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O CATINGUEIRO

Um soneto de Jeremias Macário, do seu livro ANDANÇAS

O catingueiro é tempestade do tempo e do vento;

Calmaria da caatinga de cor queimada do sol poente;

No sangue traz a seiva do mandacaru em pedregulhos;

Da seca, o sofrimento que o faz mais forte-resistente.

 

O catingueiro é cheiro da terra molhada e rachada;

Verde ou cinzenta, prosa cismada e desconfiada;

Poeira do sol a pino no arrasto do cabo da enxada;

Capanga cheia de sinais das nuvens das trovoadas.

 

O catingueiro carrega no corpo mãos calosas e espinhos;

Na alma, a sagrada palavra da prometida profecia,

De um Deus penitente, sem ler a escrita da sabedoria.

 

Pergaminho do sertão, cortando vereda e caminho;

Irmão da lua, esperança noturna, fé a lavrar todo dia;

Bicho do mato, tabaréu emboscado pela demagogia.

LIBERDADE E DEMOCRATIZAÇÃO DA MÍDIA

Nas comemorações do Dia Mundial da Liberdade de Imprensa (03/05) deve-se também se fazer uma reflexão sobre a democratização dos meios de comunicação no Brasil, que ainda estão nas mãos de poucos grupos de empresas, as quais têm sempre procurado manipular a informação a favor de seus interesses.

Nos últimos anos, pouco tem se comentado sobre esse tema democratização dos veículos, tão importante como meio de evitar a prática de um jornalismo tendencioso e parcial, descambando até para fake news disfarçadas, que os leigos não percebem. Nesse balaio, tem pontuada a mídia alternativa, mas logo é sufocada pelos poderosos, e termina com vida curta.

Todos de bom senso defendem a liberdade de imprensa, mas ela só se torna completa com a democratização, o que se torna difícil no sistema capitalista de monopólio e oligopólio onde só os fortes sobrevivem. É ingênuo imaginar liberdade absoluta e independência total quando um jornal, um rádio, uma televisão ou um simples blog depende de anúncios oficiais ou do setor privado para continuar circulando e funcionando.

Para acontecer essa liberdade mais ampla, da qual estamos falando, só os instrumentos do cooperativismo ou coletivização entre as pessoas da sociedade tornariam o veículo mais livre para expressar seus pontos de vista, com imparcialidade. Infelizmente, não se tem essa cultura na área jornalística num país que só visa o lucro do capital.

Para se criar esse ambiente de democratização da mídia, teria que se ter uma consciência mais culta em favor da liberdade, de modo a cooperar com o veículo pequeno para que ele não seja obrigado a se tornar refém dos órgãos públicos. Sem o coletivo, vamos cair no jornalismo “chapa branca”.

Diante do exposto, digo que essa liberdade é mambembe e maquiada pelos grupos que detém a maior fatia no bolo publicitário. Na Bahia, por exemplo na capital, o Jornal da Bahia tombou diante da pressão de um governo autoritário. A Tribuna da Bahia também sofreu seus ataques e esteve à beira da falência.

Por que se diz por aí que a linguagem da grande mídia, resumida em quatro tentáculos poderosos, é burguesa, que não fala para o povo? Não temos um jornalismo popular. Portanto, essa liberdade, da qual tanto desejamos, não é completa. Na verdade, o que existe mesmo é um disfarce onde as ameaças e os ataques são dirigidos aos trabalhadores jornalistas, as maiores vítimas desse jogo de poder.

Sobre essa violência, a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) aponta que entre 2019 e 2021 o total de casos desse tipo contra jornalistas no Brasil somou 1.066 ocorrências, número bem maior do que a soma de todos os episódios registrados pela entidade de classe entre os anos 2010 e 2018, que totalizam 1.024 situações.

Existe sim uma escalada de violência que aumentou mais ainda nesse governo do capitão-presidente, que não respeita o operário da informação em seu papel que, quase sempre, segue a linha editorial da empresa da qual pertence. Falar em liberdade, tem também que se falar de democratização dos meios de comunicação, totalmente voltados para atender os anseios da população mais enfraquecida.

