OS 50 ANOS DE “DEUS E O DIABO”…

Há 50 anos o golpe civil-militar batia em nossas portas e o Teatro Vila Velha, em Salvador, abria suas portas para os shows de Caetano, Gil, Bethânia, Tom Zé e Gal Costa, anunciando a vinda do Tropicalismo. Há 50 anos o baiano de Vitória da Conquista, Glauber Rocha, exibia seu filme “Deus e o Diabo na Terra do Sol”, aclamado no Festival de Cannes.

ESTUDANTES E GLAUBER 001

Foi uma época de ouro e muita efervescência cultural com a poesia, a dança, o teatro, a literatura e a música exibindo seus talentos através de suas inéditas obras. O Clube do Cinema, fundado por Walter da Silveira, em janeiro de 1950, ganhava seu devido espaço no cenário nacional com filmes de temática social.

Veio a ditadura para apagar toda aquela bela paisagem pintada por mentes que jorravam cultura e queriam fazer uma revolução. Depois de “Barravento”, em 1962, Glauber Rocha, mesmo com seus intervalos de depressão e questionamentos incompreendidos, resolveu fazer “Deus e o Diabo na Terra do Sol”, um meio faroeste que mostra o poderio do senhor da terra sobre os pobres. Um panorama das desigualdades sociais.

 Nascido em Vitória da Conquista, em 1939, o homem tempestade partiu logo cedo para a capital e não deixou se abater pelos seus tormentos e fantasmas. Prosseguiu sua obra cinematográfica sem condições financeiras, só com uma câmara na mão e uma ideia na cabeça, como dizia, e filmou, em 1967, “Terra em Transe”, outro filme de reinos diferentes.

Mais tarde, em 1969, monta “O Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro”, ganhando um prêmio de destaque em direção no Festival de Cannes. “A Idade da Terra”, em 1980, feito com a venda da casa da mãe dona Lúcia Rocha, tinha uma trama muito complexa para ser entendido. Esbravejou e xingou muita gente no Festival de Veneza (Itália). Desgostoso e desiludido, morreu um ano depois no seu autoexílio.

Antes disso, em 1970, no lugar de ficar na Europa, se aventurou pela África e no Congo, em Brazzaville, fez “O Leão de Sete Cabeças”, restaurado tempos depois, que fala da colonização e da opressão dos povos africanos pelos europeus.

O artista inquieto e que não gostava de ser contrariado em suas ideias, fez parte do Cinema Nova com Luiz Paulino dos Santos e Roberto Pires, de “Redenção”, em 1959. Glauber chegou a colaborar com a montagem em 35mm de “Um Dia na Rampa” (1955), de Luiz Paulino. No formato de 16mm, um ano depois, Roberto Pires criou “Sonho”, “Calcanhar de Aquiles” e “Bahia”.

Glauber Rocha a tudo via e resolveu mostrar que também podia fazer. Pegou sua velha câmara, em 1959, e realizou o curta “O Pátio e Cruz na Praça”. A sétima arte na Bahia se expandia e corria mundo, tanto que de 1959 a 1964 foram sete longas, destacando a “Grande Feira” (1961) e “Tocaia no Asfalto” (1962), do mestre Roberto Pires, sem contar “O Caipira”, de Oscar Santana.

Dentre os grandes nomes da cinematografia que projetaram a Bahia lá fora não poderia deixar de citar a figura de Olney São Paulo com o “Grito da Terra”, filmado em Feira de Santana entre 1964/65. Por sua obra e suas ideias, Olney foi mais tarde barbaramente torturado pela ditadura civil-militar.

A Bahia começou a conhecer esta arte pelas mãos de Diomedes Gramacho e José Dias da Costa por volta de 1910. Em condições precárias fizeram pequenas projeções sobre “Regatas da Bahia”, “Segunda-Feira do Bonfim”, “Real Theatro São João” e o “Polytheama”.

De 1930 a 1950, Alexandre Robato Filho foi outro grande incentivador do cinema na Bahia. Com seus recursos, fez “Desfile de Quatro Séculos” e o “Regresso de Marta Rocha” (1955). Ao lado de Walter da Silveira, a Bahia deve muito a estes grandes desbravadores.