É muito doído ver meus compatriotas sendo deportados dos Estados Unidos dentro de um avião como se fossem bandidos acorrentados e algemados, e aqui despejados como se fossem sacos de lixo e objetos. O chefe da nossa nação, simplesmente, não contestou o tratamento humilhante, e justificou que cada país tem suas leis, apenas para bajular o Tio Sam (Donald Trump).

Sabemos, no entanto, que muitos ianques aqui vivem de forma irregular, mas não são importunados pela nossa Polícia Federal. Ao contrário, são tratados como príncipes e superiores, com direitos a empregos e outras regalias. É triste ainda sentir que, em pleno século XXI, ainda carregamos dentro de nós o vírus do complexo de vira-lata, de Nelson Rodrigues. Falta-nos a autoestima, e sobra o endeusamento aos gringos estrangeiros.

Aos norte-americanos foi dispensado o visto de entrada no Brasil, enquanto os brasileiros, como ainda nos tempos coloniais, têm que se ajoelhar e passarem por uma rigorosa sabatina e investigação se quiserem conhecer os deslumbramentos das avenidas capitalistas de Nova Iorque; olhar a Casa Branca de Washington; ou os parques temáticos de Orlando, na Flórida.

NÃO AMO

Perdoem-me a franqueza, mas confesso que não amo este país onde um governante nos faz baixar a cabeça, e não responde à altura com a mesma moeda, diante do menosprezo que os países desenvolvidos do norte expressam em relação ao nosso povo. Abrimos as portas e, como pagamento, eles nos fecham com suas muralhas de cimento e ferro.

Não amo este país onde milhares estão sendo obrigados a furar fronteiras de arames farpados e pular muros com “coiotes”, arriscando suas vidas, porque aqui a sua pátria não cuida de seus filhos e não oferece a oportunidade de um futuro melhor e promissor. Em Portugal e na Europa nossos brasileiros são vistos como candangos.

Não amo este país das injustiças sociais onde todos os dias as pessoas clamam e choram diante dos televisores pedindo por justiça porque foram vítimas da violência brutal de policiais ou bandidos. Não amo este país de tantos excluídos de pés no chão convivendo nas imundices dos esgotos por falta de saneamento básico.

Não amo este país onde milhões derramam suas lágrimas nas filas do INSS, nas dos corredores dos hospitais rogando por um atendimento médico, nas dos balcões superlotados dos desempregados pais de famílias e até mesmo dos sofrimentos nas filas dos cadastramentos para montar uma barraquinha no carnaval. Não amo este país tão carente de lideranças onde o povo é quem paga o rombo do déficit fiscal construído ao longo dos anos pela elite política, para se manter no poder e nos oprimir.

Não amo este país dos retrocessos que ameaçam nossa ainda debilitada democracia, querendo impor uma cultura “imperativa” e “patriótica” aos moldes do nazifascismo. Não amo este país onde o nível de educação ainda é um dos piores do mundo, o que nos empurrou também para uma profunda desigualdade social de pobreza e miséria, enquanto a concentração de renda só faz aumentar.

Teria aqui um rosário de razões para me deixar envergonhado, como a contínua degradação do meio ambiente e a intenção de acabar com as reservas indígenas, colocando os nativos das florestas nas cidades, como mendigos e moradores de rua, o que resultaria no extermínio completo de suas culturas,

EU AMO

Sempre procurei defender os meus princípios e condenar os malfeitores que depois de prometer o bem-estar da nação, com lisura e honestidade, deixaram para trás uma terra arrasada, não importando a cor do partido, embora me critiquem como intransigente e aquele que quer impor ideias. Respondo apenas que, contra fatos, não existem argumentos.

Não quer dizer que não ame minha pátria, apesar das mazelas e de ver tanta gente sendo massacrada e aniquilada pelos poderosos. Eu amo este país de tantas belezas naturais, de solo rico de raros minérios e fértil, que poderia estar na linha dos mais desenvolvidos do mundo, com uma qualidade de vida invejável onde todos sentissem orgulho da sua pátria.

Eu amo este país em nome daqueles que lutaram, combateram e derramaram seu sangue em prol de uma nação democrática e mais igualitária onde seus filhos não necessitassem ter que fugir de sua terra. Eu amo este país dos grandes escritores, poetas, artistas, juristas, cientistas e todos aqueles que com seus talentos e bravuras engrandeceram o Brasil lá fora.

Eu amo este país da diversidade cultural e grandiosa, principalmente do Nordeste forte e resistente, mesmo tão explorado ao longo desses cinco séculos. Amo este país do sertanejo simples e valente que ama seu chão e nunca deixou de lutar, apesar das adversidades e das injustiças.

Eu amo este pais do maracatu, do frevo, do forró, do bumba-meu-boi, dos repentistas ligeiros nas palavras, dos cordelistas, dos trovadores, do samba no pé, dos contadores de causos, dos pintores e dos grandes compositores e músicos que deixaram suas marcas aqui e lá fora.

Eu amo este país de mistura ibérica, indígena e africana, todo misturado, que não perde a esperança e a fé de um dia ter um futuro onde todos sonhem juntos e se amem, e não de forma separada e individual, como ainda acontece. Eu amo este país de tantos brasileiros que enfrentaram e ainda enfrentam os opressores preconceituosos, racistas e homofóbicos.