A HERANÇA COLONIAL

Por volta de 1682, final do século XVII, o bandeirante paulista Manuel de Borba Gato era um fugitivo da lei por acusação de ter matado o fidalgo português Rodrigo de Castelo, administrador das Minas. Com seu bando, se embrenhou na região do Rio das Velhas onde estava localizada a Serra de Sabarabuçu, atual município de Sabará.

Naquela época, como descreve o jornalista e escritor Laurentino Gomes, a Coroa Portuguesa estava falida e ávida por encontrar ouro em terras brasis, e foi isso que Borba conseguiu naquele ermo de mundo. Pelo seu feito, ele obteve o perdão real pelo crime do qual era acusado.

Em troca da localização das minas, o rei D. Pedro II, não só anistiou ou indultou o bandeirante, como lhe encheu de honrarias e terras nas quais poderia explorar os depósitos. Borba Gato deixou de ser considerado um criminoso para ser promovido ao posto de guarda-mor das minas de Caetés, tornando-se fidalgo do rei, conforme especificava a carta patente.

Borba Gato é hoje homenageado com uma estátua de dez metros de altura e vinte toneladas de peso no bairro de Santo Amaro, em São Paulo. Esse é só um dos exemplos para ilustrar como historicamente bandidos e malfeitores sempre são recompensados no Brasil através da “lei da impunidade”. É uma herança colonial impregnada em nossa cultura.

O caso do deputado Daniel, Silveira que praticou atentados contra a democracia e ameaçou ministros do Supremo Tribunal Federal, é parecido com o do bandeirante Borba Gato. Julgado pela corte, o rei lhe concedeu a graça do indulto, e o Congresso Nacional completou com cargos em comissões.

No Palácio, o deputado foi recebido pelo rei que lhe deu uma moldura do indulto, faltando apenas mandar construir uma estátua em sua homenagem, mas isso ainda pode ser possível. Infelizmente, isso aqui virou uma republiqueta de bananas dos tempos coloniais.

O parlamentar não descobriu nenhuma mina de ouro que tirasse o país dessa falência, ou tenha realizado uma grande obra, mas foi o porta voz do rei que ataca a democracia, a liberdade de expressão, destrói o meio ambiente, pede AI-5 e intervenção militar, ou seja, um regime de ditadura para o país, introduzindo a tortura para aqueles que se posicionarem contra as ideias retrógradas e fascistas do rei.

Por falar em Borba Gato com seu monumento em São Paulo, temos no Brasil de hoje inúmeras estátuas, prédios, pontes, viadutos, ruas, avenidas e praças com nomes de pessoas que cometeram crimes de torturas durante as ditaduras brasileiras; mandaram matar adversários; fizeram malvadezas com o povo e até foram exímios corruptos. A maioria passa por esses homenageados e nem sabe quem foram eles, isto porque não tem memória e história.

ELAS ESTÃO CHEGANDO COM O AÇOITE DOS FORTES E A ILUSÃO DOS FRACOS

De quatro em quatro anos, aliás de dois em dois, eles fazem “mudanças” ou remendos em seu sistema oligárquico oligopolista para que as coisas continuem no seu mesmo lugar. Elas estão chegando como sempre, antes de serem oficializadas por lei, com o açoite do reio cru no lombo dos mais fracos, que se rendem ao canto da sereia, na vã ilusão de melhores dias para se libertar do jugo da opressão.

Claro que estou me referindo às ditas cujas eleições onde os candidatos transgressores das normas já estão em plena campanha, com xingamentos, ódios, bravatas, mentiras, truques, intolerância e até ameaças de golpe, para que elas não aconteçam. Como um vício incurável, os dependentes “químicos” entram de cabeça na onda deles e se dividem na disputa para ver quem escolhe o pior, o mais ladrão, o mais corrupto, impuro e falsário.

Todo bruto esquema é montado com antecedência, e grupos se formam com os bilhões de reais de suas próprias presas para vencer a maratona do poder. Nesse ciclo nojento, infestado de sujeiras, o caçador sempre vence a caça, que é levada para seu altar dos sacrifícios humanos, em rituais dos mais macabros. Tudo não passa de um banquete masoquista onde irmãos odeiam irmãos e até famílias se separam.

