagens artísticas em diversas áreas.

Esta realidade foi ontem (dia 24/11) estampada nas vozes de representantes da etnia negra praticante, principalmente, do candomblé durante a realização da sessão especial da Câmara de Vereadores, que homenageou a Semana da Consciência Negra, com a entrega do prêmio Zumbi dos Palmares e apresentações de cânticos religiosos em louvor à capoeira (Esqueleto) e às crenças afro-brasileiras.

Nesses 500 anos de presença africana no Brasil, as comunidades afrodescendentes clamaram por mais respeito ao seu povo por parte dos poderes públicos de Vitória da Conquista, que até hoje não conta com uma praça representativa aos deuses orixás, nem ruas com nomes de personalidades do povo negro.

O vereador pelo PT, Alexandre Xandó, organizador da sessão especial junto à Mesa Diretora, presidida por Luis Carlos Dudé, fez duras críticas à Prefeitura Municipal que insiste em cobrar IPTU dos terreiros de candomblé. Informou que houve um contato com o poder executivo para que essa taxa fosse dispensada, mas sem resposta. Em seguida, anunciou que está entrando na justiça contra essa cobrança.

Na ocasião, o parlamentar cobrou da prefeitura que abra um sistema de cotas raciais para concursos públicos, inclusive para mestres em capoeira. Xandó também criticou a violência policial contra negros na cidade, dizendo que existe uma matança indiscriminada de jovens. Estiveram presentes ao ato pai Celi (José Carlos) e o mestre de capoeira, Quequeu, que repudiou o racismo no país.

A maioria das falas dos religiosos presentes à sessão (contou com a participação do vice-reitor da Uesb- Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, Reginaldo Pereira), como pai de santo Ricardo de Oxossi, mãe Olinda, a pedagoga Elizabete (Beta), se pronunciou em defesa dos negros e pediu respeito ao seu povo.

Em seu pronunciamento, pai Ricardo elogiou a presença de vereadores evangélicos na sessão (alguns faltaram), afirmando que isso demonstrava bons ventos de união e tolerância religiosa. “Todos nós queremos saúde, educação e que se acabe de vez com o racismo. Combatemos o racismo com mais educação e não com leis”. Ele ainda reclamou que estão acabando com a memória cultural do povo negro, apontando que em Conquista não existe uma praça em homenagem aos orixás.

Sobre essa reivindicação, o presidente da Câmara, Luis Carlos Dudé anunciou que está em entendimento com a construtora VCA para criação de uma praça dos orixás em Conquista. Mãe Lene condenou a prefeitura pela suposta intenção de demolição da escola localizada no Quilombo Cachoeira dos Porcos, a qual está em péssimas condições de funcionamento. As comunidades pedem a reforma do equipamento e não o fechamento.

Existem no município 33 comunidades quilombolas que, segundo denúncia de Elizabete, a Beta, estão sendo desmontadas e sem demarcação e titulação. “Tudo para o negro é difícil”- enfatizou. Outro problema dessas famílias é a falta constante de água nas localidades.

 

A EVOLUÇÃO DO EXTREMISMO DE DIREITA E A VOLTA DAS TREVAS

Talvez os espíritas e as religiões afros, mais que os historiadores e cientistas, possam dar uma explicação mais plausível sobre o que vem ocorrendo com a volta avassaladora das ideologias extremistas e negacionistas no planeta terra, inclusive em nações mais desenvolvidas que sempre defenderam a liberdade e a democracia, consideradas mais avançadas em termos civilizatórios.

É um fenômeno inexplicável essa volta às trevas e ao obscurantismo como numa repetição maldita da história. Alguns intelectuais da África, como Soyinka, na passagem entre o colonialismo e o pós-independência de países do continente, falam muito dos males ancestrais que se arrastam para o presente. É o passado replicando o presente. É a Idade Média se incorporando em pleno século XXI.

Na Europa, nas Américas e outros continentes, as ideias fascistas, nazistas, de supremacia da raça, do preconceito, da discriminação e retrógradas negacionistas da ciência estão retornando com força através das eleições de líderes de extrema. Esse quadro se tornou mais visível nesse período pandêmico da Covid-19 onde milhões se recusam a vacinar como forma de negar a ciência.

Entre as democracias em retrocesso, Brasil e Estados Unidos estão na lista do relatório anual da Organização Internacional IDEA, com sede em Estocolmo. Os principais motivos são do presidente-capitão e do ex-Donald Trump. Mais de um quarto da população mundial estão nesse rol. Seriam cerca de 70% se forem somados os regimes autoritários, ou com tendência à degradação. Desde 2016 a lista já incluía Índia, Filipinas, Polônia, Hungria e agora, a Eslovênia.

