Todas as vezes que policiais militares são assassinados, de imediato vem por trás disso um rastro de revanches e vinganças que terminam sobrando para pessoas inocentes e parentes. O caso dos dois agentes mortos na semana passada no distrito de José Gonçalves, em Vitória da Conquista, não é uma exceção.

É só relembrar a chacina ocorrida numa periferia da cidade, se não me engano, há onze anos. Praticamente uma família foi eliminada por justiceiros, e as investigações não deram em nada. Na época, um promotor e um juiz que estavam dando andamento ao processo chegaram a ser ameaçados.

Os métodos são sempre os mesmos, e as apurações nunca chegam a uma conclusão, como o fato do menino Maicon que foi vítima de uma ação atabalhoada da polícia. Os familiares pediram clemência e justiça, mas o corpo da criança não foi encontrado. Tudo ficou sem resposta até hoje.

Na ocorrência mais recente, o que se fala é que um grupo de ciganos matou dois policiais que, segundo informações do próprio comando e de um delegado civil, estavam numa diligência investigativa, só que não esclarece que tipo de investigação.

Será que se tratava de uma espionagem atentatória contra a segurança nacional? É um segredo de Estado que não pode ser revelado? Mais uma vez, é tudo nebuloso, e ainda o secretário de Segurança Pública e o comandante Geral da Policia Militar dão uma coletiva à imprensa falando que tudo está sendo transparente. Como assim?

Outra questão é quanto o assassinato praticado por dois motoqueiros encapuzados a um menor de 13 anos numa farmácia. O secretário afirmou que foi uma queima de arquivo perpetrado pelos próprios ciganos, mas nada prova, sempre com aquele argumento de não atrapalhar as investigações. É tudo muito estranho! Ficam as dúvidas e as interrogações.

Essa de jogar a culpa para os ciganos me ativou a memória de atos de terrorismo acontecidos no final da ditadura onde se fala de abertura democrática. A turma da linha dura atirou bombas em bancas de jornais e até na sede da OAB do Rio de Janeiro e espalhou notícias falsas de que foram os comunistas.

Logo depois do fato, em José Gonçalves, ocorreram três mortes na mesma semana, e aí, novamente, o secretário, o comandante e a delegada da Polícia Civil, que vieram a Conquista, disseram que os crimes não têm nenhuma relação com os policiais alvejados. É muita coincidência! Soltaram o verbo na coletiva, e nada ficou explicado como se esperava.

Infelizmente não temos mais jornalistas investigativos como antigamente. A verdade é dura, mas deve ser dita. Por medo de ameaças ou outra coisa, a nossa mídia só dá o factual daquilo que consta no Boletim de Ocorrência, o chamado BO, e a sociedade fica sem resposta.

Aliás, é essa mesma sociedade falida moralmente que manda matar, mesmo que seja de forma indiscriminada. Foi isso que ouvi de um empresário certa feita quando no Sindicato dos Jornalistas da Bahia e na Associação Bahiana de Imprensa dei uma nota de apoio à Justiça que estava investigando a chacina.

Não estou aqui para defender o crime, nem o criminoso, mas tudo tem que ser transparente, e os culpados severamente punidos. Será que tudo está sendo feito dentro da ordem e da lei, sem o conhecido corporativismo? A coletiva dos comandantes deixou mais dúvidas que esclarecimentos.

As associações e entidades representativas dos ciganos no Brasil se mobilizaram, publicando nota de repúdio contra as perseguições ao seu povo, por sinal sempre estigmatizados como bandidos, sujos e ladrões ao longo da história, desde muito tempo antes de Cristo.

O cigano Rogério Ribeiro, presidente do Instituto Cigano-Brasil e membro consultivo da Comissão de Promoção da Igualdade Racial da OAB do Ceará, em um vídeo numa rede social, pediu ao comandante da Polícia Militar de Conquista que segurasse sua tropa, embora tenha dito que foi bem recebido em sua conversa por telefone.

Como nos tempos em que viviam em correrias, diante dessas mortes e amedrontados com o que ainda possa ocorrer, muitos tiveram que fugir para outras bandas. É uma nação cujos filhos já nascem sob os olhos do preconceito e do ódio. Foram escravos na Romênia e massacrados por toda Europa e no Brasil, desde a Colônia e no Império. Quase todos foram exterminados durante o nazismo de Hitler, e nunca foram indenizados.