Elas têm o nome chamadas urnas “democratas” ao molde tupiniquim, ultrapassado e arcaico onde se apertam os números dos votos que sempre elegem os mesmos cafajestes, porque tudo já é montado e estruturado para que não haja muitas renovações. Manda quem tem mais bala na agulha. As vítimas incultas e ignorantes são facilmente fisgadas e caem direitinho nas manjadas armadilhas ou alçapões da morte.

Depois, é só se fartar da gorda caçada com muitas orgias, comes, bebes e arrotos em suas mansões, longe das ralés desiguais sociais e famintas das degradantes periferias dos esgotos a céu aberto. A quem interessa toda essa campanha maciça para que os meninos manipuláveis de 16 a 18 anos vá ao encontro delas e votem?

Todos aqueles que se consideram inimigos na disputa se tornam castas amigas da mesma irmandade “religiosa”, cada um em nome do seu Deus, com tapinhas nas costas. Concluída a farsa, é só partir para o abraço e conchavos nos momentos certos, para cortar gargantas e decepar as pobres cabeças.

NAS CILADAS DA LUA CHEIA

Há cerca de uns três anos fiz uns versos intitulados “Nas Ciladas da Lua Cheia”, musicada pelo grande compositor e músico Papalo Monteiro que, no sentido figurado fala dos lobos que ficam moucos nessa época das eleições, no Planalto prateado do céu tropical, onde os bandos fazem sua ceia, vinda do arado suado do braço serviçal.

Prossigo falando sobre as hienas que viram renas na lua cheia, para a engorda gulosa do grande dia, enchendo seus trenós em cada aldeia, para mais quatro anos de mordomia.

Os ratos armam ciladas na lua cheia; os malignos vendem gatos por lebre; a mente fraca se encanta com o canto da sereia; e quem paga o pato é a plebe. Depois dessa festa, a chama da fé começa a minguar; o fio da esperança vai-se embora; chora o velho, a senhora e a criança, na falta da justiça, do remédio e do pão, e do direito de viver e sonhar de nunca mais ser boiada de patrão.

Arremato no final, dizendo que, no aboio ou no rasgo da guitarra, vamos embora gente valente. Não fiquei aí na espera do Deus dará. Vamos acabar de vez com a farra dessa corja bicharada em nosso lar, sem mais raposas uivando em nosso luar.

 

 

REUNIÃO DO CONSELHO VAI DISCUTIR PLANO MUNICIPAL PARA A CULTURA

Nesta segunda-feira (dia 02/05), na sede da Casa Regis Pacheco, o Conselho Municipal de Cultura de Vitória da Conquista vai debater diversos temas do setor, com destaque para a elaboração do tão desejado Plano Municipal de Cultura e uma data para sua Conferência Pública, possivelmente no mês de julho próximo.

O encontro mensal está marcado para 18 horas e 30 minutos, e na abertura dos trabalhos vão falar o compositor e músico Carlos Moreno, que irá fazer um panorama geral sobre os artistas da música em Conquista e suas carências. Logo após teremos uma conversa com o membro do Condica (Conselho da Criança), Joabe da Silva, que fará uma explanação sobre como captar recursos para o Fundo Cultural.

Na pauta ainda vamos discutir a situação dos equipamentos culturais na cidade, suas reformas, como a do Teatro Carlos Jheová, o Cine Madrigal e a Casa Glauber Rocha. Nessa mesma linha, o colegiado deverá recomendar e propor ao poder executivo iniciativas de proteção do nosso patrimônio público arquitetônico.

Por fim, o Conselho vai entrar na discussão do Plano Municipal de Cultura que irá criar as diretrizes para as políticas públicas do município. Entre outros assuntos, os membros do Conselho vão travar um debate quanto ao corte de R$2 milhões da Prefeitura Municipal na Secretaria de Cultura, Turismo, Esporte e Lazer.

A tendência é que nessa reunião saia uma nota de contestação sobre o corte na cultura, que já é uma área por demais sacrificada em termos de verbas. Os artistas conquistenses reagiram contra esse corte de recursos que poderiam ter sido investidos em edital e até mesmo na reforma do Teatro Carlos Jheová que está interditado há mais de um ano devido a desgastes em suas instalações.