Voltamos ao tempo das inquisições do pensamento, faltando apenas montar as fogueiras, como está acontecendo, particularmente em nosso Brasil de hoje. Confesso que tenho ficado chocado e angustiado com fatos absurdos, como o mais recente de uma professora de filosofia, em Salvador, que foi vítima de um processo numa delegacia só porque estava cumprindo seu dever de lecionar sua matéria, sem intenção de inocular ideologia em seus alunos. Ela falava sobre a Semana da Consciência Negra e foi denunciada como esquerdista, comunista e macumbeira. Isso remete à ditadura civil-militar no seu pior momento do AI-5.

A cada dia cresce mais e mais o fundamentalismo evangélico, com intolerância religiosa e ódio homofóbico. Aumentam a violência contra a mulher, o feminicídio e o racismo ao negro, com brutal agressão. A polícia executa os cidadãos, e o capitão-presidente incentiva cada vez mais o uso de armas. Foi aberta a porteira para a boiada da destruição das nossas florestas. O meio ambiente padece.

A impressão que temos é que está havendo um surto de raiva sem precedentes na história da humanidade, com a redes sociais repletas de imbecis incultos e estúpidos soltando espumas venenosas pela boca. Não existem debates de ideias e argumentos. Só sobraram os xingamentos extremistas, tanto de um lado, como do outro, num país dividido com milhões passando fome na extrema pobreza.

Por outro lado, o planeta está pegando fogo com o aquecimento global, que não tem mais volta. A terra vai se acabar. Os caras na reunião do clima passam dias se estapeando sobre redução dos índices de dióxido de carbono e metano. Assinam documentos e depois não cumprem o dever de casa quando retornam aos seus países de origem.

Cada um só quer elevar o seu Produto Interno Bruto (não importa o tipo de combustíveis queimados), incentivar o consumo das famílias, ostentar seus luxos e gastar cada vez mais. Os mais ricos trocam de carro, de celulares e outros aparelhos todos os anos. O lixo é cada vez mais crescente. É uma tremenda contradição porque a conta a favor do meio ambiente nunca bate. A própria mídia que denuncia e condena a destruição, é a mesma que estimula o crescimento. Ninguém quer reduzir o consumo, a não ser os pobres que já fazem isso obrigatoriamente.

NOSSO JUMENTO ESTÁ EM EXTINÇÃO

Vejo os ambientalistas e as associação dos animais defendendo os cães, gatos, baleias, tartarugas e bichinhos do lar, mas quase nada se fala do nosso jumento, símbolo do Nordeste e servidor do homem do campo por séculos, que está sendo, impiedosamente, extinto, com o aval das autoridades governamentais.

Pelo interior a fora, ele é comprado por até 10 reais e sua carne e o couro exportados por até três mil reais para os chineses. Ele, o jegue, um personagem do Novo Testamento, que tanto ajudou o agricultor por séculos foi substituído pelas motocicletas e agora está sendo maltratado em currais e morto pelos frigoríficos.

O quadro dessa situação foi exposto pela Assembleia Legislativa da Bahia e noticiado na coluna do meu amigo Levi Vasconcelos no jornal A Tarde. O assunto foi discutido em sessão da Comissão do Meio Ambiente, presidida pelo deputado José de Arimatéia, defensor da causa animal.

De acordo com dados apurados, entre 2010 a 2014 foram abatidos mil jumentos na Bahia. Entre 2015 a 2019, o número subiu para 91.145, um crescimento de mais de oito mil por cento. O extermínio está próximo. Está sendo raro encontrar um jumento no sertão, resistente à seca.

A Comissão da Assembleia denunciou que não existe qualquer tipo de fiscalização por parte dos órgãos governamentais, nem mesmo as fazendas de reprodução. Na Bahia, os exterminadores para mandar carne e coura para a China são os frigoríficos de Amargosa, Jacobina, Simões Filho e Itapetinga, por um punhado de empregos.

Há pouco tempo, houve denúncias graves de maltratos desses animais em currais dos citados frigoríficos morrendo de fome e sede, mas, de lá para cá não mais se falou nisso. Enquanto isso, o jumento, um animal dócil, cantado em versos pelo nosso cancioneiro rei do Baião, Luiz Gonzaga, vai sendo exterminado pela ganância do lucro dos donos de frigoríficos.

UM GUERRILHEIRO QUE DENUNCIOU OS ESQUEMAS DE CORRUPÇÃO EM ANGOLA

UM PAÍS AFRICANO QUE É A CARA DO BRASIL, SÓ QUE NUNCA EXPERIMENTOU O SOCIALISMO. A QUESTÃO ESTÁ NO SER HUMANO QUE É NEFASTO, DESTRUIDOR E MALÉFICO. TUDO PELO PODER.

