Com o sistema de saúde em estado terminal, com gente morrendo nos corredores dos hospitais, é enganosa, mentirosa e demagógica a orientação de especialistas do setor para que as pessoas façam exames de prevenção antes que a doença se alastre pelo corpo, como no caso do câncer e outros males que mais matam no país.

Agora mesmo um médico do Hospital de São Paulo se revoltou e denunciou que faltam materiais para fazer correções simples de retina nos olhos e que muitos correm o risco de ficarem cegas porque a unidade não dispõe de recursos para bancar os procedimentos. Se os casos de pequena e média complexidade estão assim, imagina os de grande complexidade!

Li dia desses o artigo de um neurologista onde recomenda dieta saudável, exercícios físicos e tratamento de hipertensão arterial como medidas principais de prevenção do AVC -Acidente Vascular Cerebral e ainda que o paciente seja atendido imediatamente através de uma chamada ao Samu por ambulância com profissionais treinados ou serviço móvel de emergência privado. Em sua avaliação médica, pacientes com AVC devem ser atendidos em centros especiais nos hospitais, denominados de “Unidades de AVC”.

Em se tratando de Brasil, nem é mais preciso fazer outros comentários. Tudo não passa de falsa propaganda. Estamos cheios de “previna-se” sem oferecer a estrutura adequada. Se depender do Samu a morte é praticamente certa, ou o paciente fica com sequelas. Por sua vez, nunca soube que existam Unidades de AVC em hospitais públicos. Será que cada brasileiro tem um médico particular e eu não sei?  Portanto, é muito cinismo ir para a imprensa e recomendar que a população se previna logo cedo para que o mal tenha cura. Mas, como prevenir neste país bagunçado e injusto se o paciente sofre em longas filas para marcar um exame que só vai ser atendido seis meses e até um ano depois? Conheço uma pessoa que marcou uma mamografia pelo SUS e só foi chamada um ano e meio depois. Como estaria se estivesse com um câncer?

O pior é que a mídia faz essas matérias na área da saúde e embarca nessa onda dos médicos, sem questionar este outro lado da dificuldade de tratamento. Fazem as tais campanhas como o “Outubro Rosa” e depois a precariedade e a miséria continuam na mesma situação.

Por que a mídia não mostra que, como está, chega a ser impossível o pobre se prevenir de determinadas doenças? É porque ela é incompetente, preguiçosa e já se habitou a fazer o feijão com arroz para se aparecer e agradar a um público que também não reflete. É necessário que a realidade seja escancarada e a mentira seja desmascarada.

No Brasil onde milhares morrem todos os anos por falta de assistência médica, só pode fazer prevenção de saúde regularmente quem tem dinheiro e é rico. Até mesmo quem tem plano de saúde encontra barreiras. Os pobres morrem a mingua nos corredores dos hospitais e mofam nas precárias UTIs, mesmo com ação na Justiça, que não seria necessária pela Constituição.

Mandar um pobre coitado do SUS fazer prevenção do câncer, doenças do coração, hipertensão e outras enfermidades perigosas é crime de estelionato. É falsidade e maldade. Mais parece com promessas de políticos safados. A classe médica não pode cair nessa armadilha do faz de conta. Não é mais consciente e realístico dizer que prevenir neste país é muito difícil e cobrar respeito dos governantes para com a população desvalida?

Neste quesito e em outros, a nossa mídia deixa muito a desejar e peca quando simplesmente aceita a resposta do prevenir e não estampa o outro lado vergonhoso do problema. Veja as matérias sobre avanços tecnológicos e descobertas na medicina! É como dar um doce para uma criança chorando. Com raras exceções, a maioria de nossas máquinas e aparelhos está caduca e inadequada para o uso, não tratando e até contribuindo para propagar outras doenças no organismo do indivíduo.

Sabemos que as invenções das altas tecnologias de curas e tratamentos feitas por países capitalistas desenvolvidos, especificamente no ramo da saúde, são excludentes para as nações pobres. Os medicamentos criados em laboratórios sofisticados de alta precisão só chegam ao alcance dos mais afortunados.  Aqui, os idosos mais carentes derramam lágrimas todos os dias para adquirir seus remédios, sem contar que na falta deles, muitos ficam prostrados em suas camas na espera da morte.

Quando se dá uma notícia de lá sobre uma pesquisa científica que detectou a cura de uma doença maligna, o lado de cá fica alegre, mas depois vai se saber que para chegar aqui leva anos, sem contar que a tecnologia é cara e só poucos vão poder se beneficiar dela, para tristeza e desilusão de muitos.

Num Brasil de desigualdades tão profundas onde a educação e a saúde são bens preciosos só para uma pequena minoria, essa exclusão perversa e escravocrata não ocorre somente na medicina, mas em outros setores de bens materiais e até imateriais. Só os incautos acreditam e se conformam que logo vamos ter acesso amplo para a cura de todos nossos males.