CURIOSIDADES DO TRÁFICO NEGREIRO (IX)

O livro de Laurentino Gomes, “ESCRAVIDÃO” mostra curiosidades do tráfico negreiro, muitas das quais de horror, mas que precisam ser conhecidas por historiadores, estudantes e todos brasileiros sobre o que aconteceu nos quase 350 anos de escravidão no Brasil.

Em prosseguimento aos relatos do autor, vamos destacar alguns deles sobre os sofrimentos dos negros no cativeiro:

A IGREJA E A ESCRAVIDÃO

Em “A Cruz e o Chicote”, ainda com relação a Igreja, o autor diz que “até o final do século XIX, com raras opiniões isoladas, a instituição nunca se pronunciou oficialmente e de forma inequívoca contra a escravidão”.

Prosseguindo, acrescentou que Ela reconhecia que os cativos tinham uma alma imortal que devia ser salva mediante a administração dos sacramentos, mas bispos, padres e ordens religiosas eram donos de escravos e participavam ativamente do comércio negreiro.

Os padres, inclusive Manuel da Nóbrega, diziam que o conforto dos missionários dependia do trabalho dos escravos. Sobre os livros e ensaios escritos por jesuítas, o historiador Ronaldo Vainfas os denominou de moral cristã da escravidão e de projeto escravista dos religiosos.

Um desses autores citado por Laurentino é o italiano Jorge Benci, que exerceu diversas funções no colégio da Ordem da Bahia. No livro “Economia Cristã dos Senhores no Governo dos Escravos”, Benci não questionava, nem condenava a prática escravista.

Para o italiano, o cativeiro era parte e consequência da natureza decaída do ser humano, um dos efeitos do pecado original de nossos primeiros pais, Adão e Eva, donde se originaram todos os nossos males. De acordo com ele, o pecado foi o que abriu as portas por onde entrou o cativeiro.

Benci afirmava que a maldição de Noé lançada sobre Canaã, primogênito do seu filho Cam, transformava todos africanos – segundo a tradição, descendentes dessa linhagem bíblica – em candidatos naturais ao cativeiro.

Em seu entender, a primeira e a mais importante obrigação do senhor de escravos era alimentar a alma de seus servos com a Doutrina Cristã. A segunda, impedir que os escravos permanecessem no ócio, conforme ele, a fonte de todos os males. O dever do senhor era, portanto, botar os escravos para trabalhar, o mais rapidamente possível, “pois os negros estariam mais inclinados ao vício do que os brancos”.

Outra obrigação do senhor, dizia Benci, era dar ao escravo o castigo, para que não se costume a errar. Isso, para ele, era uma obra de misericórdia. Segundo Laurentino, o envolvimento da Igreja com a escravidão era antigo, bem anterior ao tráfico de africanos para América.

A expulsão dos mouros da Península Ibérica, no século XV, afirmava o autor da obra “Escravidão”, inundou a região do Mediterrâneo de cativos muçulmanos capturados pelos cristãos. Cerca de 10 mil foram escravizados na queda de Málaga, em 1487.

Esses escravos eram usados nos trabalhos mais árduos e perigosos, como as venenosas minas de mercúrio de Almadém, na Espanha, e as pedreiras do sul da Itália. “Entre os séculos XV e XVI, seguidas bulas papais deram a justificativa religiosa e o respaldo político de que os portugueses precisavam para conquistar novos territórios na África e escravizar seus habitantes”.

Em 1452, o papa Nicolau V autorizava o rei de Portugal a atacar, conquistar e subjugar os mouros sarracenos, pagãos e outros inimigos de Cristo, capturar seus bens e territórios, escravizá-los e transferir suas terras para a coroa portuguesa de forma perpétua.

