FUGA EM MASSA, NOS PAÍSES DO SOCIALISMO SOVIÉTICO, A LÍNGUA E SEUS DIALETOS, PEREGRINOS EVANGÉLICOS E CONGRESSOS E COMISSÕES CIGANAS NA EUROPA EM BUSCA POR INDENIZAÇÕES COMO VÍTIMAS DO NAZISMO E DAS PERSEGUIÇÕES DOS GADJÉS.

Depois da guerra ocorreu uma fuga em massa dos ciganos de uma país para o outro. A maioria não foi aceita na Alemanha. Milhares abandonaram seus colonatos para serem operários fabris e da construção civil. O cenário era só de miséria entre nômades e sedentários, morando em tendas e pequenos casebres, embora o preconceito foi mais minimizado, principalmente nos países do Leste Europeu, que foram absorvidos pelo socialismo soviético.

Com a economia centralizada pelo Estado, conforme relata o pesquisador Angus Fraser em seu livro “História do Povo Cigano”, os ciganos tiveram dificuldades de se adaptar ao regime assalariado dos governos. Como o seu tino sempre foi o empreendedorismo, com trabalho autônomo e até liberal em seus negócios, eles foram reprimidos e forçados ao sedentarismo. Mesmo assim, sempre procuravam dar um jeito de se deslocar, para contrariedade dos ditadores comunistas. Muitos parlamentos tentaram regularizar a situação deles, como aconteceu na Holanda.

NO REGIME COMUNISTA

A maior parte ficou no regime comunista, e isso gerou um certo melhoramento. Era dever do Estado ajudar os grupos subdesenvolvidos. O marxismo previa a existência de diferentes nacionalidades e de minorias dentro do Estado. Só na Rússia existia mais de 134 mil, em 1959, e mais de 200 mil, em 1979, mas uma lei declarou o nomadismo como ilegal, em 1956.

A Polônia tentou integrar os ciganos nômades, com abertura de escolas e oficinas cooperativas. No entanto, eles sempre persistiam em suas migrações. Os governos misturavam condescendência com despotismo, benevolências com medidas radicais, como ocorreu na Checoslováquia.

A LÍNGUA E SEUS DIALETOS

A língua dos Sinti tem forte influência do alemão. Já os Roma são mais do Leste Europeu. Outras categorias são os Calés e os quinquis da Espanha e de Portugal, e os manouches, xoraxané, rom (kalderash) da França. Na Itália viviam os Sinti, Abruzzi e Calábria. Muitos deles vieram da Grécia. No Balcãs, existia uma grande complexidade étnica. Na Iugoslávia perambulavam 20 tribos principais entre cristãos e mulçumanos. Na Suécia, eles ficaram conhecidos como tatare e zigenare.

Nos anos 80, de acordo com estimativas do autor da obra, a população cigana era medida entre 2 a 5 milhões em toda a Europa. Suas línguas são carregadas de dialetos entre os vários grupos. Segundo Fraser em “História do Povo Cigano”, “muitas vezes se tem previsto a morte da sociedade cigana. O fato de a língua, os costumes, as tradições e todo um estilo de vida estarem em constante mutação e adotarem elementos de outra sociedade, é tido como indicador de declínio”.

Ainda conforme o acadêmico, “os valores familiares são o cimento importante de muito da vida cigana, o que se torna evidente na abordagem a um meio de ganhar a vida. Em geral, os filhos começam a contribuir assim que têm idade. Muitas vezes, com pouca instrução no sentido convencional, as crianças saem com adultos, vendendo e ajudando no trabalho dos pais”.

PEREGRINOS EVANGÉLICOS E ASSOCIAÇÕES

A maioria vive atualmente o sedentarismo. Trocaram o cavalo pelos carros para puxar suas carroças, mas o animal continua muito importante em suas vidas. Muitos passaram novamente a ser peregrinos e evangelistas, se adaptando à religião do país onde vivem. Existem ciganos católicos, protestantes e ortodoxos. No batismo e no matrimônio seguem seus costumes. Santa Sara é adotada como padroeira, e a peregrinação mais conhecida é a Les Santes Maries de la Mer, nos dias 24 e 25 de março. Outros autores falam do início de maio.