As obras “Predadores”, “O Cão e os Caluandas”, “A Geração da Utopia” e “O Desejo de Kianda”, de Artur Carlos Maurício Pestana dos Santos, o Pepetela, representam uma forte carga de críticas contra os desvios de conduta e os esquemas de corrupção do governo do Movimento pela Libertação de Angola (MPLA) quando o país foi emancipado por volta de 1975, e depois a partir da transição do socialismo para o capitalismo.

Quem faz comentários sobre Pepetela no livro “Intelectuais das Áfricas” é o professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Sílvio de Almeida Carvalho Filho, que mapeia toda trajetória de um guerrilheiro que participou da luta pela independência e depois se desligou do poder para se dedicar à literatura da denúncia na área política e social contra os malfeitos do novo governo “socialista” que propunha dar voz aos trabalhadores e à população mais pobre.

Não abandonou seu país

Pepetela, branco num país majoritariamente de negros, nasceu em 1941 ao sul de Angola, na cidade de Benguela, em uma família pequeno-burguesa. Depois da emancipação, não abandonou sua terra como fez a maior parte dos portugueses e descendentes.

Como assinalou o professor Sílvio, sempre repudiou o racismo em Angola, como fez no livro “O Cão e os Caluandas”, no qual ressaltava que os cachorros, ao guardar as casas dos colonos mordiam os negros, rosnavam nos mulatos, lambiam as mãos dos brancos ou portavam o vírus do ódio ao negro, da desconfiança ao mulato, do respeito ao branco.

Desde cedo, o angolano se manifestou interessado pelas questões sociais brasileiras, especialmente pelas obras de Jorge Amado. Ainda jovem encantou-se com a leitura de um livro do anarquista Proudhhon, e depois entrou em contato com o pensamento de Marx e seus seguidores.

Em Argel, no Centro de Estudos Angolanos, escreveu os diálogos da história em quadrinhos (primeira história em quadrinhos de Angola), intitulada “Contra a Escravidão: Pela Liberdade”. Publicada em 1967, a obra foi muito apreciada pelos guerrilheiros e nas escolas mantidas pelo MPLA. Em 1969, retoma sua verve literária escrevendo em Argel seu primeiro livro “Muana Puó”, lançado em 1978.

Conforme conta Sílvio de Almeida, enquanto participava da luta armada, não deixou de escrever romances, como “Mayombe”, entre 1970 e 71, em Cabinda, e “As Aventuras de Ngunga”, em 1972. Foi membro do Estado-Maior da Frente Centro das Forças Armadas Populares de Libertação de Angola (FAPLA). Com uma grave hepatite, retornou a Luanda em novembro de 1975, no momento da independência do país. Recuperado, foi para Lubango dar aulas.

Entre os anos de 1983 a 2008 lecionou Sociologia Geral e a Urbana na Faculdade de Arquitetura da Universidade Agostinho Neto, em Luanda. Gradativamente tornou-se em o mais importante literato angolano em virtude da editoração de 24 livros. Além da sua luta no MPLA, participou também da repressão à Revolta Nitista, em 1977. Ele contava que, quando era criança lhe obrigavam ir à missa, e agora ir à reunião da célula do partido.

Como disse o professor Sílvio, ao longo da sua vida, passou a perceber que a maior parte da crítica na agremiação partidária, muitas vezes, quando atingia as cúpulas do poder, acomodava-se à linha oficialmente estabelecida, sem rupturas. Afastou-se do partido, e um dos motivos foi a consolidação de um novo staff no poder, ligado ao novo presidente José Eduardo dos Santos, mais afeito à sociedade de mercado.

O crítico Silvio de Almeida afirma que sua literatura confirma que o MPLA, frente às ameaças externas e internas, constituiu num regime autoritário, tornando-se um Partido-Estado, concentrando todo poder em sua mão. “Essa capacidade de crítica às práticas sociais e políticas angolanas encontrava-se presente em “O Cão e as Caluandas” (1978/84)… Com o abandono dos ideais socialistas pela cúpula governamental e com a contínua expansão da corrupção e do autoritarismo, seu juízo vai se tornando mais mordaz, como se expressa nos livros “A Geração da Utopia” (1992), “O Desejo de Kianda” (1995) e “Predadores” (2005).