“ÁRVORE DA VIDA”

Vitória da Conquista foi visitada na semana passada por uma carreta de livros, estacionada na Praça Barão do Rio Branco, chamada de “Expolivro Árvore da Vida”, iniciativa de comunidades religiosas que percorrem o país disseminando a leitura por onde chega. A recepção na cidade foi muito boa, além das expectativas, segundo o coordenador do projeto, Tito Furtado. Estive lá no sábado passado para conhecer o ambiente e me senti mais esperançoso quando constatei a presença de um grande público de crianças ávidas e felizes ao manusear os livros, o que é um bom sinal para o nosso futuro, tão incerto nos tempos atuais quando se tem um governo que chega até a criminalizar a cultura. Não importa que sejam livros de cunho religioso, desde que não sejam fundamentalistas que procurem impor nos pequenos uma doutrina única, mas que abram as cabeças para condenar a intolerância e aceitar o pensar do outro, sem ódio e xingamentos.

PALAVRAS! PALAVRAS!

Mais nova obra do jornalista e escritor Jeremias Macário

Tempos de estiagem,

Num cálido vazio árido,

Assim padece nossa linguagem,

De limitadas palavras,

Menos verbos conjugados,

Cadeados, censuras e travas.

 

Palavras! Palavras vira-latas,

Nesses mares de piratas;

Sem regras gramaticais;

Travessa de ódio e xingamentos,

Pouca lógica e argumentos;

Códigos que entopem canais,

Nas enchentes das redes sociais.

 

Palavras! Palavras! Palavras!

Raízes de Alá e Baobá,

Que nos fazem racionais,

Diferentes de outros animais.

 

Palavras! Palavras! Palavras!

Nascidas nos fios das barbas,

Que perderam seu valor,

Na escrita, fala e nos sinais,

Na guerra, na paz e no amor;

Sejam dos sábios imortais,

Labaredas de fogo incandescentes,

Como nas canções dos festivais;

Iluminem nossas mentes,

Na crítica e nos pensamentos;

Que não se percam aos ventos;

Nunca armas da violência,

E sim, sentido da existência.

 

 

 

 

EXPOSIÇÃO MOSTRA A HISTÓRIA DA CAFEICULTURA EM VITÓRIA DA CONQUISTA

Exuberância de cores e realismo em dimensões variadas impressionam o visitante quando penetra na “Exposição Café com Arte”, da premiada artista plástica Valéria Vidigal, no Shopping Boulevard, que poderá ser apreciada até o dia 8 de maio.

A perfeição de suas telas dá vida, não somente à lavoura em questão, mas também às pessoas que nela labutam desde o plantio, a colheita de seus grãos (conhecidos como ouro verde ou vermelho) até à preciosa bebida chegar ao consumidor, que não pode passar sem um cafezinho para esquentar seu corpo e seu espírito, principalmente pela manhã.

Não sou crítico de arte, mas pude perceber e observar que a cada quadro que faz, a artista se supera em seus trabalhos, especialmente quando são voltados para a cafeicultura, seu principal tema que abraçou com toda dedicação em seus anos de carreira.

Como jornalista, conheci Valéria praticamente quando aqui cheguei em Vitória da Conquista nos anos 90 para gerenciar a Sucursal do jornal A Tarde, e tive o prazer de fazer algumas matérias com ela, ali na Galeria do Itatiaia, onde possuía um atelier e realizava cursos de pinturas para os interessados desejosos em ingressar nessa arte poética de fotografar coisas e objetos através dos pinceis.

Mesmo sendo suas origens de Minas Gerais, pode-se dizer que Valéria Vidigal já faz parte da própria história do café do Planalto de Vitória da Conquista, cuja cultura foi aqui introduzida nos anos 70, portanto, há cerca de 50 anos.

Suas obras modernistas e cheias de detalhes fantásticos levam as pessoas a entrar nelas como se estivessem numa própria fazenda de café, porque se sentem bem próximas da realidade. É uma artista que, além de conhecer muito bem os meandros da lavoura, faz as cores brotarem dentro da sua alma, numa rara perfeição.

Apesar do tema ser único, seus quadros não se repetem, e cada um nasce com mais força que o outro, o que desperta a atenção do visitante. É uma mostra de pura arte que enaltece a cafeicultura brasileira, conhecida internacionalmente pela sua produção e qualidade.

