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:: 26/mar/2020 . 22:48

JANGO E EU – MEMÓRIAS DE UM EXÍLIO SEM VOLTA

Melancolia, saudades da pátria, dos tempos da infância quando pouca coisa se entende dos acontecimentos, lembranças vividas num diário-romance, com passagens políticas desde o golpe de abril de 1964 até a morte misteriosa de seu pai, em dezembro de 1976, em “Jango e Eu – Memórias de um Exílio sem Volta”, escrito por João Vicente Goulart, numa linguagem simples, solta e descontraída, bem longe das amarras acadêmicas.

É um livro que eu diria bem prazeroso para se ler que se passa no Uruguai, na Argentina, Paraguai e tem uns fiapos interessantes na França, na Espanha e na Inglaterra. São narrativas espontâneas, algumas soltas, que, em pedaços, formam o todo de um tempo difícil que marcou nossa história brasileira. Não precisa que tenha vivido aqueles dias, nem que seja um estudioso do assunto da ditadura. Você vai compreender de uma maneira fácil como tudo aconteceu. O leitor faz um passeio relaxante em paisagens não repetidas.

Os grandes homens do século XX

No prefácio do livro, Tarso Genro lembra os grandes homens do século XX, com os generais Rondon e Lott, os políticos e intelectuais Luis Carlos Prestes, Jacob Gorender, João Amazonas, Juscelino Kubitschek, Leonel Brizola, Getúlio Vargas, Alberto Pasqualini, Anísio Teixeira, Carlos Nelson Coutinho, Antônio Cândido, Leandro Konder, Florestan Fernandes e, em especial, João Goulart, o mais avançado, democrático e tolerante.

Conta ainda sobre os trinta dias que ficou na fazenda de Jango, em Tacuarembó, no Uruguai, em 1972. Quase 40 anos depois assinou, como ministro da Justiça, a anistia de Jango. Destacou que Jango não era socialista, nem comunista e nem pretendia instalar uma ditadura no país. Pretendia implantar a reforma agrária nas terras situadas a dez quilômetros à margem das rodovias. Essa nunca foi feita no Brasil. Ele ainda fundou a Eletrobrás; reescalonou a dívida externa; limitou a sangria da remessa de lucros para o exterior; e abriu relações comerciais com a China, pois teve a visão de perceber o potencial daquele país.

Afirma Tarso Genro que o ex-presidente foi vítima brutal de difamações dos grandes veículos de comunicação, das arengas das forças armadas, da classe média e da ampla maioria da Igreja Católica. “A elite direitista detestava ele e o considerava traidor. Falava com os grandes chefes de Estado, como Kennedy, Fidel Castro e Mao Tsé-tung. Era um social democrata de esquerda num tempo “errado”. Apenas achava que o capitalismo poderia ser mais justo e evitou uma guerra civil”. O Brasil continuava submisso e atrasado dependente das matérias-primas na exportação. Sessenta anos depois permanece o mesmo quadro descrito por Tarso.

O prólogo da obra fala do desconhecimento dos fatos que atingiram o país a partir de 1964. O autor ressalta se sentir no dever de contar a história de seus dias de exílio junto ao pai Jango, sua mãe Maria Thereza e a irmã Denize. Ele relata o dia a dia de uma família refugiada no exílio político, se situando no período de 1964 a 1976 quando o pai morreu. “O exílio nos faz peregrinos”. Essa história real da América Latina (“Veias Abertas”, de Eduardo Galeano) “chegou até nosso cotidiano dentro de casa”

Tudo se inicia quando pisou em terras uruguaias. Mais e mais ditaduras fechavam o cerco. Recorda das constantes perseguições dos exilados, desaparecimentos e trocas de prisioneiros entre as ditaduras, como se fosse contrabando. “A liberdade é uma só” – dizia o seu pai.