Ainda um guerrilheiro, em 1969, Pepetela dizia que a rebeldia supunha realizar transformações profundas das estruturas econômicas e sociais para formar o homem novo. Supunha um governo dos trabalhadores que conduziria o Estado: “Que maravilhoso será o mundo quando os que constroem, comandarem!”.

No enredo de “Yaka”, escrito em 1983, através de um personagem contestador, asseverava que “a propriedade suja, emporcalhada, torna os homens piores que bichos. A propriedade é o roubo, afirmava Proudhon, é isso. Mas é mais. Basta a miragem da propriedade para um homem decente se tornar prepotente, um tirano. Ou ainda: O mal era a propriedade(…) mesmo pequena torna o indivíduo escravo dela”.

No início de 1970, destacava que certos quadros do MPLA aplicavam uma série de rótulos àqueles que não tinham exatamente a mesma opinião. Esse rotulismo, segundo ele, era resultado duma preguiça intelectual… ou falta de cultura, predominante em vários guerrilheiros. Dez anos após a independência, em “O Cão e os Caluandas” escrevia em tom irônico que o Estado angolano, ao se declarar “socialista” utilizou essa qualificação de forma leviana nos discursos…

Pepetela observava em seus textos que a propaganda ideológica homogeneizava enunciados de forma superficial, não estimulando um pensamento socialista autêntico e criativo, sendo um desserviço à concretização de uma nação realmente proletária. Ele denunciava os fingimentos das falas, mais preocupadas com rótulos socializantes do que com o seu conteúdo, demonstrando o reverso do prescrito pelo ideal marxista.

O intelectual angolano criticava certos militantes que se preocupavam apenas em tirar proveito escuso das mudanças políticas quando da Retificação partidária. Em muitos locais houve jogos sujos, próprios da luta pelo poder, mesmo o mais pequeno poder. Denunciava que houve subordinados que aprovaram um chefe incapaz para não serem depois exigidos nos seus serviços. Dizia que os oportunistas conseguiram durante a Retificação obter o cartão de membro do partido para auferirem vantagens e privilégios no aparelho do Estado.

Textos literários em jornais denunciavam que muitos que compactuaram com o capitalismo, e mesmo com a repressão colonial, adotaram o discurso revolucionário, ingressando no governo com intuito de se manter no poder e angariar prestígio social. Muitos burocratas foram denunciados como revolucionários de última hora.

Em os “Predadores”, comentava que alguns estavam mais interessados em se apossar dos bens deixados pelos portugueses em fuga do país do que preocupados com a implantação do socialismo. Pepetela satirizou aqueles que, não tendo uma participação na luta pela independência, inventavam um codinome revolucionário só para ter prestígio político, caso de Vladimiro Caposso em uma de suas obras.

A crítica ferrenha à ineficiência da burocracia apareceu em “O Cão e os Caluandas”, repetida também em “O Desejo de Kianda”. Afirmava que o funcionalismo estatal não trabalhava o bastante e desperdiçava meios e mobilizava estruturas por pequenas questões do dia a dia. Confrontava os excessos de reuniões e de discursos. Era o mal da “reunite”. “O poder burocrático era invisível, porém poderoso e autoritário. As práticas burocráticas geravam uma rejeição popular não apenas aos burocratas, mas ao “socialismo” tal como se instituía”.

O escritor nunca poupou aqueles que dentro do MPLA se aburguesaram. Em 1977, o próprio Comitê Central admitiu que setores da pequena burguesia, aproveitando-se da falta de quadros dentro do Movimento, tentavam aumentar seus privilégios apoderando-se dos cargos de liderança no aparelho estatal. Existia, na verdade, uma mera troca de senhores.

Entre 1978 e 1984, Pepetela condenava a ostentação de privilégios peculiares ao colonialismo por parte de autoridades nacionais e de diretores de fábricas estatais, assim como regalias no setor habitacional, usufruídas por altos funcionários partidários. Havia uma corrupção generalizada que contaminou toda camada social.

Deplorou o patrimonialismo e o clientelismo angolano, quando a burocracia, através de pistolões, reservava para si os bens escassos numa sociedade subdesenvolvida e sofrida pelos efeitos da guerra. Denunciou a obtenção de cargos públicos, não pela competência, mas por meio de afinidades pessoais com os líderes políticos. Declarava que o Estado foi capturado por uma burocracia corrupta que não concorria para uma boa gestão pública.

Mesmo com a transição do “socialismo” para uma economia liberal de mercado, iniciada em 1985, e do abandono formal do marxismo-leninismo no Terceiro Congresso do MPLA, em 1991, toda sujeira se perpetuou no governo, conforme relata Pepetela em seus livros. Angola foi classificada por organismos internacionais com um dos países mais corruptos da África.

 

 

 





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