Da Etiópia para o Brasil, para a Bahia e para Conquista até chegar às mãos da artista Valéria que, com a habilidade das tintas fez do café um produto ainda mais admirado. Como ninguém, ela soube eternizar a história dessa planta, que representou um dos ciclos econômicos mais importantes no final do Brasil colonial, permanecendo até hoje como maior produtor e exportador mundial de seus grãos.

O SERTÃO É ÚNICO

28 DE ABRIL É DIA COMEMORATIVO DA CAATINGA

Para os bandeirantes paulistas sanguinários, como Domingos Jorge Velho, irmãos Fernando e Arthur Paes de Barros, Paschoal Moreira Cabral Leme, sertão era penetrar naquelas brenhas para se aventurar na guerra contra os índios, massacrá-los e escravizá-los, bem como descobrir ouro no continente. Para alguns escritores, como Guimarães Rosa, o sertão é diverso, imenso e está dentro de cada um. Graciliano Ramos descrevia em seus romances o árido seco, a penúria, o sofrimento e o social inexistente.

Fico mais com o escritor alagoano, de Palmeira dos Índios. Na minha concepção, o sertão é único, só existe um, aquele estorricado, rachado, pedregulhento, do mandacaru, do cacto, da catingueira, do xinque-xique, do juazeiro, da espinheira, do umbu, da lagartixa e do calango correndo nas folhas secas e nos lajedos. É a vegetação dos engaços e bagaços durante as estiagens. Em meu sertão, não existiu a corrida, nem a febre do ouro e do diamante.

Sertão para mim é essa caatinga cinzenta do sol escaldante fervente, do canto da cauã na beira da cacimba, do carcará e do gavião, da asa branca, da patativa, da rolinha, do pássaro preto e do sofrer. É a terra que se renova e brota rápido em cores diversas entre o verde quando batem forte os trovões nas chuvaradas do verão. É dos profetas da chuva. O restante é mata, pantanal, cerrado ou pampa.

O sertão é poesia da fome ou da abundância de gente simples e humilde labutando no agreste no plantio da abóbora, do feijão, do milho e do andu, com fé me esperança, para vencer as intempéries do tempo, e quase sempre não desiste. É aquele solo geológico descrito por Euclides da Cunha, não o de Jorge Amado do cacau ou do litoral. Sertão, infelizmente, rima com sequidão.

Para mim, sertão só existe um, dos guerreiros, dos penitentes Conselheiros, das rezadeiras, do canto da batida do feijão, das cantorias dos adjutórios, dos cangaceiros de Lampião e da Coluna Prestes torando espinhos para se livrar das volantes. É dos retirantes pau-de-arara se arrastando nas estradas poeirentas em direção ao sul paulista, fugindo dos horrores da seca. É o sertão de Patativa do Assaré, de Luiz Gonzaga, Zé Dantas e Humberto Teixeira.

Sertão é mistério e tem uma cultura específica do caboclo boiadeiro no aboio do vaqueiro, do repentista nato, do sotaque matuto catingueiro, do homem e da mulher cismados. É um chão único inconfundível dos hábitos e frutos diferentes da mata. É onde a terra começa a virar sal e deserto porque os governantes lá de cima só fizeram promessas de melhorias e convivência com a seca. É ainda onde corre o carro-pipa no cascalho, para matar a sede do sertanejo e dos bichos.

Sertão é cheiro de bode e cabra, do gadinho mirrado e do pôr-do-sol bem vermelho corado entre os galhos secos no horizonte infinito, É no sertão onde ainda vive o que restou do jumento, conhecido como jegue, símbolo do Nordeste semiárido, que está sendo dizimado nos currais das matanças para virar carne e pele para os chineses.

O meu sertão não é todo interior por aí. Ele tem um espírito único, um olhar melancólico cheio de histórias e lendas de heróis e carrascos coronéis. É sinônimo de caatinga. Não é Chapada Diamantina. Não tem capim exuberante. Tem ramagem rala e rara onde não frequenta a capivara.  Foi lá onde nasci de parteira e respirei o primeiro ar diferente de outro lugar. Foi onde meus pais me criaram e me ensinaram a ganhar o mundo.

 





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