Quando tudo começou

Tudo começou no dia 31 de março de 1964, na Granja do Torto, com os rumores do golpe. Os telefonemas eram cada vez mais alarmantes. Darcy Ribeiro, ministro-chefe do Gabinete Civil avisou que Jango estava no Rio de Janeiro. “Pela manhã já havia malas arrumadas para irmos direto para o aeroporto. Não pudemos levar tudo”.

 

Canta, em forma de diário, que ele (João Vicente), sua mãe e a irmã saíram apressados num avião da FAB, que não era o mesmo em que viajavam, em direção a Porto Alegre. Deixaram para trás pertences pessoais que nunca foram devolvidos, inclusive joias e documentos públicos e privados. Segundo o autor, o governo Jango foi o único que não preparou sua saída do poder. Depois tiveram que lhe devolver o patrimônio que havia sido bloqueado. O voo para Porto Alegre foi demorado. Jango ainda estava em Brasília, a caminho do Rio Grande do Sul.

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A QUEM APELAR?

Há dias que venho falando que a questão nestes tempos horríveis de coronavírus não é somente mandar as pessoas ficarem em casa, como faz a mídia burguesa. A imagem flagrada pelas lentes do jornalista Jeremias Macário indica que são pessoas que vivem nas ruas há muito tempo, e a sociedade passa e vira as costas. Agora, a situação ainda é mais grave com o vírus rondando, além da fome. A quem apelar. Esse é um quadro típico do nosso país. O outro são os desempregados, informais, os trabalhadores intermitentes, os comissionados e os biscateiros de um modo geral que estão sendo obrigados a ficarem em casa, muitos em barracos e favelas das periferias. Se o pão já era minguado, imagine agora sem nada fazer para ganhar uns trocados! Quem vai socorrê-los da miséria? Quando a mídia insiste em que todos fiquem em casa, deveria, como manda o bom jornalismo, mostrar o outro lado, de como essa gente vai se alimentar, e cobrar dos governantes providências urgentes, antes que tudo vire uma convulsão social, com invasões. Ai, vamos ter mais pessoas morrendo, além do coronavírus. Outra irresponsabilidade foi a realização do carnaval quando já existia um caso no Brasil. Sem moral, agora esses governantes ficam batendo boca, fazendo política e demagogia. Os pobres, nesses momentos difíceis, são os últimos a serem socorridos. Quem olha para eles? A elite está numa boa em suas casas, curtindo seu uísque e suas deliciosas e caras iguarias. Não está nem ai para a pobreza.

REPÚBLICA CABANA BANANA

Poema inédito de autoria do jornalista Jeremias Macário

Na minha isolada cabana banana,

Tem a serra, o frio e o calor tropical;

Tem alguma lavoura que ainda restou,

Na lagoa barrenta até uns pés de cana,

Não mais os conflitos cangaços da guerra;

Tem a mulher pegando água na cacimba;

Tem os galhos secos engaços da catinga;

O orvalho poético da manhã como cantiga;

Tem violeiro cantando a canção de amor.

 

Na minha lesa República cabana banana,

Tem minhas lágrimas de ver tanta pobreza,

De ver se espalhar pelo Brasil tanta riqueza,

Nas mãos de um latifúndio cruel capitalista,

De coronéis do poder que fazem do povo,

Um poço social desigual desumano vazio,

Onde o desempregado não passa de vadio,

Alienista político em pleno primeiro de abril,

Numa pátria amada cristã fundamentalista.

 

Na minha cabana choupana consumista,

Recebo da República uma magra banana,

Esperando meu amor que nunca chegou,

Como gladiador sem ver o tempo passar,

Assuntando o vento assoviar pra lá e pra cá,

Nas saudades de estradeiro amante do mar,

Que me ensinou ser um romântico beija-flor,

Mesmo neste Coliseu de passado de breu,

Onde o pobre e o negro tentam curar a dor.

 

Na minha República cabana banana,

Tem a lança da poesia na minha capanga;

Tem o lamento do sertão e a fera da savana;

Como um fantasma do mundo vai meu grito

Entre o nascer, o poente e a fonte do saber.

 

 





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