A Igreja Evangelista Cigana constitui o primeiro exemplo autêntico de uma organização de massa pan-cigana na Europa Ocidental que transcende as subdivisões tribais. Nos anos 30, a nível político, houve alguma agitação para promover um grupo de pressão internacional na Polônia e na Romênia.

Depois da Segunda Guerra, os graves problemas que os ciganos defrontaram nas sociedades industriais foram, de início, ponderados em grande parte por organizações gadjés, preocupadas com a situação das comunidades. No entanto, os ciganos começaram também a formar suas próprias associações e grupos de pressão religiosas, políticas e culturais, tanto em termos locais, como nacionais.

CONGRESSOS E COMISSÕES CIGANAS NA BUSCA POR INDENIZAÇÕES

Na Alemanha, a partir dos anos 50, foram fundadas várias comissões ciganas para reivindicar indenizações. Mais tarde, o seu campo de atividade alargou-se, e a Associação dos Sinti e Roma Alemães (depois Conselho Central dos Sinti e Roma Alemães) conseguiu adquirir bastante força e domínio dos meios de comunicação.

A França foi também centro das tentativas para obter progressos numa frente internacional. Algumas eram utópicas, mas em 1965, fundou-se, em Paris, um órgão com objetivos mais realistas, denominado de Comitê Internacional Tsigane (Comissão Internacional Cigana) que trabalhou em estreita ligação com a Igreja Evangélica Cigana.

Todos tinham como objetivo principal não a adaptação dos ciganos à sociedade, mas o fim da injustiça social. Para tanto, prepararam manifestações, pressão sobre a opinião pública e campanhas publicitárias. O destaque ia para a necessidade de preservar a flexibilidade econômica e geográfica, o direito de continuar a viajar, o uso da língua Romani e da cultura cigana na educação oficial.

A Comissão Internacional organizou o primeiro Congresso Mundial Romani, em Londres, em abril de 1971, onde delegados de 14 países adotaram o nome Rom, uma bandeira e uma palavra de ordem “Opré Roma”! (Erguei-vos ciganos!).

Foram criadas cinco comissões para tratar de assuntos sociais, educação, crimes de guerra, língua e cultura. O segundo Congresso Romani foi realizado em Genebra, em abril de 1978, contando com 120 delegados e observadores de 26 países, inclusive da Índia. Com o nome Romani Union obteve, em 1979, um estatuto consultivo junto da Comissão Social e Econômica das Nações Unidas. Foram eleitos delegados às Nações Unidas.

O terceiro Congresso foi em maio de 1981, em Gottingen. As discussões foram dominadas pelo destino dos ciganos sob o domínio nazista. Os ciganos iugoslavos desempenharam um papel especial no desenvolvimento do movimento internacional.

A queda dos regimes de linha dura tornou mais fácil a realização do quarto Congresso, nos arredores de Varsóvia, em abril de 1990, com 250 delegados (75% do antigo bloco comunista). Na Hungria, o Partido Democrata Livre Romani trabalhou com o Democratas Livres da Hungria para assegurar dois deputados nas eleições de 1990.

O quarto Congresso Mundial Romani conferiu à sua comissão executiva a tarefa de por em prática uma série de ambiciosos programas relativos a indenizações, educação, cultura, relações públicas, língua e uma enciclopédia cigana, propondo rever o saber do mundo do ponto de vista dos ciganos do mundo.

“A busca de uma língua unificada é apenas o aspecto de um novo desejo sentido por alguns ciganos de soldar as fissuras que se tem aberto ao longo da história de seu povo e de encontrar maneira de rodear a diversificação nas suas próprias fileiras, produto do prolongado contato de uma vasta sociedade europeia. Ser cigano não consiste apenas em ser criado e viver no meio de ciganos, mas também em relação com pessoas sedentárias”.

“ Durante muito tempo, a sua sobrevivência dependeu de repelir o inimigo, mais pelo estratagema do que pela força, mantendo-se em movimento e evitando sarilhos, embora ignorando as leis de seus países de residência”.

“Sempre cuidaram da sua autonomia adaptando-se às culturas dominantes, mas preservando uma distância social intensificada pela suspeição com que eram tratados pelos gadjés. Agora, procuram encontrar o seu próprio caminho e reivindicam uma voz na defesa dos seus interesses, de maneira a poderem erguer-se contra o preconceito que meio milênio pouco fez por derrubar” – destacou o autor do livro “História do Povo Cigano”, Angus Fraser.